Segunda-feira, 21 de Novembro de 2011

Quem tem medo de uma auditoria à dívida?

 

     A ofensiva austeritária tem sido protegida por um conjunto de cortinas de fumo, ardilosamente tecidas, que não só dificultam uma percepção clara e generalizada das evidências do seu fracasso como impedem uma discussão séria, aberta e democrática das alternativas para sair da crise.
   Uma dessas cortinas é ideológica e materializa-se na capacidade de influência, nos espaços de decisão, de um pensamento económico que continua a sacralizar os mercados (finança, especuladores, ...) e que tem no neoliberalismo a sua mais eficaz e contundente expressão política.

   Uma segunda cortina de fumo, decisiva para assegurar a persistência da narrativa austeritária, forma-se no espaço comunicacional e traduz-se na sua colonização pelo discurso da inevitabilidade dos sacrifícios, que um coro disciplinado e monolítico de economistas se encarrega de repetir sem cessar, protegido do confronto de ideias e do pluralismo de opinião.

   Assegurado o domínio do espaço mediático, a terceira cortina ergue o muro da desinformação, transportando consigo a ofensiva contra o Estado, a protecção social e os serviços públicos de educação, saúde e transportes.
    É este denso manto de ocultação e bloqueio que permitiu converter a crise financeira resultante da desregulamentação dos mercados numa crise das dívidas soberanas, criando a ilusão de que reside no Estado e na despesa pública a responsabilidade pela situação económica e social em que as periferias europeias se encontram.

   É no colo desta retórica que os cidadãos têm sido embalados, com a melodia inquinada do «viver acima das possibilidades», das «gorduras do Estado» e da engenhosa falácia de que este «consome» em demasia o que a economia produz.

Como se as infraestrutruras (, serviços) e equipamentos públicos, a saúde, a educação, a segurança e a justiça não fossem igualmente economia e não beneficiassem, decisivamente, as condições necessárias ao funcionamento do sector privado. Como se o crescimento anémico da última década não fosse uma das causas centrais de um modelo económico assente no endividamento, enquadrado por uma moeda única que é interessante para a Europa desenvolvida, mas catastrófica para as economias do sul.

    A auditoria cidadã à dívida é por isso um passo crucial para rasgar uma brecha de luz na atmosfera carregada das deturpações, encobrimentos, mitos e mentiras de que a narrativa austeritária necessita para se conseguir impor e sobreviver. Por imperativo elementar numa sociedade democrática, mas também por exigência basilar de transparência, há perguntas que não podem ficar sem resposta.

- Porque devemos e porque nos endividámos? - A quem e quanto devemos?

- Que juros comportam as abnegadas «ajudas» que nos prometem a salvação? - Quanto representam no total da dívida?

- Que parte deve afinal ser imputada aos serviços públicos, tomados de assalto pelos selváticos cortes orçamentais?
   Quando o desconhecimento deliberado é a principal força do embuste austeritário, a exigência de verdade e transparência é a primeira arma para devolver à democracia o seu mais pleno sentido.
   (-por Nuno Serra, publicado originalmente na página da Iniciativa para uma Auditoria Cidadã à Dívida)



Publicado por Xa2 às 13:38 | link do post | comentar

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