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De Refugiados: péssimo 'acordo' UE-Turquia a 9 de Março de 2016 às 12:58
O acordo de princípio alcançado entre a União Europeia e a Turquia, para o repatriamento de todos os refugiados que chegaram clandestinamente às ilhas gregas, não só
viola os preceitos da lei internacional e humanitária,
como pode condenar definitivamente as populações em risco e em fuga da guerra, da perseguição política ou religiosa e da pobreza extrema.
Mas o alerta, em tom dramático, do Alto-Comissário das Nações Unidas para os Refugiados, Filippo Grandi, de pouco deve valer.
Tendo em conta o tom congratulatório com que vários líderes europeus saudaram o surpreendente compromisso alcançado em Bruxelas para “pôr fim à migração irregular para a Europa”,
as incertezas jurídicas e os dilemas morais não deverão inviabilizar a solução encontrada para travar o fluxo migratório.

O acordo, anunciado de surpresa ao fim da noite, depois de mais de doze horas de conversações que pareciam inconclusivas,
assenta num controverso programa de troca de refugiados, no âmbito do qual a Turquia aceita a deportação de todos os estrangeiros que partirem do país para o espaço europeu de forma ilegal, independentemente da sua origem ou estatuto legal:
por cada migrante “devolvido” a território turco, a União Europeia acolherá um refugiado sírio “legítimo”, entre os 2,7 milhões que vivem nos campos turcos.

O “ambicioso” projecto atende aos desejos dos governantes europeus, interessados numa fórmula que permita travar as entradas e impedir a instalação de milhares de refugiados nos seus países,
e responde às pretensões da Turquia, que aproveitou a abertura de Bruxelas para forçar a liberalização da entrada dos seus cidadãos no espaço Schengen já em Junho
e para agilizar o seu processo de adesão à União Europeia.

Numa prova da sua boa-vontade, a Turquia aceitou aplicar o acordo retroactivamente e acolher os migrantes que já estão retidos nas ilhas gregas ou na fronteira de Idomeni, impedidos de passar para a Macedónia.
A colaboração do Governo de Ancara tem um custo acrescido: pelo menos mais três mil milhões de euros, isto é, o dobro da verba inicialmente acordada entre Bruxelas e a Turquia.
Mas mais do que dinheiro, a solução tem custos políticos para a União, que até agora não conseguiu ultrapassar as divisões internas sobre o tratamento dos refugiados (ou sobre a entrada da Turquia no clube).

O acordo ainda não foi formalizado:
os parceiros comprometeram-se a trabalhar estes “princípios gerais” e finalizar um documento definitivo para ser aprovado numa nova reunião de alto nível, dentro de nove dias.
“Não posso deixar de expressar a minha profunda preocupação com qualquer acordo que implique transferências entre países sem as devidas salvaguardas de protecção de refugiados e o respeito pela legislação internacional”, reagiu imediatamente o Alto-comissário para os refugiados.

Peremptório, o director para a Europa da agência para os refugiados da ONU disse em Genebra que
“a expulsão colectiva de estrangeiros é proibida pela convenção europeia dos direitos humanos”.
Organizações como a Amnistia Internacional ou a Human Rights Watch (HRW), “destruíram” o novo plano, que nas leituras mais benevolentes foi descrito como impraticável e irrealista, e nas críticas mais contundentes foi atacado como desumano e ilegal.
“É uma não solução, uma vez que não resolve problema nenhum”, resumiram os Médicos Sem Fronteiras.

“Penso que nunca se bateu tão fundo durante os 18 meses de confusões e trapalhadas dos líderes europeus nas suas tentativas de responder ao fluxo de refugiados e migrantes.
Finalmente tornou-se claro o desespero dos europeus, que para conter a crise estão dispostos a ignorar completamente os direitos mais elementares”, censurou a responsável da HRW, Judith Sunderland, entrevistada pela NBC News.
“Este plano é absolutamente incompatível com as obrigações da União Europeia, e não consigo imaginar como esta ideia de troca de refugiados será posta em prática”, acrescentou.

A Amnistia Int'l perguntava como era possível que os chefes de Estado e de governo, na Europa e na Turquia, estivessem dispostos a regatear “os direitos e a dignidade de algumas das pessoas mais vulneráveis do mundo”.
“Esta ideia peregrina de trocar refugiados é perigosamente desumana e não oferece nenhuma solução sustentável de longo prazo...


De 'Solução final' ou problema maior próxim a 10 de Março de 2016 às 09:25
O desonroso bazar euro-turco

(por AG , 9/3/2016, CausaNossa)

"A Turquia devia ser parte da solução para esta crise mas é muito parte do problema, não só ao manipular a torneira dos traficantes de pessoas, mas também ao instigar o conflito violento na sua região sudeste e nos vizinhos Síria e Iraque.
O Conselho Europeu negligenciou tudo isto e sucumbiu à chantagem descarada do Presidente Erdogan, sob a ilusão de que é possível "outsource" as obrigações legais e morais da Europa para com os refugiados à Turquia, em troca de facilitar negociações de adesão e vistos, fechando os olhos às violações dos critérios de Copenhaga e a repressão brutal que o Presidente Erdogan dirige contra os cidadãos e media turcos, contra os curdos turcos em particular e contra os curdos na Síria, que têm sido valentes combatentes contra o Daesh e outros grupos terroristas.

O que o Conselho contempla em política de retorno e readmissões - ilustrado no bazar de se propor trocar um sírio por outro sírio - significa, ominosamente, violar o princípio de "non-refoulement".

E como podem Conselho e Comissão manter cara séria ao falar de primado da lei e de direitos humanos se não agiram para disciplinar os Estados Membros que se associaram para violar Schengen, asfixiar a Grécia e sujeitar mulheres e crianças refugiadas a tratamento indigno mesmo para animais na fronteira FYROM/Grécia?"


De Descoorden.Europeia, sabotag, chantagis a 9 de Março de 2016 às 14:22

--- Entre sabotadores e chantagistas
(- Rui Tavares, 09/03/2016 , Público)

Voltamos à estaca zero. Problemas europeus não têm soluções turcas.

Como chamar à cimeira União Europeia-Turquia que terminou na madrugada de anteontem? Proponho “cimeira para tentar que um problema europeu tenha uma solução turca”.

Sendo assim, a cimeira não poderia acabar de outra maneira, senão com concessões à Turquia por coisas que a Turquia não tem interesse em dar sem obter ainda mais concessões.
E uma série de políticos defendendo em frente às câmaras coisas em que verdadeiramente não acreditam.

A única maneira de resolver a presente crise (supostamente “dos refugiados” mas, na verdade, uma crise de coordenação europeia como todas as anteriores) é através de um plano conjunto para reinstalação de refugiados.
Os refugiados devem então ser redistribuídos pelos estados-membros segundo critérios claros e razoáveis.
Não só toda a gente sabe isto como uma maioria de europeus, em todos os estados-membros da UE, concorda com essa solução óbvia.
Numa União com 500 milhões de habitantes, não há de ser tão difícil reinstalar um milhão de refugiados ou mesmo mais.
A UE tem o dinheiro e base legal para o fazer há já bastante tempo.

Nos primeiros anos desta década, porém, os governos de alguns países — da França à Hungria, por motivos diferentes — foram sempre bloqueando a implementação dos esforços de reinstalação.
E com isso só conseguiram piorar as coisas:
o desespero tomou conta da situação e trouxe-a para as fronteiras da UE.
Em vez de facilitarem uma resposta coordenada europeia, esses países ajudaram antes a criar uma magnífica oportunidade de negócio para os traficantes de seres humanos.
A reinstalação, que pode ser feita de forma ordenada e segura, a partir dos campos de refugiados, tornou-se praticamente impossível.
A prioridade passou a ser a relocalização, feita às pressas e nas condições mais difíceis — para as pessoas que arriscam a vida no Mediterrâneo e para as sociedades de acolhimento.

Costuma dizer-se que a água não passa duas vezes debaixo da mesma ponte. O que este acordo pretende fazer é que a água passe toda para antes da ponte.
Através de um mecanismo que dificilmente será compatível com as convenções internacionais para a proteção de refugiados, pretende “devolver” refugiados à Turquia para em seu lugar reinstalar outros que de lá não saíram.
Nas suas intenções, teríamos aqui um “toma-lá-dá-cá”: um regresso à Turquia em troca de um processo de reinstalação.
Isso já seria suficientemente duvidoso, mas conhecendo certos governos da União, há razões para crer que não haverá nenhum toma-lá depois de terem obtido o seu dá-cá.

Este é o tipo de acordo que aparece quando se está numa sala com chantagistas e sabotadores.
O primeiro-ministro turco diz “ou me dão o que querem ou eu deixo passar os refugiados”.
O primeiro-ministro húngaro diz: “se aumentarem as quotas de reinstalação eu veto”.
O resultado foi ceder ao chantagista para não enfrentar o sabotador.

Voltamos assim à estaca zero.
Problemas europeus não têm soluções turcas.
A Comissão e o Parlamento Europeu que avancem com propostas de mais dinheiro para reinstalação e quotas de distribuição de refugiados e os governos que assumam as suas responsabilidades no Conselho.


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