Quinta-feira, 28 de Agosto de 2014

Social-democracia ?  (-por Joana Lopes, 28/8/2014)

 
     Onde é que ela já vai !  E não volta digo eu e há muito tempo.  O que se passa em França é paradigmático. O passado já foi, para a frente é que é o caminho, mesmo  que ainda não se veja claramente como será.
    A propósito do caso francês (remodelação de governo "pragmático"), Fernando Sobral, no Negócios de hoje:  «A social-democracia europeia perdeu-se entre a globalização e o projecto europeu e nunca mais conseguiu encontrar um caminho próprio.
    Não entendeu que estes dois factos, em conjunto, enfraqueceram o controle do Estado sobre os mercados e privilegiaram a economia face aos factores políticos e sociais. O seu castelo encantado, o Estado social, ficou assim refém de decisões alheias. Perdendo-se nesse novo mundo, a social-democracia foi incapaz de descobrir um sonho que atraísse os cidadãos.
    Aquilo que se está a passar em França, com o catavento François Hollande, que de tanto andar à roda há-de cair estatelado no chão, evidencia esta falência. Há pouco mais de um mês, Manuel Valls, explicava a quem o queria ouvir o que era esta "nova social-democracia" que está agora reflectida no novo governo francês: "os franceses não estão interessados se é um programa das esquerdas ou das direitas. Querem pragmatismo. A esquerda pode morrer se não se reinventa, se renuncia ao progresso". Ou seja, a "nova social-democracia" não é de esquerda ou de direita: de manhã pode ser Jekyll e à tarde Hyde. Desde que conquiste e permaneça no poder. E que seja pragmática. Valores? Esqueçamos. Sendo assim, a esquerda passa a ser idêntica à direita.
    A escolha dos cidadãos passa a ser sobre quem acham mais competente para CEO e para CFO. Essa insolvência ideológica torna a social-democracia incapaz de perceber porque os Estados estão hoje reféns dos mercados, e a Argentina é incapaz de pagar as dívidas porque um juiz americano (ou uma estranha arbitragem...) decide como e quando elas devem ser pagas.
    É neste pântano que António José Seguro e António Costa brigam pelo poder no PS. Amarrados ao Tratado Orçamental e à política de austeridade a ele inerente, que não permitirá baixar impostos (como diz Seguro) e onde tudo se centra na fulanização (como quando Costa pede que Rio faça uma revolta popular no PSD), mostram porque François Hollande é um fiasco.
 
É preciso  Organizar a desglobalização     (-por  J. Rodrigues, 11/8/2014, Ladrões de B.)
     Defender a “desglobalização”, na linha do último livro de Jacques Sapir e de outros bons economistas ditos neo-proteccionistas, como Frédéric Lordon, não é defender a autarcia, mas sim uma renegociação do grau de abertura da economia por forma a que esta volte a ser pilotada pelo poder político democrático, mantenha relações sustentáveis com o resto do mundo, reduzindo, na medida do possível, o poder da economia da chantagem, da opacidade, da desigualdade e da crise permanente.
    Chantagem. A liberdade de circulação de capitais, reconquistada a partir dos anos oitenta, facilita as deslocalizações, a ameaça permanente que impende sobre os Estados e as classes trabalhadoras, o que favoreceu, por exemplo, a redução da taxação sobre o capital e dificulta a organização de uma corrida para cima em termos de standards ambientais ou sociais.
     Opacidade. As estruturas da finança (neo) liberal, de que os paraísos fiscais/ offshores são um dos elementos centrais, facilitam todas as ilegalidades e todas as reciclagens/'lavagens'.
     Desigualdade. A abertura irrestrita às forças do mercado global é uma dos mais importantes factores na base da quebra de rendimentos do trabalho e do aumento de todas desigualdades económicas, comprimindo a procura salarial e substituindo-a por insustentáveis ciclos de crédito.
     Crise permamente. A intensificação da instabilidade financeira traduzida na multiplicação de crises financeiras, ou seja, de crises bancárias e/ou cambiais (ou de 'bolsas'  especuladoras e 'ratings' manhosos), é um dos principais padrões gerados pela globalização.
        Este medíocre statu quo que hoje temos é então indissociável dos processos de liberalização comercial e financeira (e os tratados de 'livre' comércio e investimento) que marcaram a economia política das últimas três décadas. São estes processos que temos de reverter organizadamente, refragmentando a economia global e assim aprofundando algumas tendências, mais ou menos espontâneas, em curso, até porque, caso contrário, a necessária política económica de combate à crise, de criação de emprego, fica totalmente dependente de um grau de coordenação entre Estados/regiões demasiado exigente e de muito difícil concretização, sendo mais facilmente bloqueada/ manipulada pelas multinacionais e giga lobbies de oligarcas.
     Alternativas existem:   do controlo de capitais, que muitos países estão a redescobrir, à necessidade de incentivar a emergência de modelos de desenvolvimento nacionais e regionais muito mais focados na procura interna, passando pela política industrial selectiva, o que exige, no caso de Portugal, desafiar nacionalmente as regras do mercado interno europeu, porque sem base industrial não há economia que nos valha, ou pela necessidade de mecanismos de protecção comercial bloqueadores da erosão dos standards ambientais e laborais.
    Trata-se de gerar uma maior margem de manobra política face às forças de um mercado global incontrolável e gerador de desequilíbrios sistemáticos. Alternativas que podem evitar que a utopia liberal em que demasiados países embarcaram acabe, uma vez mais, muito mal. É impressão minha ou muita esquerda tem andado, nos últimos tempos, demasiado silenciosa, sido demasiado complacente, nestas áreas?
    Em polémica com uma esquerda social-democrata rendida e com uma esquerda à esquerda enredada num globalismo sem tradução política e institucional que se veja, o economista Frédéric Lordon defende, no Le Monde diplomatique deste mês, a desglobalização como projecto inter-nacional. Termino com ele:
     “Se fosse avaliada pelas nossas normas (...), a configuração fordista do capitalismo do pós-guerra teria tudo de desglobalização e procuraríamos aí em vão os arames farpados e as torres de vigia, as economias hermeticamente fechadas e os projectos de auto-suficiência (...) Só quando os trabalhadores nacionais são subtraídos às relações antagónicas às quais os vota o comércio livre desigual é que podem desenvolver-se solidariedades transversais (...), fazendo prevalecer a gramática classista sobre a gramática nacionalista – em suma, respeitar o ‘facto nacional’ poderá ser a melhor forma de dar hipóteses de êxito (internacional) ao ‘facto de classe’ salarial.”


Publicado por Xa2 às 08:57 | link do post | comentar

13 comentários:
De ONU: fundos abutre arruinam nações a 11 de Setembro de 2014 às 11:03

Em relação a processos judiciais por fundos “abutre”,
a presidente da Argentina, Cristina Fernández de Kirchner, ressaltou que
"não é justo que um punhado de bilionários possam afogar uma nação."


"Não é justo que um punhado de bilionários possam afogar um país e extorquir uma sociedade inteira ameaçando-a com defaults, afastando-a do resto do mundo ",
afirmou o presidente da Argentina, numa cerimónia na Casa do Governo, transmitida na televisão nacional. " O vencermos nâo é apenas a posição da Argentina, é uma posição quem
tem dignidade e quer defender os direitos de seu povo, é a posição de todos os países que não querem ser enganados ",
disse Kirchner, referindo-se ao voto da Assembleia Geral da
ONU, que aprovou a criação de um quadro legal para a reestruturação da dívida soberana
e observou que "mais do que um triunfo da Argentina era um triunfo da dignidade das pessoas".
Nesta terça-feira a Assembléia Geral da ONU aprovou , com 124 votos a favor, 11 contra e 41 abstenções uma iniciativa Argentina para ser obtido um
quadro jurídico para reestruturar sua dívida soberana.
O chanceler argentino, Hector Timerman, descreveu como "histórica" ​​a proposta de reestruturação da dívida soberana. Entretanto, na Argentina as comissões plenárias de Orçamento, Finanças e Petições, Poderes e de Regulamento dos Deputados, deram o seu parecer sobre o projecto Soberano da Lei de Pagamento, que será votada hoje, quarta-feira, no plenário da Assembleia Nacional. O artigo propõe a desenvolver ferramentas para assegurar o pagamento de títulos do governo reestruturados em 2005 e 2010, há uma alternativa proposta pelo Governo a "mecanismos de recolha de obstrução ilegítima e ilegal".


Texto completo en: http://actualidad.rt.com/actualidad/view/139788-kirchner-punado-multimillonarios-ahoguen-pais


De UE, BCE e FMI... contraTrabalho e cl.méd a 17 de Setembro de 2014 às 11:29
Reformas estruturais -- basicamente partir a espinha
do "factor Trabalho", dos desempregados e dos envelhecidos ... e arruinar a classe média.

«(…) # a austeridade faliu por completo nos seus propósitos
e Draghi tem procurado preencher o buraco desde Nov de 2011 injectando dinheiro barato nos bancos,
mas, mesmo assim, por esse "canal de transmissão", a coisa não chega à economia real;
Draghi deu mais um passo em junho e agora em setembro e até prometeu comprar dívida privada a partir de outubro (a tal coisa dos ABS)
e injetar mais massa a partir da próxima semana em novas linhas de refinanciamento para os bancos, na esperança de...

# mas ele não quer ficar sozinho a lançar massa, os outros têm de começar a fazer a parte deles; e, então, resolveu chegar-se à frente, armar-se em político, e promover um compromisso:
eu meto a massa nos bancos e no sistema, um bodo de mais 1 bilião de euros,
o Jean-Claude Juncker (pres. CE) dá massa a partir da Comissão (por vários canais),
mas vocês metem as reformas estruturais em campo e
depois a gente vê a forma de "flexibilizar" essa coisa da margem orçamental (de abrandar o cumprimento do tratado orçamental).

# a matriz do pensamento dos banqueiros centrais como Draghi e do grupo que ainda domina o FMI, como a Madame Lagarde, bebe nessa coisa das reformas estruturais -
- basicamente partir a espinha do "factor Trabalho", dos desempregados e dos envelhecidos,
e obrigar a um processo acelerado de reorganização dos grandes grupos económicos e financeiros,
redistribuindo as margens de rendas financeiras e os quintais de cada um;
para esse grupo da elite que manda isso é mais importante do que a própria austeridade
(sobretudo quando esta é um fiasco como logo Olivier Blanchard do FMI começou por mostrar com aquele coisa dos "multiplicadores",
ou como politicamente se começou a ver que deu cabo da classe média
e produziu um eleitorado estilhaçado
em que correntes fora do 'centro' que fundou a CEE e a UE vão crescendo e ameaçam a tal de "estabilidade governativa"). (…)»

Jorge Nascimento Rodrigues, no Facebook (Os Keynesianitos de Frankfurt e arrabaldes)
⇒ Miguel Abrantes à(s) 15.9.14 , Camaracorporativa


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