Simplesmente, pensava, talvez ingenuamente, que o 3D levaria o CDA ao adormecimento, pela forte identidade das suas figuras mais conhecidas e intervenientes. O texto de agora parece mostrar que não e suscita a questão da lógica da coexistência do CDA e do 3D. Como apoiante inicial do CDA e votante da sua declaração, creio ser legítimo que me interrogue, bem como os 1600 votantes da declaração, sobre o que ele é hoje, como forma de intervenção política. Quando e em que condições é que uma posição política, como agora, vai ser tomada pelo CDA – a que pertenço – ou pelo 3D – a que não pertenço – quando, com boa probabilidade, os redactores serão os mesmos?
Certamente que os organizadores do CDA não duvidam de que o CDA “pertence” a todos os que nele se reviram e tomaram como sua a declaração. A meu ver, a declaração, ao contrário de outros manifestos diversos anteriores, ambíguos ou recuados, é um documento que vai ao encontro das ideias e vontade política de um grande número de pessoas de esquerda consequente. Julgo ter sido esta a razão do sucesso do CDA, mau grado um certo arrefecimento posterior. Pessoalmente, por não acreditar em fadas, discordo de iniciativas inconsequentes com sobrevalorização de uma salvífica convergência não se sabe para que programa. Mas mantenho o meu apoio ao CDA e desejaria ver mais força na sua continuação. E não considero que o 3D seja continuação lógica do CDA.
Os objectivos fundamentais de uma alternativa, seguindo a declaração rio CDA, eram
“a) Retirar a economia e a sociedade do sufoco da austeridade e da dívida: denunciar o Memorando;
b) Desenvolver a economia para reduzir a dependência externa, valorizando o trabalho e salvaguardando o ambiente;
c) Defender o Estado Social e reduzir as desigualdades;
d) Construir uma democracia plena, participada e transparente;
e) Dar voz a Portugal na Europa e no mundo.”
De entre as muitas propostas extensamente apresentadas, desenvolvendo e concretizando esses objectivos fundamentais, destaco a que, provavelmente, mais demarcou a posição em relação a propostas recuadas do PS e até, nessa altura, da direcção do BE. Refiro-me a
“denúncia do Memorando e abertura de um processo negocial com a CE, o BCE e o FMI a partir de uma posição determinada, ancorada no reconhecimento de que os pressupostos do Memorando estão errados e na reivindicação do direito ao desenvolvimento; Reestruturação da dívida colocada no topo da agenda das negociações; Preparação para os cenários adversos que podem resultar de uma atitude negativa da troika, traduzida numa suspensão do financiamento internacional (incluindo a necessidade de declarar uma moratória ao serviço da dívida).”
Embora de forma não tão explícita, creio que o 3D não contraria esta posição firme do CDA, mas gostava de ver isto mais esclarecido. Então porquê o 3D? Será uma diferença de plano e forma de intervenção? Parece que sim, por várias razões. Em primeiro lugar, há uma recomposição dos promotores de ambas as iniciativas, embora se mantenha um grande núcleo de pessoas muito conhecidas, independentes. No CDA havia um forte envolvimento do BE e um pequeno núcleo do PS, no 3D não. Pelo contrário, aparecem no 3D membros da direcção da Renovação Comunista, que me parecem ter estado ausentes do CDA.
Em segundo lugar, tudo parece apontar para uma marcada diferença nas propostas de intervenção política, em relação às que fizeram consenso no CDA. Neste, aprovou-se:
“8.6.1 A defesa de um compromisso comum de convergência, que ajude a viabilizar uma governação alternativa em torno de princípios abrangentes e claros como os sugeridos nesta resolução, por parte das forças políticas democráticas que decidam apresentar-se a eleições;
8.6.2 A organização e mobilização em todo o país dos apoiantes do Congresso com vista à divulgação e prosseguimento do debate no espaço público das propostas desta resolução, ao seu enriquecimento e desenvolvimento participativo e à promoção da iniciativa cidadã em defesa das causas e dos objetivos aprovados;
8.6.3 A consolidação e alargamento da base plural de apoio ao Congresso;
8.6.4 O diálogo com forças políticas, instituições e movimentos sociais, nacionais e internacionais, inspirado pelo propósito de estimular dinâmicas de convergência na ação e de construir denominadores comuns para as necessárias alternativas políticas.”
Estas posições reflectem uma perspectiva unitária, abrangente e inclusiva, bem como distante de qualquer intervenção partidária ou para-partidária com fins imediatamente eleitorais. Pelo contrário, o 3D, tanto no manifesto como em declarações de seus membros notáveis, “entende que (…) não têm de esperar por entendimentos entre toda a oposição democrática”, privilegia uma intervenção imediata no plano eleitoral, tendo “como objectivo construir um movimento político que seja o mais amplo possível”, mas afastando desde logo qualquer acção conjunta com o PCP e o PS. Como se sabe, a perspectiva, esperadamente fracassada, era a de instrumentalização da capacidade eleitoral passiva do BE, como partido, numa lista circunscrita ao BE, ao 3D e ao Livre.
Apoiei o CDA, mas não o 3D. Só vou em iniciativas e movimentações políticas pelas suas ideias e propostas, feitas de forma clara. Não vou apenas pela notoriedade dos proponentes, principalmente quando isto hoje se liga tanto ao protagonismo no círculo mediático. É assim que entendo que o manifesto 3D, com propostas não operacionais, apresentadas só na generalidade, já tenha, ao que se diz, recolhido milhares de apoios (até que ponto sobreponíveis aos do CDA, ou desviando do CDA? E com a escassa chamada a participação dos do CDA?)
As fórmulas começam a ficar estafadas, pelo afã do menor múltiplo comum da convergência. É ao posicionamento e declarações dos promotores mais em evidência que me socorro quando procuro chegar a uma conclusão, para mim próprio, do que se está a passar nesta área confusa da esquerda não partidária e na sua relação com os partidos. Não tenho dados para avaliar bem se há ou não contradição entre dirigir simultaneamente o CDA e o 3D, se as agendas pessoais são isentamente compagináveis com a participação em ambos, a nível dirigente. Como apoiante do CDA, e não duvidando da vossa seriedade política e do vosso empenhamento na dinamização da esquerda, podiam esclarecer-me? Ou sou eu que sou incoerente, apoiando o CDA (forum de debate e mobilização) e não o 3D (proto ou para-partido)?AFINAL, O QUE SE PRETENDE ? ... Os desiludidos do Bloco de Esquerda (e do PS) e mais uns tantos, porventura muitos, que sempre mantiveram uma prudente e relativa equidistância entre o PS e o BE, acham que, se não se criar uma força convergente e aglutinadora ..., o PS está tragicamente condenado a lançar-se nas mãos da direita.
... o “êxito” desta estratégia passava pela inclusão do Bloco. Mas como o Bloco ...jamais poderia dar o seu aval a uma estratégia como a defendida pelo 3D e pelo Livre, sob pena de se dissolver ou desintegrar.
Bem podem uns e outros dizer,..., mas o de obrigar o PS a governar à esquerda, ...
... E governar como membro ... minoritário de uma coligação dominada pelo PS é em si um objectivo? Ou o objectivo é antes alcançar algo, realizar algo sendo a governação, o poder, o meio adequado e necessário para o conseguir?
Ninguém de seu perfeito juízo acredita que o PCP ou o Bloco não queiram governar. Isso não passa de uma tirada demagógica à Paulo Portas, aproveitada pela propaganda do PS e adoptada por alguns dos seus oferecidos aliados.
Do Livre não haveria muito a esperar salvo aquilo a que o próprio movimento se propõe: eleger ... para defender e tornar exequíveis políticas de esquerda. ... De facto, esta esquerda atomizada por múltiplas sensibilidades, que de vez em quando se reúne em grupetos com vista a certos objectivos muito circunscritos, não oferece confiança ao eleitor em geral... São tantas as divergências quantos os protagonistas.
A Convergência de Esquerda ou 3 D, ... parece ter ficado num beco sem saída depois da recusa do Bloco. E, agora, vai convergir com quem?
... o grande problema dos nosso tempo é este divórcio consumado, de que o PS também é vítima, embora cúmplice ou mesmo em co-autor moral, entre capitalismo e democracia.
Toda a ideologia da social-democracia depois ... da vitória das ideias keynesianas assentava na ideia de que era possível simultaneamente ter um modo de produção capitalista e um modo de distribuição tendencialmente socialista. E assim foi de facto nos países ricos europeus e até na América até meados da década de 70 do século passado. Depois (com Reagan/Chicago boys e Tatcher) tudo se começou a complicar. Primeiro foi a inflação, depois o endividamento público, a seguir ou simultaneamente a concessão de crédito às pessoas para compensar a desigual distribuição de rendimentos e, finalmente, a austeridade como meio de consolidação de um novo modelo de sociedade. Uma sociedade da qual a democracia vem sendo gradativa mas consistentemente expulsa.
O que todos os dias ouvimos dos governos, dos comentadores, das organizações económicas e financeiras internacionais é a imposição da lei dos mercados com completa marginalização dos processos e procedimentos democráticos.
Não há forma de sair disto evolutivamente. O PS está enredado nesta teia do pescoço até aos pés. Toda a social-democracia está, como ainda agora se viu com Hollande. Somente através de uma ruptura – que em algum lado se há-de dar – se poderá sair disto. Sair no sentido de iniciar uma longa e dura luta, onde certamente vai haver, como em todas as lutas de longo alcance, avanços e recuos. ...