Terça-feira, 28 de Setembro de 2010
As palavras ditas por Maria José Morgado no funeral de José Luís Saldanha Sanches aqui, continuam a inquietar-nos, a despertar-nos para a necessidade de continuar a lutar contra a corrupção, por um País decente, como escrevi aqui. Recordei-as ao terminar a leitura do seu livro Justiça Fiscal, que veio enriquecer a colecção de ensaios que têm vindo a ser publicados pela FFMS (Fundação Francisco Manuel dos Santos).
Foi um livro que JL Saldanha Sanches terminou já na cama 56 dos Serviços de Cirurgia do Hospital de Santa Maria na véspera da sua morte provocada por um cancro traiçoeiro.
Constitui um ensaio lúcido sobre a justiça fiscal tomada no sentido da forma de como a carga fiscal é partilhada, na sua incidência entre os contribuintes de maiores e menores rendimentos.
Não esquece o outro lado da justiça fiscal, a da justiça na despesa pública, que pode ser posta em causa por fenómenos como a corrupção e a fraude fiscal, embora não desenvolva estes temas neste ensaio.
Desenvolve com muito rigor e pormenor a questão da justiça na tributação e do modo como devem ser cobrados os impostos para que a tributação seja justa, a temática das regras materiais de repartição da carga fiscal.
Enuncia com clareza a questão difícil do paradoxo do debate público em torno da concretização das políticas tributárias. A justiça só pode ser alcançada num processo de incessante debate democrático, mas a assimetria de informação existente entre os contribuintes e a existência de poderosos lóbis fiscais pode levar à consagração de soluções demagógicas, apenas aparentemente justas, dando exemplos em que isso aconteceu entre nós.
Aborda as questões que coloca a tributação ecológica, nomeadamente, no que se refere aos impostos sobre o tabaco e os produtos petrolíferos, na qual “a questão da justiça na repartição da carga fiscal tem um papel subordinado”, defendendo-os com argumentos ligados à eficiência económica e social desta tributação.
Como refere João Taborda da Gama, na nota prévia, as ideias deste ensaio estavam dispersas pela obra de J.L. Saldanha Sanches, que pode conhecer melhor aqui, mas este ensaio dá-nos uma síntese clara do seu pensamento nesta matéria.
O autor não foge às questões mais difíceis, como a defesa da admissibilidade da tributação retroactiva das mais-valias em IRS, que defende num quadro de crise geral do Estado Social prestador que vai exigir uma mais equitativa distribuição de sacrifícios que, para usar as suas palavras “ para ser legítima, deverá atingir todas as camadas da sociedade”.
J.L Saldanha Sanches era um cidadão preocupado com a justa repartição da carga fiscal, e uma pessoa de grande integridade pessoal. Tem por isso razão António Barreto, quando escreveu que os seus comentários no espaço púbico, nomeadamente, na televisão, na rádio e na imprensa pública “eram de um verdadeiro Provedor informal” e acrescentou “O povo ouvia-o e tinha confiança nele”.
O seu exemplo e os seus trabalhos, criam-nos a responsabilidade de continuar a lutar pela justiça fiscal sem esquecer a facilidade com que demagogicamente se podem levar cidadãos a lutar contra determinados impostos ou a defenderem benefícios fiscais, sem perceberem, em virtude das assimetrias de informação existentes, que sairiam prejudicados por essas alterações legislativas.
José Leitão in "Inclusão e Cidadania”
De Zé das Esquinas, o Lisboeta a 28 de Setembro de 2010 às 12:19
Impunidade
José Luís Saldanha Sanches, Notícias Magazine, 12 Abril de 2009
“Já fez as contas a quanto lhe vai caber na conta BPN? Provavelmente, não. Mas pode estar seguro de uma coisa: nos próximos anos uma parte do seu IRS vai ter este fim.
Ao lado do BPN, o que se passou no BCP (embora os accionistas não achem) e no BPP foram pecados veniais, que lhe podem ser facilmente perdoados.
No BCP os administradores resolveram justificar os seus vastos vencimentos com um crescimento do banco alimentado por compras de acções, via paraísos fiscais, financiados pelo próprio banco. O barão de Munchhausen conseguiu sair da caverna onde tinha caído puxando pelas próprias barbas. O BCP ia ter cotações elevadas comprando as suas próprias acções. Os accionistas – grandes e pequenos – estão a pagar isto muito caro.
O BPP foi a vertigem dos novos produtos financeiros. Quando os derivados se revelaram a arma de destruição em massa financeira, o banco afundou-se. Como o Ministério das Finanças não quis ser o salvador do banco, ao contrário do que propunha o sempre generoso Banco de Portugal, os seus clientes estão em maus lençóis. Os contribuintes, talvez não.
Resta o BPN. Ao menos aqui é tudo mais simples. Um grupo de cavalheiros de indústria, com uma sólida protecção política, passou vários anos a assaltar o banco. Toda a gente sabia disto. Em 2001 a Delloite tinha saído deixando na certificação das suas contas reservas que, em relação ao banco, eram gravíssimas. Antes já tinham deixado este mesmo banco a Pricewaterhouse Coopers e a KPMG e depois da Delloite só uma empresa muito mais pequena aceitou auditá-lo. O Banco de Portugal nada disse.
Uma revista económica (Exame), na altura dirigida por Camilo Lourenço, fez revelações gravíssimas, ao que parece provenientes do Banco de Portugal. A consequência foi uma ameaça de processo contra Camilo Lourenço e a Exame, com o Banco de Portugal a continuar impávido e sereno. Nessa altura uma intervenção pública poderia pôr cobro ao assalto, afastar e encontrar um comprador para o banco e poupar aos contribuintes qualquer coisa como 2,3 milhares de milhões de euros. Agora é tarde e Inês é morta.
As revelações recentemente feitas no inquérito que decorre na Assembleia de República sobre a inacção do banco justificariam largamente uma acção cível contra os administradores do Banco de Portugal deste período por culpa in vigilando. Mas alguém a vai interpor? Temos agora a acção penal. Nos Estados Unidos o caso Madoff, com uma gravidade semelhante, está quase findo. O réu, Robert Madoff, foi julgado e declarou-se culpado.
Felizmente que em Portugal nunca ninguém se declara culpado e o Código do Processo Penal impede que as coisas possam andar com esta velocidade indigna. Só mesmo nos Estados Unidos, onde, é sabido, não há o menor respeito pelos direitos humanos, isto pode acontecer. Além disso, a Assembleia da República teve o cuidado de aprovar uma norma sobre a responsabilidade civil dos juízes em caso de erro grosseiro. Ora, estes crimes financeiros são, por natureza, complexos e qualquer condenação suscita dúvidas. Será que alguém vai ser condenado?”
Este artigo já com ano e meio continua actual, não continua?
De . a 28 de Setembro de 2010 às 17:13
mais que actual...
De
DD a 28 de Setembro de 2010 às 22:39
O Madoff tinha um processo contra ele com mais de doze anos.Os juízes de Nova Iorque nunca ligaram ou deixaram-se sistematicamente enganar por bons advogados e ninguém na Bolsa ou Reserva Federal americana quis investigar.
É pois mentira que Madoff tenha sido condenado em poucos meses. Ele só foi condenado por causa da crise, pois nos tribunais americanos esteve doze anos a acusação de praticar o sistema Ponzi.
Isso veio na revista "Time" e nem o palerma do Medina Carreira mais os comparsas da SIC Crespo sabiam disso. Os gajos não lêem nada, só olham para os seus umbigos.
Comentar post