De o (agora) "acordo" grego: ... diferenças a 13 de Julho de 2015 às 17:48

Sobre o “acordo” grego: e as razões pelas quais não corri a tirar o tapete ao Syriza

(2015-07-12 by Marisa Matias

Muito se disse sobre o suposto “acordo” grego. A reunião de hoje do Eurogrupo trouxe a lume muitos dados absolutamente imprescindíveis para perceber este mosaico. Desde a suposta recusa alemã em reestruturar a dívida, passando pelo “medo” filandês de ver cair o seu governo, até à proposta inenarrável de deixar os gregos aplicarem o programa durante uma semana e depois logo se via… Enfim, uma coisa ficou evidente: o plano do Grexit esteve sempre dentro do Eurogrupo e não foi pela mão da Grécia.

Vamos, então, ao programa proposto ontem pelo governo grego e às razões pelas quais eu não corri a tirar o tapete ao Syriza. Há ou não há diferenças entre a proposta de Juncker e a proposta apresentada pelo governo grego? Há e não são pequenas. Ambas contêm austeridade, isso é claro, mas não é novo. Agora, fazer desta nova proposta um episódio de capitulação é, no mínimo, pouco sério.

A proposta de Juncker previa uma extensão de cinco meses do programa existente, com uma avaliação a cada mês; a proposta do governo grego prevê um novo programa de três anos, com fixação das condições para esses três anos e não a costumeira mudança de regras a meio do jogo. A proposta de Juncker propunha 8 mil milhões de Euros de austeridade para cinco meses; a proposta do governo grego propõe 13 mil milhões para três anos. Começo por estas duas questões – novo programa e austeridade – para que não se diga que começo pelas fáceis. Estas são bem difíceis de engolir, mas que não se diga que é o mesmo. Há uma terceira, não menos importante: a proposta do governo grego aceita as privatizações dos aeroportos (esta não total) e dos portos e a transferência dos 10% que restam das telecomunicações das mãos do Estado grego para o Estado alemão. E há ainda uma quarta, igualmente difícil: o aumento de impostos em sectores como a electricidade ou a restauração.

Passo agora aos elementos mais defensáveis para a esquerda. A proposta de Juncker previa apenas a transferência de fundos necessária para pagar as tranches ao FMI e ao BCE, nem um cêntimo para a Grécia; a proposta do governo grego prevê a cobertura das necessidades financeiras do país para três anos e um caminho para a reestruturação da dívida.

A proposta de Juncker inseria-se no quadro da troika; a proposta do governo grego transfere tudo para o Mecanismo Europeu de Estabilidade. Traduzido por miúdos, o FMI fica de fora, a Grécia volta aos mercados, o BCE volta a poder comprar títulos de dívida, há uma transformação ao nível das maturidades da dívida detida pelo BCE, transformando dívida de curto prazo em dívida de longo prazo e com juros mais baixos. Esta transformação é de uma importância profunda e não a ver é, no mínimo, má vontade ou má fé. A proposta de Juncker mantinha o já decretado fim da negociação colectiva; a proposta do governo grego volta a introduzir a negociação colectiva, inclui a abolição do lay-off e remove a cláusula contratual que dá vantagem aos empregadores. Mais, mantém a possibilidade de não privatizar o IPP (electricidade), suspende a condição do “défice zero”, prevê um aumento de impostos e o fim dos privilégios fiscais para os famosos armadores gregos, inclui um imposto sobre bens de luxo e o aumento do IRC. Coloco estes aumentos de impostos do lado das coisas positivas porque, convenhamos, há uma clara diferença entre o aumento de imposto na electricidade, que afecta sobretudo os mais pobres, ou um aumento de imposto num sector privilegiado, que contribui para uma maior justiça fiscal e para uma redistribuição mais justa do fardo. O aumento do IVA nos sectores em que provoca mais injustiça social fica ainda sujeito a uma cláusula de revisão no final de 2016, podendo voltar aos valores inicialmente propostos pelo governo grego se a receita resultante do combate à evasão fiscal cobrir a receita obtida por estes aumentos. Há ainda uma medida de que ninguém fala, mas que não é irrelevante: a proposta do governo grego prevê um corte no IVA aplicado aos medicamentos, aos livros e aos bilhetes de teatro, baixando-o para 6%. Sei bem que estas são minudências aos olhos de muitos nos tempos que correm, mas não aos meus.

A juntar a estas medidas, ...


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