Quando vemos na TV, lemos no facebook ou ouvimos da rádio, constatamos que o Pedro não condiz com o Passos e, estes, nada têm a ver com o Coelho.
Desconhece-se, quase em absoluto, qual o pensamento desta “santíssima trindade” sobre o país real e sobre as dificuldades que grande parte dos portugueses estão a passar. Em muitos casos a passar fome de morte.
Essa “santíssima trindade”, de certeza, também desconhece o seu próprio pensamento. Por mais que se esforce, a confusão é de tal monta que, envelhecendo a olhos vistos, não acerca qualquer vislumbre de coesão ou lucidez de pensamento.
Cultural, democrática e ideologicamente falando, qualquer das três figuras, Pedro, Passos ou Coelho demonstram um sentido único comum e em ordem a um absoluto neoliberalismo económica e socialmente numérico. Só evidenciam os números dos milhões de euros a cortar nas despesas do Estado, o que fazem bem, e nos que nos cobram em impostos, o que fazem mal, para cobrir o (continuadamente) extorquido e colocado em paraísos fiscais a coberto de vários “Montes Branco” que por aí proliferam impunemente.
É uma cultura, quase exclusivamente, alicerçada nas escolas jotinhas (que mais parecem de Chicago) do PSD, idêntica à do PS, parecida com a do PCP e semelhante à do BE. São todas de cultura aparelhisticas, sem renovação nem regeneração possível não admitindo outros ensinamentos que não sejam a ideologia controleira dos aparelhos partidários e do Estado.
É esta cultura que nos vem afundando em dívidas e nos tem submetido à má gestão dos recursos naturais e ao desperdício da riqueza produzida.
Enquanto o povo pactuar com o sistema e se deixar governar por gentes desta estirpe (relvinhas, socráticos e outros) continuaremos a pagar caro tal desleixo.
Só ontem vi, nos placards da junta de freguesia da Ameixoeira, depois do prazo para as inscrições que foi até ao passado dia 20 do corrente, (não há interesse na sua divulgação atempada?) que a próxima Reunião Pública Descentralizada da CML se realiza dia 9 de janeiro, às 18h30, nas instalações da Junta de Freguesia da Charneca, sita no Campo das Amoreiras, tendo como ponto único na Ordem de Trabalhos a “Audição dos Munícipes” das freguesias da Ameixoeira, da Charneca e do Lumiar
Já não são de admirar tais práticas, por mais que se escreva e se fale, de democracia e cidadania. É, desde logo, nas chamadas estruturas de proximidade, as juntas de freguesia que começam os maus exemplos de falta de cidadania, de desinformação e obstrução ao conhecimento por parte dos eleitos para com os seus eleitores, os fregueses que suportam com seus impostos quer a atividade como toda a estrutura mesmo dos respectivos funcionários.
Projeto “Hortas do Vale da Ameixoeira”
No caso da Junta de Freguesia da Ameixoeira, que tem conhecimento faz tempo, não divulgou a realização de uma reunião de apresentação do projeto das hortas, no respectivo vale, a ser feita pelo vereador José Sá Fernandes e seu respectivo gabinete a realizar no próximo dia 3 de Janeiro pelas 15h30 na sede da Junta.
Quem lá for provavelmente ira constatar que serão mais os técnicos da câmara que o número de cidadãos presentes. Por estas e por outras é que a gestão pública anda como anda, por isso a fatia do PIB e ir para despesa públicas disparou descomunalmente nas últimas décadas.
Portugal tornou-se uma espécie de sociedade protetora dos animais de todas as espécies muito particularmente dos de dois pés, usando para esse efeito, a riqueza alheia transformada em euros vinda quer por via das chamadas ajudas que fomos recebendo na sequencia de integração europeia como também por via dos empréstimos que fomos contraindo à custa dos nossos desgovernos e devido à excessiva facilidade de acesso ao dinheiro barato.
Esta facilidade, proporcionada pelo farto caudal de apoios de todo género e pelo facilitismo endividatorio, levou a que tanto o Estado como os particulares entrássemos numa espécie de bebedeira festiva de tal modo que a Balança de transações Corrente (BTC) também designada de Balança Comercial regista-se um sucessivo desequilíbrio a tal ponto que importamos em média, todos os anos, mais 10% do exportado. Nem a remessas dos emigrantes que tão digna e laboriosamente representam o país por esse mundo todo nos têm valido.
O disparate do endividamento chegou a tal monta que que atingiu os 240% do PIB. Dito de outro modo, para pagar o que gastamos, a amortização da divida e os respectivos juros precisamos mais 140 em cada 100 euros produzidos. Tal valor resulta da acumulação dos sucessivos excessos de gastos que fomos acumulando e andamos a varrer para debaixo do tapete através da chamada desorçamentação dos gastos públicos realizados através das empresas municipais, empresas públicas e as famigeradas Parcerias Publico-Privadas (PPP) tão a gostos de certos governantes e grandes empresas de obras públicas.
Naturalmente, é importante não esquecer, que no meio desta tramoia toda estão, como centro giratório, os partidos políticos e quem os controla, sempre os maiores e mais protegidos desta mixórdia de endividamento público e privado. Não é por acaso que tais partidos só tem experimentado mudanças de sentido único, ou seja o aprofundamento do egocentrismo, o controlo dos aparelhos sempre pelos mesmos grupos e do aumento de vícios corruptos, tanto internamente como na sociedade que afirmam representar.
A avaliar pelo comportamento dos portugueses fora de portas não será difícil de concluir que o defeito só está na população na medida em que se deixa iludir pelos políticos que escolhe. Em tudo o mais é lamentável que um povo tão abnegado e com um território tão bafejado pela natureza só cai três vezes em trinta anos numa situação de banca rota por ter políticos incompetentes, desonestos ou corruptos e lideranças que o não são efetivamente.
Andámos, durante demasiado tempo, enfeitiçados por uma espécie de “tia rica”, como afirma Camilo Lourenço no seu “manifesto,” BASTA e tanto políticos como o povo descuidaram os sábios provérbios populares que dizem que “tudo o que seja, demasiado, barato acaba por sair caro, muito caro, mais tarde ou mais cedo” ou de que “quem cabritos vende e cabras não tem de algum lado lhe vem ou anda a viver à custa de alguém”.
Se os partidos e os políticos não mudam, nas suas práticas e comportamentos, só há uma forma de resolver esta “mixórdia de vícios” é o povo muda-los a eles, sob pena de tais mixórdias se repetirem.
Há uns autarcas com mais sorte(?) do que a maioria dos eleitos. Eu próprio, que apenas fiz um mandato e no qual apresentei por iniciativa própria mais propostas que os restantes 12 juntos, não tive qualquer formação qualquer reconhecimento do trabalho realizado por parte da força política pela qual foi eleito. Só os entrosados no aparelho e os bem vistos por quem controla a estrutura tinham ou têm tal sorte.
Creio ser muito importante conhecer, de forma clara e inequívoca tanto a evolução histórica do que foram as Juntas Paroquiais e a passagem destas para a freguesia de carácter civil e, mais importante ainda, conhecer a actual legislação enquadradora das competências das Juntas (executivos e assembleias) assim como dos respectivos deveres para com os eleitores. Infelizmente a grande maioria dos eleitos não sabe e nem se mostra interessado em aprender, o que é gravíssimo.
Estranhamente, ou talvez não, os “donos dos partidos” persistem em escolher essa mesma gente, militantes ou não, pouco importa desde que não façam grandes ondas e se coloquem, não ao serviço de quem os elege, acólitos de quem os escolhe.
Enquanto assim continuar nem o conhecimento legislativo nem (o que é igualmente importante se não mesmo mais) será feita a necessária aprendizagem a ser cidadão e a ser responsavelmente conhecedor da realidade da autarquia que se representa e que se torna responsável.
Uma pessoa que não viva nem trabalhe ou tenha uma ligação com o mínimo de profundidade à autarquia e aos fregueses que nela habitam ou nutram algum interesse não individualista não poderá ser um bom autarca. Isto tambem se aprende, quando para isso haja vontade.
Quanto à legislação existente é efectivamente muito complicada e dispersa. Os dois diplomas mais importantes são Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro Com as alterações da Lei 5-A/2002, de 11 de Janeiro que define o Quadro de Competências e Regime Jurídico dos Órgãos dos Municípios e das Freguesias.
E, Por outro lado o artigo 8.º, n.º 2Lei 27/96 - de 1 de Agosto Define o Regime Jurídico da Tutela Administrativa conjugado com o disposto o artigo 90º, n.º 6 da LAL o artigo 4.º do EEL, e ainda o artigo 44.º do Decreto-Lei n.º 442/91, de 15 de Novembro, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 6/96, de 31 de Janeiro, que aprova o Código do Procedimento Administrativo (CPA) regulam SUSPENSÃO, RENÚNCIA E PERDA DE MANDATO
Outra legislação que convirá saber da sua existência:
Entre a Google e Depardieu, os parvos somos nós (-por Daniel Oliveira, Arrastão e Expresso online)
Gérard Depardieu sentiu-se "insultado" com as críticas sobre a sua decisão de ir viver para a Bélgica por causa dos impostos que o governo francês criou para os mais ricos. Tão ofendido que anunciou que vai renunciar ao passaporte francês.
Confesso que também não compreendo a ira contra Schmidt e Depardieu. Não são eles que governam. Não foi a Google que permitiu a existência de paraísos fiscais que acabariam no dia em que as principais potências do Mundo os considerassem um problema. Não foi Depardieu que impediu uma harmonização fiscal da Europa. Foram as autoridades europeias.
O primeiro-ministro francês acusou Depardieu de falta de patriotismo. Fiquei curioso: o que fez o governo francês pela harmonização fiscal no espaço da União? É que se, para fugir aos impostos, Depardieu tivesse de deixar de ser cidadão do espaço comunitário talvez pensasse duas vezes. E o que fez a Europa e o Reino Unido para impedir que empresas que operam no espaço da União usassem paraísos fiscais? É que não sei se a Google terá grande mercado nas Bermudas. E o que fez a União Europeia, no contexto internacional, para pôr fim aos offshores que permitem a pequenos Estados viverem à custa das economias dos outros? Ou para impedir que empresas que fogem ao fisco possam operar no seu País?
Nada do que os governos, britânico e francês incluídos, deixaram de fazer resulta de qualquer esquecimento. A ideia é mesmo alimentar a concorrência fiscal na Europa e fora dela e permitir que o sistema fiscal dos países desenvolvidos seja um autêntico queijo suíço para que dele beneficiem apenas os que mais têm. Porque os governos que elegemos não governam para nós.
A situação em que vivemos resume-se a isto: as grandes empresas e os cidadãos mais ricos usam as infraestruturas e apoios públicos dos países mais desenvolvidos, pagos quase exclusivamente por trabalhadores por conta de outrem com menores recursos do que eles. Como apenas os que menos têm pagam impostos, os recursos vão minguando. Como eles faltam, corta-se no fundamental. O fundamental que até agora permitiu que sobre dinheiro a alguém para ver os filmes do senhor Depardieu e que permite ao senhor Eric Schmidt viver com alguma segurança num País civilizado. Mas se falta para o fundamental, nunca falta para gastar o nosso dinheiro em resgates bancários. Até porque, à medida que o Estado mais nos vai faltando, mais dependemos da banca para coisas tão simples como ter casa, escola, saúde e reformas. Ficam todos a ganhar. Todos menos nós, que somos a maioria.
A concorrência fiscal, sobretudo na Europa, é insustentável. É até insustentável para as empresas que precisam do mercado europeu, onde as que contratam Depardieu e a Google estão seguramente incluídas. Mas o mundo não gira por imperativos éticos individuais. Não gira sequer por nenhum desígnio racional. O que o faz girar são os interesses individuais e coletivos em conflito. Não espero que um dia a Google e outras empresas distribuam menos dinheiro aos seus acionistas porque resolveram pagar voluntariamente os impostos onde deviam. Se a lei lhes permite fazer de forma diferente, de forma diferente farão. Não espero que o senhor Depardieu decida viver numa mansão mais pequena porque quer continuar a ser francês. Espero que sejam os governos a defender o interesse da maioria e a obrigá-los, como nos obriga a nós, a pagarem tudo o que devem pagar. E isso só acontecerá quando a maioria pensar como Eric Schmidt e Gérard Depardieu: de acordo com os seus interesses.
Se a maioria paga impostos e não pode fugir a eles, se a maioria precisa que o Estado continue a garantir o que apenas os impostos podem pagar, se a maioria não quer viver do crédito quando os impostos que paga lhe devia garantir o fundamental, a maioria deve eleger quem obrigue quem mais tem a pagar tudo o que deve até ao último cêntimo. Os que podem fugir aos impostos não elegem governos. Somos nós que os elegemos. Podemos acusar estes cidadãos de falta de sentido ético ou de patriotismo. Mas os culpados somos nós, que votamos em quem não defende os nossos próprios interesses. Eric Schmidt diz-se "orgulhosamente capitalista". Até quando seremos nós "orgulhosamente parvos"?
Manuel Lemos, o presidente das misericórdias portuguesas, terá afirmado que “Não há razão para haver fome” tendo dado como justificação para essa ausência não uma melhor e mais razoável distribuição da riqueza produzida mas o facto de existirem muitas misericórdias e Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) e as pessoas poderem lá ir.
Já um outro senhor, em plena campanha presidencial, aconselhou o mesmo recurso indicando, inclusivamente, que as organizações do Estado não eram tão acolhedoras e menos humanas por isso as privadas eram mais acessíveis.
Coisas estranhas (ou talvez não), cada um saberá as linhas com que se coze (estamos a falar de cozinhados, pois claro), porque há quem afirme que tais instituições estarão a rebentar pelas costuras das suas capacidades de resposta, tal é a avalanche de pedintes, enquanto outros afirmam haver fartura na esmola.
Afinal onde estará a verdade e a razão?
A razão corresponde a algo que é razoável, a algo que que tenha um mínimo de equilíbrio entre duas ou mais grandezas mensuráveis e passiveis de serem comparadas como seja a produção da riqueza e a sua, concomitante, distribuição com o mínimo de equilíbrio e justeza social.
Provavelmente nem Manuel de Lemos nem a madame Jonet são razoáveis nas suas declarações, por varias razões e sobretudo por uma, a razão de ser das suas instituições e que é a existência de excluídos da sociedade que deriva da má distribuição dos bens produzidos. Deveriam ficar contentes com uma verdadeira redução do número de necessitados, até à sua completa extinção e parece o inverso. É lamentável! A pobreza já se sabe.
Efectivamente, não há razão para haver fome, em qualquer lugar do mundo, não por existirem misericórdias ou IPSS (essas até podem coexistir com outras finalidades) mas porque são produzidos bens suficientes para se alimentarem todas as necessidades se no circuito desde a produção, passando pela distribuição e no consumo forem reduzidos os excessos e os desperdícios.
O provérbio chinês ensina que se devem distribuir as canas e levar as pessoas a ter hábitos de pesca mas continuamos a enveredar por outros caminhos. Porque será?
(Re)Construir Portugal: as alternativas à dívida pública (-por Patrícia Maia)
A dívida pública atinge neste momento os 200 mil milhões de euros ou seja 110 por cento do PIB. A aposta na austeridade e nas privatizações tem sido a solução dos últimos governos. Mas de onde vem a dívida? Será pública ou privada? Quem a deve pagar? E por fim, a derradeira questão: há uma alternativa? A Iniciativa por Uma Auditoria Cidadã à Dívida Pública e os autores do livro "Quem paga o Estado Social em Portugal" acreditam que sim.
No final dos anos 90, depois da privatização das suas principais empresas e indústrias, subjugada pela banca privada, desprovida da sua soberania económica e com uma dívida "pública" que rondava 50% do PIB, a Argentina estava de rastos. Para combater a recessão, o presidente Fernando De la Rúa implementou uma série de medidas de austeridade, orientadas pelo FMI.
Em Dezembro de 2001, depois de sete pacotes de duríssima austeridade o país continuava em profunda recessão com o desemprego a ultrapassar os 20 por cento. Chegou, finalmente, a bancarrota. As contas bancárias foram congeladas. A população, indignada, tomou as ruas do país. Uma revolta que culminou na demissão e fuga do presidente e do ministro das Finanças Domingo Cavallo.
Para José Castro Caldas, economista e membro da comissão da Iniciativa por Uma Auditoria Cidadã à Dívida Pública (IAC), Portugal deve olhar para a história recente da Argentina para evitar a repetição dos erros cometidos. Para isso é fundamental saber de onde vem esta dívida antes de a assumirmos como nossa. Um trabalho que a IAC está a tentar fazer através da sua comissão composta por cidadãos de diversas áreas (jornalistas, economistas, sindicalistas, investigadores e políticos, entre outros).
[dos muitos protestos que assolou a Argentina em 2001 © Pepe Robles]
"É importante que as pessoas saibam qual é a origem da dívida pública para saber que parte da dívida deve ser paga e perceber que não estão condenadas a sacrificar tudo o que é importante na vida para servir uma dívida cuja legitimidade não é clara", explica o economista ao Boas Notícias. A IAC não tem dúvida de que grande parte desta dívida serve para pagar o resgate de instituições bancárias e financeiras. O caso do resgate do BPN (que custou aos cofres do Estado 8 mil milhões de euros) e as garantias estatais aos clientes do BPP (perto de meio milhão de euros) serão a face mais visível da parte privada da dívida pública.
Apesar do trabalho que tem vindo a desenvolver, a IAC avisa que só o Estado tem as ferramentas necessárias para fazer uma auditoria rigorosa à dívida pública. "A Auditoria deveria ser uma incumbência do Estado português, tal como aconteceu na Irlanda, não devia estar na mão de cidadãos que apesar do seu esforço estão sempre limitados uma vez que muitos dos dados das contas públicas são considerados confidenciais, embora não haja razão para que assim seja", explica José Castro Caldas.
Que futuro para o Estado Social?
A historiadora Raquel Varela, coordenadora da obra "Quem paga o Estado Social em Portugal" (Bertrand), vai mais longe afirmando que toda esta dívida é ilegítima. "O dinheiro da Troika não serve para pagar ordenados como afirma o Governo, serve para pagar rendas privadas, os próprios juros da dívida pública, Parcerias Público Privadas, subsídios às empresas (nomeadamente através das reformas antecipadas), transferência de fundos de pensões descapitalizados da banca e da PT para a Segurança Social (SS) - que apesar de abaterem o défice prejudicam a sustentabilidade da própria SS -, ou a aplicação do Fundo da SS em aplicações financeiras de alto risco" que resultaram em enormes prejuízos, garante.
No livro coordenado pela historiadora, o investigador Renato Guedes, em parceria com Rui Viana, fazem as contas e demonstram - recorrendo a números do INE, da Segurança Social, do Eurostat e de outras entidades oficiais - que "os trabalhadores pagam, com os seus impostos e contribuições, o Estado Social", ou seja, o seu direito à reforma, à educação, à saúde. "Não é o Estado Social que provoca o défice e o crescimento da dívida... A dívida, na realidade, aparece como uma solução para os grupos financeiros que, não tendo alternativas de recapitalização das suas dívidas, colocam esse fardo na dívida pública que somos nós que pagamos através dos nossos salários".
Se a Argentina mostrou o caminho que não devemos percorrer, a Islândia poderá funcionar como um exemplo da alternativa à austeridade e à perda de direitos sociais. Depois de declarada a bancarrota em 2008, na sequência da falência dos três principais bancos do país, o país saiu à rua em diversas manifestações recusando assumir a dívida dos bancos e o Governo acatou a opinião popular. Mesmo assim, o governo islandês teve que aceitar a ajuda do FMI. Mas fê-lo "à sua maneira" exigindo a proteção dos direitos sociais e recusando um choque fiscal.
José Castro Caldas salienta que "a ideia de que os cidadãos devem pagar a dívida dos bancos é inconcebível" e acredita que nós, portugueses, só "estamos a pagar esta dívida porque ninguém perguntou às pessoas a sua opinião". Também Raquel Varela defende que posição da Islândia foi "revolucionária" pois passou por "uma situação de crise total do Estado e isso levou à suspensão do pagamento da dívida da banca à Inglaterra e à Holanda". "Aliás suspender a dívida não é um ato inédito, a Alemanha e os Estados Unidos já fizeram o mesmo", acrescenta.
Privatizações: Uma solução ou perda de soberania?
Além das mais de 50 medidas de austeridade implementadas, o Governo está a apostar num outro bem comum dos portugueses, as empresas públicas, para financiar a dívida, num processo que foi iniciado pelo anterior executivo. Até meados de 2014, o atual Governo espera arrecadar mais de 5,5 mil milhões euros com a privatização de empresas, muitas delas altamente lucrativas. A Galp e a PT são exemplos de empresas com alta rentabilidade que passaram para as mãos de privados. Desde que foram privatizadas, a Galp teve um retorno total (incluindo dividendos) de 205%, em seis anos, e a PT, uma rentabilidade total de 493%, em 15 anos.
O atual programa de privatizações inclui vários setores, desde a energia, passando pelos transportes ou comunicações, com o objetivo de pôr fim à intervenção estatal nestes setores. O primeiro passo desta vaga de privatizações foi a venda de grande parte das participações estatais da EDP e REN (setor energético). As próximas serão a TAP, a ANA (uma das empresas mais lucrativas do Estado e que tornará Portugal um caso raro numa Europa onde os aeroportos estão na mão do Estado) bem como a RTP. Está também prevista a privatização das Águas de Portugal, dos CTT, da CP Carga e do ramo segurador da CGD.
Mais uma vez, é da Argentina que se podem tirar lições a este respeito (ver documentário "Argentina's Economic Collapse"). Hoje sabe-se que a onda de privatizações em massa protagonizada pelo governo nos anos 90, e que não asseguraram os interesses nacionais, foi uma das causas direta da crise de 2002. Desprovida da sua soberania, a Argentina sucumbiu. Aliás, um estudo realizado em 2009 pela Universidade de Oxford prova que há uma relação direta entre a privatização massiva de empresas públicas e o aumento da taxa de mortalidade dos países privatizados, consequência da perda de direitos sociais, da subida da taxa de desemprego e da pobreza.
De acordo com Elaine Rossetti Behring, investigadora brasileira e uma das autoras do livro "Quem paga o Estado Social em Portugal", os governos que apostam na desregulamentação dos mercados (privatizações) defendem que não é necessária a mão do Estado para garantir o bem-estar social. Mas poderá uma economia dominada por interesses económicos particulares, onde predomina a acumulação de capital em mãos privadas, garantir o bem-estar global, ou seja, o acesso a direitos previstos na constituição como o emprego, a educação, a saúde, as reformas ?
José Castro Caldas garante que não. "Quando uma pequena parte da população acumula uma percentagem da riqueza, essa riqueza não é distribuída e dá origem a uma rutura social". O economista defende por isso, que além de ser importante manter determinados setores económicos na mão do Estado, "é preciso assegurar a redistribuição da riqueza através de uma política fiscal mais justa e redistributiva, tributando as grandes fortunas e não o cidadão comum que está no limite da capacidade de resistência".
Raquel Varela defende que "num sistema da produção virado para o lucro e para a exportação (um setor dominado pelos grandes grupos económicos) a criação de riqueza não é reintegrada no Estado, o que gera situações de desemprego, trabalho precário e, consequentemente, uma diminuição do consumo interno". "Porque é que um grupo económico que explora os recursos naturais do país, a mão-de-obra nacional, fica com todo o lucro nas suas mãos?", questiona.
Há, portanto, mais perguntas do que respostas. De onde vem esta dívida? Devemos ou não pagar a fatura do nosso bolso à custa de salários mais baixos, desemprego e privatizações? Qual será o destino final da austeridade? A solução económica e política poderá estar nas mãos das pessoas.
"Este não é o fim da história"
Ao contrário do que se diz, a História mostra, diz Raquel Varela, que "Portugal nunca foi um país de brandos costumes. No século XIX tivemos uma sucessão de eleições por causa de tempestades sociais". Sobre a situação atual, a historiadora considera "saudável que as pessoas venham para as ruas" porque "este não é o fim da história".
Num mundo interligado de cidadãos cada vez mais informados, há cada vez mais gente que usa a internet para denunciar, debater, organizar manifestações, recolher e escrutinar os erros passados e presentes dos sucessivos governos. Sucedem-se as plataformas, os sites e os grupos de redes sociais dedicados exclusivamente a denunciar os abusos do Estado, a corrupção, a má gestão, as injustiças sociais numa imensa rede que reforça a memória coletiva.
"Má despesa Pública", "Tretas", "Não votem mais neles, pensem..." são apenas alguns dos exemplos na internet portuguesa. São projetos construídos por cidadãos que estão indignados, alerta e dispostos a mudar o rumo do país. Um tema que será abordado na próxima reportagem da rúbrica (Re)Construir Portugal.
"Nós, enquanto país, só sairemos disto quando tivermos governantes que afrontem os grandes interesses e, nomeadamente, os grandes interesses económicos. Na nossa própria História, D. João II, antes de assinar o Tratado de Tordesilhas, antes de mandar imprimir o primeiro livro em Portugal, antes de fazer um reinado notável, fez uma coisa muito simples: foi aos grandes grupos económicos da altura e fez algo tão simples como matar o duque de Bragança, o duque de Viseu, o duque de Aveiro e resolveu o problema dos grandes grupos económicos que mandavam no país... Hoje o feudalismo é o mesmo – a única diferença é que, na altura, o feudalismo era ter terras e o feudalismo de hoje é na finança".
"D. João II foi aos grandes grupos económicos da altura e fez algo tão simples como matar o duque de Bragança, o duque de Viseu, o duque de Aveiro e resolveu o problema dos grandes grupos económicos que mandavam no país... Hoje o feudalismo é o mesmo – a única diferença é que, na altura, o feudalismo era ter terras e o feudalismo de hoje é na finança."
Tal como no feudalismo eram as terras que possuíam valor e os senhores feudais detinham o poder, nos dias que correm, o que vale é o Dinheiro e quem tem o poder são os banqueiros. Também, ao contrário de outrora, onde um rei podia derrubar os grandes interesses com o um exército fiel e disciplinado, agora, terá de ser uma população ligada em rede, informada, corajosa, e com pouco ou nada a perder, a justiçar os senhores do dinheiro (e a escumalha que na política, na justiça e nos Media, os ampara). Ao exército medieval - uma pirâmide com um rei no ápex e peões de brega na base, sucede-se uma malha reticulada de cidadãos desejosos de esmagar sanguessugas e de criar urgentemente uma sociedade mais justa.
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