Sexta-feira, 29 de Outubro de 2010

A dieta , por Daniel Oliveira

O Estado é gordo.

É isto que temos ouvido vezes sem conta. Tantas vezes dito por gente que, de uma forma ou de outra, viveu quase sempre à sombra dele. Como os católicos não praticantes, só se lembram de Deus na hora do sufoco.

Agora, que vai haver cortes a sério, é que vamos tirar a prova dos nove.

 

Veremos se o sector privado vai finalmente gastar qualquer coisa que se veja em investigação e desenvolvimento quando não tiver as universidades públicas para fazer esse trabalho.

Quero ver se as empresas começam a usar a lei do mecenato à cultura porque isso lhes dá prestígio.

Quero ver se em vez de mamarrachos encomendados a engenheiros do gabarito de José Sócrates vai haver encomendas dos privados a arquitetos que não destruam a paisagem.

Quero ver os hospitais privados a tratarem do que é caro e dá prejuízo.

Empresas a apagar fogos. A garantir escolas economicamente acessíveis.

E quero ver os privados a contratar as pessoas mais qualificadas deste país.

 

É que não é por acaso que a média salarial no Estado é mais alta do que no privado. Grande parte dos mais escolarizados é para lá que vai. A maioria das empresas, em Portugal, prefere o que é barato e descartável.

 

Agora sim, vamos poder ver as maravilhas do Estado mínimo que nos andam a vender há anos.

Quando faltarem polícias na rua, não resmungue.

Quanto não houver meios para combater os fogos, não se indigne.

Quando as escolas e cresces fecharem, as universidades se transformarem em depósitos ainda mais inúteis e não houver gente qualificada para trabalhar em lado nenhum, sorria.

Quando fecharem os centros de saúde e comprar medicamentos para ficar vivo for um luxo, não se apoquente.

Morra sabendo que o Estado sempre foi o culpado de todos os nossos males. E maravilhe-se com a sua elegância depois de uma boa dieta.

 

O que me espanta, o que sempre me espantou, é haver tantos, entre os que devem à maternidade pública o seu nascimento seguro, à escola pública quase tudo o que sabem, à universidade pública a sua ascensão social e cultural, ao Estado a sua segurança e ao hospital público a sua sobrevivência, a pedirem o seu emagrecimento.

Uns são apenas egoístas:

garantida que está a sua condição, os outros que façam pela vida. Outros são só parvos.

Esses vão ver agora como elas mordem.

 

Publicado na edição de 23 de Outubro do Expresso

 


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Publicado por Xa2 às 00:08 | link do post | comentar

11 comentários:
De DD a 29 de Outubro de 2010 às 01:35
O autor do texto tem toda a razão, mas, mesmo assim, as finanças públicas têm de levar uma outra orientação no imediato e tudo deverá ser feito para termos empresas exportadoras. Não sei é como, pois com subsídios o Estado é sempre aldrabado e temos uma larga experiência nesse campo que vem dos tempos "áureos do cavaquismo".
Compete a toda a sociedade fazer algo por si mesmo, ou seja, a cada um de nós fazer algo por si próprio.


De Avestruzes a 29 de Outubro de 2010 às 12:31
Pois, pois. É muito fácil fazer omeletas com ovos de galinhas alheias.

O homem até é do PSD mas, não poderia concordar mais com ele. António Borges, que afirmou “Em certa medida, estamos de joelhos diante do Banco Central Europeu, esperando que eles não alterem a sua política de ir mantendo a situação e de nos ir permitindo viver” e acrescentou

"o sistema financeiro português falhou, não tenham dúvidas" e alertou que "quando as coisas correm mal em respeito à disciplina de capital, as coisas podem ser dramáticas".

Só a primeira afirmação anda nas bocas dos hipócritas, as outras duas omitem-nas, escondem-as .

Porque será?


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