O A. O. - A DIVISÃO DAS ÁGUAS
Fui contra o acordo ortográfico (AO) desde o princípio. Mas só a partir do momento em que se tornou praticamente inevitável a sua entrada em vigor, ou seja, depois da publicação do Segundo Protocolo Modificativo é que “fui à luta” no Politeia, há cerca de quatro anos, publicando sobre o assunto três ou quatro textos.
Analisei a questão no plano político, jurídico e da língua, apesar de este último ser aquele em que naturalmente me sentia menos à vontade. Tinha, porém, a meu favor o facto de conhecer razoavelmente o Brasil, a sociedade brasileira, alguma coisa da sua literatura, do seu movimento editorial e acima de tudo o português que lá quotidianamente se fala na rua, na televisão e na rádio, bem como o que diariamente se escreve nos jornais. E por isso me aventurei a falar de um domínio que não era o meu.
Simultaneamente, na direita intelectual mais reaccionária, como é o caso de Graça Moura, ia-se travando uma intensa batalha contra o AO, cujo ponto alto me parece ser o livro do autor acima citado – Acordo Ortográfico, A Perspectiva do Desastre. Entretanto, a reacção contra o Acordo foi-se estendendo a outros sectores da sociedade portuguesa, não conotados com a direita, embora à medida que o protesto engrossava fossem escasseando os argumentos que verdadeiramente o justificava, pontificando muito claramente a partir de determinada altura uma perspectiva puramente conservadora que em si não serve para justificar absolutamente nada.
O próprio Graça Moura, que no princípio tanto se esmerou na busca de argumentos para a rejeição do Acordo, inclusive de natureza jurídica, chegou mais tarde a dizer num artigo no DN – creio que já este ano ou no fim do ano passado – que o Acordo era uma traição aos nossos clássicos!
Enfim, como Graça Moura quando fala politicamente frequentemente raia o absurdo, tal o fundamentalismo dos seus argumentos, nem sequer vale a pena responder a esta “brilhante” objecção.
Também me não seduziu o recente texto de outro brilhante intelectual da direita – Pedro Mexia, politicamente muito mais ágil que Graça Moura – e que tão badalado tem sido nas redes sociais e até replicado por muita gente de esquerda. Claro que o texto – O Aleijão - está bem escrito, como todos os textos de Mexia, é aparentemente sedutor, relativamente irónico, mas a mensagem fundamental que dele se extrai é uma mensagem claramente conservadora, embora disfarçada pela tal agilidade política do autor que tem a manifesta preocupação de deixar claro que uma língua muda “espontânea, inevitável e constantemente”, tentando por esta via atenuar o conservadorismo da mensagem, apesar de ele saber muito bem quão difíceis e lentas são essas mudanças nos tempos em que vigora a norma ortográfica. Por outro lado, no texto de Mexia perpassa difusamente um certo sentimento de suserania perdida, apenas denunciado pelas escassas palavras que acabam o por o trair: “E agora ainda passámos pela humilhação de ter o oficioso “Jornal de Angola”a lembrar-nos que o “étimo latino” ajuda a compreender o percurso de uma palavra”.
É um pouco por estas razões, e também pelo facto de em política a direita nunca ser uma boa companhia que sistematicamente me tenho recusado a “juntar a minha voz” à voz dos intelectuais da direita, numa causa dita transversal.
De facto, o AO é politicamente uma IMBECILidade (as razões aduzidas neste domínio para o justificar são confrangedoramente medíocres), é juridicamente uma ABERRAÇÃO (na medida em que viola o princípio segundo o qual os acordos multilaterais restritos só entram em vigor depois de ratificados por todos os que o assinaram) e constitui no plano puramente linguístico um acto INUTIL, arbitrário e desigual. Realmente, como muito bem sabe quem conhece com alguma profundidade o português do Brasil, se algum ponto de contacto ele tem com o português de Portugal esse ponto é a grafia e depois a fonética. Em tudo o mais diferem radicalmente. Por isso, terá tanto ou tão pouco sentido negociar um acordo para uniformizar a grafia como teria a negociação de um acordo para uniformizar a fonética!
Por último, nesta luta contra o AO seria injusto não recordar o 1º que em Portugal denunciou as suas arbitrariedades e ... o rasgou na A.R.- Jorge Lemos, ex-dep.PCP.
De .Acta, facto, cágado, ... pára -AO. a 7 de Junho de 2013 às 09:28
Merece divulgação , 4 Jun.2013
Até que enfim... alguém faz alguma coisa!!!
Magistrado alega que as "actas não são uma forma do verbo atar" e que "os cágados continuam a ser animais e não algo malcheiroso".
"O juiz Rui Teixeira, que conduziu a instrução do processo 'Casa Pia' e que agora está colocado no Tribunal de Torres Vedras, não quer os pareceres técnicos sociais com o novo Acordo Ortográfico", revela o Correio da Manhã na edição de hoje.
O magistrado enviou uma nota à Direcção Geral de Reinserção Social (DGRS) em Abril onde se podia ler, que esta "'fica advertida que deverá apresentar as peças em Língua Portuguesa e sem erros ortográficos decorrentes da aplicação da Resolução do Conselho de Ministros 8/2011 (...) a qual apenas vincula o Governo e não os tribunais'".
Ainda segundo o Correio da Manhã, a DGRS pediu um esclarecimento ao juiz, tendo este respondido que a "'Língua Portuguesa não é resultante de um tal «acordo ortográfico» que o Governo quis impor aos seus serviços', diz o juiz, acrescentando que
'nos tribunais, pelo menos neste,
os factos não são fatos,
as actas não são uma forma do verbo atar,
os cágados continuam a ser animais e não algo malcheiroso
e a Língua Portuguesa permanece inalterada até ordem em contrário'", escreve o Correio da Manhã.
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