Quinta-feira, 30 de Julho de 2009

Cavaco Silva referiu-se, no ano 2000, às despesas do Estado como um monstro incontornável. Quando o PSD está no poder o monstro cresce mais, em média, do que quando o PS está no governo. Quando o PS e o PSD tiveram maioria absoluta, o monstro cresceu menos.

Um artigo no ano 2000, Cavaco Silva referiu-se às despesas do Estado como um monstro incontrolável.

Parte desta caracterização devia-se à percepção de que há muito desperdício no Estado, e outra parte ao aumento contínuo na despesa pública desde que Portugal entrou na CEE em 1986.

O Estado consome hoje mais de 8700 milhões de euros, mais do dobro em termos reais do que há 23 anos.

O número acima refere-se ao consumo público.

Num ano, os recursos disponíveis num país são iguais ao que produzimos mais o que importamos menos o que exportamos, e podem ser usados para consumir ou para investir.

Uma medida do tamanho do monstro é a parte do consumo feito pelo Estado.

Não inclui o investimento público nem as transferências; quando o Estado tira a uns para dar a outros, em impostos, subsídios, e assistências variadas, não gasta recursos, limita-se a redistribuí-los.

Esta medida está bem abaixo das despesas totais do Estado, porque mede só os recursos que são devorados pelo monstro.

Também em relação ao tamanho da economia, a despesa tem aumentado continuamente, de 14-15% para 21-22% hoje em dia.

Se o crescimento inicial do Estado levou a convergência em relação à Europa, desde meados de 2004 que Portugal tem um Estado maior do que a média.

O que explica este crescimento?

Uma variável importante é o estado da economia.

Nas recessões como a actual, é de esperar que o Estado gaste mais para tentar estimular a economia.

Outra variável é o défice.

Seria bom se quando o défice das contas públicas cresce, os nossos governantes o corrigissem em parte cortando nas despesas.

Uma análise estatística mostra que estes factores estão ambos presentes em Portugal: quando o PIB desce 1% acima do normal, o rácio da despesa com o PIB aumenta 0,4%, e quando o défice é 1% mais alto em média num ano, a despesa cai 0,07% no trimestre seguinte e só um pouco mais nos trimestres seguintes.

Embora os défices levem a alguma contenção, repare quão modesta é a estimativa.

Para equilibrar um défice de 1% do PIB, os impostos têm de aumentar quase 0,9%.

Ou seja, em Portugal, quando a despesa sobe e surge um défice, em média isso leva nos anos seguintes a um aumento dos impostos que cobrem quase a totalidade do aumento inicial.

O Estado vai aumentando no tempo, e a carga fiscal seguindo-se-lhe.

Assim vamos, de défice em défice, de aumento em aumento na despesa.

Além da economia, a ideologia conta muito para a despesa do Estado.

Este é um dos temas políticos mais ferozmente debatidos entre quem prefere um Estado mais ou menos intervencionista na economia e na sociedade.

Sendo o PSD o partido à direita, esperaríamos que o crescimento do Estado fosse mais moderado quando está no poder.

Mas os dados revelam uma realidade surpreendente.

Quando o PSD está no poder, o monstro cresce em média 0,35% por ano, enquanto quando é o PS no poder a despesa cresce apenas 0,25% por ano.

Se olharmos só para o efeito do partido no poder na despesa pública para além do efeito das variáveis económicas, então o contributo do PSD para o monstro é ainda maior, o dobro do que o do PS.

Olhando para os quatro governos individualmente, o maior aumento na despesa veio durante os governos de Durão Barroso e Santana Lopes: 0,48% por ano. Segue-se-lhe o governo de Cavaco Silva com 0,32%, António Guterres com 0,31%, e por fim José Sócrates com um aumento de apenas 0,14%.

Se excluirmos o enorme aumento na despesa no primeiro trimestre de 2009 associado à crise, o governo de José Sócrates e dos ministros Campos e Cunha e Teixeira dos Santos teria a rara distinção de ser o único governo que reduziu o tamanho do monstro, de 21,5% do PIB quando tomou posse para 21% no final de 2008.

É importante realçar que destas simples médias não se devem tirar conclusões demasiado fortes. Mas elas fornecem pistas que põem em dúvida algumas explicações.

Por exemplo, pode argumentar-se que o crescimento do monstro durante o governo de Cavaco e Silva se deveu apenas à convergência em relação à Europa.

No entanto, a despesa convergiu a um ritmo muito mais acelerado com Cavaco do que com Guterres. Tal como Miguel Cadilhe escreveu há uns anos, o monstrinho transformou-se num grande monstro no início da década de 90.

Outra história que não convence diz que a despesa subiu com o PSD entre 2002 e 2005 por causa dos compromissos assumidos por Guterres.

Só que o aumento aconteceu sobretudo na parte final do mandato, com Santana Lopes e Bagão Félix.

No início, logo a seguir a Guterres e com Durão Barroso e Ferreira Leite, a despesa crescia a um ritmo semelhante ao verificado nos tempos de Cavaco Silva.

Um facto final é que quando o PSD ou o PS tiveram uma maioria absoluta, o monstro cresceu menos.

Este é também um dos achados mais robustos em análises internacionais neste tópico.

Uma explicação plausível diz que os governos minoritários têm de ceder a mais interesses na busca de acordos no Parlamento e isto implica abrir os cordões à bolsa.

Outra explicação nota que os governos minoritários têm menos poder em relação à administração pública, e que os funcionários querem naturalmente ter mais tarefas e poder.

De acordo com as sondagens e previsões, o próximo governo em Portugal será de minoria, e poderá vir a incluir os partidos à esquerda do PS que defendem um Estado bem maior. Suspeito por isso que o sucesso deste governo no controlo do monstro se vá perder rapidamente. [ i , Ricardo Reis]



Publicado por JL às 00:00 | link do post | comentar

MARCADORES

administração pública

alternativas

ambiente

análise

austeridade

autarquias

banca

bancocracia

bancos

bangsters

capitalismo

cavaco silva

cidadania

classe média

comunicação social

corrupção

crime

crise

crise?

cultura

democracia

desemprego

desgoverno

desigualdade

direita

direitos

direitos humanos

ditadura

dívida

economia

educação

eleições

empresas

esquerda

estado

estado social

estado-capturado

euro

europa

exploração

fascismo

finança

fisco

globalização

governo

grécia

humor

impostos

interesses obscuros

internacional

jornalismo

justiça

legislação

legislativas

liberdade

lisboa

lobbies

manifestação

manipulação

medo

mercados

mfl

mídia

multinacionais

neoliberal

offshores

oligarquia

orçamento

parlamento

partido socialista

partidos

pobreza

poder

política

politica

políticos

portugal

precariedade

presidente da república

privados

privatização

privatizações

propaganda

ps

psd

público

saúde

segurança

sindicalismo

soberania

sociedade

sócrates

solidariedade

trabalhadores

trabalho

transnacionais

transparência

troika

união europeia

valores

todas as tags

ARQUIVO

Janeiro 2022

Novembro 2019

Junho 2017

Março 2017

Fevereiro 2017

Janeiro 2017

Dezembro 2016

Novembro 2016

Outubro 2016

Setembro 2016

Agosto 2016

Julho 2016

Junho 2016

Maio 2016

Abril 2016

Março 2016

Fevereiro 2016

Janeiro 2016

Dezembro 2015

Novembro 2015

Outubro 2015

Setembro 2015

Agosto 2015

Julho 2015

Junho 2015

Maio 2015

Abril 2015

Março 2015

Fevereiro 2015

Janeiro 2015

Dezembro 2014

Novembro 2014

Outubro 2014

Setembro 2014

Agosto 2014

Julho 2014

Junho 2014

Maio 2014

Abril 2014

Março 2014

Fevereiro 2014

Janeiro 2014

Dezembro 2013

Novembro 2013

Outubro 2013

Setembro 2013

Agosto 2013

Julho 2013

Junho 2013

Maio 2013

Abril 2013

Março 2013

Fevereiro 2013

Janeiro 2013

Dezembro 2012

Novembro 2012

Outubro 2012

Setembro 2012

Agosto 2012

Julho 2012

Junho 2012

Maio 2012

Abril 2012

Março 2012

Fevereiro 2012

Janeiro 2012

Dezembro 2011

Novembro 2011

Outubro 2011

Setembro 2011

Agosto 2011

Julho 2011

Junho 2011

Maio 2011

Abril 2011

Março 2011

Fevereiro 2011

Janeiro 2011

Dezembro 2010

Novembro 2010

Outubro 2010

Setembro 2010

Agosto 2010

Julho 2010

Junho 2010

Maio 2010

Abril 2010

Março 2010

Fevereiro 2010

Janeiro 2010

Dezembro 2009

Novembro 2009

Outubro 2009

Setembro 2009

Agosto 2009

Julho 2009

Junho 2009

Maio 2009

RSS