A imprensa espanhola destaca, em manchete, na manhã desta segunda-feira, a mudança política registada no país "à custa do PP" nas eleições municipais e autonómicas de domingo, com títulos como "Cambio Radical", "Cambio histórico" ou mesmo "Instabilidade".
Nos jornais mais associados à direita, o ABC escreve que "O PP ganha em votos, perde em poder", debaixo de uma foto a toda a largura da página das candidatas "populares" a Madrid – Esperanza Aguirre (para a Câmara Municipal) e Cristina Cifuentes (Comunidade Autónoma).
Ambas ganharam, mas SEM maioria absoluta, ficando assim vulneráveis a ACORDOS entre os partidos de esquerda que as podem afastar do poder.
Aguirre e Cifuentes ilustram o que aconteceu ao PP um pouco por todo o país. O La Razon escreve mesmo "Instabilidade", explicando que houve um "Castigo ao PP"
[ainda que tenha sido o partido mais votado] e que o "Podemos manda no terreno do PSOE".
O Ciudadanos, sublinha, "ficou abaixo das expectativas".
A foto é dos festejos de Ada Colau, a activista anti-despejos que venceu em Barcelona, e que o jornal chama de "símbolo da reviravolta radical".
O El Mundo fala apenas num "Cambio político à custa do PP", explicando que os populares perdem o poder na Extremadura, Comunidade Valenciana, Cantábria, Aragão, Castilla-La Mancha e Baleares, devido especialmente aos emergentes.
"Barcelona e Madrid nas mãos da esquerda radical", acrescenta, numa referência a Ada Colau (Barcelona en Comú) e Manuela Carmena (Ahora Madrid), que "são favoritas a governar".
Em Espanha, os eleitores elegem deputados municipais e são estes que depois elegem os presidentes de câmara, numa votação em reunião camarária.
Por isso, o cabeça-de-lista do partido mais votado apenas é automaticamente presidente quando obtém maioria absoluta.
No entanto, nas municipais (ao contrário das autonómicas) os partidos têm uma votação para porem em prática acordos pós-eleitorais, se não, é a lista mais votada quem escolhe o presidente da câmara.
O El País diz que o "A queda do PP provoca uma reviravolta a favor da esquerda" e explica que o PP "pode perder a maioria das grandes cidades e autonomias".
O La Vanguardia, diário de Barcelona, puxa para capa uma foto de Ada Colau, uma das grandes vencedoras da noite, sob o título "Cambio Radical", e acrescenta que "O PP perde peso e o Podemos avança".
Nos títulos regionais, o Diario de Sevilla escreve que os resultados na capital andaluza "desenham um cenário de instabilidade", com o actual presidente da câmara, Juan Ignacio Zoido (PP), a vencer, mas perdendo grande parte do apoio nas urnas.
"Os socialistas ganham as eleições [nos municípios da Andaluzia] a um PP que se debilita nas cidades", sublinha.
O El Periódico de Catalunya adianta que "Colau dá a reviravolta" e o La Voz de Galicia escreve "Cambio Histórico", numa referência ao facto de Xulio Ferreiro, candidato do "Marea Atlántica" – apoiada pelo Podemos, ter ganhado a câmara da Corunha.
O jornal Atlántico, de Vigo, sintetiza em capa o cenário trazido pela noite eleitoral de domingo:
"Podemos e Ciudadanos, árbitros do novo mapa [político] após a queda do PP".
A esquerda e a vontade de poder
(-por Sérgio Lavos, 25/5/2015,365forte)
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As eleições autonómicas em Espanha vieram confirmar a mudança que vinha acontecendo nos últimos anos.
A emergência de movimentos de cidadãos e de novos partidos e movimentos, à direita e à esquerda, culmina na implosão (ferida) do bipartidarismo que tem sido regra desde o fim da ditadura.
O PP venceu em nove das 13 regiões autónomas, mas perdeu todas as maiorias absolutas que detinha.
Em Madrid ganhou, mas fica dependente de uma eventual coligação entre o Ahora Madrid (movimento que integra o Podemos e cidadãos de outros partidos de esquerda, como o Equo, equivalente ao LIVRE, tendo recebido o apoio também do partido comunista e de dissidentes da Izquierda Unida de Madrid) e o PSOE.
E em Barcelona, ganhou o Barcelona en Comú, outro movimento que integra o Podemos e também o Equo, derrotando o CiU, de direita.
Agora precisa de apoio para obter maioria, e o partido socialista da Catalunha será o parceiro mais provável.
Somando tudo, o PP perde onze pontos percentuais em relação às últimas eleições autonómicas e o PSOE dois pontos.
Nas comunidades onde não conseguiu maioria, o PP corre ainda o risco de ver o Podemos aliar-se ao PSOE para formar Governo.
Para além do fim (ferida) do bipartidarismo, a principal lição que podemos retirar das eleições de ontem foi
o esforço realizado por toda a esquerda (incluindo o Podemos) para conquistar o poder à direita,
representada pelo PP mas também pelo movimento Cidadãos.
Os diversos partidos à ESQUERDA do PSOE, incluindo o partido comunista, deixaram de parte divergências e JUNTARAM-se em diversos municípios e regiões, assumindo que é mais importante DERROTAR as políticas de DIREITA do que manter-se entricheirado nas diferenças.
O esforço provavelmente estender-se-á ao período pós eleições, tendo vários destes movimentos já admitido negociações com o PSOE para a formação de maiorias.
Não há trincheiras que não possam servir de rampa para outros voos.
A esquerda espanhola MOSTRA um CAMINHO.
É verdade que falamos apenas de eleições autárquicas, mas de qualquer modo é difícil não comparar esta vontade de abertura e de CONVERGÊNCIA da ESQUERDA em Espanha
(até o partido anti-sistema Podemos construiu pontes e forjou alianças para chegar ao poder) à DESUNIÃO e entricheiramento da nossa esquerda.
Blindados na sua pureza ideológica, PCP e BE continuam a queimar possibilidades. Isto é um erro táctico, mas também estratégico.
Táctico porque a soma de toda a esquerda é bastante superior aos votos da direita.
Vivemos num país onde, de acordo com as sondagens, cerca de 65% dos eleitores votam à esquerda. No entanto, é a direita que governa.
E é aí que reside o erro estratégico.
Os valores da revolução têm sido sistematicamente DESTRUÍDOS pelos sucessivos governos à direita porque a esquerda nunca soube aproveitar a maioria sociológica de esquerda do país.
Entretidos em jogos florais, os partidos de esquerda foram vendo o Estado Social sendo lentamente desmantelado, contra a vontade da maioria dos portugueses.
Tem sido uma derrota que arde em fogo lento, tecida ao mesmo ritmo com que vão sendo transferidos recursos DO factor TRABALHO para o factor CAPITAL e a desigualdade vai aumentando, invertendo a marcha do progresso prometido pela revolução dos cravos.
Ainda há tempo?
Há sempre, mas é uma agonia ver como, apesar do brutal ataque revanchista da direita aos valores de Abril,
a esquerda se mantém rigidamente fiel aos seus princípios e à sua pureza, recusando discutir alianças e convergências.
Espanha pode ser um exemplo.
Se não o seguir, a esquerda portuguesa irá continuar a intercalar derrotas e ténues vitórias durante muitos anos.
Péssimas notícias para o país e para os portugueses.
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