Sexta-feira, 21 de Novembro de 2014

Sabia que na Bolívia … ?  (-por Serge Halimi, 7/11/2014, pt.MondeDiplo.com)

Em tempos de crise, a reeleição à primeira volta de um chefe de Estado que já efectuou dois mandatos não acontece muitas vezes. A de Evo Morales, com 61% dos votos, deveria, em consequência, ter sido mais sublinhada. Até porque a sua façanha eleitoral acontece num país, a Bolívia, que viu sucederem-se cinco presidentes entre 2001 e 2005. E porque ela coroa uma redução de 25% da pobreza, um aumento de 87% do salário mínimo real, a diminuição da idade da reforma [1] e um crescimento superior a 5% ao ano, tudo isto desde 2006. Se, como nos dizem, importa reencantar a política, por que não fazer com que sejam conhecidas estas boas notícias? Será porque a sua explicação se prende com reformas progressistas e tem como actores regimes de esquerda?

Alguns grandes meios de comunicação social (media), discretos sobre o êxito dos governos latino-americanos de esquerda, são-no também sobre os fracassos dos poderes conservadores. Inclusive em matéria de segurança. Este ano, por exemplo, foram já assassinados no México cinco jornalistas, um dos quais no mês passado durante um programa, em directo, na rádio. Atilano Román Tirado exigia muitas vezes na antena que oitocentas famílias expropriadas por causa da construção de uma barragem fossem indemnizadas. A sua combatividade foi fatal num país em que os sequestros, torturas e assassinatos se tornaram moeda corrente, em particular para quem põe em causa uma ordem social corroída e mafiosa.

A 26 e 27 de Setembro, quarenta e três estudantes da cidade de Iguala, no estado de Guerrero, a cento e trinta quilómetros da Cidade do México, protestavam contra reformas educativas de inspiração neoliberal promovidas pelo presidente Enrique Peña Nieto. Quando se deslocavam de autocarro foram interceptados pela polícia municipal e levados para parte incerta. A seguir, é verosímil que tenham sido entregues a um cartel da droga, encarregado de os executar e de esconder os seus restos mortais em fossas clandestinas. Nestas últimas semanas não param de ser descobertos túmulos deste género, por vezes repletos de corpos desmembrados ou queimados. Procurados pela justiça, o presidente da autarquia, a sua mulher e o director da segurança pública de Iguala puseram-se em fuga.

Desde que abriu às multinacionais o sector da energia (privatização do petróleo) [2] que Peña Nieto é adulado pela imprensa económica [3]. A França atribuiu-lhe a grande cruz da Legião de Honra. Irão algum dia os seus admiradores interpelá-lo sobre a quase impunidade de que beneficiam no seu país as forças policiais e os corruptos representantes eleitos? Talvez os grandes jornais ocidentais, os intelectuais mediáticos, Washington, Madrid e Paris não saibam que questões colocar ao presidente mexicano. Imaginem então as perguntas que espontaneamente teriam surgido nos seus cérebros se o massacre dos estudantes tivesse acontecido no Equador, em Cuba ou na Venezuela. Ou nessa Bolívia sobre a qual se diz baixinho que acaba justamente de reeleger o presidente Morales.

Notas

[1] Passou de 60 para 58 anos, nos homens, e de 60 para 55 nas mulheres com três ou mais filhos.

[2] Ler John Mill Ackerman, «Le Mexique privatise son pétrole», Março de 2014, www.monde-diplomatique.fr.

[3] A 28 de Junho de 2013, um suplemento do Financial Times tinha o seguinte título: «O tigre asteca começa a afiar as garras». Aparentemente, a 16 de Dezembro do mesmo ano esta operação de afiação estava concluída, uma vez que nessa altura o The Wall Street Journal saudava já, num editorial, o «modelo mexicano».



Publicado por Xa2 às 07:51 | link do post | comentar

1 comentário:
De Mártir do machismo e apatia cidadã. a 2 de Dezembro de 2014 às 11:58
Morreu Tugce, jovem mártir do machismo

(Sol, 29/30/2014)

Foi desligado esta sexta-feira o suporte vital a Tugce Albayrak, uma jovem alemã de origem turca que estava em coma desde dia 15, na sequência de uma violenta agressão.

A decisão foi tomada pelos pais, depois de os médicos terem informado a família que a jovem não tinha qualquer hipótese de recuperação. O ‘adeus’ foi dado no dia do 23º aniversário.

Tugce fora violentamente agredida na cidade alemã de Offenbach, momentos depois de ter enfrentado um grupo de homens que assediavam duas jovens de 13 e 16 anos na casa-de-banho de um restaurante da McDonalds.

Segundo a imprensa germânica, Tugce jantava naquele estabelecimento quando, perante a passividade dos empregados e dos restantes clientes do restaurante, decidiu levantar-se da mesa e acudir as jovens, que gritavam.

A jovem mulher libertou as vítimas de assédio, mas não conseguiu sair do restaurante. No exterior, os agressores fizeram-lhe uma ‘espera’. Um destes, um rapaz de 18 anos, agrediu-a no parque de estacionamento, provocando os ferimentos que a levariam à morte. Segundo a Deutsche Welle, desferiu-lhe um soco que a fez cair e bater com a cabeça numa pedra. O presumível homicida está detido.

O caso chocou a Alemanha. Os amigos da vítima acusam os funcionários do restaurante de não terem prestado auxílio a Tugce – terão mesmo cobrado pelo copo de água que foram pedir para a vítima.

Nas redes sociais, ganhou força uma petição para uma homenagem de Estado. O governo estadual de Hessen, no oeste germânico, deverá condecorar Tugce. Este sábado, o Presidente da República, Joachim Gauck, enviou uma carta de condolências à família da vítima. E milhares de pessoas saíram às ruas para vigílias e homenagens.

Devido a Tugce, a Alemanha volta a discutir o problema universal da violência de género. E, ao mesmo tempo, debate a necessidade de uma maior coragem cívica – o dever de intervir perante casos de violência e de abuso – por parte dos recatados alemães.


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