20 comentários:
De Unir a esq. e todos os contra a Austerid a 15 de Julho de 2013 às 16:14
cont. entrevista a J-L. Melenchon
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A conjugação do que quer o capital financeiro com os interesses da direita alemã deu um enorme poder a esta política.

---Mas é diferente do governo de Hollande?

Portugal e França vivem uma mesma situação objectiva, mas a situação subjectiva não é igual:
nós temos um governo que se afirma de esquerda, e muita gente votou nele contra Sarkozy.
Mas houve a emergência da Frente de Esquerda num nível nunca visto em muitas décadas.
É a primeira vez, desde 1981, que um candidato à esquerda do Partido Socialista faz um resultado com dois dígitos.
Isto obrigou o candidato do PS a virar à esquerda o seu discurso usando elementos consideráveis do nosso próprio discurso.

---E isso teve algum efeito nessa eleição de Hollande na política francesa?

Em grande parte não passou de apropriação de discurso.
Os portugueses podem pensar que votando na social-democracia garantem uma alternativa. Pessoalmente desaconselharia-lhes essa ilusão.
A única maneira de fazer mexer a social-democracia é a outra esquerda ultrapassá-la nas urnas.
Este é o conselho que dou aos meus camaradas do Bloco de Esquerda e do PCP.
Quando os ultrapassarem são vocês que têm a responsabilidade de UNIR e de fazer um programa que possa juntar a maioria da população, porque é necessário ter do nosso lado a maioria das pessoas.
Temos a convicção em França de que a única maneira de fazer mexer os socialistas para a esquerda é ultrapassá-los nas eleições.
Em França está-se a verificar uma homogenização da direita.
Toda a gente ficou surpreendida no estrangeiro com as enormes manifestações de direita contra o casamento gay, no país da Revolução Francesa, das liberdades, etc., mas em França sempre houve um forte campo contra a igualdade.
Ao mesmo tempo que a direita se reforça, o governo abusando da palavra "esquerda", descredibiliza a palavra nas massas e a ideia mesma da esquerda.

Primeiro divide, porque sem os nossos 4 milhões de votos Sarkozy não teria sido vencido:
a derrota foi por um milhão de votos.
Fomos nós que demos a vitória a Hollande.
Em qualquer regime democrático do mundo, aquele que ganhou ganhou, mas leva em conta os votos que o ajudaram a triunfar.
Aqui, no momento preciso em que ele ganhou, divorciou-se daqueles que o elegeram, e o divórcio toma a forma da rejeição brutal e violenta da Frente de Esquerda.
Depois DIVIDIU os SINDICATOS para negociar uma REVISÃO das LEIS do TRABALHO com o patronato.
A esquerda está enfraquecida pela política do governo, enquanto a direita se reforçou à volta da extrema-direita.
Ela cresce propondo as soluções autoritárias e xenófobas que lhe servem para arranjar bodes expiatórios para o papel dos banqueiros e do capital financeiro.
A estratégia de combate político não pode ser senão tentar UNIFICAR todos os sectores que se OPÕEM à política de AUSTERIDADE em torno da Frente de Esquerda para conseguirmos ultrapassar os socialistas.
É um combate permanente, esperamos brevemente ver os ECOLOGISTAS juntarem-se a nós contra estas políticas de austeridade. A questão-chave desta luta são as políticas de austeridade.

---Há um fenómeno em que o descontentamento com as políticas de austeridade reforça mais a extrema-direita e os movimentos populistas que partidos como a Frente de Esquerda. Qual é a razão desse falhanço da esquerda?

É injusto dizer que há um falhanço.
Porquê?
Porque são muito difíceis as condições em que nos batemos. É preciso ter em conta o nosso ponto de partida.
A relação de um partido com um povo constrói-se no tempo e com a experiência.
O que se passa é que aquilo que se chama esquerda tem um produto tóxico, e este produto tóxico é a social-democracia.

---Temos um grande debate em Portugal em relação ao euro. Há gente de esquerda que afirma que a moeda única só serve a Alemanha e que impede o desenvolvimento, o emprego e ter uma política económica independente
e há gente que afirma que a questão fundamental é a dívida soberana e uma outra política europeia.
Acha que é possível uma esquerda europeia com o euro?

É uma realidade que pode desaparecer em dez dias. Basta Portugal não pagar e temos uma crise que pode levar ao fim da moeda única. ...


De Unir e eleger verdadeira esquerda a 15 de Julho de 2013 às 16:19

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Sobre isso (fim da moeda única/ euro) podemos apelar ao exemplo de Diógenes quando vários filósofos discutiam há horas se o real existia.
Diógenes arranja um tronco de árvore, chega e começa a bater em todos e diz:
"É este o meu argumento."
Podemos discutir o euro durante horas, mas enquanto o fazemos ele pode pura e simplesmente afundar-se e por uma razão não prevista.

O primeiro-ministro de Portugal tem um acidente de automóvel e durante umas horas está incapaz, os mercados reagem e a moeda implode.
Isto quer dizer uma coisa: este euro está condenado, porque uma moeda que depende de um acaso para sobreviver não é uma moeda estável.

Para acabar com a crise, em várias ocasiões a Europa tomou medidas que não estavam previstas nos tratados:
por exemplo, cortar Chipre de todas as transacções internacionais.
Diziam-nos que isso não era possível, para fazer uma política de esquerda, mas para fazer uma política de direita parece que é possível.

A situação económica encontra-se ainda mais fragilizada por uma política que desencadeia crises orçamentais.
Em Portugal viu-se pela primeira vez o enorme cinismo do capital financeiro e dos mercados:
as agências de rating diziam que é preciso que Portugal faça austeridade, para forçar isso baixam-lhe a cotação, e quando leva a cabo a austeridade exigida baixam-lha porque como a fez vai ficar em más condições económicas. Um total cinismo.

Resumindo, este euro não tem condições para se aguentar.
Agora resta saber se é conveniente que se aguente.
Para o seu futuro é determinante quem vai estar no poder na Europa, quem vai poder fazer um contraponto à política alemã.
É completamente diferente um continente em que, por exemplo, em França, na Grécia e em Portugal possam ser eleitos governos verdadeiramente de esquerda.
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Jean-Luc Mélenchon."A social-democracia é um produto tóxico"
(-por Nuno Ramos de Almeida, publicado em 15 Jul 2013 Jornal i )


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