Galeguia: descolonizar as nossas línguas (-por Bruno Góis, 17/6/2014)
... Razão tinham já os gregos antigos, para quem palavra e pensamento eram (e são) a mesma coisa: logos.
O problema da “portugalização” da CPLP
(24/06/2014 por A.F.Nabais, Aventar)
Feliciano Barreiras Duarte, segundo o Ventos da Lusofonia, é investigador, o que é, com certeza, importante, mesmo que não se conheça a área de investigação. Feliciano Barreiras Duarte é, ainda, deputado do PSD, que é outra maneira de se ser importante tendo a possibilidade de fazer qualquer coisa. Aliás, de acordo com a biografia da página da Assembleia da República, Feliciano tem, ainda, um Doutoramento em Doutoramento (vd. imagem infra), o que é tão específico como ser investigador em geral e deputado em particular.
(Coincidência ou não, já me tinha cruzado com outro deputado do PSD licenciado em licenciatura. Fica a faltar um mestre em mestrado. Já existia um licenciado sem licenciatura.)
Em declarações à página Ventos da Lusofonia, Feliciano Barreiras Duarte não desilude: o que se espera de um investigador que é também deputado do PSD, doutorado em doutoramento, que tem vários livros em preparação e que publicou, entre outras, uma obra com o estimulante título “Apostar no Bombarral”? Espera-se, obviamente, uma série de declarações vácuo-épicas sobre qualquer assunto.
Sendo o assunto a CPLP, o investigador/deputado/doutorado profere coisas sobre a possibilidade de a dita CPLP poder “ganhar outra voz à escala mundial” e a necessidade de “aprofundar o lado político e linguístico, mas acima de tudo, em simultâneo e com muita pressa, também o lado económico e cultural”. É preciso não esquecer que Feliciano Barreiras Duarte é do PSD e membro da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas, o que implica ter de elogiar sempre a CPLP.
A cereja em cima do bolo surge no final, quando, a propósito da próxima entrada da Guiné Equatorial na CPLP, acusa os críticos de quererem “portugalizar” a instituição, já que, manchados por tiques colonialistas, são incapazes de compreender a nobreza aparente de todos aqueles que querem, decerto desinteressadamente, ajudar o povo da Guiné Equatorial. Feliciano faz de conta, é claro, que as críticas não estão relacionadas com os direitos humanos, porque o importante, lembra, é que vivemos “no século XXI, de movimento dos povos, em que o direito à mobilidade das pessoas e das empresas ganha cada vez maior prioridade nas políticas públicas e é importante sabermos as semelhanças e diferenças que existem entre os membros”.
Afinal, a Física está errada: o som propaga-se no vácuo.
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http://ventosdalusofonia.wordpress.com/
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http://www.publico.pt/mundo/noticia/carta-aberta-a-adesao-da-guine-equatorial-representa-a-venda-dos-valores-da-cplp-1660063
Recusar a adesão da Guiné Equatorial à CPLP como membro de pleno direito enquanto não estiver comprovado, na lei e na prática do país, o cumprimento das condições dos Estatutos da CPLP.
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Exmos. Senhores Chefes de Estado e de Governo dos países da CPLP,
No dia 20 /2/2014, os Ministros de Negócios Estrangeiros da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), recomendaram que a Guiné Equatorial se tornasse membro de pleno direito da CPLP, decisão que deverá ser ratificada durante a Conferência que terá lugar daqui a um mês, em Díli.
Um dos “progressos” registados pelos ministros, face ao Programa de Adesão de Julho de 2012, foi o anúncio da adoção de uma moratória sobre a pena de morte. Porém, organizações como a Amnistia Internacional divulgaram que pouco tempo antes, pelo menos quatro pessoas, “senão mesmo nove”, foram executadas. Estas mortes levantam sérias dúvidas sobre a motivação da moratória apresentada.
Acresce o facto de nada ter sido introduzido na Constituição ou na lei penal ordinária que permita concluir com segurança que o país tenciona pôr fim à pena de morte. A anunciada “moratória temporária à aplicação da pena de morte”, contida na Resolução Presidencial n.º 426/2014, não passa disso mesmo: uma decisão, temporária, que não foi sequer submetida a ratificação parlamentar nem a referendo popular. Continuam também a registar-se várias execuções extrajudiciais pelas forças de segurança governamentais.
É, pois, incompreensível, que os Ministros tenham concluído existirem “progressos” nesta matéria.
Amnistia: “a Guiné Equatorial apresenta uma situação muito preocupante ...
CPLP - A hora da verdade
Posso ser sincero? A CPLP tem duas décadas de existência e, há que dizê-lo com frontalidade e transparência, estes vinte anos não foram os mais entusiasmantes.
Houve países que investiram a sua vontade política na CPLP. Outros fizeram os mínimos, outros nem isso. A profunda desigualdade entre os Estados integrantes, as diferentes prioridades em que cada um coloca a organização no quadro das suas opções externas – tudo isso contribuiu para desenhar uma manta de retalhos, aqui ou ali nem sempre muito bem servida pelas personalidades a quem competiu desempenhar o cargo de Secretário-Executivo. Presumo que não seja politicamente correto dizer isto “alto”, mas eu, que estou de fora, não me coíbo em afirmá-lo.
A CPLP tem urgentemente de se repensar. Neste tempo de refluxo global da liberdade de circulação, ou a organização se consegue relançar como um espaço de cidadania coletiva, visivelmente útil para todos os seus cidadãos e Estados, ou o seu destino continuará a ser o estiolar na rotina declaratória das cimeiras. Por essa razão, criar tensões artificiais, para tentar relançar jogos de poder, é um gesto gratuito e até irresponsável. Nesse caso, talvez fosse melhor assumir, com coragem, o desafeto lusófobo ao projeto, em lugar de estimular polémicas que podem ter efeitos detrimentais nas relações bilaterais. Ou então, se esse é objetivo, assumi-lo abertamente.
Sei que o tema não é cómodo para muitos, mas também não vale a pena esconder que a adesão da Guiné Equatorial – forçada pela generalidade dos restantes membros, contra a vontade portuguesa – não configurou a “finest hour” de uma organização que se havia assumido, no seu início, com uma vocação ético-política, e que acabou por vergar-se à realpolitik. Goste-se ou não, essa adesão deixou feridas, descredibilizou profundamente a organização e permanece como um ferrete de que a CPLP se não libertou. O facto dos diferentes países ainda hoje olharem para esta realidade de forma contrastada é, em si mesmo, prova da fragilidade dos princípios comuns da organização.
Tenho-o dito e escrito, desde há muito: enquanto a CPLP não for assumida pelo Brasil como um instrumento essencial da sua política externa, a organização tem escassas possibilidades de evoluir e de afirmar-se à escala global. E nunca, até hoje, o foi. Em 2016, o Brasil assume a presidência rotativa da CPLP. Fá-lo-á passando a ter como embaixador junto da organização um diplomata que conheço muito bem, com grande qualidade e prestígio. Esta é uma oportunidade soberana para Brasília dar mostras de liderança e capacidade para relançar um projeto que, para ter “pernas para andar”, necessita, apenas e só, de vontade política. Porque acho que a ideia da CPLP permanece cada vez mais válida, confesso que ando à procura de razões para alimentar o meu otimismo.
(-por Francisco Seixas da Costa, 2 ou 3 coisas, 11/3/2016)
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