Sistema partidário sem banca: o fim de um regime e o começo de outro.
Tudo começou a rolar muito depressa no dia 22 de maio último, quando a Reuters divulgou que o Luxemburgo começara a investigar irregularidades graves do Grupo Espírito Santo (GES) numa das suas empresas no Luxemburgo, detetadas numa auditoria da KPMG realizada a pedido do Banco de Portugal e divulgada no dia 20 de maio passado.
Em causa estão irregularidades nas contas da Espírito Santo International, que foram detetadas numa auditoria realizada pela KPMG a pedido do Banco de Portugal, informação que foi divulgada na noite de terça-feira no prospeto de aumento de capital do Banco Espírito Santo. A ES International é uma holding de topo na estrutura do império Espírito Santo, que concentra as participações na área financeira (o BES) e na área não financeira (a Rio Forte) — Expresso, 22.05.2014
(Reuters, 27-06-2014) - Luxembourg justice authorities have launched an investigation into three holding companies of Portugal's Espirito Santo banking family, the biggest shareholder in Portugal's largest listed bank which bears their name, a spokesman for the authorities said on Friday.
The three companies - Espirito Santo International SA, Espirito Santo Control SA and Espirito Santo Financial Group SA - are all holding companies in a complicated, cascading ownership structure by the family.
Banco Espirito Santo (BES) warned last month of "material irregularities" at one of the companies, Espirito Santo International.
The spokesman for Luxembourg's justice authorities said the investigation was launched on May 22 over alleged breaches of company law. He declined to give any further details about the investigation.
A situação é hoje clara: o grupo financeiro Espírito Santo está a completamente falido, e começou a ruir às claras diante de todo o mundo no dia em que Ricardo Salgado tentou sucessivamente e sem sucesso um financiamento de urgência, no valor de 2.500 milhões de euros, junto dos governos português e angolano.
A abébia que o Banco de Portugal lhe dera há cerca de um mês, autorizando um empréstimo do BES, no valor de 100 milhões de euros, ao insolvente RioForte, uma das holdings do GES, foi apenas uma tentativa desesperada de impedir que o dique GES desabasse em plena operação de aumento de capital do BES.
O dique, entretanto, cedeu depois de Maria Luís Albuquerque, Pedro Passos Coelho e José Eduardo dos Santos terem recusado atirar dinheiro para um buraco negro que, soube-se hoje por uma nota do BPI citada pela Reuters (ler notícia no Dinheiro Vivo), andará pelos 7.300 milhões de euros.
“...de acordo com fontes da imprensa, a ESI tem entre 2.000 e 2.500 milhões de euros de ‘book value’ negativo e a dívida total do GES está nos 7.300 milhões de euros”.
Para agravar este colapso irremediável soube-se ainda que a PT decidiu, sem consultar 90% dos seus acionistas, ajudar um dos seus sócios comprando 900 milhões de euros de papel comercial ao insolvente RioForte. Resultado: as ações do BES fecharam hoje a cair 11,43%, as do ESFG, cairam 18,51% e as da Portugal Telecom, 5,64%, e o PSI20 1,65%.
Apesar dos motivos oficialmente invocados, parece evidente que quem convocou de facto o Conselho de Estado foi o GES, ou melhor, a implosão acelerada do banqueiro do regime. Ninguém sabe que parte do BES poderá vir a ser engolida pela implosão do grupo. Ninguém sabe, aliás, muitas coisa, nomeadamente sobre os fundos de capitalização do grupo, sobre submarinos, herdades, aeroportos, campanhas eleitorais, e muito mais. Mas sabe-se, isso sim, que o sistema partidário indígena está neste momento em estado de choque, a começar pelo CDS, que tentou in extremis levar Pedro Passos Coelho a usar dinheiro da Troika, via CGD e BCP, para acudir à família Espírito Santo sem lhe exigir, como vem estabelecido nas regras da Troika, a abertura do baú das contas.
Como escrevemos a 20 de junho, o colapso do BES pode arrastar o regime para uma crise sem precedentes!
A promiscuidade entre alguns banqueiros indígenas e a partidocracia que capturou o regime foi a base de uma estabilidade democrática ilusória, sustentada por uma desastrosa alocação de recursos financeiros importados, pelo consequente processo de endividamento que nos levou até à pré-bancarrota, e pela corrupção pandémica do regime e do país.
No entanto, depois da implosão do BPN e do BPP, da redução a cêntimos do BCP e Banif, e do grande estouro em curso do BES-GES, a base oculta, mas até agora decisiva, do nosso sistema partidário e do nosso regime pseudo-constitucinal ruíu.
Os principais responsáveis políticos e financeiros da tragédia que se abateu sobre o país tentam ainda e desesperadamente agarrar-se aos destroços do navio Portugal, em nome dos vícios que não conseguem abandonar. Mas o mais provável é que tenham um dia destes que responder em tribunal pelo mal que fizeram.
Neste sentido, Pedro Passos Coelho e António José Seguro, e esperemos que António Guterres, ou até Rui Rio, são a porta estreita que se entreabre entre um passado que não consegue, e sobretudo não pode voltar, e um futuro incerto, mas de rigor e esperança, que falta e é urgente construir.
Quem nos trouxe até a este buraco não merece senão a mão pesada da Justiça. Se a indígena, por corrupta, não servir, que venham os tribunais europeus recolocar este país nos carris!
PS: vale a pena ouvir o que disse ontem José Gomes Ferreira na SIC sobre a crise no BES.
E ainda o que disse Ana Gomes sobre o BES-GES (Youtube):
No Conselho Superior da Antena 1 desta manhã, Ana Gomes diz compreender "o esforço de tantos comentadores, sabichões e economistas em tentar isolar e salvar do lamaçal o BES, o maior e um dos mais antigos bancos portugueses, que emprega muita gente e ninguém quer ver falido e nacionalizado, mas a verdade é que o GES está para o BES como a SLN para o BPN".
Segundo a eurodeputada socialista, o "banco foi e é instrumento da atividade criminosa do grupo". "Se o BES é demasiado grande para falir, ninguém, chame-se Salgado ou Espírito Santo, pode ser demasiado santo para não ir preso", sublinha.
"Nem os empregados do BES, nem as Donas Inércias, nem os Cristianos Ronaldos se safam se o Banco de Portugal, a CMVM, a PGR e o Governo continuarem a meter a cabeça na areia, não agindo contra o banqueiro Ricardo Salgado e seus acólitos, continuando a garantir impunidade à grande criminalidade financeira, e não só, à solta no Grupo Espírito Santo", alerta.
Ouvida pelo jornalista Luís Soares, Ana Gomes recorda como começaram a ser investigadas as contas do grupo e afirma que o líder do BES, Ricardo Salgado, dizia não querer financiamento do resgate "para não ter que abrir as contas do grupo à supervisão do Estado, esse Estado na mão de governantes tão atreitos a recorrer ao GES/BES para contratos ruinosos contra o próprio Estado".
Para além de acusar Ricardo Salgado de tentar "paralisar as tentativas de investigação judicial" em vários casos -- como o dos submarinos, Furacão ou Monte Branco --, Ana Gomes argumenta que a mudança das regras da supervisão bancária a nível europeu "obrigou o Banco de Portugal a analisar as contas do GES/BES a contragosto e com muito jeitinho".
A eurodeputada socialista critica a escolha da consultora PMG -- "uma empresa farta de ser condenada e multada nos Estados Unidos, no Reino Unido e noutros países por violação dos deveres de auditoria e outros crimes financeiros" e que "foi contratada pelo BES desde 2004, pelo menos, para lhe fazer auditoria", só que "a borrasca era tão grossa que nem a PMG se podia dar ao luxo de a encobrir".
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