Quinta-feira, 23 de Dezembro de 2010

Em muitas situações, a deriva dogmática alimenta-se, paradoxalmente do que, à primeira vista, poderia parecer o seu antídoto mais eficaz: a razão.

 

O título do presente artigo bem poderia servir como uma apressada definição de dogmático. Definição que destaca, de entre os diferentes traços que convergem na figura, o de que o dogmático nunca se reconhece a si mesmo como tal. Talvez porque (interessadamente?) tende a confundir dogmatismo com fanatismo, que é a atitude característica de quem se liga às suas ideias ou princípios com tanta veemência como falta de espírito crítico, e isso faz sentir-se ao dogmático como imune a essa imputação.

O que caracteriza o dogmático não é tanto o facto de que não está disposto a debater, como a forma em que planeia o debate. Repare que digo “forma” porque no fundo, em certo sentido, poderíamos considerar que está claro: o dogmático entende que o conjunto das suas opiniões não admite contradição nem controvérsia (de facto é assim que surge definido no dicionário da Língua portuguesa da Porto Editora:” diz-se da pessoa que não admite contradição; peremptório nas suas opiniões). Sem dúvida, ao contrário do fanático, não aceita que a sua inflexibilidade seja devida a nenhuma abdicação da sua capacidade reflexiva, nem crê que a ausência de toda a dúvida deva atribuir-se á adesão a dogma algum, mas apenas que, ao contrário, tende a interpretar a própria firmeza como prova inequívoca da solidez das teses que defende.

Em que se reconhece então o dogmático? Desde logo em que, visto que não pode enclausurar as discussões com nenhum recurso do tipo: “Até aqui podíamos chegar!” “mas você, por quem me tomou?”, “nesse caso, terminamos!” (ou outras modalidades de morte súbita do debate com as quais os fanáticos de qualquer sinal obstruem a possibilidade de que sejam colocadas em questão as suas mais profundas convicções) acostumaram-se a recorrer a um tipo de estratégia, em aparência mais respeitosas com as regras do jogo da livre discussão, mas orientado a um único fim, a saber: o de desactivar as críticas.

Em alguma ocasião propus descrever o dogmático como aquele tipo que, a qualquer objecção que se coloque, responde sempre e sem qualquer vacilação “mais a meu favor”. Pretendo assinalar com esta descrição que, ainda que o próprio dogmático esteja acostumado a ignorá-lo, este procedimento em última análise poderia ser alvo de críticas dele mesmo. Popper, quem em reiteradas ocasiões, assinalou que o traço mais característico das doutrinas metafísicas (especialmente as inspiradas na doutrina hegeliana), é precisamente o facto de que são capazes de neutralizar qualquer elemento eventualmente falsificador da sua doutrina, dar-lhe a volta, fazê-lo jogar a seu favor e convertê-lo em prova da sua verdade.



Publicado por Izanagi às 09:34 | link do post | comentar

2 comentários:
De Poeta foi-se a 23 de Dezembro de 2010 às 18:04
Alguém viu o Alegre depois do confronto de ontem, na TVI, com o candidato da AMI. O gajo é bem melhor do que afigura. Descacou forte e feio no candidato poeta. FInalmente alguém a chamar os bois pelos nomes. Só espero que muita gente tenha visto debate.


De DD a 23 de Dezembro de 2010 às 19:00
O Nobre é um gajo profundamente desonesto. Está a fazer campanha com os dinheiros dados à AMI que, entretanto, deixou de ter qualquer atividade e morreu com a ambição política do Nobre. Conheço muitas pessoas que davam pelo Natal algo à AMI e este ano não dão nada.

O médico acusa Alegre de, na qualidade de deputado, ser um dos culpados da crise portuguesa.
O gajo é estúpido, há dezenas de países em crise e basta ler a página 99 do Expresso-Economia de hoje para ver as dívidas dos vários países, cuja lista publiquei aqui neste blog há tempos.
Um homem que andou pelo Mundo, viu crises medonhas, deve conhecer o que se escreve no "Economist" e no "Courrier" ou no "Le Monde Diplomatique" e fala da crise portuguesa com o desplante de dar a ideia que um Presidente da República em Portugal pode resolver alguma coisa ou um simples deputado e que tuda não passa em Portugal de votações na AR.
Vejam no Expresso que a seguinte frase "os governos europeus precisam de contrair empréstimos no montante de 2,28 biliões de euros (milhões de milhões)"., isto em 2011, ou seja, 40 vezes mais que Portugal e a Zona Euro só tem 33 vezes mais habitantes que Portugal.
O Nobre é estúpido; não percebeu que a Europa entrou em luta tribal pela colocação de títulos de dívida ao juro mais baixo para cada tribo e mais altos para os outros. A tribo germânica dos "alemânicos" procura dominar as restantes com a ideia da sua solvabilidade, mas necessita de 329,9 mil milhões de euros e a tribo dos francos precisa de 442,7 mil milhões, enquanto a tribo castelhana procura 191,4 mil milhões e os lusitanos só precisam de 45,7 mil milhões.
Toda a crise atual resulta do Euro estático que nenhum candidato percebeu, nem o economista Cavaco que, aparentemente, nada percebe de moeda ou finge por ser inteletualmente desonesto.


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