Terça-feira, 25 de Março de 2014

Um amigo de Gaspar?      (

Vítor Gaspar invocou ontem a autoridade de um “pai fundador” dos EUA, Alexander Hamilton, para defender os inconvenientes do incumprimento da dívida. Os seus aduladores na imprensa, os que confundem jornalismo com opinião, trataram logo de dizer que “Vítor Gaspar demonstrou que tem estudado a matéria”. O primeiro Secretário do Tesouro era de facto contra tal prática em princípio, estávamos no contexto de formação de um novo Estado, mas na realidade Hamilton procedeu a uma significativa reestruturação da dívida no processo da sua assunção pelo governo federal, como está relatado neste artigo do NBER que a compara com a reestruturação mexicana dos anos oitenta/noventa. A história é sempre mais complicada: dessa vez também não foi diferente.

    De resto, é curioso que Gaspar invoque Hamilton, dado que este foi um construtor nacional (não, a UE não será um Estado, que os povos dos Estados-nação já existentes não deixam), um dos que forjou os principais argumentos para o proteccionismo, quer por razões de financiamento, quer sobretudo enquanto política de educação para o desenvolvimento das capacidades industriais da nova nação face aos seus competidores. O realismo, com preocupações de segurança e de poder nacionais, de Hamilton está muito longe dos delírios pós-nacionais dos nossos neoliberais capturados pela imaginação do centro. O seu famoso relatório sobre as indústrias é economia política nacional no seu melhor: todos os argumentos proteccionistas posteriores vão ter aos EUA no final do século XVIII e no século XIX, incluindo os do alemão Friedrich List. É a chamada história secreta do capitalismo que se repete: do proteccionismo às reestruturações. Precisamos mesmo dela contra a economia política neoliberal de Gaspar.
-----J.S:

Depois do Adam Smith, Hamilton é mais um imbuído do Espírito de Abril ('avant la lettre', evidentemente). Ah, e há ainda os 74 Economistas estrangeiros que apoiam o 'Manifesto dos 74' de cá (http://www.publico.pt/economia/noticia/manifesto-da-divida-recebe-apoio-de-74-economistas-estrangeiros-1628981?page=2#follow). É verdadeiramente uma 'Conspiração Mundial Keynesiana' deve pensar Passos Coelho lá do seu bunker!



Publicado por Xa2 às 07:56 | link do post | comentar

1 comentário:
De Parlam. Europeu: 2 boas notícias a 27 de Março de 2014 às 11:22
20 /3/2014 http://esquerda-republicana.blogspot.pt/2014/03/duas-excelentes-noticias-de-bruxelas.html#comment-form
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Duas excelentes notícias de Bruxelas para Portugal que passaram despercebidas hoje

1. O Fundo europeu de liquidação de bancos vai funcionar a nível comunitário (e será financiado pelos bancos).

Ao contrário do que a Alemanha defendeu afincadamente desde o início, e invertendo a proposta do Conselho Europeu, o Parlamento Europeu, pela mão de Elisa Ferreira, conseguiu levar à melhor criando assim uma separação entre o risco da dívida pública dos países europeus, e o risco dos bancos neles sediados.

Lembremo-nos que não foram os países com dívida pública mais alta (Itália e Bélgica) que sofreram mais com a crise, mas os países onde os privados mais tinham dívidas ao exterior (Espanha, Irlanda, Portugal e Grécia), dado que os riscos dos privados eram transferidos para os estados responsáveis pela sua liquidação. Atrevo-me a dizer que se este ponto fundamental da união bancária (e que a Alemanha sempre menosprezou) já estivesse regulamentado, em 2010 teríamos assistido apenas a uma crise orçamental em Atenas.

2. O método de cálculo do défice estrutural será mais favorável do que inicialmente considerado.

O défice estrutural é um conceito vago, e essa nebulosidade era suficiente para eu ter muito medo do Pacto Fiscal imposto por Berlim (e aceite prontamente pelo PS, PSD e CDS). Por estabelecer o limite de 0,5% do PIB para os défices estruturais, o pacto chegou a ser acusado (com razão) de ilegalizar políticas contra-cíclicas keynesianas.

Ao que tudo indica, a estimativa do produto potencial (outro conceito vago, do qual depende o défice estrutural) poderá ser significativamente diferente do produto real, havendo assim mais espaço para compensações activas por parte das políticas orçamentais dos estados membros.


Autor: Miguel Carvalho, Esquerda Republicana
Marcadores: Economia, União Europeia
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2 comentários:

Luís Lavoura:

Excelente.
Assim se vê a utilidade do Parlamento Europeu.


Miguel Carvalho:

Nem mais! E porque é que o Conselho tem-se agarrado tanto ao poder que ainda tem


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