Sábado, 14 de Maio de 2016

      Obama  e  o  mundo      (-por F.S. da Costa, 6/5/2016, 2ou3coisas)

 
 
   Notei o desapontamento em muitas caras quando, na tarde de hoje, no painel de encerramento da 2ª Conferência de Lisboa, afirmei que Obama (presidente dos EUA) nos vai deixar um mundo mais inseguro do que aquele que existia ao tempo em que assumiu funções. Apesar da liderança demonstrada na negociação nuclear com o Irão e da descompressão nas relações com Cuba (numa "esquina" da ilha, chamada Guantanamo, não cumpriu o que prometeu), o saldo da política externa de Obama é medíocre.
    Claro que gostei do discurso do Cairo, como agora apreciei o de Hanover, mas a paz e a segurança não se fazem com palavras. A sua gestão das "primaveras árabes" foi péssima, com responsabilidades muito sérias, partilhadas com a França e com o Reino Unido (e Alemanha,) na exploração ilegal do mandato do CSNU quanto à Líbia, com as consequências à vista das costas europeias. Quanto a Israel, mostrou a tibieza habitual dos presidentes democráticos e não deu um único passo relevante na resolução do conflito - embora Telavive continue a ser mantido como o principal recetor da ajuda externa dos EUA.    No Iraque, a diplomacia americana foi um completo desastre, o "phasing-out" do Afeganistão é pavoroso e nada conseguiu fazer no caso importantíssimo do Paquistão.    Grande parte da tragédia da Síria deve-se ao desregramento de toda essa zona e, salvo o compromisso das "armas químicas" (com Lavrov a ajudar), os EUA revelaram uma falta total de estratégia para a região. Obama não é culpado pela emergência do Estado Islâmico, mas a América é a grande culpada do desmembramento regional que lhe facilitou o surgimento e expansão. Mas serão os EUA responsáveis por não resolver problemas dos outros?, perguntarão alguns. Eu respondo: são, porque, no essencial dos casos, foram eles que ajudaram fortemente à sua eclosão. O presidente de um país que se arroga o direito de intervir em todo o mundo, na defesa dos seus interesses, (ou ao serviço dos negócios/ lucros das 'suas' poderosas transnacionais, magnatas,  lóbis e elites) tem a responsabilidade de ter de responder pela sua ação global. 
      Para o que à União Europeia importa, Obama deixou-se envolver pela agenda da "nova Europa" (e pela Alemanha) no conflito ucraniano, que já havia conseguido contaminar setores de Bruxelas, a começar pela Comissão. O resultado é o que se vê: Rússia "empochou" a Crimeia, empatou o conflito e controla a crise, com Putin mais popular do que nunca. Do lado de cá, a NATO (que é um "heterónimo" dos EUA) foi obrigada a instalar no seu seio um certo pânico e a descrispação parece agora pouco provável.
     Se não nos sair em rifa Trump, teremos Hillary Clinton a suceder a Obama. A senadora democrática que esteve ao lado de Bush na invasão sem mandato do Iraque, que teve um gestão "republicana" do State Department e que tem um postura internacional muito ao estilo da "guerra fria", promete uma presidência '"hawkish" e confrontacional com Moscovo, com tensões que não deixarão de provocar clivagens na NATO e na própria Europa. Essa é também uma das partes da herança (negativa) de Obama.
    A eleição de Obama foi, para mim, uma imensa alegria. Como homem, é uma figura respeitável, vê-lo na Casa Branca foi um salto importante para o mundo e tomou algumas decisões internas muito corajosas. Porém, no plano diplomático, foi uma imensa desilusão.
 
 ----   O  TTIP  e a  pós-democracia  europeia  (-F.Sobral)
  «Barack Obama veio, sorridente, à Europa pedir a sua unidade. Mas veio, sobretudo, tentar que o acordo comercial entre europeus e americanos (o chamado TTIP) avançasse a todo o vapor.
     O certo é que este acordo (de "comércio livre"/ neoliberal, global) está já ferido de morte. Se o comércio é bom para os povos, a forma como os norte-americanos o encaram seria um golpe mortal no sector agrícola europeu (tal como o conhecemos, desde a diversidade de sementes às formas de produção) e na própria democracia e no poder dos Estados.   Os documentos que a Greenpeace divulgou são exemplares sobre aquilo que foi sendo negociado em segredo entre os EUA e os burocratas de Bruxelas, longe do olhar dos cidadãos. É demasiado grave para passar incólume... Há, nesta tentativa de acordo, uma questão de princípios em jogo. (…)
     E, depois, o TTIP é um ataque frontal à soberania democrática e às leis, regras e princípios dos Estados. A tentativa de criar um sistema judicial paralelo ao existente, exclusivamente para ser utilizado pelas empresas, seria um descalabro. Ele permitiria às empresas processar Governos perante um tribunal de advogados ligados a elas próprias. Poderiam desafiar as leis que não lhes agradam e conseguir indemnizações inimagináveis. (…)
    Como acordo comercial livre deixa muito a desejar: nele uns são mais livres do que os outros, apesar de todos parecerem iguais. Este TTIP é uma espécie de "pós-democracia" (que, por exemplo, os burocratas de Bruxelas defendem na prática), onde as velhas estruturas como as eleições e Parlamentos permanecem, mas não têm poder político real. O poder moveu-se para outros sítios, pequenos círculos onde as elites políticas fazem acordos com os lóbis das multinacionais. Criar tribunais que fogem às regras da lei, é uma forma de pós-justiça. (…)
    De acordo com as estatísticas oficiais, o TTIP levaria a perder-se mais um milhão de empregos na Europa (o que seria mais um passo rumo ao caos, face à pressão migratória existente). A forma como tudo foi negociado (num segredo enorme) demonstra mais uma vez o défice democrático existente na Europa, que é bem visível noutras áreas (…). A Europa, com a pobreza visível dos seus líderes, caminha para um território minado. Este caso do TTIP mostra isso mesmo.»
         A dimensão inimaginável da economia especulativa
  «A economia especulativa atingiu dimensões inimagináveis. A grande complexidade que o sistema financeiro adquiriu nos últimos anos, juntamente com a ampla desregulamentação, que se aplicou especialmente desde a década de 1980, torna difícil o seu controle e a previsão das consequências de algumas decisões.
     Após a crise de 2008, meios de comunicação social, analistas e economistas começaram a distinguir entre economia especulativa e real, uma distinção que muitos não entenderam. Embora a crise capitalista mais recente se tenha desenvolvido na esfera financeira, milhões de pessoas em todo o mundo ficaram sem emprego. Porquê?»      --(Continuar a ler AQUI. http://www.attac.es/).


Publicado por Xa2 às 07:38 | link do post | comentar

2 comentários:
De EUA (os poderosos) e o resto... a 13 de Maio de 2016 às 15:24
---MS:
...A herança de Obama em politica externa, com especial destaque para o Médio Oriente e Norte de África, está ao nível do desastre iraquiano de Bush Filho.
Foi uma presidência simbolicamente muito positiva, por ter sido o 1.º negro no cargo: lembro-me da previsão desencantada de uma conhecida escritora americana, de que neste momento não recordo o nome, que previa o pior: que o assassinassem.
O que felizmente não aconteceu até agora, sendo pouco espectável que ocorra até ao final do mandato.
Contudo, na política interna foi bastante eficaz nestes tempos conturbados: Obamacare, crescimento da economia, etc.
O termo de comparação é a UE em matéria de crescimento (só visível no superavit alemão).

---PrD:
...esse tipo de politica externa "enriqueceu" ou "empobreceu" quem tem poder ?...

---:
...Garantiu no Cairo que a primavera árabe seria apoiada pelos Americanos e fomentou a subida ao poder da Irmandade Muçulmana.
Forneceu armas aos rebeldes da Siria e da Libia. Muitas destas armas foram fortalecer o Estado Islamico.
Depois garantiu que o Estado Islamico era um JVTeam, uns amadores, que não seriam ameaça para ninguém.
Hipotecou a confiança dos aliados da europa de leste na amizade americana. ...

---JF:
Obama foi o que o verdadeiro poder na América, as oligarquias militar e financeiras -os donos do mundo-, o autorizaram a ser.
E o mundo será também o que a América o deixará ser. Os únicos capazes de bater o pé aos Americanos são (os russos, os chineses e) os que aceitam se sacrificar até à morte. Exemplo: Os Vietnamitas, os Afegãos, e poucos mais.

Obama faz-me pensar no valor das eleições nos países ditos democráticos: uma fachada para que se pense que a liberdade existe.
Mas na realidade, sabemos que não existe liberdade sem meios decentes de subsistência, sem educação, sem saúde, sem dignidade humana.

Obama fez sonhar o mundo inteiro porque era Negro, pertencia a uma minoria americana, ...

São os mesmos que ontem expulsaram Charlie Chaplin da América, porque, diziam que era comunista. Mas ninguém fala hoje de Gary Cooper, que denunciou Chaplin, mas continua a falar-se de Chaplin, imortal no mundo do humanismo.

A América, o sonho Americano, que Hollywood vendeu ao mundo inteiro, defensor dos valores de civilização,
não só semeou a morte e a destruição no mundo desde o fim da última guerra, mas foi Putin que fez tocar a Orquestra Sinfónica de São Petersburgo, 6/5/2016, nas ruínas de Palmira Balbeck reconquistada pelos Russos.
Com os soldados iraquianos, sírios e russos, assim como os habitantes libertados de Daesch nas bancadas do teatro romano.

A América é a falência universal duma nação que começou a sua existência com um genocídio e continua a alimentar a desgraça por toda a parte.

A América promete-nos Trump ou Hillary, isto é, a peste ou a cólera. Isto é, mais do mesmo, na linha de Bush.
...
Não ouso imaginar o que vai ser a Europa se o Tratado Transatlântico (TTIP) for assinado. Justificaria uma revolução à escala europeia para o derrubar.
---MS:
... O Iraque e o desemprego nos EUA deixados pelo antecessor de Obama (de que certamente muito gostará), Iraque cuja situação interna piorou sempre desde a intervenção Bushiana e o desemprego que deixou, reflectido na popularidade dessa personagem no mais baixo nível de sempre quando abandonou a Casa Branca, são dois bons exemplos do mundo maravilhoso deixado por quem certamente muito considerará.
Quanto à política externa de Obama, parta do post e leia os comentários todos, a começar pelo primeiro, que por acaso é meu.
Quanto à política interna com reflexos na economia: nunca se esqueça de que houve a maior recessão mundial desde 1929 e de que se está perante a maior globalização no mundo de que há memória.
E compare a situação dos EUA com a da Europa, esta capitaneada por duas personalidades de que certamente muito gostará: Merkl e Schäuble. ...


De TTIP é o fim dos Estados e da Democracia a 13 de Maio de 2016 às 15:28
---:
Barack Obama veio, sorridente, à Europa pedir a sua unidade.
Mas veio, sobretudo, tentar que o acordo comercial entre europeus e americanos (o chamado TTIP) avançasse a todo o vapor.
O certo é que este acordo está já ferido de morte.
Se o comércio é bom para os povos, a forma como os norte-americanos o encaram seria um golpe mortal
no sector agrícola europeu (tal como o conhecemos, desde a diversidade de sementes às formas de produção) e
na própria democracia e no poder dos Estados.

Os documentos que a Greenpeace divulgou são exemplares sobre aquilo que foi sendo negociado em segredo entre os EUA e os burocratas de Bruxelas, longe do olhar dos cidadãos.
É demasiado grave para passar incólume ... Há, nesta tentativa de acordo, uma questão de princípios em jogo.
E, depois, o TTIP é um ataque frontal à soberania democrática e às leis, regras e princípios dos Estados.
A tentativa de criar um sistema judicial paralelo ao existente, exclusivamente para ser utilizado pelas empresas, seria um descalabro.
Ele permitiria às empresas processar Governos perante um tribunal de advogados ligados a elas próprias.
Poderiam desafiar as leis que não lhes agradam e conseguir indemnizações inimagináveis.

Como acordo comercial livre deixa muito a desejar:
nele uns são mais livres do que os outros, apesar de todos parecerem iguais.
Este TTIP é uma espécie de "pós-democracia" (que, por exemplo, os burocratas de Bruxelas defendem na prática), onde as velhas estruturas como as eleições e Parlamentos permanecem, mas não têm poder político real.

O poder moveu-se para outros sítios, pequenos círculos onde as elites políticas fazem acordos com os lóbis das multinacionais.
Criar tribunais que fogem às regras da lei, é uma forma de pós-justiça.

De acordo com as estatísticas oficiais, o TTIP levaria a perder-se mais um milhão de empregos na Europa (o que seria mais um passo rumo ao caos, face à pressão migratória existente).

A forma como tudo foi negociado (num segredo enorme) demonstra mais uma vez o défice democrático existente na Europa, que é bem visível noutras áreas.

A Europa, com a pobreza visível dos seus líderes, caminha para um território minado.
Este caso do TTIP mostra isso mesmo.
---


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