Passou, na RTP2, um maravilhoso documentário com um monólogo de Vandana Shiva.org. São pessoas assim que às vezes me levam a acreditar na humanidade. Abordou : - a apropriação de sementes pelas grandes corporações/multinacionais; - a impossibilidade do modelo de crescimento/consumismo ocidental; - a necessidade de a humanidade se assumir como parte integrante do planeta.
Agricultores pedem estado de calamidade pública para a região.
A Federação dos Agricultores do Distrito de Santarém (FADS) e a Associação de Produtores de Tomate do Ribatejo (APTR) vão pedir que o governo decrete o estado de calamidade pública para a região, em virtude dos prejuízos causados pelas intempéries de Maio e Junho.
Voltar à Agricultura para quê? Para continuarmos todos a pagar as quebras de um negócio particular? Então temos de pagar porque chove? E porque não choveu? Porque faz calor? E porque fez frio?
Porque tiveram uma quebra na produção quando comparada ao ano anterior de 60%?
E quando aconteceu o contrário e tiveram uma produção maior em «x»% comparativamente ao ano anterior? Ou ainda, porque o tempo esteve excelente e foi um ano de boas colheitas? Reportaram o excesso desses «lucros» ao estado?
Como se poderá chamar um negócio que quando dá prejuízo «pagamos todos» e quando dá lucro é só deles?
Numa posta que escrevi há tempos, toquei algo superficialmente numa série de temas relacionados com o desenvolvimento internacional. Por uma questão de clareza e rigor, quero agora regressar com um pouco mais de profundidade a dois ou três aspectos que então referi.
O primeiro é o ‘mapa distorcido’ novamente reproduzido em cima, que retirei de www.worldmapper.org e apresentei na altura como representando a distribuição mundial da riqueza em 2002. Cometi aí uma imprecisão, aliás algo grosseira. Primeiro que tudo, porque o que aqui está representado é oproduto (variável de fluxo) e não a riqueza (variável de stock).
Em segundo lugar, e mais importante, porque o mapa ilustra bem a desigualdade entre países e continentes, mas não tem em conta a desigualdade dentro de cada país, ou no seio da população mundial como um todo. Falta a componente inter-individual da desigualdade, que decorre principalmente da posição de classe. Por confrangedor que seja, o mapa representa apenas uma parte da desigualdade global – a realidade é bastante pior.
A segunda questão tem a ver com a defesa da remoção das quotas e tarifas no acesso ao mercado norte-americano e europeu por parte das exportações originárias dos países menos desenvolvidos. Não se trata aqui de um argumento geral em favor do comércio desregulado. O comércio “livre” é o proteccionismo dos poderosos: dadas as enormes diferenças ao nivel da dotação infraestrutural e do controlo político e tecnológico sobre os processos produtivos monopolistas e quase-monopolistas, a desregulação contribui para a desestruturação da produção nos países mais pobres, para o aprofundamento da desigualdade e para a instabilidade global.
Isso é tanto mais perverso quanto se trate de produtos essenciais, como os alimentos, em relação aos quais a soberania produtiva é mais importante do que a suposta “eficiência global”.
Dito isto, defender a abolição de barreiras proteccionistas no caso específico do acesso aos mercados do Norte por parte dos exportadores do Sul é defender a remoção de um dos mecanismos que aprofundam a desigualdade e o desequilíbrio. O aumento das receitas de exportações dos países do Sul não reverte automaticamente para os respectivos assalariados ou camponeses, como é óbvio – mas permite potenciar as dinâmicas de acumulação nesses países e isso, se acompanhado por suficientes sucessos ao nível da luta pela repartição dos benefícios, constitui um progresso em termos globais.
A terceira precisão tem a ver com a defesa de uma política migratória mais progressista através da "concessão de um contingente extraordinário de vistos a migrantes oriundos de países vítimas de catástrofes". É certo que, como referi na altura, esta medida constitui apenas um avanço meramente simbólico. Entendamo-nos: os fluxos migratórios auto-regulam-se, sendo determinados na sua maior parte pela procura (ou seja, pelos empregadores) no contexto de mercados de trabalho que são, sempre, segmentados e socialmente incrustados; tipicamente, políticas migratórias mais restritivas têm como único resultado que os mesmos fluxos passam a ter um carácter irregular, com todas as desvantagens que daí advêm para todos os trabalhadores (nacionais e imigrantes); e, consequentemente, a posição progressista em relação à política migratória tem necessariamente de passar pela sua completa liberalização, ainda que enquadrada pelo planeamento.
Dito isto, mesmo um avanço tímido como o que é atrás referido poderia, e poderá, constituir um progresso efectivo, na medida em que reflicta e contribua para a progressiva tomada de consciência de que:
(i) a possibilidade de migração constitui uma das vias mais eficazes para a melhoria da situação dos migrantes, das suas famílias e, em certas circunstâncias, das suas comunidades; e
(ii) o regime internacional de restrição da liberdade de movimentos e de instalação em que hoje vivemos (e que muitos consideram natural e inevitável) é nada mais nada menos do que um apartheid global, que urge desconstruir e abolir.
Foi possível na África do Sul e quase todos festejámos. Façamo-lo agora à escala mundial.
Agricultores versus Grandes Superfícies: a revolta de Pierre Priolet
Em artigo publicado em 6 de agosto de 2010, o jornal Le Monde dedica uma página inteira a Pierre Priolet, fruticultor, que se tornou porta-voz dos produtores franceses de frutos e legumes que não conseguem viver das suas colheitas. Numa manhã de dezembro de 2009, Pierre Priolet ouvia no rádio o ministro da agricultura a dizer que o governo ia ajudar os agricultores. Isso irritou-o. Dois dias antes, Pierre tinha jantado com dois cunhados, produtores de cerejas, que tinham acabado de pedir um empréstimo bancário. Não para investir: para comer.
Telefonou logo ao programa, sem saber o que ia dizer. Começou por declarar: "Nós não somos mendigos!" A seguir, com voz presa de emoção, disse: "Mais um ano como este, e arranco tudo." Os auditores puderam ouvir as lágrimas dele, quando continuou: "Não nos querem para nada; desprezam-nos; é melhor acabarmos com isto."
Vários jornalistas de televisão famosos convidam-no para intervir nos seus programas, provocando a emoção do público. Priolet não se deixa enganar por um certo paternalismo em parte dessa receção mas acha que o que importa é a mensagem que veicula: a razão de ser dos agricultores não é o mercado, mas alimentar a população e manter o território. Trabalham com prejuízo, e ao mesmo tempo os consumidores não têm meios de comprar os seus produtos. Há pois que aproximar produtores e clientes."
Priolet, 58 anos, conta como entregou em agosto a sua colheita a uma organização de produtores e como só em maio do ano seguinte ela lhe foi paga, a um preço que lhe não permite remunerar a mão-de-obra.
As suas intervenções na rádio e na televisão são seguidas de numerosos telefonemas e correio, ofertas de solidariedade, entre as quais um informático que se oferece para lhe criar um sítio na net (www.consommer-juste.fr). Ao contrário de alguns que o ouvem, não se julga infeliz, mas privilegiado. "Na comunicação social não é de mim que falo, como poderia eu queixar-me se vivo no paraíso?", explica ele na região lindíssima onde habita (Mont Ventoux, o célebre monte de Petrarca!).
Com diversas experiências anteriores, há vinte anos tornou-se produtor de maçãs e peras. Primeiro empresário, depois simples agricultor, enquanto poda as suas árvores interroga-se: como explicar que ele venda um quilo de maçãs a 17 cêntimos, ao passo que os consumidores o compram entre 1,70 e 3 euros? Como fazer tomar consciência ao consumidor que uma compra é um acto político? Porque é que os comerciantes não afixam nas suas etiquetas o preço pago ao produtor?
Anda a ler o último livro de Joseph Stiglitz, o prémio Nobel de economia que foi dirigente do banco Mundial e rompeu com a lógica dele, em francês (O Triunfo da Cupidez). Quando compra uma camisa, pergunta à caixeira onde foi produzida: "Não por patrioteirismo mas porque a globalização é a destruição do mundo operário e agrícola. Tanto mais que, para o mundo agrícola, o tempo e o espaço não são os da economia de hoje. "As terras, elas, não podem ser deslocalizadas, e quando se planta uma árvore, são precisos cinco anos para dar maçãs. Ora nós estamos numa sociedade do instante." Em 2009, após ter vendido a sua fruta, faltavam-lhe 15 mil euros para remunerar os que as tinham colhido. Se a próxima época for assim tão má, arrancará os pomares para se consagrar em exclusivo à sua luta: fazer com que os produtores sejam pagos a um justo preço e que os consumidores possam comprar os seus produtos.
UM ALIADO INESPERADO Uma grande cadeia de restaurantes de churrasco, em França (Bufallo Grill) tornou-se um inesperado aliado. O seu presidente ouviu Priolet num dos programas que referimos. Ficou impressionado, no dia seguinte telefonou a Priolet e fez-lhe uma proposta: Buffalo Grill poderia colocar 330 parques de estacionamento dos seus restaurantes à disposição dos produtores durante dois meses, para aí exporem as suas colheitas.
Priolet acolheu a proposta com uma frieza que surpreendeu o homem (Sautereau). É que Priolet viu logo o benefício publicitário que poderia daí tirar uma cadeia considerada como inimiga dos pecuaristas (produtores de animais) franceses. Buffalo Grill, então, faz concessões: compromete-se a aumentar consideravelmente a parte de compras de carne para os seus restaurantes aos produtores franceses. Buffalo Grill investiu 400 mil euros no fabrico das bancas postas à disposição dos produtorers expositores e das refeições que lhes serão oferecidas.
Em cinco semanas, Priolet encontrou alguns agricultores prontos a participar. Missão complicada em período de colheita. Havia na data do artigo 21 restaurantes implicados. Priolet tem a intenção de recuperar o tempo perdido em setembro, montando uma operação "maçãs-peras", com o aluguer de camiões para ir vender nos parques de Buffalo Grill e talvez nos bairros dos subúrbios das grandes cidades.
"A minha ideia é que é preciso (produzir para) alimentar os pobres (e os outros).
O nosso papel é alimentar a população, não (é) fazer especulação". »
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O mesmo princípio pode aplicar-se a outras produções agrícolas e não agrícolas, a outros sectores produtores da economia, tornando esta mais 'real', mais próxima das verdadeiras necessidades das populações, com menos custos/margens de intermediação e muito menos especulação.
- Será que as grandes superfícies (cadeias de distribuição) não estiveram/estão a incentivar a produção e 'fidelização' dos pequenos e médios empresários (fruticultores, hortícultores, viti-vinicultores, pecuários, 'leiteiros', pescadores, ...) com contratos e apoios que, ao fim de alguns poucos anos, os 'esmagam' com preços demasiado baixos e os levam à ruína, à venda das suas propriedades/empresas, ou sua total dependência (subordinação hiper-exploradora) às cadeias de distribuição (e/ou aos bancos)... ? !
- Que escolhas conscientes querem/podem fazer os consumidores e os cidadão ? ''as compras (ou não...) também são actos políticos' !!
Mais um consultor de Cavaco que ataca violentamente o governo na "sua área": a área em que aconselha o PR e a área em que foi anteriormente ministro da república. Fazem-no para mostrar como funciona a cooperação estratégica ou para defenderem a partir de Belém as orientações políticas que eram as suas enquanto governantes, as quais, naturalmente, não são as mesmas com outra maioria e outro governo?
Ou, neste caso, será por, há alguns anitos já, Jaime Silva ter declinado continuar como chefe da equipa da agricultura na Representação Permanente de Portugal junto da UE, quando Sevinate Pinto era ministro da pasta, forma que Jaime Silva na altura encontrou para não continuar a pactuar com a estratégia completamente errada e condenada ao fracasso que Sevinate estava a seguir na relação com a União?
É lamentável que o Palácio de Belém, o quartel-general do grande timoneiro, sirva de abrigo às pequenas vinganças pessoais de pessoal político que não fez história enquanto teve o leme na mão. [Porfírio Silva, Machina Speculatrix]