Os partidos dos funcionários (-por Daniel Oliveira, Arrastão e Expresso online)
Quando vi que o Congresso do PCP começava numa sexta-feira, de dia, não pude deixar de pensar: como pode um partido político juntar os delegados a um congresso num dia de semana? Só de uma forma: se
uma parte significativa desses delegados trabalharem para o partido, forem
eleitos para cargos políticos com disponibilidade a tempo inteiro ou forem assalariados
de organizações que lhe são próximas. Henrique Monteiro escreveu
aqui sobre o assunto, ao referir que dois terços dos eleitos para o Comité Central do PCP são funcionários do próprio PCP. Assim, até lhe retomo o título.
O debate, pelo menos à esquerda, sobre o papel da burocracia partidária nos processos políticos está muito longe de ser novo. E o problema também. O que é novo é a falta de implantação social dos partidos políticos. O que torna o problema ainda mais grave.
O problema não é apenas do PCP. Longe disso. Há dois anos, a Convenção do Bloco de Esquerda aprovou (por proposta de um grupo de militantes onde me incluí) uma norma que definia que a sua Mesa Nacional não podia ter mais de metade de membros que fossem funcionários, assessores ou eleitos com disponibilidade a tempo inteiro. Ou seja, que de uma forma ou de outra dependessem financeiramente do partido. Uma regra tão tímida (mas inédita nas organizações partidárias) teve, num partido jovem e com raízes na crítica à burocracia comunista, o resultado de obrigar a lista então maioritária a recompor a sua proposta de composição da Mesa Nacional.
Se tratarmos do PS ou do PSD, encontraremos menos funcionários de partido, mas uma impressionante e talvez ainda maior massa de deputados, ministros, assessores, diretores de estruturas públicas, presidentes de câmara, vereadores a tempo inteiro.
Na realidade, como bem escreve Henrique Monteiro, o problema é geral: os partidos são dirigidos quase exclusivamente por profissionais da política. É um tema que debato desde a minha militância comunista e que, com a redução da implantação social dos partidos políticos, tende a agravar-se.
Primeiro, é bom afastar deste debate o discurso populista que tanto sucesso faz por estes tempos. Os partidos, como qualquer organização, precisam de funcionários. A partir de um determinado nível de exigência, de disponibilidade e conhecimento as coisas não se conseguem fazer nas horas vagas. A democracia precisa de deputados e autarcas. E estes cargos precisam de apoio técnico profissional.
Eu próprio fui, durante quatro anos, assessor partidário, na área da imprensa, que era onde tinha experiência. Não foi seguramente pelo rendimento que tal função me garantiu que aceitei a tarefa. Ser funcionário do PCP ou do BE, pelo menos, não é especialmente gratificante do ponto de vista financeiro. Se me é permitido este pequeno desvio autobiográfico, coloquei uma condição quando entrei em funções: só ali ficaria durante quatro anos (o tempo de um mandato parlamentar) e depois regressaria à minha vida extrapartidária. Quatro anos depois, foi o que fiz: saí pelo meu pé. Não fui o único a fazê-lo e sei que na vida tenho tido a sorte de poder escolher a minha vida profissional, coisa que não depende exclusivamente dos valores que defendemos. Confesso que não foi nenhum princípio republicano que me moveu nesta condição para ocupar aquele lugar Foi outro, um pouco mais egoísta: não queria depender de um partido para viver.
Os partidos precisam e de funcionários e os eleitos precisam de assessores. E nem todos os funcionários partidários, eleitos e assessores são falhos de qualidade e princípios. Há até quem desperdice boas carreiras - conheço-os em vários partidos - por militância. A questão é outra: os partidos não podem ser dirigidos exclusivamente, ou principalmente, por pessoas que, de uma forma ou de outra, dependem profissionalmente deles. Por três razões: autonomia, representatividade e motivação política.
Funcionários, deputados ou assessores dependem, direta ou indiretamente, financeiramente do partido. Podem, claro está, ser suficientemente livres e desapegados para, ainda assim, correr o risco de tomar posições dissonantes. Mas quanto mais tempo ocupam o lugar menores são as probabilidades de encontrarem uma carreira fora do partido. E menor virá a ser a sua autonomia face ao próprio partido. Por mais livre que seja, um assalariado é menos livre do que alguém que não depende do partido para viver. A não ser, claro, que dentro do partido sirva outros interesses que lhe garantam uma carreira futura. Encontramos muito disso em partidos de poder.
Direções alargadas (Comité Central, Mesa Nacional, Conselho Nacional, etc.) que são, como praticamente todos são, maioritariamente constituídos por profissionais políticos, não representam a realidade nacional. Podem preocupar-se com ela, mas demoram mais tempo a compreender todas as suas contradições.
Não representando a realidade do País e dependendo do partido na sua subsistência, tendem, mesmo que não queiram, a ser movidos pela sua própria sobrevivência partidária. Essa motivação ajuda a explicar a dificuldade que todos têm, neste momento, em compreender e assimilar o momento de emergência nacional que se vive.
É, em parte, esse instinto de sobrevivência que explica porque o PS não corre riscos na oposição e se limita a esperar que o poder lhe caia no colo. Que explica, em parte, porque o PCP e o Bloco tendem a ter uma posição imobilista na construção de alternativas e preferem manter o satus quo à esquerda. E porque é que, mesmo quando ninguém acredita neste governo e nas suas soluções, não há uma revolta no PSD e no CDS. Pela rede de dependências que criam (e esta é apenas uma delas), os partidos são mais conservadores do que o resto da sociedade.
Repito: o problema é de todos. E obriga os partidos políticos a repensar a sua própria organização. Com o risco de se transformarem em espaços isolados do resto da sociedade, incapazes de reagir às suas necessidades e onde o uso da liberdade individual é uma excêntrica exceção de gente que tem um estatuto económico suficientemente confortável e uma ambição suficientemente contida que lhe permita dar-se ao luxo de correr riscos
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H.M. :
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Dois terços dos dirigentes (PCP e outros partidos...) dependem, na sua vida pessoal, do próprio partido, da sua liderança.
Não têm, pois, autonomia pessoal. Ali não há pluralidade de interesses nem diversidade de vidas. 66,6% dos dirigentes têm vidas semelhantes uniformizadas.
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E o mais preocupante é que a generalidade dos outros partidos lhe seguiu o modelo.
A diferença é que, em vez de funcionários do partido, têm para aí dois terços de BOYS colocados em organismos políticos e administrativos do Estado,
os quais dependem indiretamente do poder que lhes dá o líder.
Querem reformar o país? Pois assim é difícil.
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( http://expresso.sapo.pt/os-partidos-dos-funcionarios=f770910 )
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E sabendo que a composição dos órgãos dos partidos tem uma elevada quota de cargos por inerência ... percebemos a razão para o imobilismo...
De Cidadãos COBARDES ou Partidos de MERDA a 6 de Dezembro de 2012 às 13:52
As elevadas quotas «por inerência» de cargos políticos (deputados, autarcas, governantes, membros dos órgãos nacionais e federativos, presidentes de concelhias, ...)
influenciam e distorcem a discussão livre nas secções e nos (delegados aos) Congressos,
sendo o proprio voto «indicado» pela lista a que «pertence» ... a Liberdade e Democracia interna nos grandes partidos é uma MENTIRA. ...
racionalidade, coerência, valores, análise e opinião própria, comunicados e moções ... tudo é vendido ou trocado por tachos, por hipóteses de ser eleito (colocação em lugares elegíveis...), pela manutenção do seu emprego ou do seu familiar ...
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Rafael Ortega
Há que ver que esse estado de coisas interessa aos partidos.
Uma lei eleitoral que dificulta a vida a movimentos de cidadãos e a partidos pequenos empurra quem quiser participar para os partidos grandes. E aí ou se lambe muitas botas e se é "yes man", ou nada feito.
O Daniel foi assessor, mas se quiser alguma vez ser deputado vai ter que calar muitas críticas que faz. Caso contrário vai ver tipos muito INCOMPETENTES a passar-lhe à frente.
É por muito do que diz no post que muitas das pessoas mais capazes SE AFASTAM dos partidos e da política activa, deixando os medíocres ficar com a maioria dos lugares.
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- logo, com um sistema partidário viciado, não é de estranhar o AFASTAMENTO (auto-af. mas também 'empurrado') dos cidadãos da Política, da Cidadania, do Sindicalismo, do Associativismo e Cooperativismo, ... e do próprio País, EMIGRANDO ou escondendo a "cabeça na areia".
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lobisomem
Afinando a pena:
?
Estará a solução em pensões vitalícias para os ex-titulares de cargos governativos
(não acumuláveis com outra qualquer remuneração)
e a proibição de exercerem qualquer tipo de actividade profissional durante, digamos, 10 anos ?
sim...
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Américo Gonçalves
É mesmo por isso que as Jotas, TODAS, deviam ser pura e simplesmente abolidas.
Logo após o 25 de Abril, os líderes dos partidos eram homens com "Mundo", escola da vida, se quiser.
Agora, temos estes jotinhas, que andaram décadas em disputinhas por votinhos e lugarinhos, cujo expoente máximo é o RELVAS.
Mesmo a sua "experiência profissional" é sempre no perímetro da" porca política".
E pior que tudo, formam uma "casta" que serve de isolante á participação popular.
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De .. a 6 de Dezembro de 2012 às 14:07
Jorge
A demagogia anticomunista de dois colegas
Começa Daniel Oliveira por estranhar que o Congresso do PCP tivesse começado a uma sexta-feira. E se fosse ao sábado? já estava bem? desconhece DO que os operários em Portugal também trabalham ao sábado? que muitos nas fabricas trabalham por turnos e que a folga é quando calha? que os operários agrícolas e o trabalho no campo a folga é quando o tempo manda? que os empregados do comercio trabalham ao sábado e outros até ao domingo? É normal que nao saiba pois nunca entrou numa fabrica e pensa que toda a gente é profissional liberal e trabalha no Expresso . E os outros?pensara o DO. Pois os outros ,DO tiraram um dia de ferias como o fazem quando preparam a festa do Avante. Sabe a dedicação revolucionaria é uma coisa muito bonita. E os estudantes ? pensara DO . Pois se tinham aulas faltaram às aulas, mas olhe que os estudantes comunista sao geralmente os que têm melhores notas, nao se "preocupe."
Depois vem a "preocupação "com o número de funcionarios e a burocratizarão e o afastamento da vida. O anticomunismo tem esta "preocupação "que ate chega a dizer o que os comunista devem fazer e como devem ser. Nao se "preocupe "DO , os trabalhadores e a classe operaria (maioritaria nos órgãos dirigentes do PCP) estão bem entregues. Já no tempo da clandestinidade e com todos os dirigentes funcionarios as lutas dos trabalhadores nao deixaram de se fazer .
Vem ainda a "preocupação "com a independencia dos funcionarios porque dependem do salário do partido. Nao se preocupe DO, a procura é grande e geralmente muito bem remunerada por excomunistas que venderam a alma . Lembra se de Pina Moura, de Zita Seabra, só para citar alguns? Estão bem na vida nao se "preocupe "e a folha de salarial é directamente proporcional ao nível de anticomunismo mostrado.
Citando Alvaro Cunhal (outro funcionário do partido) " o próprio facto de existir, como partido operário, como partido marxista-leninista, é a maior prova de independencia do Partido" e ainda " Ser comunista nao consiste apenas em ter um objectivo político e lutar pela sua realização. Ser comunista nao é apenas uma forma de agir politicamente. É uma forma de pensar,sentir e de viver. E isto significa que os comunistas , nao só têm objectivos políticos e sociais , nao só têm uma ideologia e um ideal de transformação da sociedade , como têm uma moral própria , diferente da moral burguesa e superior a ela."
Fique descansado
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Apophis
Devia ter sido feita a distinção entre os funcionários dos partidos e as prostitutas dos partidos. Ser profissional não significa que se venda a alma, as ideias ou a dignidade.
Dando alguns exemplos:
Sónia Fertuzinhos (funcionária do PS) é a prova viva de que a formação académica e a experiência profissional é indiferente, desde que se tenha escalado convenientemente no aparelho partidário. Quando se votou a criação do município de Vizela, ela votou contra o PS (e ao lado do PSD) pelo simples facto de não querer perder poder em Guimarães.
A menina rabina da Francisca Almeida (PSD e Católica) é advogada num escritório que representa a agência Lusa, tendo assim acesso a informação privilegiada que depois lhe permitiu ser assessora para o despedimento de funcionários dessa mesma agência.
Vitalino Canas (PS) é outro trauliteiro, consultor em diversas fundações e um académico com vasta obra publicada no domínio da legalidade do direito constitucional e das relações entre os vários regimes jurídicos da coisa pública, segundo o parafraseado hermético-juridiscional que aos poucos vai matando a equidade social.
José Lello é "gestor de empresas" e Ricardo Rodrigues, o larápio dos gravadores, é advogado. Embora pelo profundo conhecimento que ambos têm das dinâmicas dos offshores até podiam redefinir a profissão. Já nem falo de Duarte Lima, senão tinha de arranjar algo como professional hitman para o designar.
No fundo, essa é a ambição de todos os jotinhas. Espetarem facas nas costas uns dos outros, mutuamente fazendo e devendo favores na espreita de uma oportunidade de ascensão, quando o cadáver do político que estiver acima deles ainda se encontrar fresco. Assim são os partidos em Portugal.
De .«Social Democracia Radical» no PS. a 6 de Dezembro de 2012 às 15:22
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O SOCIALISMO COMO HORIZONTE - uma visão humanista do pós-capitalismo.
Colóquio promovido pelo Clube Manifesto para uma Renovação Socialista
No próximo dia 15 de dezembro (sábado), com início às 15 horas, o Clube Manifesto para uma Renovação Socialista vai promover um colóquio sobre:
O socialismo como horizonte - uma visão humanista do pós-capitalismo.
O Colóquio terá lugar na Faculdade de Economia da UC (Anfiteatro 1.1. – piso 1), na Avenida dias da Silva – nº 165, em Coimbra.
Conservando-se o formato dos três colóquios anteriores, será moderador um dos membros do Clube, Pio Abreu.
Uma das intervenções será feita por um convidado, Pedro Nuno Santos, a outra, será feita por outro membro do Clube, Rui Namorado.
Seguir-se-á um debate.
O nosso convidado, Pedro Nuno Santos, é economista, deputado na Assembleia da República pelo PS e Presidente da Federação de Aveiro do PS, tendo sido secretário-geral da Juventude Socialista (2004-2008).
Este colóquio é aberto a todos os interessados, esperando-se que seja objeto de uma particular atenção por parte dos militantes do PS.
Pelo Clube Manifesto para uma Renovação Socialista
Rui Namorado, 4/12/2012, http://ograndezoo.blogspot.pt/
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Anónimo disse...
Pedro N.Santos gostei de o ouvir, no Lumiar/Lisboa, há cerca de um mês.
Não falou a treta do costume
(como papagaio político-jurista ou economista avençado ou partido-tacho-dependente)...
este jovem deputado do PS, economista, mostrou-se apenas um (infelizmente dos pouquíssimos no PS)
«radical social-democrata e conservador»(!!!) defensor dos princípios do Partido "Socialista"... (!!)
para espanto/incompreensão de vários/maioria (?!) da assistência (com partidarite, palas e ...).
Vão lá ouvi-lo ... recomendo.
Bloco de Esquerda
...
Louçã, Semedo e Pureza vêm defender a inauguração de “uma nova etapa com quem a quiser fazer, mas sem qualquer preconceito ou afastamento de quem queira seguir por outra via”.
Os proponentes afirmam que “esta plataforma da corrente Socialismo é formada numa nova época, que supera o quadro político da época anterior. As correntes de que alguns de nós fizemos parte foram formadas pelas fronteiras políticas dos anos 70”. Essa “base política é referencial”, mas “40 anos depois, pensamos que tanto não basta para nos identificar”. Agora, no presente, “o Bloco actua sobre uma nova fronteira política da nossa época, a da financiarização global, da crise europeia, do ataque contra os contratos sociais do pós-guerra ou da democracia portuguesa. É nessa nova fronteira que se deve juntar toda a capacidade para construir uma direcção clara no programa, consistente na ideologia e empenhada na política”. Reconhecem os subscritores: “Esse passo é difícil, porque é novo. Mas ele é definido pela vontade do futuro, não pela saudade do passado.”
Contra ps e PCP Os mínimos olímpicos de convergência com o PCP que têm sido ensaiados pela nova direcção do Bloco não se reflectem neste documento, muito crítico do PCP. “A diferença entre o Bloco e o PCP é realçada pelas exigências de combate à troika. Em primeiro lugar, o Bloco empenha-se em políticas e convergências unitárias, abertas e criadoras. Recusa ambiguidades soberanistas que sugerem de forma sempre envergonhada a alternativa da saída do euro e apresentam uma visão nostálgica da autarcia económica e, ao mesmo tempo, prometem o milagre económico de uma economia dependente do sector exportador”. Registe-se que o último congresso do PCP recusou uma proposta de alguns militantes que defendiam a via da saída do euro. Quanto ao PS, os subscritores afirmam que “o PS sempre rejeitou alianças à esquerda para uma política de esquerda” e que “de novo, agora, se limita a tentar atrair apoio para uma política vinculada ao Memorando de Entendimento com a troika”. A solução não passa pelo PS – “o centro morreu” –, mas por um governo de esquerda, do Bloco. “É precisa uma inversão do modo de fazer política: começar na ofensiva. Não fazemos do PS o centro da política à esquerda, pois isso seria desistir.”
... (em: http://www.ionline.pt/portugal/bloco-esquerda-cria-nova-corrente-maioritaria-socialismo )
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- E para quando uma Aliança entre partidos, movimentos, sindicatos, pessoas defensoras da Social-Democracia (ex-Socialistas) ?
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