A erosão do espaço público prosseguirá graças às engenharias políticas de governos dispostos a tudo para agradar aos mercados.
As acções de Sócrates e o carácter que estas revelariam são escrutinados e debatidos até à exaustão. Fala-se muito do autoritarismo do primeiro-ministro e da sua necessidade de controlo da agenda mediática. Curioso é que muitos dos seus recentes críticos na imprensa passaram anos a entoar loas às suas determinação e coragem "reformistas" contra os chamados "grupos de interesse": estranhamente, o empresarialmente correcto dominante só usa esta expressão para se referir aos sindicatos e às suas lutas.
O que é realmente preocupante não está no centro do debate: o autoritarismo não é um defeito de Sócrates, mas sim o feitio de escolhas políticas governamentais concretas. São mais as políticas neoliberais, as que satisfazem os agentes que operam nos mercados financeiros liberalizados, a escolher os autoritários convenientes para a sua prossecução do que o contrário.
Sócrates sabe isto muito bem. Sabe onde está o poder. Basta estar atento às suas declarações à imprensa estrangeira, em que se apresenta como o mais competente para fazer recair o fardo do ajustamento sobre os mesmos grupos e espaços de sempre: contenção dos salários garantida pelo aumento de desemprego e pela precariedade e erosão dos serviços públicos.
Aqui a convergência com Belém e com a direita é total: prosseguir o que o economista político David Harvey designou como acumulação por expropriação dos bens comuns, ou seja, a empresarialização da gestão dos recursos públicos, de que as escolas secundárias são o último exemplo, como primeiro passo para a privatização nas condições que forem mais cómodas para os grupos económicos que já só prosperam à custa desta predação.
É claro que este processo, num contexto de crise e de estagnação duradoura, tem de gerar resistências, que serão tanto mais fortes quanto maior for a capacidade de mobilização dos contrapoderes na sociedade civil, sejam eles sindicatos, partidos ou outros movimentos sociais. Só uma sociedade civil activa pode traçar as linhas políticas que protegem a integridade do espaço público e assim asseguram as condições para a democracia e para a sobrevivência de um ethos de serviço público necessariamente antimercantil.
E, no entanto, foi sobre estes movimentos sociais que recaiu, e recairá, a ira do poder económico e de muita comunicação social. A desconfiança de sempre relativamente a uma democracia vibrante leva agora muitos a temer as explosões sociais e a olhar para o Oriente com enlevo: os modelos de capitalismo autoritário prosperam sem as tralhas da democracia. Enquanto não houver rupturas democráticas com esta trajectória ideológica e de políticas governativas, a erosão do espaço público prosseguirá graças às engenharias políticas de governos dispostos a tudo para agradar aos mercados.
Economista e co-autor do blogue Ladrões de Bicicletas
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