Quinta-feira, 10.11.16

---  A “Europa” está podre :    França fez “acordo secreto” com Comissão da UE para não cumprir metas do défice (via Aventar)

(via  Entre as brumas ...):

 --- A mentira é a regra da União Europeia. (José Soeiro) 

«Que pensar então de tudo isto?    Primeiro, que este projeto europeu bateu no fundo, mesmo para quem achava que não havia mais fundo para bater. É uma teia de mentiras, de jogos de dissimulação e de degradação democrática.     Segundo, que a única atitude digna é desvincularmo-nos de um embuste que nos aprisiona. Esse embuste chama-se Tratado Orçamental e tem vindo a destruir as democracias e a própria União. A mentira é apenas o outro lado da estupidez das regras deste Tratado. Com elas, não há Europa que sobreviva.»

--- A Grécia não está parada

  Comissão de auditoria à dívida grega reuniu em Atenas.
       ««A comissão impulsionada pela ex-presidente do parlamento grego prossegue agora como associação cívica e promete continuar a luta pela suspensão do pagamento da dívida.(…) 
    Zoe criticou ainda a posição do novo governo, que deixou de falar na redução do montante da dívida, passando a reclamar apenas a sua restruturação de juros e montantes. E sublinhou a necessidade de continuar o trabalho da auditoria, agora sob a forma de associação cívica.»

--- Desobedecer aos credores para romper a austeridade. (E.Toussain e F.Martín) 

     «A experiência mostra que os movimentos de esquerda podem chegar ao Governo sem conquistar o poder. A democracia, ou seja o exercício do poder pelo povo e para o povo, requer muito mais.» 
---   O  tal  Summit      (-José Soeiro, no FB)
 
«Segundo os jornais, o Web Summit 2016 teve um financiamento público de 1,3 milhões de euros, pagos pelo Estado, para acontecer em Lisboa (os "empreendedores" que organizam estas coisas não sobrevivem afinal sem um subsídio generoso do bom e velho Estado). 
    Para partilharem as suas ideias de negócio e arranjarem uma "oportunidade", os participantes têm de pagar à organização um bilhete que oscila entre as módicas quantias de 700 euros e de 5 mil euros. 
   O evento tem 663 oradores, dos quais só 120 mulheres; 32 são portugueses, dos quais só duas mulheres (somos modernos, mas pelos vistos sucesso e negócios continuam a ser coisas de homens...). 
    Quem garante o funcionamento do encontro são cerca de 2500 voluntários, que, nessa condição, recebem zero pelo seu trabalho.
     Pergunto:  -- é mesmo a isto que se anda a chamar "futuro"?»
--- «Investigate Europe»: Desmitificar é preciso  (-N.Serra, 27/10/2016, Ladrões de B.)
 
 Nove jornalistas europeus de diferentes nacionalidades constituíram, em julho passado, o Investigate Europe, uma plataforma editorial que vale a pena acompanhar. Trata-se de uma rede transfronteiriça de jornalismo de investigação que se propõe cruzar dados e verificar factos, por forma a confrontar muitas das narrativas hegemónicas da crise, da austeridade e das opções políticas dos países. Para nesses termos desmontar mitos e ideias feitas, os enviesamentos e as perceções infundadas a que essas narrativas dão lugar, numa ampla difusão nas televisões, rádios e na imprensa escrita.
     Sabemos, desde o início da crise financeira, que a colonização do espaço público de debate pela narrativa dos «sacrifícios» e do «ajustamento», da «austeridade expansionista» e das «gorduras do Estado» foi decisiva para transmutar os efeitos nefastos da desregulação do sistema bancário e financeiro num problema de dívidas soberanas, apontando de caminho o dedo ao Estado, à social-democracia e às políticas keynesianas, como sendo os grandes responsáveis pela crise. Do «viver acima das possibilidades» ao «erro das políticas de investimento público e de redistribuição», das sacrossantas «reformas estruturais» ao mito dos «países preguiçosos» do sul e à necessidade de criar mercados e «flexibilizar» as relações laborais.
    De facto, se «o mundo dos nossos dias não se circunscreve às fronteiras nacionais, os jornalistas também não se devem aí confinar», defendem os nove autores do Investigate Europe. Tanto mais quanto, acrescentam, «os factos e as análises que demonstram a interdependência» entre países, economias e sociedades tendem a rarear na comunicação social, à escala europeia. Razão pela qual, referem ainda, a constituição de redes de jornalistas de diferentes países permite recolher e decifrar a informação e os dados necessários à desconstrução de mitos, ideias feitas e falsas narrativas. O Investigate Europe pretende ser uma dessas redes e o seu surgimento é pois uma excelente notícia, desde logo para o pluralismo, no debate político-económico.


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Domingo, 13.03.16

O bem-estar das corporações multinacionais    (-R.N. Rosa, 23/2/2016, via OCastendo) 

(Fundos e empresas transnacionais, fisco e grandes consultoras, manipulação e captura de governantes e estados, 'offshores' e fluxos financeiros, U.E. e imposição de políticas)

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Rui Namorado Rosa  estuda no texto que hoje apresentamos os mecanismos do planeamento tributário das multinacionais, uma outra maneira de dizer ao normal pagamento (/fuga) de impostos nos diversos países:
      «A multinacional elabora um planeamento financeiro do qual resulta uma complexa estrutura organizativa de fluxos materiais, imateriais e financeiros que, tirando partido das especificidades dos variados regimes fiscais, procura optimizar os benefícios agregados. Entre diferentes itens que esse planeamento abarca e sobre os quais a multinacional toma opção, no processo de construir a sua estrutura, relevam os seguintes: onde incorporar a sede social, onde incorporar as suas subsidiárias, em que condições conduzir as transacções entre empresas do grupo, onde registar as suas vendas, onde incorrer os seus custos, onde localizar os seus activos, onde empregar o seu pessoal, onde aceder ao crédito, onde registar a sua propriedade intelectual, onde extrair privilégios fiscais especiais.»

     Quando uma grande empresa desenvolve as suas actividades internacionais recorre ao planeamento tributário, assistida por uma empresa de auditoria e consultoria fiscal e jurídica, optimizando fontes e fluxos de capital e de factores de produção, estruturando-se numa empresa multinacional (ou transnacional). É provável que menos de 10% das empresas do mundo sejam «corporações multinacionais» – grupos de empresas interdependentes por laços de propriedade e articulação funcional – e talvez menos de 1% sejam empresas-mãe de tais grupos. Todavia, transacções internacionais entre empresas do mesmo grupo representarão mais de metade do comércio mundial.

     As multinacionais pretendem ser reconhecidas como uma entidade única e publicam relatórios e contas que sugerem assim ser, porém consistem em grande número de empresas distintas quanto a localização e actividade. A empresa-mãe é proprietária da totalidade ou da maioria das demais, as subsidiárias, e controla todas elas. Poderão ser algumas apenas ou ser milhares. Uma contagem recente sugere que a BP detém mais de 3.000 empresas subsidiárias pelo mundo fora.

    Isto significa que, conquanto a corporação multinacional se apresente com uma só face perante o mundo, e publicite um conjunto impressionante de activos, actividades e resultados, a realidade é que quando se trata de tributação não existe tal coisa como uma simples entidade multinacional. Cada empresa de que se compõe é tributada de per si, geralmente ou no país em que se encontra incorporada ou no país onde conduz o seu negócio, não havendo norma universal. Uma sociedade estabelecida segundo o direito inglês é sempre tributável no Reino Unido sobre os rendimentos realizados em todo o mundo. Porém, uma empresa constituída na Inglaterra que tem uma filial em França é em primeira instância tributada em França sobre o rendimento da filial francesa, e depois no Reino Unido, mas com crédito dado ao desembolso fiscal já pago em França, nos termos do acordo de dupla tributação entre esses dois países.   Porém, diferentes países têm regimes fiscais diferentes, compreendendo diferenciadas actividades e tipologias de rendimentos, de tal modo que as taxas de impostos variam amplamente entre países e segundo as actividades desenvolvidas. Assim, uma multinacional detém empresas separadas por actividade em cada país em que opera, e conduz certas actividades em certos países e não noutros, à luz do planeamento tributário.

    A multinacional elabora um planeamento financeiro do qual resulta uma complexa estrutura organizativa de fluxos materiais, imateriais e financeiros que, tirando partido das especificidades dos variados regimes fiscais, procura optimizar os benefícios agregados. Entre diferentes itens que esse planeamento abarca e sobre os quais a multinacional toma opção, no processo de construir a sua estrutura, relevam os seguintes:   onde incorporar a sede social, onde incorporar as suas subsidiárias, em que condições conduzir as transacções entre empresas do grupo, onde registar as suas vendas, onde incorrer os seus custos, onde localizar os seus activos, onde empregar o seu pessoal, onde aceder ao crédito, onde registar a sua propriedade intelectual, onde extrair privilégios fiscais especiais.

     Respeitando à sede social, as multinacionais costumam configurar uma holding, propriedade da empresa-mãe, por sua vez detentora de empresas operacionais subsidiárias. Pouco acontece nesse nível intermediário, excepto que colecta dividendos das subsidiárias para depois conceder os recursos de que dispõe, não a título de dividendos mas como empréstimo à empresa-mãe. A localização intermédia é escolhida numa jurisdição com regime fiscal favorável quanto a tributação de rendimentos, dividendos e juros recebidos, e um amplo leque de acordos sobre dupla tributação com outros países – de modo a não suscitar suspeição de se tratar de um paraíso fiscal, embora o seja de facto. Na Europa, os locais mais procurados a respeito são os Países Baixos, a Irlanda, o Luxemburgo e a Suíça.
        As «quatro grandes»    empresas de consultoria e auditoria – Deloitte, Ernst & Young, KPMG e Price Waterhouse Coopers – são as multinacionais que dominam o sector de serviços de auditoria e consultoria contabilística, fiscal, financeira e jurídica, prestados a empresas de todos os demais sectores em todo o mundo. Elas são igualmente solicitadas por entidades públicas e governamentais para realizarem estudos e prestarem assessoria antecedendo decisões políticas.     Estas empresas gozam de acesso privilegiado aos círculos económicos, legislativos e executivos, e detêm informação que lhes faculta contribuir para conceber e operacionalizar modelos político-económico e jurídico-fiscais em que se configuram programas políticos e estratégias empresariais ao serviço do grande capital transnacional.

     Deloitte Touche Tohmatsu Limited, ou simplesmente Deloitte, sede em Nova Iorque, emprega 210 mil profissionais e gerou $34 mil milhões de receitas em 2014. Price Waterhouse Coopers (PwC), sede em Londres, é uma rede multinacional de serviços profissionais, presente em 157 países, emprega quase 200 mil técnicos, somou $34 mil milhões de receitas em 2014. Ernst & Young (E&Y), sede em Londres, opera como rede de firmas legalmente separadas em 150 países, emprega 210 mil técnicos, realizou $29 mil milhões. KPMG, sede em Amesterdão, emprega 160 mil técnicos, realizou $26 mil milhões de receitas.

       As «quatro grandes» actuam como plataforma giratória de pessoas, conceitos e métodos entre as esferas político-institucional e económico-empresarial, em que assenta o funcionamento do sistema capitalista na sua actual etapa.     A influência política abusiva das «quatro grandes» surge averiguado e verberado num relatório recente da comissão de contas públicas da Câmara Baixa do Parlamento britânico. O Governo britânico vem recorrendo a técnicos dessas empresas de auditoria e consultoria, destacados nos Serviços Tributários e Aduaneiros, para a redacção de leis fiscais. As referidas empresas são livres de depois aconselharem multinacionais e indivíduos em matéria fiscal, fazendo uso do conhecimento privilegiado que possuem, assim facilitando a exploração de detalhes e hiatos da legislação cuja redacção elas mesmas assessoraram. Trata-se de uma ilustração óbvia de um consabido mecanismo corruptor conhecido por «porta giratória».

      Os Serviços Tributários e Aduaneiros britânicos têm recorrido a auxílio externo ('outsourcing'), por alegada insuficiência de recursos, na tentativa de conter as perdas para o erário público causadas por via da evasão fiscal. Os números são convincentes: as «quatro grandes» empregam quase 9000 funcionários e cobram anualmente €2,8 mil milhões pelo trabalho que fazem para as autoridades do Reino Unido.   Os Serviços Tributários têm muito menos recursos, em particular na área de transferência de preços – transacções complexas implementadas por empresas multinacionais tendo em vista transferir lucros tributáveis para jurisdições de baixa tributação –, esquemas de evasão justamente montados com assessoria das mesmas consultoras. «Só nessa área de transferência de preços há quatro vezes mais funcionários que trabalham para as quatro consultoras do que para o correspondente serviço público», diz o relatório.    Um porta-voz dos Serviços Tributários justifica-se:  «Damos cuidadosa consideração a potenciais riscos assim como à forma de mitigar potenciais conflitos de interesse, antes de qualquer desses destacamentos ser acordado. Tudo ponderado, a utilização cuidadosa de quadros destacados é benéfico para o desenvolvimento da política fiscal e melhoramento da eficácia do sistema fiscal.»

     A KPMG aconselhou o Tesouro sobre o desenvolvimento do conceito e de normas para um regime de Direitos de Propriedade Intelectual designado por patent box, para de seguida emitir material promocional relevando o papel que havia desempenhado. Na brochura «patent box: o que ela tem para si» a KPMG sugere que a legislação representa uma oportunidade de negócio para reduzir os impostos, oferecendo ajudar os seus clientes na preparação da alocação de despesas elegíveis.   Depois, a KPMG explica-se em comunicado:   «Quando solicitados pelos departamentos governamentais destacamos especialistas para o seu serviço. O seu papel é fornecer subsídios técnicos e experiência comercial para que as autoridades possam fazer escolhas informadas sobre política fiscal. Os nossos quadros aí destacados não redigem legislação nem tomam decisões políticas». Também o chefe de política fiscal na Deloitte explica:   «Nós não cremos que alguma vez tenha havido qualquer conflito de interesses, e gostaria de ajudar a garantir que não há percepção de conflito».  Já o director de fiscalidade na PwC:  «Nós fornecemos ao governo uma visão técnica, mas apenas quando solicitados e nunca estamos envolvidos na decisão sobre política fiscal, que é uma questão do governo.»   E o chefe de fiscalidade da E&Y vai mais longe:  «Acho que há benefícios no trabalho que fazemos com o governo (…) benefícios para o país em geral. Se olharem para a qualidade da legislação que agora temos (…) é muito melhor do que era há 10 anos atrás.»  «Porque assim? Porque estamos trabalhando activamente com o governo, às nossas custas, para certificarmos que a base legislativa com que estamos a trabalhar é tão clara e concisa quanto pode ser.»

    Porém a presidente da comissão parlamentar identificou esse conflito de interesses e descreveu a acção dessas empresas como sendo equivalente a um esquema fraudulento. «As grandes empresas de contabilidade detêm numa posição poderosa no universo da fiscalidade e mantêm uma inapropriada relação de proximidade com o governo», afirmou, pedindo ao Tesouro para não mais aceitar essas assessorias externas na elaboração de futuras leis fiscais.

     A comissão parlamentar afirma estar «muito preocupada com a maneira como as quatro empresas parecem utilizar seu conhecimento interno da legislação para vender aos clientes aconselhamento sobre como usar essas regras para pagarem menos imposto», acrescenta o relatório. Prem Sikka, professor de contabilidade da Universidade de Essex, declarou:  «Elas [as quatro grandes] são o epicentro de uma indústria de elisão fiscal global, e a perda de receitas fiscais é directamente responsável pela actual crise económica. O Tesouro deveria actuar como as autoridades norte-americanas e processar e multar as empresas. Infractores habituais deveriam ser encerrados».

       Entre nós, a KPMG foi, entre 2002 e 2014, a auditora das contas das principais empresas do Grupo Espírito Santo, sediadas no Luxemburgo. Mantendo-se como auditora do BES «mau», surgiu agora a dar assessoria aos dois candidatos chineses Anbang e a Fosun nas negociações para a compra do Novo Banco (BES «bom»); enquanto isso, a actual auditora do Novo Banco, a PwC, surge também como assessora do fundo norte-americano Apollo, nas negociações para a compra desse mesmo banco. Os paraísos fiscais e as auditoras/consultoras estão omnipresentes e guardam bem os seus segredos.
             Evasão fiscal, paraísos fiscais
     As multinacionais concorrem pelos regimes fiscais mais generosos. Os governos dos países concorrem para as atrair, antecipando maiores receitas fiscais ou então, comprometidos no mesmo objectivo, oferecendo regimes fiscais favoráveis ou isenções.

     A concorrência fiscal, com incentivos para manipular e atrair investimentos, estimula a evasão e fuga de capitais. A concorrência fiscal mina a soberania financeira dos governos posto que contraria a adopção de política fiscal própria; induz mudanças de política tributária, de imposto sobre sociedades para o trabalho e o consumo, agrava a carga fiscal sobre os pobres (classes média e baixa, especialmente sobre os trabalhadores por conta de outrém, impossibilitados de fugir aos impostos); em estados vulneráveis resulta em redução da base tributária, maior assimetria social /desigualdade e enfraquecimento do estado nos planos interno e externo. É esta a corrida para o precipício que o capitalismo tem para oferecer.

      A elisão, a evasão e a fraude fiscal, difíceis de monitorizar e quantificar, resultam em enormes montantes de receitas públicas perdidas. Encaminhadas para paraísos fiscais, atingirão a ordem de $1 milhão de milhões anuais. Os paraísos fiscais, ao permitirem estatuto de privilégio às grandes fortunas e às multinacionais, contribuem para a redução das respectivas tributações, abrem caminho para que a carga tributária recaia sobre os trabalhadores. E iludem a percepção de realidade, risco e responsabilidade do sistema financeiro.

     A fuga de capitais, um fenómeno relacionado com a evasão e a fraude, reporta-se à saída de recursos produtivos de países em desenvolvimento ou periféricos. Embora haja várias motivações por detrás da fuga de capitais, a mais comum será a movimentação e acumulação de riqueza escondida. A fuga de capitais estima-se que exceda $500 mil milhões anualmente, tendo os paraísos fiscais como destino para os acolher com discrição em segurança.

      Fluxos financeiros ilícitos, isto é, movimentos de recursos ilegalmente adquiridos, transferidos ou utilizados, designadamente via transacções comerciais instrumentalizadas por sobre/subfacturação, visam iludir direitos aduaneiros, imposto de rendimento ou IVA, e obviamente também fundos oriundos ou aplicados de/para actividades criminosas. A pesquisa da Global Financial Integrity sugere que 45% dos fluxos ilícitos acabam em centros financeiros offshore e 55% em bancos nos países desenvolvidos. A exportação de fluxos financeiros ilícitos pelas economias em desenvolvimento e emergentes tem progredido à taxa anual de 9%, duas vezes mais rápida do que a geração do PIB global, tendo atingido $991 mil milhões em 2012 (estimativa conservadora por não compreender falsificação de facturação de serviços, dinheiro em espécie e lavagem de dinheiro).

     Um relatório de 2013 revela que, depois de ponderar todos os tipos de fluxos financeiros (legítimos e ilegítimos), incluindo investimentos, remessas, perdão da dívida e exportação de recursos naturais, a África é um credor líquido do resto do mundo. Para além do impacto económico negativo da saída de capital, os fluxos ilícitos têm um impacto terrível sobre os governos, as vítimas da criminalidade e a sociedade. Facilitam a criminalidade organizada, recompensam a corrupção, diminuem as receitas fiscais e comprometem a governação.

      Os fluxos ilícitos exportados por países em desenvolvimento excedem o total do investimento directo estrangeiro (FDI) e da assistência oficial ao desenvolvimento (ODA) recebidos. E o maior volume desses fluxos, 78%, é facturação fraudulenta de transacções comerciais. Aí está patente a marca da acção das multinacionais.

«De acordo com a UNCTAD, mais de 30 por cento do Investimento Directo Estrangeiro passa por paraísos fiscais e a tendência é crescente, distorcendo as estatísticas sobre fluxos de investimento e de capital. Por exemplo, alguns paraísos fiscais como Bermudas recebem mais investimentos dos Estados Unidos do que países como a China».

      A evasão fiscal é ainda mais facilitada quando incide sobre intangíveis, como Propriedade Intelectual (PI), patentes ou direitos de autor, mesmo logotipos e marcas registadas. A empresa-mãe de uma multinacional cede a propriedade de uma patente a uma empresa de fachada (holding) constituída em território de baixa tributação. Todas as subsidiárias produtivas desse complexo multinacional pagarão subsequentemente royalties a esta empresa de fachada, a partir dos proveitos de suas vendas atribuíveis a essa patente. Garante assim um débito contínuo de receitas para o paraíso fiscal. A Microsoft, só por registar os seus direitos de PI numa subsidiária na Irlanda, «poupou» $1800 milhões em impostos, entre 2001 e 2004, posto que tributados a uma taxa de 12,5% na Irlanda estariam sujeitos à taxa de 35% nos EUA.

      À mão das «quatro grandes» empresas de auditoria e consultoria, a engenharia fiscal é cuidadosamente planificada com vista a contornar e reduzir quanto possível os impostos cobrados a uma empresa, sem necessariamente contradizer a letra da legislação mas iludindo o seu espírito. Tirando partido de ambiguidades ou lacunas das normas legais, e das diferenças entre regimes fiscais vigentes em distintos países. A Organização Mundial do Comércio e o Fundo Monetário Internacional, ao promoverem a liberalização do comércio e da circulação de capitais, com vista ao crescimento e incremento dos lucros dos grandes grupos económicos, abriram caminho à infiltração de esquemas de elisão e evasão fiscal, de oportunidades de fuga de capitais e fraude fiscal.

                  Caso de sucesso: os Países Baixos

        A respeitável Europa está recheada de paraísos fiscais. O maior paraíso fiscal do mundo será a Suíça, tradicional esconderijo de grandes fortunas. Indivíduos e corporações acorrem discretamente a esse país para lá esconder os seus activos, protegidos por leis de sigilo bancário. Embora o regime fiscal compreenda imposto de rendimento sobre empresas (IRC, ...), todavia não cobra sobre proveitos auferidos por subsidiárias além-fronteira, por aí facultando a possibilidade de as empresas registadas na Suíça evitarem tais impostos. Porém a barreira do anonimato pode ser episodicamente derrubada, em caso de conflito entre centros financeiros, ou por força de investigações lançadas (por potências como EUA ou Alemanha) sobre incidentes bancários.     Crédit Suisse, UBS-AG, e Liechtenstein Grupo Global Trust (LGT) contam-se entre instituições financeiras acusadas de evasão fiscal pelas autoridades norte-americanas, penalizadas após sequente acção jurídica a pagar milhares de milhões de dólares em multas e a ceder informação sobre pessoas físicas e jurídicas com contas secretas. Foi alegado que «o maior gestor de fortunas do mundo [UBS] escondeu $17,9 mil milhões de 19 mil americanos que não declararam os seus bens ao Internal Revenue Service (autoridade tributária dos EUA).» A instituição financeira pagou «$780 milhões, admitiu fomentar a evasão fiscal e forneceu detalhes sobre 250 contas secretas,… posteriormente revelando outras 4450 contas.» Trata-se do maior banco suíço, presente em 50 países, tem 60 mil trabalhadores.

Os Países Baixos são um nó importante na rede mundial de evasão fiscal, onde presentemente estacionam $13 milhões de milhões. Numa União Europeia em crise é motivo de perplexidade e indignação.    O papel dos Países Baixos no sentido de facilitar a elisão e evasão fiscal remonta aos fins da década de 1970 quando, visando atrair empresas multinacionais, iniciou um regime de garantia de tributação favorável pré-acordada (the Dutch turn) em troca de lhes ser permitido o trânsito de capitais. Ao encaminhar proveitos através dos Países Baixos a caminho de paraísos insulares, as empresas podem colher um duplo benefício, não ter de pagar imposto sobre os seus capitais tanto à entrada como à saída.

       Empresas farmacêuticas ou ditas tecnológicas procuram reduzir os seus encargos fiscais pagando royalties sobre direitos de propriedade de patentes em subsidiárias offshore. Tais transacções normalmente incorrem em custos substanciais pois muitas nações desenvolvidas aplicam imposto de retenção na fonte sobre a saída de royalties para jurisdições com as quais não mantenham um acordo fiscal. Pelo contrário, os Países Baixos não impõem imposto de retenção sobre royalties que deixem o país, independentemente do destino. E o imposto é ou reduzido ou eliminado quando os pagamentos sejam feitos para uma jurisdição que seja parceira de acordo fiscal bilateral. A extensa rede de acordos fiscais neerlandeses protege o fluxo de pagamentos através das suas fronteiras.    A evasão fiscal tem fomentado uma vasta população de empresas trusts nos Países Baixos, e gerado cerca de mil milhões de euros de receitas fiscais anuais e cerca de 3500 postos de trabalho, segundo um estudo de 2009. Empresas locais, como Intertrust Group Holding SA e Grupo TMF disponibilizam caixas de correio para multinacionais, proporcionando-lhes um endereço em seus prédios de escritórios em Amesterdão.

      Atraídos por políticas amigáveis e uma vasta rede de tratados fiscais, empresas como IBM, Yahoo, Google, Cisco, Dell ou Merck transferiram proveitos para este país. De acordo com o próprio Banco Central dos Países Baixos, em 2010, empresas multinacionais encaminharam €10 milhões de milhões através de 14 300 «unidades especiais de financiamento» neerlandesas, muitas vezes unidades de negócio que existem apenas no papel, como é permitido por lei.   A IBM International Group BV foi constituída e registada de acordo com a lei dos Países Baixos em 1999, sucursal da IBM na Europa, por sua vez holding de uma rede de mais de 40 empresas subsidiárias representando a IBM por todo o mundo, incluindo as suas operações na Irlanda, um paraíso fiscal onde mantém alguns milhares de empregados. A holding holandesa tinha três funcionários em 2008, número que, desde então, multiplicou para cerca de 200 mil, no final de 2012, cerca de metade dos efectivos globais dessa multinacional. No final de 2012 a IBM tinha acumulado $44 mil milhões de lucros no exterior, dos quais não pagou impostos nos EUA, o sexto maior total de qualquer empresa norte-americana de acordo com dados compilados pela Bloomberg. Desde a constituição da IBM International Group BV, a taxa de imposto reportada pela empresa-mãe desceu 12 vezes em 14 anos. Os fundos por essa via liberados têm financiado a recompra de acções desde 2010, reduzido a quantidade de acções em circulação, e incrementando o lucro por acção, mesmo quando as receitas vão tombando.

     A Dell, um dos maiores fabricantes de computadores pessoais do mundo, usa os Países Baixos como base para evitar o pagamento de imposto de rendimento em qualquer lugar. A subsidiária neerlandesa Dell global BV, sem ter qualquer pessoal afecto, conduz de facto os seus negócios através de uma filial em Singapura, onde a Dell projecta e vende laptops e outros equipamentos para os EUA, Europa e Ásia. Dell global BV paga imposto à taxa de 1/10 de 1 por cento sobre lucros que ascenderam a cerca de $2 mil milhões em 2011, o que permitiu essa subsidiária angariar nesse ano quase três quartos dos proveitos mundiais da Dell. A Dell explica que para fins fiscais o lucro é produzido em Singapura, onde goza de um privilégio fiscal desde 2004. Embora a empresa pague quase nenhum imposto de rendimento em Singapura, os Países Baixos também não cobram imposto de rendimento significativo, alegando evitar a dupla tributação que pode ser reclamada evocando o lucro ser obtido em Singapura.   Como se comprova, também nos Países Baixos e em Singapura, os regimes fiscais à volta do mundo estão muito mais adequados a promover o bem-estar das corporações multinacionais do que das famílias trabalhadoras.

     Ora foi do Reino dos Países Baixos que, no início de 2013, o Senhor Jeroen Dijsselbloem partiu para Bruxelas para dirigir o Eurogrupo e o Mecanismo de Estabilidade Europeu. Em Junho de 2015, os cinco presidentes – Dijsselbloem, do Eurogrupo, Mario Draghi, do Banco Central Europeu, Jean-Claude Juncker, da Comissão Europeia e Donald Tusk, do Conselho Europeu, ditaram o «Relatório dos Cinco Presidentes» para valer como doutrina da União Monetária Europeia, impondo, de cima a baixo, aos Estados-membros as regras de política económica e social da zona euro.



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Segunda-feira, 22.06.15

Os Tratados  mudam-se com  rupturas.   (-J.Bateira, 20/6/2015, Ladrões de B.)

     O sistema monetário internacional do padrão-ouro acabou em 1931, no dia em que o Reino Unido abandonou o compromisso com a convertibilidade a uma taxa fixa. Seguiram-no outros países e o resultado está à vista na figura que o Alexandre Abreu publicou num magnífico texto do ano passado. Comparem a trajectória da crise nos países que saíram do sistema (desvalorização da moeda - linha cinzenta) versus a dos que mantiveram a austeridade (desvalorização interna - linha amarela).   Hoje, apesar dos estabilizadores automáticos (subsídios de desemprego e outros) e de se tratar do conjunto da zona euro e não apenas da periferia (linha vermelha), percebe-se bem que esta crise já demorou demasiado tempo.

     Oxalá a Grécia tome a dianteira e nos ajude a romper com este projecto anti-democrático. Para mudar a Europa, é preciso romper com os Tratados da UE. Os que querem mudar por dentro, devagar, com a diplomacia convencional para não ofender ninguém, desempenham o papel do "polícia bom" neste processo de tortura e submissão dos povos europeus ao totalitarismo ordoliberal.  Neste sentido, o economista italiano Sergio Cesaratto apela à esquerda europeia para que assuma a estratégia da ruptura (aqui). Onde está escrito 'Grécia' podia estar 'Portugal':

     A "união monetária europeia" constituiu uma armadilha tanto para a Grécia como para a Itália, (e Portugal) embora com diferentes caminhos. De facto, os dois países estão em diferentes estádios do desenvolvimento capitalista.

Para a burguesia italiana, tratava-se de finalmente livrar-se do poder dos sindicatos impondo ao trabalho uma disciplina germânica (totalizante, de sobre-exploração, medo, enfraquecimento e perda de direitos). O modelo monetário e económico europeu abriu essa oportunidade já que foi construído sobre a ideia de políticas de deflação competitiva. A burguesia grega viu o euro como o caminho fácil para atrair o capital estrangeiro de forma a financiar a despesa privada e pública, e as importações, o que permitia manter o consenso eleitoral.      (...)

      A alternativa, tanto para a Grécia como para a Itália, teria sido uma estratégia de desenvolvimento nacional independente, com uma estratégia industrial liderada pelo Estado (a que a UE se opõe) acompanhada de uma taxa de câmbio competitiva.

    O que veio a seguir é bem conhecido. Como era de esperar, as políticas de austeridade falharam a recuperação do desenvolvimento sustentado, produzindo desindustrialização e miséria. O projecto europeu tornou-se cada vez mais um projecto reaccionário, sendo a Europa federal e progressista uma quimera (sempre foi) que apenas umas quantas pessoas loucas ainda têm a coragem de defender.      (...)

     Dado que uma unificação política europeia mais profunda, democrática e progressista, está fora de alcance, devemos lutar por uma dissolução pacífica e justa da presente união monetária e económica e substituí-la por um novo quadro institucional.    Este seria baseado na cooperação económica, monetária e financeira, mas também permitiria a cada país a liberdade de prosseguir a estratégia de crescimento democrático que melhor sirva o seu estádio de desenvolvimento.

     Percebemos que uma dissolução, pacífica e sem dor, da actual união económica e monetária europeia não é uma tarefa fácil.  Ainda assim, devemos lutar para que a actual situação se torne insustentável tendo em vista acelerar a transição para um novo estádio de cooperação na Europa mais democrático e socialmente comprometido.

----- O “polícia bom” é do mesmo grupo de lampeiros que por cá arranja sempre formas se banquetear no caldeirão da neoliberal UE enquanto receita Pec’s (austeridade, privatizações, perdas sociais em todos os sectores) mas na realidade nada faz de diferente:
tratado orçamental – é bom e é para ser usado com “inteligência”, leia-se destruição do estado social;
austeridade – devagar devagarinho estamos confiantes que as coisas podem vir lentamente a melhorar um bocadinho, enquanto vamos entregando aos privados o sistema público de segurança social;
auditoria e reestruturação da dívida – nem pensar falar disso, isso equivale a levar com uma porta nas trombas e um monumental chuto no c..;
euro – é uma adoração transcendental beatífica com direito a lengalenga … tu és e sobre ti erigiremos um culto neoliberal
    Quando tudo isto começar a ruir e não deve tardar preparemo-nos para o oportunismo do costume do centro, da direita e da extrema. Depois de terem vendido a família e alinhado na destruição da comunidade a pior coisa que nos pode acontecer é, o neoliberalismo nacional amaciado ou outra patranha, continuar a aceitar a indignidade da UE, a destruir o estado social e a empobrecer a maioria dos portugueses, privatizando tudo o que ainda resiste.

-----  ...excerto dum magnífico texto de Manuel Loff (via otempodascerejas2):
      "«(...) Quem o escreve é a Comissão da Verdade sobre a Dívida Pública nomeada em abril pela presidência do Parlamento da Grécia, constituída por peritos internacionais (ou julgar-se-á que “peritos” são só os FMI e do BCE?) e que apresentou esta semana um relatório preliminar. Contrariando todo o discurso dos nossos governos austeritários, que entendem que não há nada que discutir quanto à legitimidade da dívida (“há que a pagar, ponto final!”), o Parlamento grego criou uma comissão “com o mandato de investigar sobre a criação e o aumento da dívida pública, a forma e as razões pelas quais ela foi contraída, e o impacto que as condições associadas aos empréstimos teve sobre a economia e a população.”
     Concluiu ela que o crescimento da dívida pública grega desde os anos 80 “não se deveu a um gasto público excessivo, que se manteve abaixo do gasto público doutros países da eurozona, mas sim ao pagamento de juros extremamente altos aos credores, um excessivo (...) gasto militar, perda de receita fiscal devido aos fluxos ilícitos de capital, à recapitalização estatal dos bancos privados e aos desequilíbrios criados (…) na conceção da própria União Monetária.”      “O uso do dinheiro” que adveio dos dois resgates (2010 e 2012) “foi estritamente ditado pelos credores, sendo revelador que menos de 10% destes fundos se tenham destinado ao gasto corrente do governo.” Em que foram gastos, então? No resgate de bancos privados gregos e europeus: a troika passou dinheiro à Grécia (a juros, claro) para que esta pagasse aos bancos (mais juros). E dessa forma, a Grécia (como Portugal) ficou sob o protetorado de instituições internacionais de que fazem parte mas onde a sua voz não conta para nada, cedendo-lhes toda a sua soberania económica — e, automaticamente, toda a sua soberania nacional!   Por água abaixo vai a tese, tantas vezes repetida por Teixeira dos Santos, Gaspar e a ministra dos swaps, de que os empréstimos servem para pagar pensões e a saúde pública, pelo que devemos estar todos agradecidos aos nossos benfeitores..."  -- http://www.publico.pt/mundo/noticia/a-grecia-e-as-licoes-da-austeridade-1699519  .



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Domingo, 21.06.15

Solidários com a Grécia

 

«Em funções há cinco meses, o governo da Grécia tem procurado consensualizar na União Europeia uma renegociação da dívida e um caminho alternativo à austeridade.
Desde o primeiro dia, as instituições europeias e o FMI mantêm total intransigência e desafiam o mandato democrático do povo grego, procurando impor novos cortes nas pensões, entre outras medidas recessivas.   O garrote financeiro agrava a situação económica e social na Grécia e serve de chantagem política contra todos os povos da União.   Vivemos a hora decisiva em que cabe à mobilização impedir a expulsão da Grécia da moeda única.   Só a democracia dos povos da Europa pode evitar a punição de um país inteiro pela recusa de mais austeridade e miséria.»      ... já está disponível em português,... a intervenção de Yanis Varoufakis na última reunião do Eurogrupo. ...para quem queira perceber o que está em causa na Europa.

     Grécia responde nas ruas às ameaças dos credores    ( Manifestação contra a chantagem dos credores - 17 junho 2015

     Para além de membros do Syriza, os protestos contaram com a participação de vários sindicatos e movimentos sociais e também com o partido Gregos Independentes. As palavras de ordem mais ouvidas, segundo a agência ANA-MPA, foram “A dignidade não se vende” e “As nossas vidas não são dos credores”. Mas viam-se também faixas e cartazes em inglês e alemão, pedindo mais democracia para a Europa.

     “Estar aqui hoje significa duas coisas”, disse um dos manifestantes à agência de notícias grega.  “Por um lado, fazemos pressão para o governo não recuar.  O povo irá estar aqui na Praça Syntagma como esteve há cinco anos.  Mas por outro lado, mostramos aos nossos credores que o governo não está sozinho e que tem o apoio do povo”.

    Também presente na manifestação de Atenas, Francisco Louçã descreveu no Facebook o ambiente vivido na Praça Syntagma:   “Havia alegria, gente de todas as idades, deputados junto com multidão de grupos politicos diferentes, e em todos uma sensação forte:   não pode continuar a indefinição, não se deve atrasar mais uma solução. Nos altifalantes, nenhum discurso, mas canções gregas e, no meio delas, o Bella Ciao.   O  economista e fundador do Bloco de Esquerda foi convidado pela presidente do parlamento da Grécia a participar na sessão da Comissão de Auditoria e Verdade da Dívida, onde intervirá esta quinta-feira.

     Em comunicado, o Syriza afirma que as manifestações em Atenas, Salónica e outras cidades deram “uma mensagem de recusa da cultura do medo e da chantagem, mostrando que ninguém pode roubar o direito democrático a um povo de decidir sobre o seu futuro. O apoio da maioria da sociedade grega é a arma mais poderosa nas negociações que o governo leva a cabo”.

  “Eles têm MEDO que o «vírus do Syriza» se espalhe pela Europa”: ..., tac,tic,tac,tic,...

Porta-voz do grupo parlamentar do Syriza diz que as manifestações de solidariedade com a Grécia por toda a Europa assustaram os poderes que dominam a UE.

Manifestação em Lisboa(Abrupto)

Grécia: o “golpe de Estado” que não será televisionado  (-por Sarah Adamopoulos )

Porque é financeiro, conta com o apoio do presidente da Comissão Europeia, do ministro das Finanças da Alemanha, das agências de notação financeira, dos governos (entre os quais o português), da Oposição interna ao Syriza, e dos jornalistas (com destaque para a imprensa alemã e francesa) comprometidos com o sistema. Mais, aqui (e em comentário; em francês).
        Uma tragédia clássica em perspectiva   (-por Pedro Figueiredo, 365forte, 18/6/2015)
  « Se  Lutas  podes  perder (ou ganhar qq coisa)  se  Não  Lutas  estás  Perdido ! »

 O desfecho de uma possível saída da Grécia da zona euro tem tudo para se tornar uma tragédia clássica tal como Aristóteles a descreveu. E não necessariamente para os gregos, ainda que a situação financeira do país fique por resolver mesmo abandonando a moeda única. Isto porque a ideia de Europa, em consonância com os desígnios de quem a pensou na sua forma original, tinha tudo a ver com a solidariedade entre os povos.   Churchill dizia que em tempo de paz o que deve prevalecer é a boa vontade. No entanto, esta parece estar a ser sacrificada pelo simples facto de um país recusar impor aos seus cidadãos a agonia de um estrangulamento económico que apenas agrava (e compromete seriamente) o desejado (por todas as partes) pagamento das obrigações.

    Ainda ninguém conseguiu avaliar a real dimensão da saída da Grécia do Euro e há opiniões para todos os quadrantes ideológicos. Porque, que se queira quer não, é de ideologia que se trata e não de simples contabilidade orçamental. O Syriza, radical ou moderado, teve o mérito de afrontar o discurso vigente das inevitabilidades que desde 2008 tem sido vendido à opinião pública. O resultado dessas inevitabilidades vem hoje muito bem descrito na primeira página do The Guardian. Brevemente podem fazer o mesmo com Portugal.

É possível que a saída da Grécia seja um caso isolado. Que não haja perigo de contágio ou, mesmo a haver, a boa vontade que parece não haver com os gregos agora, tenha que obrigatoriamente surgir mais tarde com as economias mais débeis da zona euro, com Portugal (de cofres cheios) obviamente na linha da frente das vítimas. O certo é que para a história ficará uma ferida das que deixam marcas num projecto comum (importante), no qual se deixou cair um parceiro por razões meramente contabilísticas. Como no elo mais fraco: “adeus”. Sem que se tenham ouvido vozes suficientes para a defesa de um Estado membro da União (monetária, neste caso).

Para os mais acérrimos defensores da lógica mercantilista é sempre bom lembrar que existem na equação activos intangíveis. Que discurso terá a Eurogrupo depois de permitir a saída da Grécia do Euro? Que solidariedade pode defender sem manchas de ridículo por ter desistido do sexto mais populoso país dos 19 da moeda única? Não será difícil adivinhar quem será o maior prejudicado desta tragédia clássica que se perspectiva. Entre Euro e Grécia, o futuro o dirá.



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Terça-feira, 16.06.15

A Grécia !  A Grécia !!   A Grécia !!!   Mas qual Grécia?

Há mais que uma Grécia. (... e há diferentes tipos de governantes, partidos, classes e cidadãos !)

Uma Grécia

O ex-min. da Defesa da Grécia, Akis Tsochatzpoulos, comprou em 2000, 4 submarinos à Alemanha por 2,85 mil milhões de euros.   A Justiça alemã descobriu ter havido corrupção (62 milhões em luvas). Os corruptores alemães foram julgados, condenados e presos.   E havendo corruptores há corrompidos (não é como em Portugal, "nós não somos a Grécia!") e assim ao ex-min da Defesa grego, o corrompido, sucedeu o mesmo.    Aconteceu na Grécia dos governos corruptos, dos governos que privilegiavam o lucro do grande capital financeiro, e para quem o estado social… ora o Estado Social… em primeiro lugar estão os mercados e os grandes negócios depois se sobejar alguma coisa, pois com certeza, o Estado Social.

 Outra Grécia:

 Em 2001 um grupo de organizações, movimentos e pequemos partidos deu origem a um partido um pouco maior que concorreu às eleições e foi tendo estes resultados:

Parlamento

Votos

 %

Assentos

2004

241 539

3.3

6 em 300

2007

361 211

5.0

14 em 300

2009

315 627

4.6

13 em 300

2012 - Maio

1 061 265

16.8

52 em 300

2012 - Junho

1 655 022

26.9

71 em 300

2015

2 246 064

36.3

149 em 300

Dá pelo nome de (Partido/ Coligação) Siryza e tem no seu programa entre outros objectivos:

 «1. Realizar una auditoría sobre la deuda pública. Renegociar su devolución y suspender  los pagos hasta que se haya recuperado la economía y vuelva el crecimiento y el empleo.

2. Exigir a la UE un cambio en el papel del BCE para que financie directamente a los Estados y a los programas de inversión pública.

3. Subir el impuesto de la renta [IRS] al 75% para todos los ingresos por encima del medio millón de euros anuales. [acima dos 42.000€/mês aproximadamente]

4. Cambiar la ley electoral para que la representación parlamentaria sea verdadeiramente proporcional.

5. Subir el impuesto de sociedades para las grandes empresas al menos hasta la media europea.

6. Adoptar un impuesto a las transacciones financieras y también un impuesto especial para los productos de lujo.

7. Prohibir los derivados financieros especulativos, como los swaps y los CDS.

8. Abolir los privilegios fiscales de los que disfruta la iglesia y los armadores de barcos.

9. Combatir el secreto bancario y la evasión de capitales al extranjero.

10. Rebajar drásticamente el gasto militar.

11. Subir el salario mínimo hasta su nivel previo a las recortes (751 euros brutos mensuales).

12. Utilizar los edificios del Gobierno, la banca y la iglesia para alojar a las personas sin hogar.

13. Poner en marcha comedores en los colegios públicos para ofrecer desayuno y almuerzo gratuito a los niños.

14. Ofrecer sanidad pública gratuita para las personas desempleadas, sin hogar o sin ingresos suficientes.

15. Ayudas de hasta el 30% de sus ingresos para las familias que no pueden afrontar sus hipotecas.

16. Subir las prestaciones de desempleo para los parados. Aumentar la protección social para las familias monoparentales, los ancianos, los discapacitados y los hogares sin ingresos.

17. Rebajas fiscales para los productos de primera necesidad.

18. Nacionalización de los bancos.

19. Nacionalizar las antiguas empresas públicas de sectores estratégicos para el crecimiento del país (ferrocarriles, aeropuertos, correos, agua…).

20. Apostar por las energías renovables y por la protección del medio ambiente.

21. Igualdad salarial para hombres y mujeres.

22. Limitar el encadenamiento de contratos temporales y apostar por los contratos indefinidos.

23. Ampliar la protección laboral y salarial de los trabajadores a tiempo parcial.   ....... » Link 

     O governo alemão que atualmente tutela a UE é amigo da 1ª Grécia, acima identificada e com ela não só fez excelentes negócios chorudos como fechou os olhos a todo o tipo de falsificações que permitiram a entrada da Grécia no Euro.   A 1ª Grécia era por sua vez muito amiga da Alemanha e dos seus bancos que lhe ofereciam todo o dinheiro que quisesse para pagarem juros incomportáveia para o  povo grego mas muito apreciados pelos bancos alemães e outros, incluindo portugueses.  

    CONCLUSÃO:   quando  falamos da Grécia, convém saber de que Grécia estamos a falar, se da  Grécia dos  oligarcas  donos dos bancos e dos  grandes consórcios   ou da  Grécia dos  trabalhadores e das  classes  médias.

A (troika) UE, o BCE, o FMI fazem tudo o que podem, e podem muito, para vergar o governo grego, para obrigar o Siryza a deixar de cumprir as suas promessas eleitorais e obrigar as classes menos favorecidas da Grécia a pagar os desmandos dos anteriores governos gregos amigos da Troica, cortes nos salários, nas pensões e tudo o que temos visto por cá. E depois a UE, o BCE e o FMI mandam os seus papagaios da comunicação social apregoar: vejam o Siryza! Vejam o governo grego!! Promete e não cumpre! Populistas e Corruptos. Corruptos como os nossos !  Link com dados eleitorais Wikipédia ;    ( #  Raimundo P. Narciso, PuxaPalavra)



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Sexta-feira, 20.02.15

----- Todos somos credores  (-por J.M.C. Caldas, Ladrões de B.)

 O  Fórum Dívida e Direito Humanos, promovido pela IAC, é já amanhã, sábado 21, de fevereiro, a partir das 9.30 no Auditório do Liceu Camões em Lisboa. A inscrição pode ser feita aqui e mais informação encontrada aqui ou aqui.
     Estávamos longe de imaginar quando a data foi fixada que o Forum iria ocorrer num dia tão decisivo. Não sabemos o que irá prevalecer hoje na reunião do euro-grupo: o acordo razoável proposto pelo governo grego, ou o “não” da matilha punitiva. Sabemos que o resultado seja ele qual for, não é definitivo. Negociar-se-à até ao último minuto. Continuar-se-à a negociar mesmo depois, exista ou não algum tipo de acordo. Tudo está em aberto. E quando tudo está em aberto muito depende de cada um de nós.
    Podemos e devemos, portanto, usar o encontro de amanhã para discutir em conjunto o que pode ser feito em Portugal. Como devemos agir?  Poderemos ouvir e discutir de manhã com Yiannis Bournous - um amigo vindo da Grécia. Podemos usar as oficinas para organizar ideias, propor soluções e formas de ação coletiva. Temos um dia para pensar e trabalhar juntos. Utilize-mo-lo bem.
   No centro da discussão estará o conflito entre dívida e direitos humanos. Qual é a questão?
   Numa sociedade decente todos somos credores. E todos somos devedores. Essa sociedade é feita de direitos e de obrigações reciprocas. Mas quando a reciprocidade é quebrada e alguns - os credores financeiros – julgam ter o direito de sobrepor os seus direitos ao mais elementares direitos de todos os outros, e conseguem efetivamente fazê-lo, então, é preciso parar, dizer basta, impedir que as linhas vermelhas sejam transpostas.
    É esse o ponto em que estamos em muitos países do mundo, e também na Europa que se diz próspera, mas consente a miséria e o sofrimento evitável, em corredores de hospitais, na fila do desemprego, na porta da cantina social, no posto de trabalho inseguro, na pressão exaustiva das longas horas de trabalho, nos aeroportos da emigração. 
     Ilegítima é a dívida e a austeridade imposta em nome de "direitos" dos credores financeiros que se sobrepõem aos direitos humanos. Essa é uma dívida a que não estamos obrigados. Que legitimamente deve ser repudiada.
    Devemos negociar, claro, como o governo grego tem feito, com responsabilidade, de igual para igual, e sem consentir que os credores financeiros transformem dívidas financeiras em servidão. Mas devemos negociar sabendo que a razão está do nosso lado:  se todos somos credores, por que é que alguns pretendem ser mais credores do que outros?
    O  euro  em  fase  terminal   (-por J. Bateira, Ladrões de B.)
     Quando participei no primeiro debate televisivo realizado em Portugal sobre o euro ("Prós e Contras", 15 Abril 2013), afirmei que a moeda única iria acabar. Da mesma forma que a Inglaterra de 1931 não aguentou a política de austeridade imposta por um sistema monetário que excluía a desvalorização da moeda - no padrão-ouro, o reequilíbrio externo teria de ser alcançado por redução dos salários, a chamada "desvalorização interna" -, também nos nossos dias, um dos países sujeitos à política cruel imposta pela UE acabará por sair. O primeiro será a Grécia, os outros vão a seguir, ao ritmo do respectivo ciclo político.
       Entretanto, o discurso do MEDO  voltará às televisões.  Dir-nos-ão que sair do euro é uma calamidade porque perderemos metade do poder de compra, que os bancos vão falir e perderemos as nossas poupanças, que o Estado não pagará aos funcionários públicos e pensionistas, que seremos excluídos dos mercados para todo o sempre e, argumento último de quem está inseguro, que a Alemanha nos invadirá para restabelecer a ordem.    Do serviço público de televisão, gerido por comissários políticos, não se pode esperar uma informação isenta e fundamentada.  Não haverá recolha de depoimentos de especialistas estrangeiros que ponham em causa o pensamento dominante, não haverá debate honesto com uma participação plural que ultrapasse o discurso partidário rotineiro. Dos canais privados também não podemos esperar que cumpram as exigências básicas de pluralismo, nem que as autoridades competentes o exijam. O que temos visto fala por si. Aliás, os analistas que ocupam o palco estão no bolso dos grupos económicos e da finança. Um governo de salvação nacional também terá de resgatar a comunicação social e pô-la ao serviço do interesse público.
         Recordemos então algumas ideias simples que os portugueses não têm direito a debater nos  media de grande audiência.
Quando Portugal sair do euro, todos os contratos realizados sob jurisdição nacional ficam automaticamente redenominados em novos escudos, segundo a jurisprudência internacional ( lex moneta , 1 escudo = 1 euro). Assim, todos os empréstimos bancários, depósitos, salários, pensões, preços nas lojas, etc., passam a escudos e, a partir desse dia, o Estado apenas paga e recebe em escudos. O Estado fica sem problemas de liquidez porque os seus défices - necessários para estimular a economia - ficam cobertos por financiamento interno, quer do sector privado, que procura obrigações do Tesouro para aplicações seguras, quer do Banco de Portugal, a entidade pública que emite moeda. Portanto, sair do euro significa a libertação do país dos humores dos mercados financeiros. Quanto às necessidades de financiamento em outras moedas, os últimos dias mostraram-nos que os EUA estão dispostos a ajudar para evitar o recurso aos seus rivais. Note-se que os BRIC têm agora um banco que é alternativa ao FMI. 
       Um governo de ruptura deve, à cabeça, nacionalizar os bancos e instituir o controlo dos movimentos de capitais. Seria vantajoso comprá-los em bolsa, à cotação do momento, e proceder à sua recapitalização, tudo com emissão monetária. A inflação será o custo a pagar para recuperarmos a soberania. Mas será um custo transitório (inicialmente, cerca de 12%, muito menos nos dois anos seguintes) que pode ser distribuído com justiça social através de compensações a atribuir aos rendimentos mais baixos.   A classe média/alta, vendo os seus desempregados recuperarem a dignidade de voltar a trabalhar em condições decentes, aceitará de bom grado alguma perda temporária de poder de compra. Como seria de esperar, o novo paradigma da política económica dará prioridade ao emprego, ao contrário da finança, que diaboliza a inflação e acha inevitável este desemprego típico dos anos trinta do século passado. 
       À medida que se forem abrindo espaços de debate público informado sobre o que significa sair do euro, os portugueses ficarão cada vez mais receptivos à proposta de uma Europa de países soberanos. Por muito que custe aos federalistas, não creio que os portugueses queiram viver num protectorado sujeito a diktats.

------        Sobre o poder das ideias arcaicas na Economia

Desde o início da crise que incrivelmente surpreendeu os “peritos” da economia, vimos um mito após outro ser destruído pelos factos. A redução do défice não levou ao crescimento do investimento por acréscimo da confiança. Emitir moeda numa economia gravemente deprimida não conduziu a uma inflação descontrolada ou ao afundamento do valor das moedas.

Chegou a hora da União Europeia parar de executar uma política económica baseada em mitos estúpidos. Se a chanceler alemã Angela Merkel, e outros líderes da União Europeia, não podem aceitar a realidade, então a Grécia e a Europa do sul ficariam bem melhor saindo do euro, deixando a Alemanha a nadar nos contos de fadas da Economia do século XIX.



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Quinta-feira, 19.02.15

 (in)  Dignidade  e  direita  no  poder     (-por josé simões, derTerrorist)

Margaret Bourke-White.jpeg[Imagem de M.Bourke-White]

«O Estado paga, no máximo, 178,15 euros por titular de RSI; 89,07 por cada um dos outros adultos que existam no agregado; 53,44 por cada criança. Ora, um casal com duas crianças recebe no máximo 374,1 euros de RSI. [...] os critérios de acesso à prestação são apertados e a medida envolve assinatura de contrato de inserção social que implica todos os membros.

    ... às instituições particulares de solidariedade social (IPSS), o Estado paga 2,5 euros por cada refeição fornecida pelas cantinas sociais. Conforme o protocolo, podem as refeições ser fornecidas até duas vezes por dia, sete dias por semana. [...] uma IPSS pode receber até 600 euros por mês para fornecer almoço e jantar a um casal com dois filhos e ainda cobrar 1 euro por refeição.»

     E depois ninguém ganhava dinheiro nenhum com isso e agora até já há a "economia social" e o "terceiro sector" e o caralh.. e quem receba subsídio para pagar a renda dos outros e o abono de família que os outros não recebem e pague ainda as próprias coisas:

    «Diogo Leite de Campos, vice-presidente do PSD, quer «acabar com os benefícios sociais e fiscais para toda a gente» e defende a criação de um «cartão social de débito», um sistema no qual o estado presta serviços em vez de dar dinheiro.       [...]       «há muita gente que recebe subsídio para a renda ou abono de família e depois gasta o dinheiro noutras coisas».  (!!!)

------- Custe  o  que  custar   (às pessoas ! )  (- por Nuno Pires, 18/2/2015, 365forte)

 Custe o que custar

 --Vamos lá brincar à propaganda. Vamos lá brincar com as palavras  (-por josé simões)

     Primeiro aplica-se o memorando, para além do que a troika exigia, e depois vão-se adaptando as metas e os objectivos, inexequíveis, de modo a que a realidade encaixe na teoria e que a credibilidade, do devedor e do credor, saia reforçada, assim como a confiança mútua, para maquilhador, maquilhador e meio.

    Da outra parte tratam os outros. Depois de anos e anos de agit-prop de patranhas impingidas, que os contribuintes alemães estavam a pagar o grego 'way of life' e o 'dolce far niente' nas ilhas do Mediterrâneo, como é que se vai explicar a alguém -que até há sete décadas, no nazismo, acreditava piamente que o vizinho do lado, o colega de trabalho ou de escola, o amigo, o familiar, antes um semelhante, depois só porque professava uma religião diferente era um piolho, um inumano que merecia ser esmagado e exterminado,- que afinal não paga salário mínimo nenhum ao cidadão grego e que os gregos têm direito a ter direitos, entre eles um salário mínimo condigno?

    Vamos lá brincar às palavras, é Portugal, com o memorando ajustado de 3 em 3 meses para caber dentro da realidade, a prova de que os memorandos de entendimento funcionam ou é a Grécia, primus inter pares na aplicação dos memorandos, a prova de que não funcionam?

---- "Grandes Opções de Plano"    (-por josé simões, derTerrorist)

Quanto é que custou ao bolso do contribuinte o plano de encomendar uma auditoria para contradizer o estudo da ONU, para Paula Teixeira da Cruz ficar bem na fotografia de ministra da Justiça, e quem é quem nas relações perigosas entre a empresa auditora e o 'inner circle' político-partidário com ligações ao poder?

---- A  dignidade   ***  (-OJumento, 20/2/2015) 

    Em pleno conflito entre a Alemanha e a Grécia o país é surpreendido com a notícia de que a ministra das Finanças de Portugal vai a Berlim, onde participará num seminário ao lado Wolfgang Schaeuble. A sala tem um ar deprimente, a meia dúzia de presentes tem todo o ar de funcionários arrebanhados para fazerem de figurantes, a mesa tem uma flor tem no centro e ao lado da ministra e do ministro aparece uma terceira personagem que ninguém se deu ao trabalho de apresentar.  A ministra lá foi apresentada como o "bom exemplo", a prova de que o programa "de ajustamento" (empobrecimento...), logo ela que chegou ao cargo depois do (agora vice-p. do BCE e) preferido de Wolfgang Schaeuble  ter escrito uma carta onde reconheceu o falhanço (da política económico-financeira e social do desgoverno PSD/CDS).
     A dignidade de Portugal foi respeitada quando uma ministra do governo da República de Portugal se presta a participar numa encenação montada por um governo estrangeiro que apenas pretende exibir a Grécia como um país falhado, ainda por cima quando se sabe que em Portugal grassa o desemprego  e a miséria, quando os melhores jovens foram convidados a emigrar para zonas de conforto pelo próprio governo ou quando nenhuma meta acordada foi cumprida?
      Que se saiba a ministra não foi a Berlim, ainda por cima à custa do erário público, por ordem da troika, foi porque o governo português se sente orgulhoso neste papel. A afirmação de Junckers de que a dignidade dos portugueses e da Grécia não foram respeitadas só faz sentido em relação àquele país, no caso português foram (governantes) portugueses a não respeitarem os portugueses, ainda que um deles fosse presidente da Comissão Europeia.
      Não foi Passos Coelho que perante o sofrimento do seu povo pediu aos portugueses para não serem piegas?  Não foi ele que disse não dar prendas de Natal aos filhos e fez disso propaganda?  Não foi Passos Coelho que num seminário com membros da Troika lhes disse que não era por eles que fazia o que estava fazendo mas sim pelos portugueses, o mesmo seminário onde foi tirada a fotografia onde aparece curvado perante meros funcionários de organizações internacionais?
     Quem se esqueceu das imagens humilhantes de três funcionários, que nem directores-gerais eram nas respectivas organizações, a entrarem pelo parlamento com ar de bois a olharem para um palácio, para serem recebidos com subserviência pela segunda mais alta figura do Estado português?  Não foi o FMI, a Comissão ou o BCE que obrigou os governantes portugueses a proporcionarem estas figuras tristes e indignas. Foi um governo que querendo usar a Troika para encobrir o seu projecto ideológico (neoliberal) não hesitou em arrastar um país e todo um povo pela lama.
      De certeza que foi o FMI a impor uma reforma do Estado depois transformada em guião e agora já em fase de conversão em programa eleitoral, ou foi o governo a pedir ao FMI para vender a sua chancela para um projecto que era seu, um projecto com muitas das medidas que gente como Passos Coelho sempre defendeu?  Este governo não hesitou em colocar a intelectualidade deste país ao nível do Burkina Faso para pedir a técnicos do FMI de preparação duvidosa, muitos deles reformados da América latina ou contratados a prazo algures no mundo, para lhe dizer o que fazer do Estado de um país membro da EU e da OCDE.
     A passagem da Troika por Portugal é um período negro na história de Portugal, não por causa da crise, não por causa do empréstimo, não por causa das organizações internacionais. Mas sim por causa de gente quase iletrada, ambiciosa e com uma ideologia de discoteca que sujeitou o país  a uma experiência económica (neoliberal), com base num livro cheio de erros técnicos (e/ou intenções?!) e com pressupostos como o do ideólogo agora arrependido Vítor Bento, de que os cidadãos portugueses (em especial os trabalhadores e os funcionários públicos, da classe média) eram culpados do pecado do consumo acima das suas possibilidades.
     Não foi a Troika que ofendeu a dignidade dos portugueses, foi a direita mais idiota (e serventuária de interesses financeiros) deste país, gente sem dimensão humana e sem grande currículo, com ministros doutores de diplomas aldrabados que humilharam (e empobreceram) Portugal e os Portugueses.
       ***    «J.-C. Juncker, presidente da Comissão Europeia (e ex-p. do Eurogrupo), acusou a troika (CE, BCE, FMI) de beliscar e pecar contra a dignidade dos cidadãos da Grécia, Portugal, ... e acusou a anterior Comissão Europeia, liderada por Durão Barroso, de confiar “cegamente” nela.   e “ ... que as instituições europeias têm de “aprender as lições do passado” e “não repetir os mesmos erros”.


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Segunda-feira, 15.12.14

Continuar a combater a dívida  (-por JM Castro Caldas, Ladrões de B.)

 
     Em consequência das petições dirigidas à Assembleia da República, nomeadamente a petição Pobreza não paga a Dívida: reestruturação já!, realiza-se no próximo dia 16 de dezembro de 2014, na Sala do Senado, na Assembleia da República, uma Conferência Parlamentar sobre Dívida Pública.
     A Conferência é aberta ao público (sujeita à lotação da sala). As inscrições poderão ser efetuadas aqui:
Participarei no Painel sobre a “Sustentabilidade da Dívida Pública”, às 15 horas. O programa está aqui. É preciso insistir: o Estado português deve preparar-se para a renegociação e reestruturação da dívida.

     No dia seguinte, 17 Dezembro 2014, pelas 18:30 horas, na Casa da América Latina, Avenida 24 de Julho nº 118-B, Lisboa, a Iniciativa para uma Auditoria Cidadã à Dívida (IAC) promove um debate sobre “Restruturações anti-abutre: Lições da América Latina” com Jorge Argüello (Embaixador da República Argentina) e Eugénia Pires (IAC).
                 Um, dois, três debates    (-por J.Rodrigues, Ladrões de B.)
 
1. Este fim-de-semana terá(teve) lugar a Assembleia Cidadã organizada pelo Junto Podemos. Participarei num debate onde procurarei aprofundar a reflexão sobre populismos, confrontações e regimes. Do Ladrões também participará o Jorge Bateira na mesma linha soberanista, necessariamente eurocéptica ou eurorealista, como preferirem. 
     2. Na próxima terça-feira, dia 16, pelas 14h, terá lugar um seminário no CES sobre o poder pós-democrático da financeirização. Procurarei ir um pouco para lá da ideia de que o neoliberalismo é uma mera expressão ideológica do poder financeiro. Do Ladrões intervêm igualmente o Nuno Teles e o Ricardo Paes Mamede, a que se juntam José Reis, Ana Cordeiro Santos e Mariana Mortágua.
     3. Na próxima quarta-feira, dia 17, realiza-se, pelas 18h na FEUC, um debate a propósito do livro A economia política do retrocesso, com João Cravinho. José Reis e eu responderemos por um livro colectivo.


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Sábado, 28.06.14

-- Que faire de la dette ? Un audit de la dette publique de la France    59% de la dette publique proviennent des cadeaux fiscaux et des taux d’intérêt excessifs

-- L’État au service des banques dans le scandale des prêts toxiques en France 

-- Rigueur et compétitivité : un cocktail toxique pour l’Europe   avec d’une part des coupes budgétaires dans les dépenses sociales (austérité), de l’autre des politiques au service des multinationales et investisseurs privés (compétitivité). Mais ces mesures suscitent de fortes résistances sociales dans de nombreux pays européens. 

-- François Hollande : ne cédez pas au lobby des banques ! Pour une taxe ambitieuse sur les transactions financières !

  

          A Vida a a Dívida  (-por Tim Jones, 13/2/2014)

   A dívida tem sido usada pelas instituições internacionais e pelas elites locais para impor políticas económicas que atentam contra os interesses dos cidadãos comuns. E, ao mesmo tempo que o atual colapso financeiro global alimenta uma crescente crise das dívidas, milhões de pessoas são empurradas para a pobreza, em todo o mundo.

    O Jubilee Debt Campaign foi fundado para fazer campanha contra a crise das dívidas no Terceiro Mundo, que provocou injustificadas dificuldades económicas e sofrimento para milhões de seres humanos no conjunto dos países do Sul, desde os finais dos anos 70.   Durante esta crise, denunciámos algumas das formas, através das quais a divida foi criada e usada para transferir riqueza de uma parte da sociedade (e do mundo) para outra, para tornar o sector financeiro mais poderoso à custa da pessoas e para pré-determinar escolhas económicas e restringir direitos democráticos.

    Batemo-nos pelo fim dessas crises, mas enquanto 130 milhares de milhões de dívida dos países mais empobrecidos eram, então, cancelados, a dívida continuava, de facto, a aumentar em todo o mundo e o sector financeiro – que a alimenta – a crescer ainda mais poderoso. A mais recente crise financeira é o culminar desta insustentável situação financeira, na qual complexos instrumentos financeiros são usados para esconder a verdadeira dimensão da dívida global.

     AS PESSOAS COMUNS NÃO FORAM RESPONSÁVEIS, E NÃO BENEFICIARAM COM A DÍVIDA

O colapso da presente crise financeira global foi sentido em todo o mundo com a chocante subida no desemprego, na pobreza e no sofrimento humano.

    Mas como chegámos nós até aqui? Durante os anos 2000, os bancos ocidentais mantiveram uma corrida aos empréstimos em países como a Grécia, a Letónia e Portugal, fomentando bolhas económicas, inflacionando custos de habitação e construção desmedida.

    Estes empréstimos tiveram, porém, um fim precipitado com a crise financeira. Agora milhões de pessoas estão a sofrer com o aumento do desemprego, da pobreza e a destruição de serviços públicos, tais como os cuidados de saúde e educação, em resultado destes empréstimos irresponsáveis.

   No centro do furacão da crise financeira, com os bancos a enfrentar a bancarrota, em resultado do excesso de créditos, os governos deram passos para os salvar. Mas esses resgates não ficaram por aqui. A UE e o FMI emprestaram dinheiro para assegurar que os credores irresponsáveis, tais como os bancos, continuariam a ser pagos. Entretanto, a austeridade foi imposta às populações a pretexto de que isso iria tornar as dívidas pagáveis. Na realidade, as economias acabaram por falir ou ficar estagnadas, ao mesmo tempo que as dívidas continuaram a aumentar.

    Embora os níveis de pobreza na Europa sejam diferentes, a presente crise reflete os acontecimentos que conduziram o Terceiro Mundo à crise das dívidas que atingiu o conjunto dos países do Sul. O boom de crédito nos países da América Latina e Africanos nos anos de 1970 tornou-se explosivo nos anos 1980, porém, quando os EUA aumentaram as taxas de juros sobre a dívida e a economia global entrou em recessão. Para proteger os bancos ocidentais, o FMI acabou por socorrer os credores irresponsáveis, ao mesmo tempo que impunha austeridade, privatizações e liberalização.

     Na Jamaica, por exemplo, durante mais de 30 anos, 20% das receitas eram totalmente destinadas a pagamento da dívida. Desde então, o governo já pagou mais em capital e juros do que aquilo que tinha sido emprestado e, ainda, deve cerca de 7.8 mil milhões de dólares.

Da crise das dívidas na América Latina no princípio dos anos 80 até à crise financeiro do Leste Asiático de 1997, chegando à crise nos nossos dias, a desregulamentada concessão de crédito já causou mais devastação a quem nada teve a ver com eles, do que aos culpados por esses comportamentos imprudentes.

    APESAR DO PAPEL DOS BANCOS E DO PODER FINANCEIRO NA CRIAÇÃO DESSAS DIVIDAS, ESTAS CRISES FORAM UTILIZADAS PARA REFORÇAR O PODER DA FINANÇA E CRIAR UM SISTEMA AINDA MAIS VOLÁTIL

    Apesar da forma como os media os apresentaram, os resgates nem de panaceia temporária serviram para as economias expostas a choques.   Em vez disso, eles serviram apenas para evitar a falência dos estados soberanos, permitindo o pagamento da dívida à banca – o resgate foi, efetivamente, aos credores imprudentes.

     Hoje, até mesmo o FMI admite que as dívidas não podem ser totalmente pagas na Jamaica ou na Grécia. No Paquistão e na Tunísia os empréstimos do FMI estão a ser inteiramente usados para pagar dívidas antigas – no caso do Paquistão, para pagar anteriores empréstimos do FMI.

    Na Letónia, ainda que não existisse uma crise de dívida pública, os empréstimos do FMI foram concedidos e usados para pagar aos bancos escandinavos, sobrecarregando o governo com mais dívida.

    As políticas de austeridade e de privatizações impostas na América Latina e nos países africanos no passado não funcionaram melhor;
Entre 1980 e 2000 o crescimento económico, por pessoa e por ano foi de - 0,5%´na América Latina e de – 1.5% em África;
Entre 1980 e 1990 o número de pessoas a viver na pobreza na América Latina aumentou de 144 para 211 milhões;
Em África, o número de pessoas a viver em pobreza extrema ( com menos de $1,25 por dia ) aumentou de 205 milhões em 1981 para 330 milhões em 1993;
     E, o mais revelador de tudo, a dívida não se reduziu. A dívida externa detida pelos países na América Latina e África aumentou de 17% do PIB em 1980, para 33% em 1990;

     O problema dos elevados pagamentos da dívida é exacerbado pelas enormes taxas de fraude e evasão fiscal que reduzem, ainda mais, o dinheiro disponível pelos governos. Ambos, pagamentos de dívida e fuga de lucros e capitais não taxados, são formas dos países continuarem a ser saqueados e os povos empobrecidos, enquanto grandes empresas e elites, em qualquer outro local, enriquecem cada vez mais.

    Tanto quanto o aumento da pobreza e da desigualdade, o sistema de resgates lança as sementes para a próxima crise, pelo aumento das dívidas e reforço do poder do setor bancário, sem qualquer responsabilização. Um documento de trabalho do Banco de Compensações Internacionais (BIS), afirma que na preparação da atual crise financeira global os bancos emprestaram em larga escala a bancos de países altamente endividados, devido às “expectativas “ de um “resgate” em qualquer um dos países com problemas. O atual sistema encoraja o crédito imprudente.

O CUSTO MAIS ELEVADO É PAGO PELOS MAIS POBRES DA SOCIEDADE, AQUELES A QUEM A AUSTERIDADE É IMPOSTA

     Os resgates chegam com condições para impor medidas de austeridade, tais como:

  • cortes nas despesas do Estado
  • aumento de impostos, particularmente nas taxas regressivas fixas, em impostos como o IVA
  • privatização de empresas públicas
  • desregulação, de que são exemplo a remoção de taxas sobre as importações e o corte nos salários mínimos

    O anterior chefe de missão do FMI na Irlanda, Ashoka Mody, dizia que não há: “uma única circunstância histórica" em que as políticas de austeridade tenham conduzido ao fim do pesado fardo de dívida . Mas o falhanço da austeridade não é senão uma parte da história. É sobretudo o impacto dos ajustamentos da dívida e da austeridade sobre as pessoas comuns que melhor mostra a verdadeira dimensão do falhanço.

   Em 2000, enquanto parte do Objetivo 8 de Desenvolvimento do Millennium, 189 países –aí incluídos os da UE, EUA e Japão – concordaram em “lidar compreensivelmente com os problemas da dívida, nos países em desenvolvimento “. Falharam o cumprimento desse compromisso. Essa é uma das razões pelas quais os países atingidos pela dívida, estão impedidos de atingir outros objetivos de desenvolvimento. A Jamaica está excluída, pelo menos, em um dos indicadores para todos os MDG´s. Em dois deles, retrocedeu mesmo. Em 1990, 97% das crianças completavam a escola primária. Em 2010, apenas 73% o conseguiam. A mortalidade materno infantil quase duplicou disparando dos 59 por 100.000 nado vivos em 1990, para os 110 em 2010.

     Elevados pagamentos de dívida e cortes nas despesas do Estado, tornam mais difícil garantir serviços públicos decentes, tais como cuidados de saúde e educação. A Jamaica gasta em pagamentos de dívida o dobro daquilo que investe em educação e serviços de saúde, somados.

    Os países da Europa tem igualmente sofrido tremendos recuos. Na Grécia, os novos orçamentos hospitalares estão a deixar muitas pessoas sem tratamento e crianças sem vacinação, porque deixaram de ser gratuitos. As despesas com a saúde caíram 40% entre 2010 e 2013. A Letónia perdeu 8% dos seus trabalhadores de saúde e 14% do pessoal de educação.

     A ausência de oportunidades económicas, acompanhada do crescente aumento do custo de vida, particularmente elevado nos encargos com a alimentação e os combustíveis, estão a levar cada vez mais pessoas a emigrar, para procurar trabalho. Na Letónia, 200.000 pessoas – um décimo da população – abandonou o país na busca ,noutros locais de trabalho. Milhares de jovens, da altamente endividada Tunísia, enfrentam riscos cruzando o perigoso mar, para atingir a ilha italiana de Lampedusa, em travessias durante as quais mais de 500 pessoas já pereceram, nos dois últimos anos. Mais de 740 pessoas emigram de El Salvador para os EUA todos os dias, ao mesmo tempo que o governo de El Salvador gasta, por ano um quarto do seu rendimento em pagamentos de dívida, dívida essa que teve na sua origem os empréstimos ocidentais à Junta Militar, durante os anos 80.

QUE MUNDO ESTAMOS NÓS A CONSTRUIR?

      A importância da dívida na perspetiva da construção de um movimento para a mudança social é o que permite identificar as raízes dos mitos subjacentes á divida-austeridade-economia.

      A narrativa imposta “ estamos em divida?”, “então, deve ser por nossa culpa” “o que podemos fazer por ela?” procuram convencer-nos de que não existe alternativa. Questionar a legitimidade da dívida liberta o nosso espírito para começar a pensar como seria a sociedade se não estivesse controlada pela finança – como seria se fosse baseada em princípios diferentes daqueles que são ditados pelo mercado

     O combate contra a dívida é o combate pelo primado dos princípios e dos valores. Não existe nenhuma solução política para libertar as pessoas, baseada no flagelo da dívida injusta e da austeridade. Algumas especificidades emergem, contudo. Uma das vias chave para repor justiça em dívidas injustas é deixar de as pagar. Isso pode acontecer quer através de auditorias à divida que levem os países a repudiar as dívidas, quer através da criação de um processo de arbitragem justo e independente para reduzir as dívidas do Estado.

     Em 2008, o governo do Equador instalou uma comissão de auditoria pública à divida para investigar de que países ela resultava. Depois de identificar que alguns dos contratos de divida eram ilegítimos e potencialmente ilegais, o Presidente Correa anunciou que eles não iriam ser pagos. Enquanto este processo litigioso não era totalmente resolvido, uma queda drástica aconteceu no valor da dívida do Equador nos mercados financeiros, o que permitiu ao governo recompra-la, a baixo preço, permitindo uma brutal redução do valor da dívida.

    Uma abordagem alternativa está a ser tentada pelo governo de Granada. Depois do default da sua dívida, no inicio de 2013, o governo da Ilha do Caribe declarou agora publicamente que pretende negociar em conjunto com todos os credores – uma coisa que normalmente o FMI e o Banco Mundial não gostam que aconteça – e a todos os credores que partilhem a redução da dívida.

Mas o cancelamento de dívidas injustas e não sustentáveis não é suficiente, se pretendemos construir uma maior democracia económica e prevenir crises futures. A economia precisa tornar-se mais justa, com os governos a assegurar recursos necessários para proporcionar serviços decentes, através de sistema fiscal justo.

    As causas na origem das crises da dívida, por todo o mundo, são um sistema financeiro desregulado, no qual enormes quantidades de empréstimos se movem entre países, alimentado desequilíbrios comerciais e instabilidade global. Um vasto conjunto de regulamentos é necessário para o sistema financeiro, para colocar a finança sob controle e para reduzir estes grandes fluxos de dinheiro que circulam pelo mundo.

    Estas recorrentes crises de dívida não são inevitáveis, mas o resultado de políticas económicas ideologicamente orientadas e de erros. Nos anos cinquenta (1950) e sessenta (1960) o número de governos que provocou default nas suas dividas a credores privados estrangeiros, era em media de 4, em cada vinte anos. Desde os anos setenta, esse numero subiu para 4, em cada ano.

    O sistema de câmbios fixos ajustáveis de Bretton Woods em vigor desde o final dos anos 40 até ao princípio dos anos 70, consagrou um período de muito maior envolvimento dos governos na economia, e especificamente em que havia regulação para os movimentos de dinheiro – empréstimos, especulação e investimento – entre países. Os chamados “controles de capitais “ entre países, eram cruzados com “os controles de crédito “, limitando a quantia em dinheiro que os bancos emprestadores podiam fazer e os vários setores. Por exemplo, no Reino Unido havia limites não só para a forma como os bancos podiam emprestar, como quanto podiam eles emprestar para hipotecas imobiliárias .

    Para a vida ter prioridade sobre a dívida, precisamos de construir uma alternativa para o modo como controlar o sistema financeiro – aí incluída justiça fiscal, controle sobre empréstimos e cancelamento de dívidas injustas.

       Publicado em Green European Journal, vol 7, janeiro de 2014. Tradução da IAC. Ver:

Taming_the_giant_-_towards_a_sustainable_financial_system.pdf

http://gef.eu/news/taming-the-giant-towards-a-sustainable-financial-system/ 



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Sexta-feira, 20.06.14

Grupo Espírito Santo : "too big to fail" ou "too holy to jail ?"   (-por Ana Gomes, 17/6/2014)

  
Eu proponho voltarmos a 6 de Abril de 2011 e revisitarmos o filme do Primeiro Ministro José Sócrates, qual animal feroz encostado as tábuas, forçado a pedir o resgate financeiro.   Há um matador principal nesse filme da banca a tourear o poder político, a democracia, o Estado:  Ricardo Salgado, CEO do BES e do Grupo que o detém e controla, o GES - Grupo Espírito Santo.  O mesmo banqueiro que, em Maio de 2011, elogiava a vinda da Troika como oportunidade para reformar Portugal, mas recusava a necessidade de o seu Banco recorrer ao financiamento que a Troika destinava à salvação da banca portuguesa.
    A maioria dos comentaristas que se arvoram em especialistas económicos passou o tempo, desde então, a ajudar a propalar a mentira de que a banca portuguesa - ao contrário da de outros países - não tinha problemas, estava saudável (BPN e BPP eram apenas casos de polícia ou quando muito falha da regulação (do BdP, CMVM, do Estado), BCP era vítima de guerra intestina: enfim, excepções que confirmavam a regra!). Mas revelações recentes sobre o maior dos grupos bancários portugueses, o Grupo Espírito Santo, confirmam que fraude e criminalidade financeira não eram excepção: eram - e são - regra do sistema, da economia de casino em que continuamos a viver.
    Essas revelações confirmam também o que toda a gente sabia - que o banqueiro Salgado não queria financiamento do resgate para não ter que abrir as contas do Banco e do Grupo que o controla à supervisão pelo Estado - esse Estado na mão de governantes tão atreitos a recorrer ao GES/BES para contratos ruinosos contra o próprio Estado, das PPPs aos swaps, das herdades sem sobreiros a submarinos (, pandures, ...) e outros contratos de defesa corruptos, à subconcessao dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo.   À conta de tudo isso e de mecenato eficiente para capturar políticos - por exemplo, a sabática em Washington paga ao Dr. Durão Barroso - Ricardo Salgado grangeou na banca o cognome do DDT, o Dono De Tudo isto, e conseguiu paralisar tentativas de investigação judicial - sobre os casos dos Submarinos, Furacão e Monte Branco, etc.. e até recorrer sistematicamente a amnistias fiscais oferecidas pelos governos para regularizar capitais que esquecera ter parqueado na Suíça, continuando tranquilamente CEO do BES, sem que Banco de Portugal e CMVM pestanejassem sequer...
     Mas a mudança de regras dos rácios bancários e da respectiva supervisão - determinados por pressão e co-decisão do Parlamento Europeu - obrigaram o Banco de Portugal a ter mesmo de ir preventivamente analisar as contas do BES/GES. A contragosto, claro, e com muito jeitinho - basta ver que, para o efeito, o Banco de Portugal, apesar de enxameado de crânios pagos a peso de ouro, foi contratar (cabe saber quanto mais pagamos nós, contribuintes) uma consultora de auditoria, a KPMG - por acaso, uma empresa farta de ser condenada e multada nos EUA, no Reino Unido e noutros países por violações dos deveres de auditoria e outros crimes financeiros e, por acaso, uma empresa contratada pelo próprio BES desde 2004 para lhe fazer auditoria...
    Mas a borrasca era tão grossa, que nem mesmo a KPMG podia dar-se ao luxo de encobrir:  primeiro vieram notícias da fraude monstruosa do GES/BES/ESCOM no BESA de Angola, o "BPN tropical", que o Governo angolano cobre e encobre porque os mais de 6 mil milhões de dólares desaparecidos estão certamente a rechear contas offshore de altos figurões e o povo angolano, esse, está habituado a pagar, calar e a ...não comer...    Aí,
Ricardo Salgado accionou a narrativa de que "o BES está de boa saúde e recomenda-se", no GES é que houve um descontrolo: um buracão de mais de mil e duzentos milhões, mas a culpa é... não, não é do mordomo: é do contabilista!
    Só que, como revelou o "Expresso" há dias, o contabilista explicou que as contas eram manipuladas pelo menos desde 2008, precisamente para evitar controles pela CMVM e pelo Banco de Portugal, com conhecimento e por ordens do banqueiro Salgado e de outros administradores do GES/BES. E a fraude, falsificação de documentos e outros crimes financeiros envolvidos já estão a ser investigados no Luxemburgo, onde a estrutura tipo boneca russa do GES sedia a "holding" e algumas das sociedades para melhor driblar o fisco em Portugal.
    Eu compreendo o esforço de tantos, incluindo os comentadores sabichões em economia, em tentar isolar e salvar deste lamaçal o BES, o maior e um dos mais antigos bancos privados portugueses, que emprega muita gente e que obviamente ninguém quer ver falir, nem nacionalizar.   Mas a verdade é que o GES está para o BES, como a SLN para o BPN:   o banco foi - e é - instrumento da actividade criminosa do Grupo.   E se o BES será, à nossa escala, "too big to fail" (demasiado grande para falir), ninguém, chame-se Salgado ou Espírito Santo, pode ser "too holy to jail" (demasiado santo para ir preso).
    Isto significa que nem os empregados do BES, nem as D. Inércias, nem os Cristianos Ronaldos se safam se o Banco de Portugal, a CMVM, a PGR e o Governo continuarem a meter a cabeça na areia, não agindo contra o banqueiro Ricardo Salgado e seus acólitos, continuando a garantir impunidade à grande criminalidade financeira - e não só - à solta no Grupo Espírito Santo.


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