Quinta-feira, 3 de Julho de 2014

Imaginemos que os salários na Administração Pública são repostos, gradualmente, até 2019. Imaginemos o mesmo para as pensões de reforma acima de mil euros. Imaginemos que não há despedimentos de funcionários públicos. Imaginemos que as prestações sociais, as despesas com Saúde e as despesas de consumo do Estado vão subindo apenas ao ritmo da economia real e da inflação. Imaginemos que não se mexe mais nos impostos. Imaginemos que a economia cresce entre 1,5% e 2% em termos reais - e que vamos pagando a dívida com dinheiro que levantamos nos mercados. Este cenário não é propriamente um sonho. É verdade que não tem "austeridade nova". Mas mantém a velha. Implica a manutenção de cortes (se o Tribunal Constitucional deixar), embora gradualmente mais pequenos, nas pensões e nos salários. Significa a manutenção de uma carga fiscal muito alta, do IVA ao IRS.  
 
Representa a cristalização de tudo o que foi feito até aqui na Saúde e nas prestações sociais. É, no geral, um cenário pior do que qualquer coisa que o PS, por exemplo, esteja disposto a assumir publicamente. No entanto, o mesmo cenário significaria o incumprimento grosseiro dos compromissos orçamentais assumidos por Portugal na Europa. O Banco de Portugal fez as contas e apresentou-as na semana passada: seria preciso juntar medidas no valor de 6,7 mil milhões de euros (4% do PIB) para o país chegar a 2019 com um défice estrutural de 0,5% do PIB, como define o tratado orçamental europeu. É metade do enorme esforço aplicado nos últimos três anos. Mais do que cobrir a recta final da presente legislatura, o horizonte de análise do Banco de Portugal abrange a totalidade da próxima. Por outras palavras: esta é uma medida indicativa da restrição que, com a informação que temos hoje, o próximo Governo terá que cumprir. Para a administração do Banco de Portugal, liderada por Carlos Costa, o exercício destina-se precisamente a ilustrar com números aquilo para que muitos alertam com palavras: os próximos anos serão de forte aperto orçamental. O interesse que trabalhos destes têm para a política portuguesa é filtrar os debates estéreis sobre o lugar de Portugal na zona euro. Nada como citar do texto publicado pelo banco central, na parte em que é um recado directo a partidos e instituições: "O reconhecimento por parte dos agentes políticos e sociais dessa mesma restrição é fundamental para que o debate sobre opções de política se situe no terreno do realizável e seja, por isso, um debate consequente." Trocado por miúdos: ninguém em Portugal está em condições de prometer uma inversão significativa de caminho. Mais útil seria travar o debate político em dois planos: quais são as melhores opções políticas dentro desta restrição e quais são os pontos que queremos negociar na Europa (e como) para ampliar a restrição, torná-la menos apertada. Tudo o resto é, essencialmente, conversa - e desilusão potencial mais à frente, para quem ainda se consiga iludir.

[Fonte: Diário Económico de 16/6/2014]

 



Publicado por [FV] às 12:40 | link do post | comentar

2 comentários:
De Bocage a 3 de Julho de 2014 às 16:42
Isto não impediu que na AR os nossos queridos deputados tenham votado, sem quaisquer votos contra nem abstenções, um aumento nos seus vencimentos para o corrente ano de 2014 (cerca de 5%, passando dos cerca de 9.803,00€ para os 10.293€) e ainda aprovaram uma subvenção de 18.261,459€ para propaganda eleitoral...
ou como diria Du Bocage:
"A vida é filha da puta
A puta, é filha da vida
Nunca vi tanto filho da puta
Na puta da minha vida"
Amen.


De Neoliberais e alienados sabujos... a 3 de Julho de 2014 às 18:40
Do liberal ao liberal estalinista

(ou do Capataz / fantoche do capitalismo selvagem apoiado por neoliberais e alienados ! )

(-por oJumento, 3/7/2014)

Se pudesse vasculhar a minha memória como se fosse o Google e procurasse por “investimento estrangeiro” a primeira referência seria à desistência da Nissan de instalar uma fábrica de baterias em Portugal. Se procurasse por criação de emprego a primeira referência diria respeito à redução dos salários. Se procurasse por crescimento económico iria parar à humilhação infligida por Vítor Gaspar ao então ministro da Economia Álvaro Santos Pereira, quando este propôs medidas para o crescimento e teve como resposta “não há dinheiro” e ao insistir ouvi Gaspar perguntar-lhe “qual das três palavras não percebeu?”.


Passos Coelho acreditava que depois de uma poda rigorosa da economia portuguesa nem seria necessário adubar a árvore porque nasceriam viçosos rebentos por todo o lado. Os patos-bravos da construção passariam a construtores de automóveis e os donos de restaurantes falidos ressurgiriam como startups na indústria electrónica. Os crescimento era uma consequência de uma economia com um Estado reduzido e com rigor orçamental e não o resultado de qualquer veleidade económica.



O Gaspar fugiu, o sôr Álvaro saiu humilhado pelas portas traseiras, para o lugar do idolatrado professor bastou uma licenciada da Lusíada e o Álvaro foi substituído na Horta Seca por uma santinha milagreira que em pouco tempo fez mais milagres do que a santinha da Ladeira. O país passou a ser um caso de sucesso, a santinha anunciava o milagre da exportação e do crescimento e até o Lambretas já anda armado em santinha e anuncia o milagre da descida do desemprego sem criação de empregos ou a redução dos carenciados apesar da multiplicação da miséria.



Agora, Passos Coelho revela-se um ultraliberal de influência estalinista, o liberal proibia a palavra crescimento e excomungava quem propusesse medidas que o visassem, agora decide que é o momento de crescer como se o crescimento fosse um comboio com hora para a partida e ele fosse o chefe da estação. Dantes bastava a desvalorização fiscal dos trabalho para que a economia crescesse, agora quer um acordo nacional para a criação de emprego, como uma missa presidida por Cavaco e com sacristões como Passos e Seguro seja o melhor princípio para uma procissão destinada a pedir emprego a Deus.



O mesmo Gaspar que fala na diferente qualidade das medidas orçamentais esquece que o crescimento não se mede apenas em taxas, também se pode questionar a sua qualidade. Um crescimento resultante da exportação de produtos refinados ou de produtos de baixo valor acrescentado e usando matérias primas importadas não só cria pouco emprego como gera poucos excedentes capazes de sustentar o investimento.



Passos Coelho começou por acreditar em Gaspar e desprezou o investimento e destruiu sectores que suportavam o tecido social, o resultado foi o desemprego e a fuga de projectos como o da Nissan. Depois acreditou na santinha da Horta Seca e começou a inventar milagres. Agora que as eleições se aproximam e receia a queda tenta convencer que o combate ao desemprego que ele provocou depende de um dos tais compromissos de que o ti Cavaco tanto fala.



Enquanto acreditou em Gaspar o líder do PSD foi um militante do ultra liberalismo, agora que as eleições se aproximam e “está à rasca” revela-se um estalinista, ele que mandou parar o crescimento decide agora que o crescimento deve retomar a marcha. Passos Coelho acha que a economia portuguesa é um comboio daqueles que lhe terão oferecido no natal quando era gaiato. Só que já está demasiado crescidinho e ao dar ordens de marcha à economia mais parece o velho Estaline a brincar na sua dacha com uma miniatura do Expresso do Oriente.


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