Mulheres sem medo (-por Ana C. Câmara, Sol, 2/2/2014)
Em grupos de cinco, as jovens abordam rapazes ou homens que andam a assediar mulheres e avisam-nos de que esse comportamento tem de acabar. Se o alvo não dá importância à mensagem, as jovens da Brigada Vermelha avançam para o passo seguinte: a humilhação pública – o terror na machista sociedade indiana.
Em casos pontuais, admitem recorrer a estalos. E estão preparadas para isso, com aulas de artes marciais onde aprendem técnicas que podem salvar-lhes a vida.
------------ V, de Violação
Mais uma violação colectiva, numa zona rural da Índia, voltou a revoltar o país. Mas as grandes manifestações de Dezembro de 2012, que levaram milhares de pessoas para as ruas de Deli a exigir uma justiça mais célere e dura, parecem ter ficado para trás.
Por ter sido encontrada com um homem numa cabana da aldeia, numa zona remota da Índia, uma mulher de 20 anos foi condenada a violação colectiva, na semana passada. A família não tinha como pagar 27 mil rupias (pouco mais de 310 euros) da multa aplicada pelo conselho tribal, o que levou o ancião de Subalpur a ordenar aos homens que "usufruíssem dela", segundo disse a vítima à Polícia. O relatório médico estima que W – a vítimas de violação – terá sido violada por entre 5 e 15 homens. 13 foram detidos. O lugarejo de Subalpur reagiu, aliando-se contra W.
Há um muro de negação – e de silêncio – naquela aldeia do estado nortenho de Bengala Ocidental. Os habitantes não refutam que, na segunda-feira da semana passada, W foi surpreendida numa das cabanas com outro homem, casado, de uma aldeia vizinha. Nem que ambos foram atados a uma árvore, enquanto o conselho tribal resolvia a punição que o caso merecia, dado que relações com membros de outras comunidades são proibidas – para mais com um muçulmano. Nem tão-pouco que a sentença foi uma multa (que a família do homem infractor conseguiu pagar). ...
Os conselhos tribais, de minorias étnicas que habitam regiões isoladas do país, regulam os povoados e gerem as disputas, em lugares onde a justiça tarda e é vista com desconfiança. "É assim que fazemos. Não vamos à Polícia. Se há um problema, resolvemo-lo entre nós", explicou Fulmoni Tudu, de 40 anos, cujo marido está entre os 13 detidos.
Segundo conta o Guardian, W estava longe de ser acarinhada pela comunidade, onde a esmagadora maioria não sabe ler nem escrever. Há quatro anos, tinha decidido trabalhar em Deli: a mais de 1.600 km de distância, é quase o mesmo que dizer que se mudou para outro planeta, numa terreola onde os vizinhos nunca chegaram sequer à cidade mais próxima, Suri, a 35 km dali.
"Os nossos homens trabalham no campo. Nós ficamos com as crianças. Porque é que algum de nós iria para uma cidade, a não ser para fazer alguma asneira?", questionou Manika Tudu. W teria arranjado um trabalho numa cozinha em Deli, mas em Subalpur dizem que era prostituta.
A jovem relatou às autoridades que foi levada para outra cabana e repetidamente violada durante a noite. ...Fechada em casa e ameaçada de represálias caso saísse, W escapou graças à mãe e a dois irmãos que, dois dias depois, conseguiram levá-la a uma clínica – de onde foi transferida para um hospital, devido à gravidade dos ferimentos. Daí ao alerta da Polícia foi um passo.
O caso Nirbhaya
A história de W não provocou até agora as ondas de choque do caso Nirbhaya – nome que significa ‘sem medo’, dado à estudante universitária de 23 anos que em Dezembro de 2012 foi violada e espancada por seis homens num autocarro em Nova Deli.
Após a morte da jovem, que não resistiu aos ferimentos, milhares de pessoas tomaram as ruas da capital e enfrentaram a Polícia, para exigir mais segurança para as mulheres. "Não posso vestir o que quero, não posso ir onde quero sem ter homens especados a olhar para mim... Onde está a minha liberdade?", perguntava uma manifestante. "Ela podia ter sido eu", reconhecia outra, identificando-se com a vítima.
Mas essa empatia por uma universitária, que motivou multidões na megacidade de Deli, não tem eco quando se trata de uma jovem analfabeta de um meio rural, num país a desenvolver-se num colete-de-forças de castas, onde o machismo impera apesar de milhões venerarem no dia-a-dia as mais variadas divindades femininas.
Mais impacto teve a notícia, em meados de Janeiro, da violação e assalto de uma turista dinamarquesa de 51 anos, em Nova Deli, por cinco homens – três já foram detidos. Ou o caso da polaca violada por um taxista que a levava (e à filha) para a capital indiana. Ou a suíça que no ano passado também foi vítima de uma violação colectiva no centro do país. Ou ainda a história de uma cidadã britânica que para escapar a uma agressão saltou pela janela do hotel em Agra, a cidade do Taj Mahal. Esse impacto, teme o Governo indiano, pode reflectir-se no turismo : os números são de crescimento, mas registam desaceleração (9,3% em 2010; 13% em 2011; 5,4% em 2012 e 4,1% em 2013, segundo o Ministério do Turismo).
Dados do Gabinete de Estatísticas Criminais, do Ministério da Administração Interna indiana, referem que a cada 22 minutos uma mulher é violada.
Após o caso Nirbhaya, o Governo instituiu uma comissão para rever a legislação sobre a violência sexual contra mulheres. Daí resultaram várias medidas, como a criação de tribunais ‘rápidos’, que obrigam a que um julgamento por violação tenha sessões diárias até à sentença – mas a pesada máquina judicial continua lenta (e denegando justiça).
Também se alargou a pena de morte para violadores reincidentes ou em casos de violação que levam à morte das vítimas. À excepção de um menor que foi condenado a três anos e outro réu que apareceu morto na prisão, os agressores de Nirbhaya foram sentenciados à morte – uma medida que vai contra as opiniões das organizações que defendem os direitos humanos, como a Human Rights Watch, que, no relatório publicado no início do ano, chamou a atenção para o facto de a lei indiana ainda não ter medidas eficazes "para a protecção das vítimas ou das testemunhas".
Mesmo com mudanças – como obrigar os polícias a aceitar queixas por agressão sexual –, estas organizações avisam que a maior dificuldade será implementar as leis quando, por exemplo, apenas 7% do efectivo policial é constituído por mulheres. E quando se estima que só um em cada 100 ataques é comunicado às autoridades. ...
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