Dia Zero
(-por F.Louçã, 25/1/2015)
Talvez Leonard Cohen, sempre suave, seja demasiado apoteótico para os dias de hoje. Mas, citado em Atenas no último comício do Syriza antes da contagem dos votos, que termina dentro de horas, evoca simplesmente um estado de espírito. “Primeiro tomamos Manhattan, depois tomamos Berlim”. « First we take Manhattan, then we take Berlin »
Mas leia o resto da letra:
depois de vinte anos de aborrecimento por tentar mudar o sistema por dentro, venho agora devolver-lhes, primeiro tomamos Manhattan, depois tomamos Berlim. Amaste-me como um perdedor, agora tens receio de que possa vencer. Metáforas e baladas, há três dias cantadas com coração.
Hoje de noite pode começar a escrever-se essa nova letra europeia. Já não era sem tempo. Tantos anos de aborrecimento por tentar mudar o sistema por dentro.
...
----------
Grécia. Quando a pulga mordeu o elefante
(-por J.Lopes, http://entreasbrumasdamemoria.blogspot.pt/ )
...Independentemente do que se seguirá, foram ontem atingidos dois objectivos maiores, aqueles que sempre me fizeram esperar que 25 de Janeiro ficasse marcado como um dia histórico –
não só para os gregos, nem talvez apenas para os europeus, mas (e muito) para nós que por aqui estamos nesta outra ponta do velhíssimo continente. Fundamentalmente, por duas razões:
1 – Porque ficou provado que um dos mais pequenos e o «mais desgraçado» dos nossos companheiros de percurso conseguiu enfrentar sem medo os grandes, e vencê-los, com uma postura expressa e fortemente anti-austeritária.
2 – Porque se quebrou o mito da inevitabilidade de governar ao centro, em alternâncias com laivos de danças macabras. Que a Nova Democracia tenha tido uma derrota importante e que o PASOK tenha passado quase à insignificância são excelentes notícias.
Vêm aí tempos difíceis e imprevisíveis para a Grécia? Certamente. Mas de grande esperança.
------------
Grécia. Nada será como dantes.
...
...O Syriza não ganhou porque os gregos são um povo suicida. Venceu porque um povo não gosta de ser espezinhado até ao limite.
Seis anos de políticas feitas a mandato da troika não resolveram nada. Pelo contrário, DESTRUIRAM o tecido social grego sem construir nada em troca. Na Grécia vive-se uma economia de guerra:
quando o Syriza prometeu electricidade gratuita para as pessoas a quem a tinham cortado ou senhas de racionamento para as crianças não fez promessas alucinadas.
O MEDO do desconhecido e uma ruptura total com a UE fizeram com que Samaras vencesse as eleições de 2012.
Essa CHANTAGEM não resultou:
a UE não percebeu o que estava em jogo, hipnotizada pela crença que a Europa é só um Frankenstein fiscal onde tudo o resto é acessório.
O futuro da Europa ou é político ou não é. Não pode ser um purgatório fiscal.
Ou um muro de lamentações mudas e surdas onde se humilham os povos do Sul em nome da moral.
A DESTRUIÇÃO da CLASSE MÉDIA, sempre o colchão onde repousa a DEMOCRACIA, criou na Grécia a sensação de que qualquer futuro é menos mau do que esta austeridade que corrói o orgulho nacional.
Depois da vitória do Syriza nada será como dantes.» (Realce meu.)
F.Sobral
----------
..Juncker, Lagarde e Merkel têm feito ameaças mais ou menos veladas aso gregos, "avisando-os" que a vitória do Syriza pode obrigar a Grécia a sair do euro.
Ontem, quando o BCE anunciou que ia por as rotativas a funcionar para injectar dinheiro na economia , pensei que a data fora escolhida para dar apenas um sinal aos gregos, mas hoje percebi que Draghi também não se escusou a "molhar a sopa" ao anunciar que, pelo menos até Julho, não haverá compra de dívida grega.
...Este desespero tem uma vantagem. Qualquer grego ( e europeu) inteligente perceberá que há realmente alternativa à política de austeridade e que a vitória do Syriza é a única possibilidade de mudar os caminhos da Europa.
Lá para o Outono, se as sondagens continuarem a colocar o PODEMOS como o partido mais votado em Espanha, assistiremos a um remake do que se está a passar agora em relação à Grécia e que obviamente influenciará as eleições em Portugal.
A Europa pretende impedir a todo o custo a alteração do panorama partidário dos interesses instalados. Mas ...não tardará até que uma onda de indignação e revolta varra esta selvajaria neoliberal.
-CBO crónic
Viva a Grécia!
por MÁRIO SOARES
A Grécia é sem dúvida o Estado ao qual os europeus mais devem antes de Roma. Mas foi muito maltratada pela Alemanha da senhora Merkel, quando se atreveu a mandar na União Europeia e em primeiro lugar na Irlanda, por pouco tempo, diga-se, e finalmente na Grécia, em Portugal, em Espanha e noutros Estados do Sul. Impôs a todos a chamada austeridade, que os foi destruindo pouco a pouco.
Austeridade que mata, como disse o Papa Francisco com a sua sagacidade.
No domingo passado tive a grande alegria de assistir à vitória de Alexis Tsipras, ... . Realmente, tratou-se de uma vitória impressionante, que não só muda a Grécia como vai ter um grande impacto em toda a União Europeia.
É óbvio que a vitória de Tsipras provocou reações em toda a União Europeia, por um lado de entusiasmo e para a direita uma obrigação de refletir de modo a mudar as políticas que tem vindo a seguir e, obviamente, a austeridade, que tantos malefícios tem provocado.
A U.E. está a mudar, como se tem visto, por exemplo, com a posição de Draghi, BCE. E o êxito extraordinário que Alexis Tsipras conseguiu no domingo passado vai ajudar imenso. Tenhamos, pois, como sempre disse, esperança, porque melhores dias virão. Inevitavelmente.
--------
ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS
Foi em outubro de 2013 que li o livro de Stephen Emmott, professor da Univ. Cambridge, Dez Mil Milhões - Enfrentando o Nosso Futuro.
Apercebi-me então do que seria a dramática situação do planeta se a ganância da globalização dos mercados continuasse, sem regras, em busca do petróleo, furando a terra e provocando trágicas consequências nos oceanos, a que infelizmente temos vindo a assistir nos últimos anos.
Daí, seguramente, a razão por que o presidente dos Estados Unidos, Obama, um político de uma inteligência e visão extraordinárias, fez baixar o preço do petróleo por toda a parte, tentando ao mesmo tempo limitar a fúria dos oceanos e a consequente formação de gelo que este ano, excecional, atingiu as duas costas dos EUA e outros continentes.
No ano passado, o mar, em Portugal, destruiu grande parte das nossas praias. Mas se este ano isso se repetisse - e não gostaria que isso acontecesse - ficaríamos sem praias e sem turismo.
Daí que seja necessário que os cientistas que ainda nos restam e que se interessam por esta área se imponham e responsabilizem o governo pela prevenção dos impactos negativos das alterações climáticas, que tendem a agravar-se.
...
O QUE RESTA A PORTUGAL
O governo de coligação que nos rege e que tem gozado sempre da proteção do PR, tem estado completamente paralisado e sem norte nos últimos meses.
Compreende-se que assim seja porque Portugal está completamente ARRUINADO. Muitos dos nossos melhores cérebros EMIGRARAM e os que restam e têm a CORAGEM de dizer a verdade não são ouvidos e têm os seus telefones CONTROLADOS.
Há hoje em Portugal determinadas polícias que fazem lembrar a antiga PIDE...
Entre os JORNALISTAS que são ou foram independentes há vários que perderam os seus lugares e outros infelizmente - a vida é dura - adaptaram-se...
A coligação, tenho-o dito várias vezes, não se entende. Mas quando o PM fala duro, obedece. O ministro da Economia tem sido uma boa prova disso, mudando de opinião quando lhe abrem os olhos...
Os ministros obedecem mas estão mais ou menos paralisados. Alguns têm sido verdadeiras CATÁSTROFES, como a ministra da JUSTIÇA e os ministros da EDUCAÇÂO, da Defesa, da Economia, dos Negócios Estrangeiros e, neste último ano, o da SAÚDE.
De resto, nunca houve tantas MORTES e tão poucos médicos e enfermeiros para as evitar. Quanto aos outros, estão calados e certamente fazem pouco. Mas ninguém se demite. Certamente por MEDO.
Há uma ministra que tem obviamente categoria, Maria Luís Albuquerque. Mas obedece sempre ao PM.
O mais importante é que em três anos o atual governo DESTRUIU Portugal sem mostrar ter a mínima visão que seja de patriotismo. VENDEU Portugal aos chineses e agora, no caso da PT, nada fez para evitar que fosse comprada por uma empresa francesa, quando Isabel dos Santos, uma lusófona, foi impedida, sabe-se lá porquê, de comprar a PT.
Falta, vender a TAP, .... É um (des)governo antipatriótico... Veremos como, depois de ter pago tantos juros, vai ter € para pagar o que ainda deve à troika ...
Somos todos gregos...ou queremos ver-nos gregos?
( por AG, 27/1/2015)
A vitória do Syriza é histórica para a Grécia e para toda a Europa. É uma vitória da democracia, como todos terão de reconhecer, incluindo os que tudo fizeram para intimidar e condicionar o voto dos gregos, como o governo alemão.
É um claríssimo sinal de que a Europa tem de mudar.
O povo grego ergueu-se contra a humilhação e o sofrimento que lhe estão a ser impostos e veio dizer que quer um caminho alternativo.
É uma salutar chicotada democrática dada a uma Alemanha que hoje domina a Europa, embalada pela sua própria prosperidade e pelas patranhas que lhe vendem os seus governantes de que está a salvar os pobrezinhos dos "PIGS" sulistas, enquanto o que verdadeiramente faz é salvar os ricos bancos alemães dos seus próprios desvarios.
Mas importa que a escolha dos gregos se transforme num verdadeiro terramoto político e acelere o abandono do fanatismo austeritário que tão devastador tem sido para a Europa e para a Democracia europeia.
O reconhecimento do falhanço da receita austeritária já está explícito no programa de investimento publico que a Comissão Juncker acaba de lançar e que implica uma leitura flexível do chamado Pacto Orçamental. E já está explícito nas medidas que o BCE finalmente anunciou de injecção de liquidez na economia, por via de compra directa de obrigações do tesouro aos Estados Membros da zona euro, fazendo uma interpretação extensiva do seu próprio mandato, apesar da oposição da Alemanha.
Mas tudo vai agora depender do respaldo que o novo governo grego venha a encontrar na Europa e em particular nos países que mais estão a sofrer com a crise.
Há pouco mais de uma semana, escrevia o já empossado Primeiro Ministro Tsipras, no El País, que a mudança tinha de vir do sul. Muito do que acontecer daqui para a frente - e espero que o Syriza saiba estar à altura das suas responsabilidades no governo em Atenas e na governação da União Europeia - vai depender da forma como actuem agora os governos dos outros países do sul da Europa também brutalmente afectados pela crise.
Do Governo P.Coelho e Portas, porém, não temos a esperar senão mais do mesmo: o talibanismo do bom aluno servil junto de Merkel e o oportunismo despudorado, quando toca a colher os beneficios das mudanças que antes disse impossíveis e até combateu: é a atitude de incentivo e contribuição zero ao programa Juncker e ao programa de "quantitative easing" do BCE, transformada subitamente, a posteriori, com PM e VPM a procurarem cavalgar e capitalizar as mudanças. Sobre o que a Grécia disse querer nas urnas, ouvimos já Passos Coelho escarnecer, vergonhosamente, como "conto de crianças". Ele prefere os contos de terror que os portugueses têm a contar da sua governação....
Ora, já que a voz do Governo português não se ouve em Bruxelas ou Berlim, ou só se ouve para ecoar a melodia ilusória de que "Portugal está no bom caminho" que convém à Senhora Merkel para continuar a levar no engodo o povo alemão, é imperativo que se faça ouvir a voz da oposição portuguesa, e do PS em particular, desmentindo a narrativa mentirosa, expondo os reais efeitos da crise em Portugal e apoiando a mudança radical que Tsipras quer promover.
Nada vai ser mais central do que o que fazer à dívida soberana, que na Grécia como cá aumentou exponencialmente com as troikas do austeritarismo e do empobrecimento forçado. A Grécia pode precisar de mais um perdão da dívida que é totalmente impagável, já esta acima dos 170 % do PIB - e não será nada de novo já teve duas, em 2010 e 2012 com acordo europeu. Portugal precisa certamente de renegociar a sua dívida, que hoje acima dos 130% constitui uma canga arrasadora dos esforços feitos pelos portugueses para sair da crise.
A solução não pode mais ser fragmentada, tem de ser europeia e reforçar em vez de enfraquecer o euro: precisamos de um Fundo Europeu de Redenção para gerir e amortizar colectivamente as dívidas públicas europeias, incluindo a alemã que também esta acima dos convencionados 60%.
Não podemos deixar que se empurre para fora da UE a Grécia, como alguns maldosamente querem. É preciso fazer compreender ao povo alemão que sem Grécia e sem euro acabaria a sua galinha d'Ouro.
Só salvando a Grécia e o Euro, salvaremos a Europa.
Ouçam este homem
(Yanis Varoufakis, economista, novo ministro do governo Syriza, grego e europeu)
(-por Rui Tavares, 28/1/2015, Público)
No segundo semestre de 2011, a situação na zona euro tornou-se crítica. O resgate grego tinha-se dado pouco mais de um ano antes, o português durante o primeiro semestre, o irlandês entre ambos. Mas
os resgates não só não conseguiam acalmar os juros nos mercados da dívida soberana, como até os excitavam mais ainda. Após cada país que caía, a aposta era sobre qual seria o próximo a cair. E os próximos seriam a Espanha, e a Itália, e depois a França. E com isso seria o fim desordenado do euro, uma coisa pouco bonita de se ver.
Em setembro desse ano escrevi uma crónica chamada “Onde estamos”, onde defendi a implementação de uma solução para a crise do euro baseada na
“Modesta Proposta para Salvar o Euro”, de Yanis Varoufakis e Stuart Holland. Ao contrário das anteriores propostas baseadas na mutualização da dívida, politicamente bloqueada, a proposta de Varoufakis e Holland baseava-se
na emissão direta de títulos pelo Banco Central Europeu e na reciclagem da dívida soberana num prazo longo,
ao passo que o Banco Europeu de Investimentos financiaria um plano de recuperação e relançamento da economia, em particular nos países do Sul e da periferia.
Não havia tempo a perder. Era preciso que Varoufakis e Holland viessem a Bruxelas explicar a proposta deles aos líderes do parlamento europeu. Começámos imediatamente a trabalhar nessa viagem, que ocorreu no fim de novembro de 2011.
Para ultrapassar a primeira crise europeia do século XXI, precisamos de um tipo especial de europeus. Gente que entenda o papel do seu país na Europa, e o papel da Europa no mundo. Que queira reformular com as pessoas e não contra elas.
Que tenha noção das consequências de um novo fracasso. Que esteja mais interessado em novas soluções do que velhos dogmas.
Yanis Varoufakis é certamente um desses europeus. É também um dos poucos economistas a não encarar esta crise como um mero economista. Onde outros se limitam a proclamar as suas equações e a desconsiderar o resto,
Varoufakis entende a necessidade política de procurar soluções que não dependam de fazer de conta que o eleitorado alemão não exista ou que os tratados europeus possam ser ignorados.
Coisa rara num economista, não pretende sacrificar os empregos e prejudicar as vidas de milhões de pessoas só para provar que tem razão.
Está longe, muito longe, de achar que o euro é perfeito, mas prefere melhorá-lo do que lançar o seu país e a Europa no desconhecido.
Após aquela visita a Bruxelas em novembro de 2011, um outro economista cosmopolita do Sul — Mario Draghi que acabara de tomar posse no BCE — conseguiu estancar a fase aguda da crise do euro, mas os problemas estruturais estão ainda todos conosco.
Mais de três anos passaram, e as mentes estão mais disponíveis para os outros elementos da Modesta Proposta.
Os países do Sul continuam a precisar de um “Projeto Ulisses”- relançar a Europa a partir do sul- que partilhei em conversa numa cafetaria, para grande entusiasmo de Varoufakis e de Stuart Holland (ver o resultado em http://www.projetoulisses.net/p/documentario.html ).
Varoufakis está do lado da civilização e, com as suas capacidades de ironia e persuasão, será capaz de convencer uns quantos colegas no Conselho Europeu. Para bem de todos nós, esperemos que o consiga.
Comentar post