Sexta-feira, 09.01.15

Combater o terrorismo sem faz-de-conta   (-J.Bateira, 9/1/2015)

      A chacina feita nos escritórios do jornal satírico francês "Charlie Hebdo" deixou-nos em estado de choque. As manifestações de repúdio e condenação foram imediatas e ainda não terminaram. Queremos viver em democracia, queremos escorraçar o medo, queremos dizer bem alto que a intolerância e a violência não vão dominar as sociedades europeias, é isso que nos leva a sair à rua. Infelizmente, nem todos partilham deste espírito de cidadania. 
    Nas redes sociais, já são visíveis comentários de ódio aos muçulmanos, de incitamento à vingança, de acusações de cobardia àqueles que repudiam a violência. Marine Le Pen, líder da Frente Nacional, afirmou que a "França tem de estar em guerra contra o fundamentalismo", uma linguagem bélica que certamente agradará a todos os que vivem mal com a diferença, vêem em cada imigrante islâmico um potencial terrorista e acreditam que isto se resolve com "olho por olho, dente por dente". O aproveitamento político da tragédia começou. 
       Apesar da escassez da informação disponível, há coisas que neste episódio de violência saltam à vista: a frieza, a crueldade e o método de actuação dos terroristas. Este ataque foi feito por gente treinada militarmente, não foi um acto de loucura cometido por três jovens franceses marginalizados. O que aconteceu deve levar-nos a pensar sobre as causas menos imediatas desta tragédia. Precisamos desse esforço de lucidez, não só para fazermos o luto - os democratas estão de luto -, mas sobretudo porque um combate eficaz ao terrorismo exige que se entendam as suas causas. Análises simplistas, acompanhadas de apelos demagógicos à limpeza de uma Europa em risco de islamização, só agravam a espiral de ódio e violência.
      A estratégia do confronto serve os interessados na manutenção do medo, sobretudo a indústria do armamento e os defensores de sociedades etnicamente limpas, dotadas de Estados policiais autoritários. Os defensores de uma sociedade aberta, democrática e solidária, contrapõem-lhe o pleno exercício do estado de Direito, democrático e social. A sujeição das nossas democracias aos interesses das grandes corporações multinacionais, e à finança globalizada, tem-nos impedido de enfrentar as raízes desta violência, executada com rosto tapado mas com biografia bem à vista. 
      Afinal de contas, quem praticou a injustiça de expulsar da Palestina os seus habitantes e gerou o histórico ressentimento que produziu o Hezbollah e o Hamas?    Quem apoiou os Talibãs no Afeganistão e ainda hoje os financia?    Quem arma os guerrilheiros da Al-Qaeda no norte de África e no Próximo Oriente?    Quem compra o petróleo ao Exército Islâmico para que possa armar-se e recrutar guerrilheiros na Europa?   Quem permite a livre circulação dos capitais provenientes dos negócios de droga e armas, e recusa encerrar os paraísos fiscais que os encobrem?    Estas são algumas perguntas que, a serem respondidas com seriedade, nos remetem para a geopolítica dos interesses do capital, para regimes políticos despóticos e, vergonha nossa, para a venalidade e hipocrisia das elites da nossa UE e dos EUA
      Olhando mais para dentro de portas, quem é responsável por manter no desemprego milhões de jovens europeus, incluindo nos países mais desenvolvidos da UE?    Quem é responsável pelas políticas económicas que, em nome da estabilidade dos preços e da confiança dos mercados financeiros, perpetuam o desemprego e a pobreza entre os imigrantes de segunda e terceira geração?   Quem desmantelou os controles policiais nas fronteiras entre os Estados-membros da UE em nome do Mercado Único?    Quem matou o desenvolvimento da África com a imposição do modelo neoliberal, suscitando o desespero das populações que hoje se entregam ao tráfico e à morte no Mediterrâneo? 
      Em ano de eleições no sul da Europa, importa que os partidos candidatos também expliquem a estratégia que defendem para o combate ao terrorismo.   Esperemos que não se fiquem pelo enunciado de medidas de cooperação policial, fazendo de conta que estão a falar a sério. A tragédia de Paris exige uma mudança política global, na ordem interna e na ordem externa.


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Sábado, 10.05.14

                Contra  a   Escravatura,  a   Violação  e  o   Rapto  das   Crianças !

    Para conhecer a informação do drama relativo ao rapto de 200 meninas na Nigéria para serem vendidas como escravas sexuais, ler e  assinar a Petição da Amnistia Internacional AQUI! 

      

Não  ao  Casamento  com  Crianças !   Não  ao  Rapto !    Não  ao  Tráfico !  

            Os  raptos  na  Nigéria  (-por J.Lopes, 6/5/2014)
 Mal vai um mundo, na segunda década do século XXI, em que os seus principais líderes se revelam impotentes ou nem sequer se sentem responsáveis pela resolução do drama das mais de 200 meninas capturadas, algures no Nordeste da Nigéria, há mais de três semanas.
     A história é (vagamente) conhecida:   membros de um grupo islâmico ultraradical raptaram as alunas de uma escola enquanto dormiam, levaram-nas para a selva e terão começado já a vendê-las por 12 dólares como escravas, para casamentos forçados, nas fronteiras com o Chade e com os Camarões. Tudo para que não continuem a receber educação «ocidental».
         Um excerto do vídeo de 56 minutos em que Boko Haram, líder do grupo raptor, se explica:
  As famílias desesperam, o governo nigeriano titubeia, a ONU pressiona hoje, lembrando que «escravizar e abusar sexualmente de pessoas pode constituir crime contra a humanidade» e pede ao presidente do país « agilidade na solução do caso».
    Mas a verdade é que o mundo em geral (e os meios de comunicação em particular) prestou muito mais atenção à queda de um avião da Malásia e ao naufrágio de um barco na Coreia do Sul, situações em que, infelizmente, pouco ou nada havia a fazer para além de recuperar cadáveres e identificar culpados, do que a este caso em que 200 pessoas estão vivas e deviam poder ser resgatadas, tão urgentemente quanto possível.
   Mas o sobressalto não parece ser tão grande assim. Tivesse isto acontecido nos Estados Unidos ou num país europeu e outros galos cantariam.   Esta é a triste realidade dos factos


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Sexta-feira, 31.01.14

     África   deles  –  China  e  Japão

   África é, neste momento, motivo de tensões, políticas e diplomáticas, entre o Japão e a China. A caminho de Davos, o primeiro-ministro japonês visitou a Etiópia, a Costa do Marfim e Moçambique e o ministro dos Negócios estrangeiros chinês passou também pela Etiópia, para além do Senegal, Gana e Djibouti.
     O Japão acusa o seu eterno rival asiático de apenas querer explorar recursos naturais (petróleo, minérios, madeira, ...) e de criar pouco emprego (sabe-se que muitas das grandes obras, em países africanos, são executadas por trabalhadores levados da China), o governo de Pequim recorda as atrocidades cometidas pelos nipónicos durante a Segunda Guerra Mundial e argumenta com números da atualidade: em 2012, o volume de comércio da China, em África, foi sete vezes superior ao do Japão. 
    Os africanos assistem e (as suas elites) vão tirando partido destas novas formas de colonização, com outras etiquetas, de que não podem de modo algum prescindir.      (Fonte*, entre outras)
     Só para falar da Etiópia, longe parecem ir os tempos em que o Japão podia evocar as velhas relações entre os dois países, não só mas também por ambos  terem saído vencedores contra investidas militares europeias (o primeiro na Batalha de Tsushima e o segundo na de Adwa) e assinarem por isso um Tratado de Amizade e Comércio, em 1930. E se é verdade que essas boas relações foram interrompidas porque o governo japonês não ajudou os etíopes na segunda guerra destes contra a Itália de Mussolini (1935-1938), acabaram por ser reatadas, a partir dos anos 50. 
     Hoje (em vez das canhoneiras coloniais), falam muito mais alto os cifrões (das multinacionais, das 'empresas soberanas' e): África está a ficar chinesa (mas também grande parte da Ásia, Europa e até os USA estão fortemente endividados/comprados pelas exportações/investimentos da China).  E, contra factos, há cada vez menos argumentos (e menos soberania ...).
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     * « ...Japan will not just extract resources from Africa but “create jobs.” (Japanese PM) spokesman, told the BBC that countries like Japan “cannot provide African leaders with beautiful houses or beautiful ministerial buildings.” Instead, Japan’s policy is “to really aid the human capital of Africa.”

     Mr. Abe was trying to distinguish Japan’s efforts from those of China, Europe and the United States, news agencies reported. However, at a time of tension between Japan and China, the Chinese Foreign Ministry responded angrily, calling Mr. Abe’s comments “unprofessional and ridiculous.”

Relations between the two countries have been strained because of a sovereignty dispute over several East China Sea islands and unresolved issues from Japan’s wartime past. ...

...(chinese) Mr. Lu said that African countries “have already seen” that Japan was eyeing African resources and markets, wanting to compete with China and to win votes at the United Nations.

He criticized Japan’s approach as empty words whereas Chinese assistance “can be seen and touched.” China has financed the construction of numerous major infrastructure projects in Africa, including government buildings, roads and railways – often with resource-backed loans.

“During Abe’s visit to Africa, the Japanese side said China only engages in infrastructure construction,” Mr. Lu said. “The problem is, without infrastructure, how can Africa develop? Why don’t you, Japan, help Africa with basic infrastructure?”

... the war of words was an important fight that China “must not lose.”  “There is no smoke in this ‘Chinese-Japanese public opinion war’ but it is a special 21st century battlefield,”.»



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Quinta-feira, 05.12.13

Nelson Mandela ('Madiba'): 1918 - 2013

Honra ao Humano Estadista, exemplo para políticos e cidadãos de todo o mundo.

Cresceu num país onde os negros não tinham voto, nem direitos. Resistiu a décadas de prisão (política), foi libertado por pressão internacional e luta constante do seu povo, acedeu à Presidência da África do Sul e foi exemplo de tolerância e democracia.

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«Eu não sou nem mais virtuoso, nem mais abnegado do que qualquer outra pessoa, mas descobri que não conseguia nem sequer desfrutar das liberdades mais mesquinhas e limitadas que me eram permitidas, sabendo que o meu povo não era livre.» - Nelson Mandela, O Longo Caminho para a Liberdade, 1995, p. 690. (-por J.Rodrigues)

Nelson Mandela
...sobre Nelson Mandela  ficam 2 ensinamentos:
 - Contra o absurdo da desumanização, resistir! Resistir sempre, porque o impossível mais não é do que aquilo que ainda não foi possibilitado.
- Porque tudo é reversível pode-se perdoar, nunca se pode esquecer.   (-por LNT [0.479/2013])


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Terça-feira, 07.05.13

 A emergência da China e dos “BRIC”, miragem ou realidade? (parte II.4)  (-por Francisco )

 

2012_Pudong A China neste momento é a segunda economia mundial e são recorrentes as previsões que irá ultrapassar os EUA e assumir o lugar cimeiro. Para alguns será em 2016, para outros em 2020, varia mais a data de que a certeza que tal dia chegará. É também comum a narrativa do ocidente decadente perante a emergência de novas potências… Não só os BRIC (a China, mas o Brasil, a Índia e a Rússia)…  Recentemente tem-se também falado da Colômbia, Indonésia, Malásia e alguns países da África subsariana.

     Até que ponto tais narrativas são sólidas, ou meras miragens? Não subscrevo por inteiro a tese deste texto – Broken BRICs: Why the rest stopped rising - mas pelo menos tem a virtude de desmistificar o “inexorável” avanço dos países ditos “emergentes” face às potenciais estabelecidas, ao contrário de certas análises simplistas como esta. Pura e simplesmente extrapolar a taxa de crescimento de uma economia, com base na sua performance nos últimos 10 (ou cinco) anos é um exercício coxo, que nos diz mais acerca do passado e presente de uma economia que do seu futuro. Analisar apenas taxas de crescimento oculta também o facto de se estarem a comparar pontos de partida completamente diferentes. É óbvio que nos países “Ocidentais” não há margem para taxas de crescimento equivalentes a países onde a infraestrutura é raquítica e o nível de vida baixíssimo, ou seja onde pequenas melhorias de rendimento ou novos projectos têm um efeito exponencial no PIB, enquanto que as melhorias em países já desenvolvidos têm sempre efeitos marginais no produto agregado. Outro erro comum é assumir que a clivagem fundamental é entre as potencias estabelecidas e os países emergentes. Mais do que desalojar países da Trilateral (EUA/Europa/Japão) da sua posição dominante, o mais comum é certos países emergentes substituírem outros emergentes na hierarquia do sistema-mundo.

    Um dos casos que fura mais a corrente narrativa é o da Rússia, considerada uma potência emergente, mas o que é a Rússia de hoje comparada com o que foi a URSS? Se a Rússia de Putin está bem acima do descalabro Ielstiano, não deixa de estar a anos luz do poder social, geopolítico, político e mesmo económico da defunta URSS. Ou pensemos numa Argentina se é verdade que está bem melhor agora do que na década de 80 do século XX, convém lembrar que a Argentina já foi uma potência económica e política bem mais relevante que nos dias de hoje (no final do século XIX e até à segunda guerra mundial, mais coisa menos coisa).

     No caso de África, corre o debate se o século XXI não será um século muito favorável a esse continente. Até pode ser, espero que seja, mas daí até achar que a África será uma super potência no final do século XXI vai uma grande diferença.

    Mas talvez o caso que mereça maior atenção seja mesmo o da China. São inegáveis os avanços e o desenvolvimento da China nos últimos 30 anos, cuja base foi lançada nos 20 anos antecedentes. Vários números podem ser dados para exemplificar isso, a China ocupa hoje um lugar importante no sistema mundo. Mas irá transformar-se na potência dominante? Os dois textos seguintes dão um bom enquadramento no que concerne à natureza do processo de desenvolvimento Chinês e às tensões a que esse modelo está agora sujeito.      The Global Stagnation and China, John Bellamy Foster and Robert W. McChesney.    China’s capitalism and the crisis, Jane Hardy and Adrian Budd.

     O desenvolvimento de um pujante mercado interno Chinês que absorva as exportações do Ocidente é uma das maiores esperanças dos “mandarins” das potências da Trilateral desejosos de escapar à “espiral recessiva”. Mas a questão prévia é saber se a economia Chinesa conseguirá ajustar-se à queda da procura para as suas exportações no mercado ocidental. A China não sofreu mais com a crise de 2008-2009 porque implementou uma política Keynesiana ao quadrado (ou à escala Chinesa…), até que ponto esses investimentos e o crédito concedido obterá o retorno necessário para sustentar a economia Chinesa e possibilitar a margem de manobra necessária a uma reconversão do seu modelo produtivo com vista a uma dinamização do mercado interno, é algo que está por saber. O que é certo é que entre enunciar um rumo “desenvolver o mercado interno” e de facto operar transformações nesse sentido, vai uma grande distância, até porque essas transformações irão colidir com interesses particulares instalados, interesses que se baseiam no actual modelo produtivo virado para as exportações. Isto num contexto em que a conflitualidade social e laboral atinge níveis importantes, níveis que permitiram de facto, um aumento considerável dos salários na China.

     Mas não é só a contracção no consumo a ocidente que força a uma alteração no modelo produtivo Chinês. Existe também o estagnar do outsorcing e das deslocalizações de empresas ocidentais para a China. O debate sobre até que ponto o outsorcing está a morrer (aqui ou aqui) ou até que ponto está a ocorrer um regresso da Indústria aos EUA, está em curso (aqui, aqui ou aqui). O facto de se dar esse debate é só por si revelador, é revelador, de que, no mínimo, o grau de deslocalizações de Industrias ocidentais para a China estagnou. Portanto, aquele que foi um dos maiores motores de desenvolvimento da economia Chinesa parou. A liderança Chinesa sabe disto, daí a nova orientação para o mercado interno e o assumir de que os anos de crescimento exponencial terminaram.

     Até que ponto é possível a China re-ajustar o seu modelo a este novo ambiente é uma grande questão. E seja qual for a resposta, esta questão por si só desmonta a narrativa do inexorável avanço Chinês até à primazia no seio do sistema-mundo.

Para lá destas questões, a forma como a China chegou a esta posição no sistema mundo merece uma breve discussão. Sobretudo porque permite desmontar certos mitos difundidos pela elite capitalista, tomados por muitos como verdades irrefutáveis. É essa a maior força do artigo China 2013, de Samir Amin.

     ... Foi exactamente por seguir uma via de desenvolvimento diferente do modelo capitalista da trilateral que a China chegou onde chegou, a segunda economia mundial, com o maior nível de crescimento económico das últimas décadas!!! Tivesse a China seguido os conselhos do FMI, Banco Mundial e outros que tais, ainda seria uma nação dividida e marginal no sistema mundo… Outro mito comum é de que o desenvolvimento Chinês deveu-se única e exclusivamente aos salários baixos. Se assim fosse o Burundi ou qualquer outro país a roçar o miserável ter-se-ia desenvolvido exponencialmente. Os baixos salários foram certamente parte da equação, mas estão longe de ser a única componente e cada vez mais serão uma parte menor da equação, uma vez que existe um aumento do rendimento dos trabalhadores Chineses, ao mesmo tempo que na Trilateral/ocidente há um congelamento ou redução dos custos laborais. A existência de (e investimento em) infraestruturas de transportes e telecomunicações, a existência de cadeias logísticas, as economias de escala possíveis, a existência de clusters de indústrias, a urbanização e, last but not least, o controlo político e estratégico de todo o processo por parte do Partido Comunista Chinês é que permitiram a China chegar onde chegou. E sobre o ponto onde a China chegou muito se pode dizer, incluindo, que a enorme redução dos níveis de pobreza mundiais entre os anos 80 e a actualidade se deveu, quase em exclusivo, aos esforços desenvolvidos pela República Popular da China.

    Com todas as suas vicissitudes e contradições, a China foi seguindo o seu próprio caminho. Um caminho que incluí o crescimento exponencial das últimas décadas e a transformação da China no maior centro de manufactura mundial. Este caminho gerou e gera fortes tensões, tanto a nível interno, como externo.

    Quanto às tensões internas e à luta de classes os dois textos que mencionei no início da discussão sobre a China abordam o assunto. Mas acrescentaria mais dois, China in Revolt -Today, the Chinese working class is fighting. More than thirty years into the Communist Party’s project of market reform, China is undeniably the epicenter of global labor unrest - e, The Struggle for Socialism in China.

    O texto Imperialism and instability in East Asia today, de Ha-young Kim foca-se no crescendo de tensões inter-imperialistas no extremo-oriente . ...how-america-wants-to-check-chinas-expansion E o que dizer dos EUA? Sem dúvida que os EUA já não estão na posição dominante inquestionável que por instantes ocuparam após a queda da URSS. Há várias questões que se colocam quanto às bases do seu poderio. Mas neste momento são ainda a potência hegemónica global, o seu poder militar e económico são ímpares. O dólar continua a ser a moeda referência mundial, as forças armadas dos EUA são ainda as mais poderosas do globo (não são é omnipotentes…), em termos de desenvolvimento científico os EUA ocupam um lugar cimeiro, a economia dos EUA (mesmo com problemas) continua a mais pujante do planeta. Desalojar os EUA do seu lugar implica ultrapassar todos estes obstáculos mais a rede de alianças centrada nos EUA (na Ásia com o Japão, Coreia do Sul e outros, na Europa com a NATO, etc…) e a rede de instituições globais (FMI, Banco Mundial, ONU, etc…) desenhadas para manter a hegemonia dos EUA e a actual hierarquia  dentro do sistema mundo encabeçado pela Trilateral, em que o vértice mais alto são os EUA.

     A isto acrescento outra vantagem, que os EUA dispõe face à China e mesmo a uma putativa Europa unificada. O seu grau de coesão. É muitas vezes dito que a sociedade dos EUA é muito desigual, que há uma enorme desigualdade social e na distribuição de riqueza. Sem dúvida, isso é verdade. Mas o que não se faz tanto é comparar a realidade dos EUA com a realidade Chinesa ou Europeia. Na verdade, fazendo uma medição através do índice de gini, os EUA apresentam um índice de desigualdade social semelhante ao da União Europeia! O que acontece é que cada país da UE tem um nível de desigualdade inferior ao dos EUA, mas se a UE for tomada no seu todo, as enormes diferenças entre o norte rico (e.g. Holanda, Finlândia, Dinamarca…) e o sul pobre (e.g. Roménia, Grécia, Portugal…) resultam num índice semelhante aos dos EUA. Mas para além do coeficiente de gini está a realidade histórica e cultural. A Europa é uma manta de retalhos de nações com ódios seculares entre si. A China é também uma realidade muito mais plural do que se julga, por extensos períodos de tempo a China nem foi um país  unificado, mesmo hoje em dia por vezes certas regiões reivindicam a independência (e nem estou a falar do Tibete!)… Nos EUA, apesar de existirem alguns regionalismos, a guerra civil resolveu a questão nacional, não existem movimentos independentistas dignos de registo nem tensões inter-regionais/inter-nacionais significativas. Quando comparado com a China ou a Europa, os EUA são uma realidade político-social muitíssimo mais coesa e homogénea. Em tempos de crise esse grau de coesão faz uma grande diferença.

    Para concluir direi que é importante ter em conta que no actual sistema mundo as potências da Trilateral já não são os únicos agentes relevantes. A China, outras potências na Ásia, África e América do Sul também ocupam um lugar no “grande jogo“. Outro factor a ter em conta é o reforço das relações ditas “sul-sul”, entre China e África, África e América Latina, em que a Trilateral já não ocupa um ponto de charneira incontornável. Estas novas realidades tem impacto na economia, no social e na geopolítica… ou até no simples design de produtos. As ideologias, ideias, artes, padrões estéticos até há uns anos atrás considerados “universais” eram decalcados do mundo ocidental, haverá uma tendência para que os novos padrões universais incluam reflexos de outras paragens e não exclusivamente os do “Ocidente”.

    Dito isto, importa acrescentar que isso não significa que iremos assistir a uma pacífica e inexorável transição para um mundo em que a potência hegemónica seja a China ou outra potência Asiática. Tenho grandes dúvidas que tal venha a acontecer, mesmo a médio prazo. O que é certo é que a emergência destes novos players, sobretudo da China, dará azo a novas contradições inter-imperialistas e irá reacender velhas feridas, isso será cada vez mais visível à medida que a actual crise se agudizar.



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Segunda-feira, 28.01.13

Mali – Segurança europeia defende-se ali  (Ana Gomes, 16/1/2013)

       François Hollande merece admiração e respeito pela corajosa decisão de responder com uma intervenção militar ao apelo desesperado do Presidente do Mali por ajuda internacional, face à progressão em direcção a Bamako, a capital, das forças do grupo terrorista Ansar al Din, associado da AQMI (Al Qaeda no Magrebe Islâmico), que desde há um ano vêm cavalgando a rebelião tuaregue no norte daquele país.

A decisão era difícil e arriscada: o Presidente socialista não queria ser acusado de prosseguir as políticas de suserania neo-colonial das últimas décadas (a "Françafrique" de tão triste reputação...), nem ignorava os riscos que o envolvimento no Mali comportava: numa guerra, pode saber-se como e por que começa, mas nunca se sabe como e quando se sai...

     Mas a situação era de verdadeira emergência, a evolução vinha sendo acompanhada desde Março de 2011 pelos centros de informação e política externa europeus, no quadro da Estratégia de Segurança para o Sahel que a União Europeia (UE) entretanto desenhou, desde que o fim de Kadhafi na Líbia implicou deixar na região milhares de mercenários no desemprego e vultuosos arsenais à solta (só a pobre da Alta Representante e Vice-Presidente da Comissão Barroso, Sra. Ashton, se lembraria de clamar diante do PE, dia 15 último, que a UE tinha sido apanhada de surpresa...)

     Hollande sabia, certamente agastado, que a UE custava a mover-se e a pôr em prática a decisão tomada em Julho de 2012 de accionar ao menos, com o carácter preventivo possível, uma missão militar no quadro da PCSD - Politica Comum de Segurança e Defesa - para ajudar a reorganizar as disfuncionais Forças Armadas do Mali.

     A lentidão replicava as tergiversações políticas que têm prolongado a crise económica na UE: também se fazem sentir no quadro da política externa e da segurança europeia, pois a crise é política, de falta de vontade política - sinal de fraca liderança europeia.

     Por isso é que ainda é mais de saudar o Presidente Hollande: ele decidiu não esperar mais e pôs a França a avançar sozinha. Que contraste com os governantes europeus que estão ainda a usar todos os pretextos, inclusive a crise económica, para não se chegarem à frente, no Mali e não só. Não cuido de incensar Hollande por ser camarada socialista: não tive hesitações em louvar o execrável Sarkozy por salvar a honra da Europa ao travar o massacre de Benghazi em 2011. O Presidente Hollande mostrou, ao avançar para o Mali, que é líder, não fica dependente de sondagens... (embora já esteja a ter algum impacto na necessária viragem para tirar a Europa da crise económica, ficamos a saber que tem o que é preciso, se for preciso dar uns murros na mesa).

     No Mali e, de facto, em todo o Sahel e Norte e do Oeste de África - como demonstra o trágico episódio da captura e chacina de reféns na Argélia - não se trata apenas de uma resposta para proteger interesses franceses na região. Trata-se de exercer a responsabilidade de proteger as populações da região das barbaridades cometidas por terroristas e contrabandistas que, em nome de um Islão pervertido, violam mulheres, recrutam crianças, profanam túmulos e destroem património histórico e cultural. Trata-se de garantir a segurança regional, numa região às portas da Europa. Trata-se assim também de defender a própria Europa, negando santuário a forças que têm a UE e interesses europeus como alvos da criminalidade que prosseguem.

     A ofensiva no Mali pôs em relevo a fragmentação da PCSD. O Parlamento Europeu adoptou duas resoluções, uma em Abril, outra em Junho de 2012, nas quais sublinhava a urgência de uma acção concertada por parte dos 27 para fazer face à situação que se degradava dia após dia. Em Novembro foi a Assembleia Parlamentar Conjunta ACP-UE (que inclui o Mali) a fazer o mesmo apelo. E o Conselho de Segurança da ONU em duas resoluções também pediu forças internacionais para neutralizar os rebeldes, restabelecer o controlo na região e prestar auxilio à população do Mali. O Presidente da União Africana chegou mesmo, em desespero, a pedir uma intervenção... da NATO!

     A UE tem que reconhecer que, ao tardar em responder, poderá ter encorajado os terroristas a lançar esta ofensiva. É imperativo que se mostre agora, ao menos coesa, em apoio da iniciativa francesa, numa missão de risco que poderá defrontar muitas surpresas. O Conselho de Ministros da UE decidiu entretanto o mínimo: reforçar e acelerar a colocação no terreno da missão EUTM Mali, na qual Portugal anunciou participar.

    É pouco para o que podemos fazer. E já que o Primeiro-Ministro e o Ministro dos Negócios Estrangeiros usam o argumento real das dificuldades orçamentais, cabe-lhes colocar na agenda do Conselho Europeu a urgência de aprovar financiamento comunitário para esta e outras missões no quadro da PCSD. É crucial ultrapassar o constrangimento da PCSD que obriga cada país a pagar a sua própria participação, impedindo assim os países em dificuldades financeiras de fazer mais significativas contribuições em tropas - como poderia fazer Portugal, que tem Forças Armadas capazes e bem preparadas para actuar em África.
    Finalmente, é fundamental que o esforço militar francês e europeu seja enquadrado numa estratégia abrangente e de longo prazo, articulada com a União Africana, para a paz, para o desenvolvimento e para a boa governação no Mali e vizinhança.

     Neste contexto, tem de ser uma prioridade resolver o conflito no Sahara Ocidental, que alem de negar a autodeterminação ao povo saharaui, opõe Marrocos e a Argélia, vizinhos que deviam unir esforços contra o inimigo comum. É preciso articular a acção civil-militar da UE e outros actores internacionais para eliminar os factores destabilizadores na região, que facilitam a actuação das redes de terrorismo e da criminalidade organizada, do Ansar Dine ao Boko Haram na Nigéria, dos passadores de migrantes nas costas de Marrocos aos narco-traficantes na Guiné Bissau.

     Ao ajudar a consolidar Estados democráticos e capazes de cuidar dos interesses das suas populações em toda a região do Sahel e África do Norte e do Oeste vizinha, a UE estará a trabalhar pela sua própria segurança.



Publicado por Xa2 às 07:48 | link do post | comentar | comentários (2)

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