Portugal, Um Dia Destes (- P. Pinto, 29.04.15, jugular)
Tomei conhecimento, por via da crónica do F. Louçã, do que me parece ser o mais magnífico exemplo da originalidade intelectual portuguesa e a quem vaticino os maiores sucessos mediáticos, políticos e ribalteiros. Falo de Pedro Cosme Vieira (PCV), que reúne, num único molho, o toque de Midas lusitano:
a) é alguém que não é "intelectual" - coisa próxima do insulto por cá - porque fala direto e barato, quero dizer, popularucho, diz bacoradas em barda, coisa que o aproxima da grunhice mas que, como diz na capa do seu livro, pretende ser "diferente e corajoso";
b) é economista, portanto, percebe daquilo que realmente interessa, que é o pilim;
c) não é político, logo, não está metido em alhadas, não consta da lista negra do Paulo Morais ou do Marinho Pinto e não espreita moças avantajadas durante as horas de expediente;
d) é "Professor da Faculdade de Economia etc", o que lhe confere aquela respeitabilidade - melhor dizendo, respeitinhabilidade - que herdámos do senhor Professor Oliveira Salazar e que o coloca uns degraus acima de outros "Professores", como o Carlos Queiroz ou o Bambo;
e) serve de referência (como prova a crónica de Louçã) a políticos em ascensão, que o citam e seguem, como é o caso do mais brilhante fruto da grande árvore laranja, o grande ideólogo e pensador Duarte Marques. Tudo isto em shaker esplendoroso. O Camilo Lourenço que se cuide, o Pedro Arroja que arrume as botas, PCV chegou para vencer.
Leio comentários indignados acerca das expressões que utiliza no seu blog, os "barcos com pretalhada", etc. Meus amigos, não viram nada. Atualizem-se. Estão out. A crónica do F.Louçã é de ontem e refere-se a um post de qunta-feira. No domingo, "o grande pensador" produziu novo pedaço de prosa genial (com má ironia ou algo bem pior?) - é o mais recente até ao momento - cuja leitura recomendo vivamente. Nele, estão expostas as linhas mestras da quadratura do círculo: receber todos aqueles "desgraçados" que atravessam o Mediterrâneo e lucrar com isso, sob a égide do "português" David Ricardo. Como? Muito simples, criando uma "Cidade Franca" (*) na Zona Saloia ou no Alentejo (ou seja, para lá do sol posto, longe da casa dele) onde se recebessem todos os imigrantes, isolados do resto do País (e da Europa), onde trabalhariam à vontadinha em estruturas "privadas" (claro), desde que pagassem uma renda anual a Portugal.
Depois, poderiam regressar aos seus países (!). É claro. A gente quer é que eles venham, paguem mas não se misturem. À vontadinha, pá, sem espiga. Não se sabe bem o que lá fariam, onde trabalhariam, mas isso seria lá com eles e com os "privados" que fariam a gestão da Cidade Franca. Passa-me já pela cabeça meia dúzia de sugestões de "trabalho" onde vários cartéis - legais e ilegais - e multinacionais não se importariam nada de investir, desde que a Cidade Franca fosse também offshore financeira. As contas são infalíveis, desde contabilizar "72h/dia" (!!) "segundo o Génesis" (grande clássico da economia e das relações laborais, como se sabe) a espetar em tal guetto 50 milhões de imigrantes, seguindo o exemplo de Manila (excelente modelo de harmonia social, salubridade e qualidade de vida !!). Tudo calculado, tudo pensado, é só lucro e vantagem para todos. Objetivo final? está no fim do texto: "Seremos todos sheikes árabe, só praia e gajas boas" (e, caso houvesse dúvidas, está uma foto para o comprovar). Magnífico. Não sei bem como premiar isto. Óscar? Comenda? Razzie? Hmm a Ana Matos Pires poderá dar uma sugestão no novo serviço que acaba de inaugurar.
P.S. - Dei uma vista de olhos pelo livro de PCV, Acabou-se a Festa, Lisboa, Vogais, 2011. Parei na parte em que sugere acabar com as renováveis (!) e transferir as centrais nucleares espanholas para Portugal(!). Fiquei tentado a parafrasear uma expressão do livro, devidamente adaptada à sua pessoa, aquela em que diz (p. 85), "Nossa Senhora de Fátima, que apareceste para salvar Portugal, como Permites governantes destes para Portugal?"
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(*) - «A Cidade Franca» teria uma cerca (dupla e farpada, 4m de altura, estrada e polícia militar, ... + electrificada? cães?, betão armado?, torres de atiradores ?... como nas terras palestinas/ colonatos israelitas, na Berlim da RDA ou nos campos de extermínio nazi ?!) ... , 200 km de extensão e conteria 3000 km2 de terreno, cerca de 3% do território português (uma área idêntica à do Distrito de Lisboa)... seria uma Zona Internacional (!!, ou 'offshore'/ zona franca/ gueto/ «distrito #» alienígena ?! com 'lei e ordem' PRIVADA e 'gente?' SEM DIREITOS políticos, civis, laborais ou HUMANOS, i.e. um 'moderno' enclave ou colónia para ESCRAVOS e de escravocratas/ plutocratas !!!).
A Cidade Franca
(- PVC, 26/4/2015)
...
É que são uma oportunidade para nós. Assim, podemos ajudá-los e, ao mesmo tempo, beneficiar enormemente com isso.
Vamos cobrar uma renda anual a cada pessoa que queira vir viver para Portugal e ver se alguém quer.
Se alguém aceitar pagar renda para viver cá é porque vive melhor aqui (pagando a renda) do que onde está (não pagando) e nós também ficamos melhor porque passamos a receber dinheiro que de outra forma não receberíamos.
... Mas eu tenho uma solução óptima para isso.
--- Vamos fazer uma Cidade Franca isolada do resto de Portugal.
... No meu exercício, a Cidade Franca será uma Zona Internacional. Assim, qualquer pessoa pode ir para lá viver e trabalhar e regressar ao seu país sem necessidade de visto nem passaporte.
Para viver na Cidade a pessoa apenas precisará de pagar uma renda anual.
Fig. 3 - Se esta vedação é humana em Melilla, também o será na Zona Saloia.
As pessoas residem na Cidade Franca como se continuasse no seu país de origem.
Por exemplo, um eritreu, não tendo passaporte nem visto, compra um bilhete de avião com destino à Cidade. Chegado ao aeroporto de Lisboa, apanha o Shuttle para a Cidade onde fica a residir com o mesmo estatuto que teria se estivesse na Eritreia. Quando pretender viajar de volta à Eritreia, vai no Shuttle até ao Aeroporto de Lisboa e apanha o avião de volta a casa. Se tiver visto para entrar noutro país, também poderá ir a partir da Cidade.
Como as pessoas não podem sair da Cidade para o resto de Portugal, estarem lá não terá qualquer impacto negativo nas nossas vidas.
A pessoa, além da residência, poderá estudar, ensinar, trabalhar, ser empregado ou patrão, poupar, investir, importar e exportar. Por estar dentro da Zona Euro, a moeda será o Euro e haverá livre comércio com os países da União Europeia. É isto tudo que está incluído na renda.
Quem quiser pagar vem.e quem não quiser pagar fica em casa desenrascando-se como puder.
---A Cidade Franca será gerida por empresas privadas.
Agora tenho que resolver o problema da gestão da Cidade. Será preciso tratar das infra-estruturas, do abastecimento de água e recolha de lixos, da segurança, da aplicação da justiça e da cobrança dos impostos para pagar esses serviços todos e a renda. Será ainda preciso arranjar investidores que construam as casas e as instalações industriais, de serviços e de lazer.
À luz da economia, o melhor é a Cidade ser privada. Para haver concorrência, a Cidade será dividida em lotes idênticos, (por exemplo, 10), geridos cada um por uma empresa privada (em concorrência). Cada empresa terá que procurar ter um nível de serviços e de impostos que atraia pessoas produtivas e bons empresários para os seus lotes de forma a maximizar os seus lucros.
Sobre os lucros, as empresas pagarão ainda IRC ao Estado Português.
---E quantas pessoas terá a Cidade Franca?
... Num horizonte temporal de 30 anos, darão à costa 27 milhões de pessoas! Somando os filhos, para resolver o problema das praias europeias é preciso a Cidade ter capacidade para 50 milhões de pessoas.
É muita coisa, a Cidade terá 5 imigrantes por cada português. ... mas a zona urbana de Manila - Filipinas tem uma densidade de 15400 pessoas por km2 (vivem 22,5 milhões de habitantes, em 1475 km2). semelhante em tamanho ao Distrito de Lisboa, sem estarem muito apertadas. Ainda dará espaço para parques e jardins públicos.
E 50 milhões de pessoas a 1000€/ano cada, são 50 mil milhões € por ano de renda, em 4 anos pagam a nossa dívida pública toda.
E, além da renda, teremos muitos outros benefícios.
Portugal vai vender água, 100m3 por segundo, e fazer o tratamento dos esgotos e dos lixos. A água não será problema pois o rio Tejo tem um caudal Médio de 330 m3/s e o lixo tratado previamente na Cidade (reciclando tudo o que seja possível).
Vamos ainda fornecer electricidade e serviços de logística. Fornecer serviços médicos, de educação e bancários.
A Cidade também será a origem de muitos turistas para as nossas praias e mercado para muitos dos nossos bens, hortaliça e frutas incluídas.
Com 50 milhões de habitantes, tudo isto vai render muito bom dinheiro e criar muitos postos de trabalho para os portugueses.
A nossa economia vai evoluir para uma economia de prestação de serviços e ricos como os luxemburgues
Bem-vindos à cidade neoliberal
Ao longo dos últimos três anos, segundo uma investigação do The Independent, mais de 50 mil famílias terão sido compelidas a abandonar as suas casas, localizadas nos bairros do centro de Londres, sendo posteriormente deslocadas para zonas administrativas situadas na periferia da cidade.
Um movimento silencioso, quase imperceptível, que o periódico britânico rotula de «limpeza social» (social cleansing)
e que traduz fundamentalmente o impacto, nos agregados familiares pobres, da subida das rendas e dos cortes em protecção social, a partir de 2010
(com a fixação de um tecto nos apoios sociais e com a introdução do «imposto de quarto», nos alojamentos sociais).
A informação a que o The Independent teve acesso, e que consta de documentos que as autoridades recusaram inicialmente divulgar, permite constatar a existência de
«um número sem precedentes de famílias que deixaram de poder pagar a casa em que viviam, sendo arrancadas dos seus bairros e deslocadas para localidades cada vez mais longe da capital,
quebrando-se deste modo os laços com familiares e redes de apoio». No total, entre o início de 2012 e o final de 2014,
o êxodo de famílias pobres da capital quase quadruplicou, tendo vindo entretanto a acelerar-se o ritmo das deslocações administrativas (que se estima rondar actualmente as 500 famílias por semana).
Ou seja, está a verificar-se precisamente o contrário do que prometera o (conservador/ neoliberal) Mayor de Londres, Boris Johnson, quando disse em 2010 que as reformas que iria implementar não conduziriam a uma «limpeza social de tipo Kosovo»,
assegurando que os londrinos jamais veriam «milhares de famílias a serem removidas dos lugares onde vivem».
Emma Reynolds, a ministra-sombra do Partido Trabalhista (na oposição) para a Habitação, considera tratar-se de
«uma tragédia, o facto de tantas pessoas estarem sem casa ou a lutar por manter um tecto e, como se isso não fosse suficiente,
são ainda confrontadas com o cenário ficarem a milhas da sua actual casa».
Bem-vindos pois às novas cidades, socialmente desenhadas pelo fomento deliberado das desigualdades,
pela recusa do papel do Estado e das políticas sociais públicas na promoção do bem-estar e da igualdade de oportunidades, para já não falar da consagração das lógicas mais selvagens de mercado.
Não configurando, como é óbvio, nenhuma nova etapa interessante nas formas de organização urbana das sociedades,
a cidade neoliberal antes reconstitui e reproduz as lógicas de SEGREGAÇÃO e as «muralhas» que caracterizavam a cidade medieval.
(-por Nuno Serra, 7.5.2015 , http://ladroesdebicicletas.blogspot.pt/2015/05/bem-vindos-cidade-neoliberal_7.html )
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