«Já poucos têm dúvidas de que o propalado "fim da história" que Francis Fukuyama anunciou aos crentes desapareceu num buraco negro. O mundo global, gerido como uma economia de mercado e ligado por sistemas democráticos, é um mito.
A crise económica que se iniciou em 2008 está a deixar demasiados feridos (e mortos) no seu caminho e os danos colaterais são demasiados para que um novo paradigma não esteja a surgir. Isso é evidente no surgimento de regimes musculados, onde se juntam as "delícias" do capitalismo com o poder de um Estado forte, mas também no interior da própria União Europeia onde esses ideais vingam perante o beneplácito de Bruxelas. Basta olhar para alguns países do Leste Europeu (Hungria, Bielorussia, Turquia, ...) para se ver onde está a democracia. Mas os sinais são mais alarmantes noutras latitudes. Por um lado, basta ver o estilo autoritário de Donald Trump. Por outro lado, podemos olhar para o Brasil para vermos como está a nascer um novo ovo da serpente. (…)
Tudo isto não é obra do acaso. É o poder da decisão ((da alta finança transnacional...) …) que volta a ser determinante. Por isso Donald Trump é tão fulcral para se perceber este novo tempo. Ele tornou-se o líder dos EUA porque conseguiu que os americanos acreditassem que ele era o tipo de chefe que eles precisam para "fazer" as coisas. Trump não quer seguir as regras: quer destruí-las e fazer tudo à sua maneira, algo que tem muito que ver com a ideologia neoliberal que se tornou hegemónica no mundo nas últimas décadas. Por isso, o Estado, sendo o grande satã destas pessoas, tem de ser ocupado por dentro: para que esta aliança entre o poder político, económico (-financeiro) e cultural (as televisões, as redes sociais e as tecnologias portáteis estão a servir para nivelar o conhecimento pela mediocridade e superficialidade) se conclua. É a nova era do capitalismo (neoliberal global e desregulado). Por isso, Trump é tão importante para Vladimir Putin. Sem perceber o essencial está a fazer aquilo que um novo poder deseja.»
. «É um labirinto sem saída: Portugal emite dívida para pagar os juros da dívida acumulada. Joga com os juros e, de vez em quando, faz uns pagamentos antecipados para poupar uns trocos.
Aperta o cinto do défice, mas não cresce o suficiente para ir ceifando a dívida pública medonha que cresceu como num campo de trigo sem dono. O (BCE e o) FMI engorda: paga-se, pelos vistos, juros de 4,6% a uma entidade que tem uns técnicos que, de vez em quando, repetem como papagaios o que leram nos livros dogmáticos da instituição. Pior ficam sempre os portugueses: só este ano têm de pagar aos credores 8,3 mil milhões de euros em juros, qualquer coisa como 4,3% do PIB. Nem o rei da matemática conseguiria um saldo zero com estas variáveis. Como já não há ouro do Brasil nem pimenta das Índias, Portugal fica de mão estendida à espera que a DBRS não esteja enjoada e que o BCE emita moeda. É uma triste sina para o país. E não vamos lá com a tentativa de, através de baixos rendimentos, nos tornarmos o Bangladesh da Europa, como alguns desejavam.
Portugal é a Little Dorrit da Europa. Basta ler "Little Dorrit", uma obra de Charles Dickens que poderia ter tudo que ver com os dias de hoje. Nela Amy Dorrit vive numa prisão para detidos por questões financeiras, Marshalsea, onde o seu pai está encarcerado desde antes do seu nascimento. "Little Dorrit" é um livro sobre dinheiro e estatuto. Sobre os empréstimos a pessoas que não o têm e que nunca o poderão pagar, como William Dorrit, que gastam o que não têm. Esbanjámos, é certo, com a bênção de José Sócrates. Mas custa ver este país, que poderia ser um pequeno paraíso com sol e mar, perdido num destino que não controla. A história da nossa culpa colectiva é conhecida e é contada aos meninos do Norte da Europa, que acham que no Sul só existem mandriões e pedintes do seu dinheiro. Não se olha para o outro lado da moeda que adoptámos e que fez a fortuna do Norte e a miséria do Sul. Mas, claro, não é assim que deixamos de ser a pequena Amy Dorrit.»
O governo que muitos alvitravam não durar mais do que uns meses, fez aprovar o segundo OE na AR, deixando muita gente (mesmo dentro do PS) desiludida.
Em 2016 foram revertidas quase todas as medidas que asfixiavam as famílias, diminuiu o desemprego, reduziu-se o défice e a dívida. Digamos que o governo cumpriu um pouco mais do que os serviços mínimos. Isso não significa, no entanto, que a geringonça esteja estável. Aliás, se assim fosse, não poderia ser geringonça…
Não vale a pena fazer como a avestruz e fingir que não se adivinham dias difíceis e problemas complicados para António Costa, para a geringonça e para o país. Independentemente dos reflexos internos do que possa acontecer a nível externo, há dificuldades que os partidos de esquerda colocarão ao governo e poderão pôr em risco a geringonça.
Devolvidos os salários e as pensões, PCP e BE irão aumentar (e bem…) a pressão para a tomada de medidas de combate às desigualdades. Não tenho dúvidas de que essa também é uma prioridade do governo, resta saber até onde pode ir, sem colocar em causa o crescimento e a confiança externa. É preciso ter os pés bem assentes no chão e não esquecer que os juros da dívida continuam a subir perigosamente e a única agência de “rating” que garante a manutenção de nível acima de lixo (DRBS) poderá deixar de manifestar esse apoio se as taxas de juro ultrapassarem os 4%. A pressão sobre os juros da dívida vem de demasiados lados, pelo que menosprezar esse factor pode significar, a prazo, o fim da geringonça.
Se é certo que a dívida, sendo impagável, tem de ser renegociada, não é menos verdade que este deverá ser o ano pior para o fazer. Compreendo bem a justeza da campanha que o PCP vai lançar em Março, mas aceito menos bem uma velada ameaça dos sindicatos de regressarem à rua, se as suas reivindicações (nomeadamente em áreas sensíveis como a educação e a saúde) não forem aceites pelo governo.
Mas se à esquerda os receios de uma avaria irreparável na geringonça são vistos com muita apreensão, à direita rejubila-se com a hipótese de essa avaria ocorrer. Pouco interessa à direita se a pedra que afetar a engrenagem da geringonça é de proveniência interna ou externa. A única coisa que interessa aos mafiosos, digo, pafiosos, é regressar ao poder e para isso é essencial que o motor da geringonça gripe. Depois, ancorados na máxima “ nós tínhamos avisado” tomarão medidas de extrema dureza que afectarão irremediavelmente as classes trabalhadoras. Seria bom que partidos de esquerda e sindicatos pensassem bem nas consequências de elevar demasiado alto a fasquia das reivindicações. Mesmo sendo justas, têm de ser realistas, pois não é possível reverter em dois anos, a destruição provocada pelo anterior governo PSD/CDS durante os 5 anos em que andou de rédea solta e contou com o entusiasmado apoio de Cavaco Silva.
Será fundamental à esquerda não perder o discernimento e, com os pés bem assentes no chão, reflectir sobre os passos que podem ser dados sem colocar em risco o crescimento da economia. Destruir a geringonça é escancarar a porta à direita, com as nefastas consequências para os mais desfavorecidos que já se conhecem. KEEP CALM, PLEASE!
O presidente da Turquia, Recep Payyp Erdogan, afirma que a tentativa de golpe militar de sexta-feira foi um “presente de Deus”: vai permitir-lhe “limpar” as forças armadas (e o resto: jornalistas, juízes, opositores, ... organizações políticas, cívicas e religiosas).
Quem fala verdade não merece castigo, pelo que todos os deuses evitarão punir o autocrata turco, embora sabendo que muitos são os seus pecados.
E “limpezas” são a especialidade deste padrinho e protector de uma miríade de grupos de mercenários e terroristas entre os quais se destacam, para os que não estão lembrados ou o ignoram, o Daesh ou Estado e Islâmico e a Al-Qaida nos seus muitos e variados heterónimos.
Limpou o país da oposição, acusando os principais adversários de servirem os direitos nacionais curdos e ameaçando privá-los da nacionalidade turca. Para que não surgissem obstáculos à sua ascensão ao topo presidencial do poder fez manipular actos eleitorais através da propaganda, da censura e do medo, de tal modo que nem os observadores do Conselho a Europa e da OSCE, embora reconhecendo as irregularidades em privado, ousaram torná-las públicas e definitivas.
Limpou o aparelho judiciário e militar saneando centenas de juízes e os procuradores que denunciaram a corrupção governamental e da família Erdogan, designadamente a sua familiaridade pessoal e financeira com o banqueiro saudita Yassim al-Qadi, próximo de Bin Laden e conhecido internacionalmente como “o tesoureiro da Al-Qaida”. Por essa razão, está sob a mira da ONU, o que não o impede de deslocar-se a Ancara em avião privado para conviver e gratificar generosamente a família presidencial.
Vem limpando paulatinamente as forças armadas, mas este “presente de Deus”, como admitiu o próprio Erdogan, proporciona-lhe uma oportunidade de ouro para acelerar o processo. A partir de agora ruirá o maior obstáculo secular à confessionalização de um regime turco formatado em estrutura ditatorial e em teor fundamentalista islâmico.
Erdogan fala claro, disso não tenhamos dúvidas. Há 20 anos, em plena ascensão na carreira política, iniciada entre os fascistas e supremacistas “lobos cinzentos”, definiu a democracia como “um eléctrico que abandonamos quando chegamos à nossa paragem”. Recentemente falhou a consulta para impor uma Constituição “inspirada em Hitler” (*) – as palavras são suas – de modo a consolidar um poder presidencial absoluto. A seguir a esse intuito por ora fracassado, Erdogan começou então a receber “presentes de Deus”.
O atentado contra o aeroporto de Istambul parece ter sido um deles. Apesar da autoria não ter sido reivindicada, Erdogan atribuiu-o ao Daesh, por conveniência da sua própria imagem internacional; mas por que razão os protegidos iriam atacar no coração do protector? Provavelmente por convergência de interesses – uma mão lava a outra, não é o que se diz? Um atentado é, sem dúvida, oportunidade de ouro para reforçar poderes de excepção e perseguir inimigos internos vários, mesmo que nada tenham a ver com a violência.
Quando ainda decorre o rescaldo do acto terrorista surge o golpe militar, com inegáveis debilidades de amadorismo num exército dos mais poderosos da NATO, precisamente com Erdogan ausente, “de férias”, circunstância excelente para um regresso triunfal, afirmativo, justificando limpezas. Deus não poderia ter sido mais generoso, em boa verdade.
Enfim, é a este ditador turco que a União Europeia paga anualmente três mil milhões de euros confiscados aos nossos impostos para impedir que cheguem à Europa os refugiados das guerras que os donos da Europa provocam. Para que conste, não há um vínculo formal entre o conselho Europeu e Erdogan sobre esta verba; foi estipulada apenas em comunicado de imprensa dos chefes de Estado e de governo da União Europeia.
Foi com este presidente turco que o governo francês negociou a garantia de não haver atentados do Daesh durante o Euro 2016, em troca do apoio à criação de um Estado curdo no Norte da Síria. Constatámos, da maneira mais trágica, que ao Daesh bastaram apenas quatro dias para se libertar do período de nojo, fazendo gato-sapato do securitarismo fanático e inconsequente de Hollande e Valls.
É a este presidente turco que a União Europeia ainda reconhece credenciais de democrata (!), apesar de o próprio rei Abdallah da Jordânia ter revelado o apoio (daquele) ao Daesh, à Al-Qaida, ao contrabando de petróleo que serve de financiamento ao Estado Islâmico e de enriquecimento à mafia familiar de Erdogan.
Foi comovente – e patético – o apoio de grande parte da comunidade mediática (tv, rádio, net, redes sociais... tudo controlado pelo governo) a Erdogan durante as vicissitudes da tentativa de golpe e ao uso dos seus apoiantes como escudos humanos e carne para canhão nas ruas, praças e pontes das principais cidades da Turquia.
Entre a componente militar e a mafia governamental de Erdogan estavam em luta, durante a tentativa de golpe, dois conceitos de regime autoritário: um secular, outro fundamentalista islâmico. A democracia e os interesses populares não tinham nada a ver com aquela guerra entre elites interesseiras e pouco ou nada preocupadas com as pessoas.
O terrorismo islâmico, a guerra e a anarquia no Médio Oriente, porém, têm muito a ganhar com a absolutização do poder de Erdogan em Ancara. Ou seja, é impossível estar simultaneamente contra o terrorismo islâmico e temer pelo futuro político de Erdogan. A democracia não passa por aí, mas também já pouco se sabe dela nesta União Europeia.
Porém, quando a vida das pessoas está à mercê destes “presentes de Deus” é possível testemunharmos os acontecimentos e os ditos mais bizarros. (e horrores)
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Curioso é também a Turquia ter assegurado (nas vésperas do 'golpe militar') acordos com Israel e com a Rússia... e agora acusar um líder islâmico rival, 'abrigado' nos EUA, de ser o instigador do golpe... (*) lembrem-se que os Nazis também incendiaram o seu 'Reichstag'/parlamento e atribuiram o crime aos judeus e opositores...! e consolidaram o seu poder ... e seguiu-se + horror.
E a U.E. não se demarca do autocrata turco (e do húngaro, ...) e dos movimentos, partidos e políticas de extrema direita que vão ganhando força na Europa ... (com apoio de governantes fantoches ditatoriais, tecnocratas neoliberais e/ou fanáticos religiosos...).
C. Scarllaty: Tudo não passou de uma Golpada de Erdogan para conseguir uma revisão constitucional que o torne único e perpétuo ditador eleito! - ... se analisarmos bem todo o "filme" é por demais evidente. Além disso, os militares que encabeçariam a rebelião... onde estavam? Nunca apareceram!!! - Os soldados foram mandados para a rua ao "Deus dará". (nem procuraram tomar/controlar mídia, infraestruturas estratégicas, ...- foram simples 'peões' enganados e mandadas para 'abate' **- tal como os 'camisas castanhas' nazis depois substituídos pelas SS de Hitler.) Uma conspiração a sério nunca teria esse final, daí que os EUA e a UE tenham vindo deitar logo 'água na fervura'! Demasiado evidente, até para um leigo.
Iniciada na passada sexta-feira, dia 15, e terminada em fracasso menos de 24 horas depois, a nova irrupção dos militares na cena política turca (a quinta, nos últimos 56 anos – uma por década), foi tão patética que deixou perplexo o mundo inteiro
… e levantou até suspeitas de que a aparente tentativa de golpe poderia afinal ter sido montada pelo próprio presidente do país.
Eleito chefe de Estado em 2014, depois de 11 anos consecutivos no poder como primeiro-ministro, à la Pútin, Recep Erdogan embarcou desde então numa deriva autocrática cada vez mais acentuada e pode agora, a pretexto da tentativa de golpe, reforçar exponencialmente o seu poder.
O imã muçulmano Fethullah Gulen, líder do Hizmet (Serviço), um movimento social e religioso com grande influência, que começou por apoiar Erdogan, mas depois se transformou num dos seus maiores opositores, foi um dos primeiros a levantar essa hipótese. Do seu auto-exílio na Pensilvânia, onde se refugiou no final dos anos 90 para escapar da perseguição do regime, Gulen afirmou: “É possível que estejamos perante um golpe montado a fim de justificar mais acusações”.
Inépcia ou engano?
Os militares chegaram a atacar a sede do Parlamento(*) e um helicóptero disparou contra os populares que vieram para as ruas protestar. Houve também aparentes tentativas de controlar a rádio e a televisão, mas – espantosamente! – a internet continuou a funcionar e foi através dela (FaceTime) que Erdogan se dirigiu aos seus apoiantes para virem para as ruas resistir.
Se a tentativa de golpe foi genuína, os militares envolvidos deram provas de grande descoordenação e inépcia, mais parecendo estarem a executar um acto desesperado do que uma acção bem pensada e planeada. E no momento da verdade parece não terem tido estômago (ao contrário do general Al-Sisi, no Egipto, em 2013) para enfrentar e reprimir em grande escala a população que protestava.
Ainda assim, dos confrontos resultaram quase três centenas de mortos, mais de cem entre os próprios militares, que baixaram as armas e passaram a ser perseguidos e atacados pelos populares.
Mas também não é de excluir que muitos dos membros das forças armadas envolvidos tenham sido induzidos em erro quanto à finalidade da operação. No sábado, alguns afirmaram terem sido enganados, dizendo que antes de saírem dos quartéis lhes comunicaram que se tratava de um simples exercício…
Uma “dádiva dos céus”
Real ou fictícia, a aparente tentativa de golpe conferiu a Erdogan um pretexto suplementar para intensificar a perseguição aos seus adversários que, numa espécie de golpe de Estado larvar, vem promovendo desde 2013, quando ainda primeiro-ministro, reprimiu violentamente as manifestações contra um polémico projecto urbanístico numa das praças centrais de Istambul.
Quando, em Dezembro desse mesmo ano, rebentou um escândalo de corrupção em que estariam envolvidos membros da sua própria família (um esquema em que eram violadas as sanções americanas contra o Irão), Erdogan fez saneamentos em massa no aparelho de Estado, em particular na polícia, ministério público e judiciário e praticamente suprimiu a liberdade de expressão e de imprensa no país. A Turquia é o quarto país do mundo com mais jornalistas presos.
Por outro lado, Erdogan voltou a reprimir severamente o movimento pela autonomia dos curdos, ao mesmo tempo que intensificava a participação do país na guerra da Síria (de facto contra os curdos e resistentes ao Daesh...), o que levou à reação dos islâmicos radicais, traduzida em sucessivos atentados terroristas.
Criou-se assim um clima de grande tensão e medo, com o país cada vez mais radicalizado e muito dividido entre os incondicionais do presidente e os seus adversários, quase em proporções idênticas.
Agora, real ou fictícia, a tentativa de golpe confere a Erdogan uma oportunidade de ouro (“uma dádiva dos céus”, na sua própria expressão) para intensificar o seu domínio, afastando o que resta da oposição no aparelho de Estado e criando no país um clima de intolerância, em que não há mais adversários, mas apenas inimigos e que em toda a oposição é tratada como um vírus que precisa de ser extirpado.
Desde que os militares regressaram aos quartéis, já foram detidas mais de 6000 pessoas e as autoridades estão inclusive a pensar alterar a lei para permitir a pena de morte para os golpistas, o que constituiria violação do princípio básico da não retroactividade do Direito. Também no sábado foram afastados quase três mil magistrados, incluindo pelo menos um do Supremo Tribunal. O objectivo parece ser o de substituir o regime parlamentar vigente por um regime presidencialista (absoluto/ ditatorial), em que todo o poder estaria concentrado nas mãos do chefe de Estado.
Depois da caça às bruxas e da limpeza radical da administração pública agora em curso, com as vozes da oposição silenciadas, Erdogan conta ter o caminho livre para fazer aprovar essa viragem, seja por votação no Legislativo, seja por via de um referendo, que no clima exacerbado actual certamente teria facilidade em ganhar.
Afastada durante largos anos do poder pelos militares de inspiração laica que seguiam a linha do fundador da República, Mustafa Ataturk, uma massa mais conservadora de (muçulmanos) religiosos praticantes acabou por ver-se representada nos políticos do AKP – Partido Justiça e Desenvolvimento – que se tornou, na última década, a força dominante da política turca, obtendo sistematicamente entre 40 a 50% dos votos. Erdogan (líder do AKP) apresentou-se inicialmente como um conciliador, procurando o justo equilíbrio entre a religiosidade intrínseca do país e os princípios da democracia, chegando por isso a ser visto no plano internacional e em particular na Europa como o homem capaz de conciliar Islão e liberdade. Daí, também, a possibilidade admitida pela União Europeia de – contra toda a história do continente, feita de séculos de confronto com o império turco – um dia vir a incluir a Turquia nas suas fileiras.
Mais fácil dizê-lo, no entanto, do que concretizá-lo. A ideia – fomentada por razões estratégicas pelos Estados Unidos – sempre desagradou a algumas elites europeias, em particular na França, e agora, com a deriva autoritária de Erdogan, esses planos parecem cada vez mais remetidos para as calendas gregas. (...)
Faça parte duma luta crucial. Movimentos Cívicos e de Defesa dos Direitos Humanos e do Ambiente sofrem uma grande ameaça. Governos em todo o mundo têm aprovado leis para proibir mobilizações e fechar organizações não governamentais (ONGs pacíficas). É um momento de repressão tão grande da sociedade civil como nunca antes nesta geração. A equipe da Avaaz* foi expulsa do Egito. E, na Índia, a maior democracia do mundo, a Avaaz foi difamada e perseguida pelo governo. O poder da Avaaz está na união de nossas vozes. Caso nosso trabalho seja considerado ilegal ou nossas estratégias sabotadas pelos governos, estamos perdidos! É hora de lutar contra esse ataque. Temos um plano robusto para proteger a democracia, que consiste em formar uma equipe de advogados global para defender os grupos mais vulneráveis de nossa comunidade. A verdade é que, na luta entre os indivíduos/ cidadãos e o poder (governos e oligarquias financeiras e grandes empresas), os indivíduos raramente contam com bons advogados, pois não conseguem arcar com os altos custos. É aí que entramos: a Avaaz já tem uma pequena equipe jurídica de primeira classe. Se formarmos a maior e melhor equipe jurídica em defesa da democracia do mundo, juntos conseguiremos desafiar leis repressivas no momento em que elas forem propostas, para depois contestá-las nos tribunais e enterrá-las de uma vez. Basta clicar nos links abaixo para doar o equivalente a uma refeição e assim ajudar a Avaaz a enfrentar os poderosos nos tribunais em todo o mundo e proteger nossa liberdade.
Nos últimos três anos, mais de 60 países aprovaram leis que intimidam grupos não-governamentais. Na Espanha, membros da Avaaz podem ser multados em até 600 mil euros por organizar um protesto pacífico. Em Israel, um projeto de lei ameaça rotular as organizações de direitos humanos como "agentes estrangeiros"(...), e cortar seus fundos internacionais. Em Uganda, um órgão do governo poderá em breve desmantelar quaisquer grupos que não sigam a mesma ideologia do governo. Sabemos que a atuação jurídica da Avaaz funciona. Quando a África do Sul tentou censurar nossa campanha contra o comércio de ossos de leões, levamos o governo à justiça e ganhamos um caso de liberdade de expressão inédito, que estabeleceu um padrão para todo o país. Com apoio suficiente, juntos podemos: Expandir nossa equipe de advogados para garantir que teremos a melhor equipe defendo a Avaaz em caso de ataques.
Criar um banco de dados dos melhores advogados de direitos civis do mundo, e unindo-os em uma frente jurídica global pró-democracia.
Fazer uso de ações judiciais, e desafiar juridicamente e com campanhas aqueles oponentes que tentarem atrapalhar a atuação da Avaaz.
Estas novas leis retrógradas mostram que os políticos temem a força das pessoas. Não podemos permitir o esmagamento de cidadãos informados e organizados, parte fundamental da democracia. Não vamos permitir que eles nos tirem do nosso foco -- vamos enfrentá-los com coragem e determinação. Basta clicar abaixo para fazer uma doação para criar uma equipe global de advogados da Avaaz, dando ainda mais força política ao nosso movimento:
Em alguns momentos, é preciso arriscar e LUTAR para preservar a essência das liberdades democráticas. Foi o que fizemos ao enfrentar os poderosos barões da imprensa/TV da Inglaterra e os comparsas do governo no Canadá. Se conseguirmos arrecadar o suficiente, poderemos continuar lutando contra aqueles que tentam nos silenciar (que pisam a cidadania e oprimem os povos) em todos os lugares do mundo. Com esperança e determinação, Emma, Alice, Ricken, Alex, Bert, Laila e toda a equipe da Avaaz P.S. Se você é um advogado que quer ser colocado no banco de dados da equipe de defesa jurídica global, clique aqui.
... ... * Avaaz é uma rede de campanhas global de 41 milhões de pessoas que se mobiliza para garantir que os valores e visões da sociedade civil global influenciem questões políticas nacionais e internacionais. ("Avaaz" significa "voz" e "canção" em várias línguas). Membros da Avaaz vivem em todos os países do planeta e a nossa equipe está espalhada em 18 países de 6 continentes, operando em 17 línguas. Saiba mais sobre as nossas campanhas aqui, nos siga no Facebook ou Twitter.
O estado de coma a que foi levada uma estudante numa praxe em Faro traz de novo esse fenómeno para a ribalta mediática. No caso, ela foi enterrada na areia de uma praia e forçada a ingerir álcool nessa situação. Porém, mesmo que não aconteçam desfechos com essa gravidade, o que se vê nas praxes é de ano para ano mais assustador. Nem que seja por se irem acumulando as manifestações de algo que apenas encontra num certo de tipo de violência política a sua justificação social e psicológica.
Ao final da tarde, quando não chove, percorro uma parte da cidade onde estão próximas várias universidades, faculdades e institutos superiores. Nesse trajecto, atravesso a pé diferentes zonas verdes. No período das praxes, o qual agora dura todo o ano só variando na intensidade, observo diariamente as macacadas e cenas tristes que os diferentes cursos organizam em espaços públicos, fora do perímetro das suas instituições de ensino. A percepção que registo é a de o ambiente ser cada vez mais militarizado, vendo-se os praxistas a passearem-se ufanos na sua farda medonha e ridícula como se estivessem num quartel e expressarem-se por gritos e ameaças copiados de contextos onde há abuso de poder.
Nada disto tem a ver com o que foram as praxes outrora, na sua versão pedagógica levando a brincadeiras dentro da sala de aula (alunos finalistas a passarem-se por professores, por exemplo) e na sua versão carnavalesca não passando de uma festa antecedida de palhaçadas inócuas (pinturas, ovos, farinha). Agora, o que está em causa é verdadeiramente sinistro no seu plano simbólico. Num contexto de sexualização animal e humilhação moral dos alunos por outros alunos, o que se transmite é uma associação entre a vida académica e uma atitude de conformismo obnóxio e revanchista.
Creio que nunca foi feito, mas teria supino interesse conhecer as práticas e preferências políticas desta elite assim iniciada na vida adulta.
Adolescente, li "Porta de Minerva" um livro da autoria de Branquinho da Fonseca onde a descrição da vida estudantil de Coimbra me fascinou... e assustou porque nunca percebi a razão pela qual um estudante universitário tinha que limpar as botas dos seus colegas, apenas por ser mais novo e ter acabado de entrar na "academia"!...
Depois, com o 25 de Abril, percebi que o ritual das praxes se constitui como a institucionalização do reconhecimento da legitimidade da hierarquia, independentemente do saber, do mérito e da justiça, apenas enquanto respeito -expressão do MEDO !- legitimador de uma ordem sem fundamento -como o seria o direito hereditário ao exercício do poder. Pior um pouco : os líderes das "praxes" académicas adquirindo esse estatuto por "antiguidade", ao invés de promoverem o direito ao reconhecimento do saber, da inteligência ou ao conhecimento materializam, isso sim, o reconhecimento do direito à preguiça e ao autoritarismo gratuito. Por tudo isso, não cumpri praxes, "queimas das fitas" ou similares... Para mim, a vivência universitária implicava a autonomia do pensamento crítico e o afastamento definitivo da obediência cega e da submissão gratuita e acéfala -ainda que mascarada sob a lógica do humor, da "brincadeira", etc... Hoje, perante a notícia e a especulação da morte de 7 jovens na praia do Meco fica, à reflexão de todos, o problema... e a opção por um mundo mais racional, sério, justo e responsável... para todos! Contra a hierarquia gratuita do poder, sem escrúpulos e sem legitimidade a não ser aquela que nós, cidadãos, livres e inteligentes, lhe reconhecemos... ou não !
Se continuarmos a admitir as praxes – na Escola e na Vida – não me admira que, muito em breve, um novo Hitler seja eleito democraticamente, em Portugal.
Em 1967, um aluno de Ron Jones (jovem professor de História californiano) perguntou como era possível que @s alemãxs tivessem eleito e seguido Adolph Hitler. O professor respondeu criando um estado fascista virtual dentro do seu instituto (ver documentário em baixo). O seu objectivo era afastar alunxs dos atractivos do totalitarismo-aliado-à-necessidade-de-sentimento-de-pertença-a-um-grupo. Desta forma, pôs em funcionamento uma audaz experiência social que superou as suas melhores expectativas, ou melhor, os seus piores pesadelos.
Xs estudantes envolvidxs, 30 no princípio, passaram a ser 200 – fervorosxs seguidorxs do “movimento”! Entre elxs cumprimentavam-se de uma forma específica e havia uma série de informadorxs que agiam como membros da Gestapo (a toda-poderosa polícia política nazi) … Era, em suma, uma fiel recriação das raízes do Terceiro Reich (regime nazi na Alemanha, Austria e ...).
Esta experiência, denominada “Terceira Onda”, foi um simples episódio na história de uma escola mas serve como um alerta permanente.
Em Portugal esta experiência ocorre todos os dias, de Norte a Sul, mas não é virtual e ninguém lhe põem um fim (por enquanto): chama-se Praxe!
O meu conselho é: na praxe e na vida, sê a pessoa destacada na foto (no círculo, o único que não faz a saudação nazi ! ). Porque umx a umx, em breve, seremos muit@s!
----- Bandeira grega subiu ao Castelo de São Jorge(:infogrecia5/7/2015)
As ações de solidariedade com a Grécia prosseguem por toda a Europa. Este domingo, um grupo de ativistas do movimento “Eu Não me Vendo.pt” colocou a bandeira da Grécia no cimo do Castelo de São Jorge, em Lisboa. A acção sublinha o direitos dos povos das nações da Europa a decidirem o seu futuro. Todos temos direito a decidir sobre as políticas que condicionam gerações de pessoas. A soberania é do povo e não é da casta, do governo de Berlim, dos eurocratas de Bruxelas, e do capital financeiro especulador.
.Numa sessão que encheu o Fórum Lisboa, personalidades de vários quadrantes políticos expressaram a sua solidariedade com o povo grego na resistência à brutalidade de uma União Europeia que se transformou “numa ditadura sobre as democracias”.
“A crise europeia aos olhos da Grécia”. ...
-- José Reis: “Declaro-me dissidente desta Europa punitiva”... denunciou que o “projeto europeu foi usurpado por políticos autoritários” que deixaram “uma Europa desfeita por instituições sem cultura nem projeto”. ... propondo “o início de uma nova construção europeia”, assente na paz, no emprego e nos direitos sociais. “A minha ambição europeia tem a voz da Grécia”, sublinhou.
-- Marisa Matias: “Os extremistas não estão no governo grego, estão nas instituições da troika” ... defendeu que “se uma União Europeia no seu funcionamento normal não comporta um governo de esquerda, já não é um projeto que interesse. ...Contra esta “Europa do partido único, que é a antítese da Europa plural e diversa”, cabe aos democratas “mandar abaixo este regime”. ... Ficaram preocupados quando nas eleições ganhou um partido fora do arco da corrupção”.
-- Eugénio Rosa: “É melhor ser livre um dia que andar de cócoras e submisso toda a vida” ... as exigências dos credores “uma ofensa à dignidade”, perguntando “como é possível uma interferência tão grande com os eurocratas a definirem o imposto da eletricidade que os gregos têm de pagar”. E criticou os responsáveis políticos portugueses por espalharem a “mentira” de que Portugal está a salvo de qualquer contágio, ... Quem paga em ultima instância são os contribuintes”. ...a sua economia e sociedade devastadas nos últimos anos. ...o funcionamento do euro condena os países periféricos à austeridade perpétua, enquanto a Alemanha lucra com a moeda única com saldos positivos na balança comercial. ...
-- Hélia Correia: “Alguma coisa começa a ligar-nos ao passado da Grécia: é a dignidadede um povo” ...lendo parte de um “texto com 2500 anos”, o relato de Túcidides do discurso de Péricles sobre a distinção de Atenas em relação aos outras civilizações. “Como amiga da Grécia apetecia-me fazer como Lord Byron e partir para combater ao lado dos gregos pela sua libertação. Mas hoje é difícil fazer o mesmo porque não sabemos contra quem dar os tiros”, lamentou. ...um processo de desumanização nos últimos anos. ... o que nos aconteceu? E como aconteceu?”. “Quando ouço falar o Syriza a dizer que o povo é que manda ali, ...
-- Freitas do Amaral: “A União Europeia passou a ser ‘uma ditadura sobre democracias’” ... defendeu ter sido “um grave erro da Europa, e de Portugal, não ter respeitado, minimamente, a vontade do povo grego” quando elegeu o Syriza para governar em janeiro. “É difícil de acreditar que em todas as reuniões de Bruxelas o resultado tenha sempre sido de 18-1. Onde estão os moderados? Onde estão os membros da Internacional Socialista? Onde os poucos Democratas Cristãos que ainda restam?”, perguntou. “A inflexibilidade negocial de Bruxelas, e os sucessivos “diktats” de Berlim, mostram que a U.E. passou a ser “uma ditadura sobre democracias”! Há que combater isso, enquanto é tempo”, ... “Só ... não querem ver, e têm raiva a quem já percebeu tudo!”,... o aproximar de um “momento perigoso” para o mundo exige “coragem e lucidez”, e não “cobardias e cegueiras ideológicas”.
-- Francisco Louçã: ...falou do efeito da crise grega para a Europa, numa altura em que “Sarajevo e Versalhes são evocados para falar da Grécia e ao mesmo tempo nos dizem que o que os separa é pouco: um quinto do BPN ou 20 Gaitans”. “A Europa ficou gelada com o referendo” e entrou “em modo de golpe de estado”, ... pondo em contraste a ajuda aos bancos espanhóis e irlandeses com a decisão de Draghi para fechar os bancos gregos. “O mais grave é que eles sabiam de tudo” sobre o fracasso da austeridade, dando o exemplo do relatório agora divulgado pelo FMI a dizer que sem 20 anos de carência no pagamento da dívida e uma grande restruturação não há nenhuma possibilidade de pagar a dívida. “As autoridades gregas ignoraram a crueza dos adversários, para quem a legitimidade democrática nunca é um argumento. Nesta Europa de partido único só há lugar para partidos de correia de transmissão”, resumindo a “única regra do euro: quanto pior melhor”. “Temos um Reich por 20 anos que é o tratado orçamental”, acusou, rejeitando os argumentos dos que à esquerda ainda dizem querer reformar a Europa. “No tempo da crise grega finaram-se as meias palavras: ... Ou a esquerda se redefine contra a submissão ou será submissa. ...
-- Manuel Alegre: ... contra as ameaças de Berlim e Bruxelas, que “querem que os gregos ajoelhem para que fique claro que não pode haver alternativa”. “O problema já não e só a austeridade, mas a liberdade”, ... “já havia orçamento com visto prévio, mas agora também há visto prévio de Bruxelas aos governos que são eleitos”. ...“uma vergonha” a posição do governo português e do Presidente da República sobre o que se está a passar na Grécia. “Substituem a razão de Estado pelo seguidismo perante os que mandam na Europa”, acusou. Os socialistas europeus também não ficaram de fora das críticas: “A crise da Europa é a crise da Internacional Socialista e dos que sedizem socialistas (ou social-democratas) e estão a permitir esta vergonha que está a ser feita”, ... “O medo está a progredir mas a história não acaba aqui. A Grécia já nos deu uma lição de dignidade. E só por isso a Grécia não será vencida”.
-- Pacheco Pereira: “Os gregos podem falhar, mas resistiram” em nome da dignidade e do seu país. ... falou de patriotismo com paralelos em acontecimentos históricos: os conjurados de 1640, os colonos americanos em 1765 ou a resistência francesa em 1940. “Todos eles escutaram os apelos à razão, todos ouviram ameaças”, mas todos eles lutaram contra a realidade que lhes impunham como inevitável. “Portugal devia ser o único sítio onde o meu voto manda. Mas andam a encolher o meu voto e cada vez manda menos”. “Por isso o destino dos gregos não é indiferente. Houve um governo que resistiu a cortar mais salários e pensões e defendeu o seu país de ser controlado por estrangeiros, esses tecnocratas pedantes que são os adultos dentro da sala”, ... não esquecendo “os socialistas que acham que são membros suplentes do Partido Popular Europeu”.
----- E (os gregos) não desistem (Troika irritada: "Há mais de 2000 anos... que os Gregos 'merdam' o mundo com a sua democracia")
Excertos de um importante texto de Manuel Loff, no Público de hoje:
«É tão importante perceber como se transita de uma ditadura para uma democracia como o inverso. Os processos de degradação dos estados liberais (/pré-democratas), em transição para o autoritarismo, podem ser rápidos e bruscos (como o português, de 1926: "Estado Novo", 'corporativista'/ fascista, salazarento), ou graduais, nos quais a ditadura se institucionaliza gradualmente a partir de dentro de sistemas que se descrevem como democráticos (como o italiano, em 1922-26, Fascista, ou o alemão, com Hitler, em 1930-33, nacional-socialista/Nazi), nos quais se percebe, como na metáfora de Ingmar Bergman, a serpente dentro do ovo. Mas será que conseguimos mesmo perceber quando, apesar de não se mudar o nome, acaba a democracia e se instala o autoritarismo?
Do nosso lado do mundo, gosta-se de dizer que os novos autoritarismos estão na Rússia, na Venezuela, na China, mas o que emerge das revelações de Assange e de Snowden é que também nós vivemos em sociedades que se dizem democráticas mas que estão sujeitas a condições de vigilância e de controlo totalitários. (...)
70 anos depois da libertação de Auschwitz, o fundamento dos regimes em que vivemos é ainda a rejeição radical do fascismo e do racismo? A ilegitimidade de toda a dominação colonial? O reconhecimento de que não há liberdade sem bem-estar, de que não há democracia sem direitos sociais, sem igualdade efectivaentre homens e mulheres, com discriminação legal ou social de minorias étnicas ou de orientação sexual? Não. Já não somos herdeiros de 1945. Desde que Thatcher proclamou que a “sociedade” era “uma invenção marxista”, e que, pelo contrário, nas relações sociais só existem “indivíduos”, começou, apesar de todas as resistências, a des-democratização, a inversão do caminho aberto em 1945.
Retomou-se o caminho da desigualdade. As relações sociais no Ocidente voltam a estar saturadas de racismo e de xenofobia; ainda que não tenham nunca desaparecido, voltam a ser assumidos abertamente por governos, polícias, instituições, empresas, umas vezes em nome do que sempre se invocou para colonizar e/ou reprimir (a luta contra o terrorismo e a barbárie), outras invocando-se o mercado, sacralizado, para justificar condições de trabalho próximas da escravatura, a contaminação do planeta ou a expulsão populações do seu habitat. Se, durante uns 30 anos, até ao fim dos anos 70, maiorias esmagadoras de eleitores reconheciam a utilidade do voto e forçaram a mudanças muito práticas nas suas vidas colectivas, hoje qualquer Governo diz ser legítimo (exactamente como há cem anos atrás, quando poucos tinham o direito de voto) mesmo que tenha tido o apoio de uns 20% dos inscritos, desde que a engenharia eleitoral em vigor invente maiorias absolutas a partir da abstenção maciçadaqueles a quem se ensinou que não há alternativa.
A história, contudo, não acaba aqui. É que, como se viu, também não acabou quando a Europa inteira achou que Hitler tinha ganho a guerra e que o fascismo era o fim da História.»
O Observador revela, finalmente, ao que veio: (tentar) implodir a Constituição vigente, abrindo caminho para um novo modelo de sociedade, à la Compromisso Portugal, em que o Estado Social será uma longínqua miragem.
Para o efeito, pretendem lançar um “debate constitucional”. E o atrevimento chega mesmo ao ponto de se arvorarem em Assembleia Constituinte, prometendo a elaboração de uma nova Constituição, feita pelo próprio Observador. Sim, é isso mesmo, leu bem: há um jornal online que pretende elaborar uma nova Constituição para Portugal.
E que Constituição será essa? A aferir pelo tom absolutamente tendencioso, enviesado e ideologicamente carregado com que atacam e questionam o atual texto constitucional, podemos esperar o pior.
Para já, como que para preparar terreno, o Observador foi buscar cinco jovens constitucionalistas e encomendou-lhes um projeto de revisão constitucional. Só que – oh azar dos Távoras – os cinco jovens convidados a fazer o frete constitucional acham que «NÃO, a Constituição não precisa de ser revista».
Nada que detenha a agenda constitucional do Observador, claro está. Por ora, segue o projeto de revisão constitucional (que não é necessário, mas sempre abre caminho ao verdadeiro objetivo). Depois – oh, sim, depois – virá a nova Constituição, certamente assinada pelo reputado constitucionalista José Manuel Fernandes.
Enquanto não nos chega essa bela peça jurídica, centremo-nos nalgumas das 13 grandes alterações para já propostas:
1- Redução do elenco de direitos sociais e desconstitucionalização do respetivo financiamento, exceto no caso da educação.
Aqui, não se engana ninguém. O objetivo é mesmo estraçalhar o Estado Social, designadamente secando-lhe as fontes de financiamento e eliminando assumidamente da Constituição a tendencial ou progressiva gratuitidade dos sistemas de saúde e de educação (para lá do ensino obrigatório).
Acresce que o verdadeiro efeito desta alteração seria uma redução da proporcionalidade e, portanto, o afastar da Assembleia da República de alguns pequenos e incómodos partidos, reforçando o centrão.(de interesses e ...)
11- Redução dos órgãos com legitimidade para pedir fiscalização da constitucionalidade abstrata.
Na verdade, o que se pretende é acabar, pura e simplesmente, com a fiscalização preventiva da constitucionalidade (sim, acabar com a possibilidade de fiscalização preventiva, por iniciativa do Presidente da República) e limitar enormemente a fiscalização abstrata sucessiva da constitucionalidade das leis, que passaria a poder ser desencadeada unicamente pelo Provedor de Justiça. É o "faroeste", portanto: um sistema em que praticamente não há fiscalização do cumprimento da lei (e não é uma lei qualquer, é a lei fundamental do Estado!), tendo o legislador (governo centrão) tem carta branca (ou quase) para ignorar a Constituição.
13- Redução da hiper-rigidez da Constituição, flexibilizando as normas sobre a revisão constitucional.
Primeiro, restringem-se gravemente as vias de fiscalização e repressão das violações à Constituição. Depois, abre-se o campo para a própria mudança do texto constitucional. Em suma, retira-se força jurídica e vinculatividade à Lei Fundamental, que passa a estar sujeita a ímpetos e orientações conjunturais. À luz da realidade recente, podemos bem temer o aconteceria à Constituição... (o partido Nazi mostrou como fazer...)
PS: para finalizar, não resisto a destacar apenas dois pequenos momentos de absoluto delírio constitucional por parte do Observador:
Ver também o 'post' de R. Namorado: «A crise da Democracia» ("...Ora, atualmente, a deriva autoritária, trazida no seu bojo pelo neoliberalismo, tem vindo a enfraquecer a democracia política, pela subalternização dos órgãos eleitos, em benefício dos poderes de facto do capital financeiro e seus acólitos. E, em perversa conjugação com essa anemia política crescente, tem bloqueado e contrariado tudo o que de democrático impregnava o sociale tem procurado esconjurar, como pecado mortal, qualquer impregnação democrática da economia. ... ... É, isso sim, o fruto da não extensão da democracia aos aspetos sociais, económicos e culturais da vida em sociedade; e, em conjugação com isso, é também o fruto da corrosão da democracia política pelo agravar da deriva neoliberal sob a batuta do capital financeiro. ...").
A ideologia neoliberal e as práticas do ajustamento da Troica estão a criar as condições para uma nova situação autoritária no país! Vislumbram-se várias práticas, atitudes e comportamentos que pressagiam um neofascismo laboral, cultural e político.
Podemos incluir aqui como indícios dessa cultura algumas práticas sádicas, hierárquicas e dominadoras entre a juventude estudantil, nomeadamente nas praxes académicas e nas relações violentas de namorados. Podemos incluir certos comportamentos de claques desportivas incitadoras de ações violentas.
Ainda mais preocupante é, sem dúvida, o que se passa em algumas escolas onde o bullying e o assédio vitimizam todos os dias crianças, funcionários e professores. Por outro lado, alguns programas de TV, com sucesso popular, desenvolvem sentimentos rasteiros, estimulando a vulgaridade e a superficialidade. Respira-se em vários setores da sociedade um certo amorfismo, uma não crença nas virtudes da democracia e da participação cívica. Luta-se por interesses imediatos e individuais e parece que poucos querem saber do chamado «bem comum».
Mas é no mundo das relações laborais onde mais cresce esse neofascismo, incluindo na Administração Pública! O assédio moral, a bajulice, o autoritarismo puro e duro, bem como o medo de ser despedido crescem de forma assustadora! Concomitantemente cresce o discurso e a prática antissindical nas empresas e na comunicação social. Desprestigia-se o sindicalista falando dele como um «pau mandado» dos partidos! Envia-se a mensagem para toda a organização que a militância sindical não é boa para quem quer fazer carreira. Os documentos sindicais são sonegados por chefias e por colegas, não se coloca placard para a informação sindical e criam-se outros constrangimentos. Pratica-se formalmente a lei fazendo de conta que se ouvem as organizações de trabalhadores, mas verdadeiramente não se ouvem!
O que mais impressiona é que estas práticas não são apenas apanágio de gestores e dirigentes da direita política! Inclui dirigentes e gestores que votam ou militam em organizações de esquerda. Isto significa que a cultura da repressão e do autoritarismo está a ser abrangente e pode, tornar-se, ou já é, dominante! Esta questão merece uma profunda reflexão! Até que ponto a cultura democrática e participativa está a perder terreno no nosso país e na Europa? Como enfrentar esta questão que está no coração de qualquer mudança profunda da sociedade? A cultura autoritária e opressiva apenas interessa ao capitalismo e á desigualdade social!
Numa entrevista ao jornal Publico, em 2010,o investigador e psicanalista Christophe Déjours afirmava o seguinte: «A avaliação individual é uma técnica extremamente poderosa que modificou totalmente o mundo do trabalho, porque pôs em concorrência os serviços, as empresas, as sucursais - e também os indivíduos. E se estiver associada quer a prémios ou promoções, quer a ameaças em relação à manutenção do emprego, isso gera o medo. E como as pessoas estão agora a competir entre elas, o êxito dos colegas constitui uma ameaça, altera profundamente as relações no trabalho: "O que eu quero é que os outros não consigam fazer bem o seu trabalho."
Ora, esta afirmação de um tão conhecido cientista toma hoje outra importância quando o governo e os patrões portugueses pretendem introduzir a avaliação do desempenho individual como primeiro critério para despedir o trabalhador! Caso esta proposta vingue poderemos imaginar o que significa para as relações entre os trabalhadores. Não se trata apenas de concorrência para ganhar prémios ou promoções mas de ir para a rua na vez do companheiro!
Com esta medida, para além de se permitir o livre arbítrio patronal, acrescenta-se mais uma gota de veneno no mundo laboral, acabando por destruir a coesão e o que resta de solidariedade e cooperação entre colegas de trabalho. Mas contestar a panaceia da avaliação do desempenho não é fácil neste momento em que reina a ideologia da concorrência e do "mérito", uma filosofia da competição e não da cooperação!
Parece que a qualidade dos serviços e dos produtos se atinge desta maneira. E a qualidade do ser humano? E a dignidade do trabalho? E a vivencia democrática? E a responsabilidade, o rigor e empenhamento no que se faz?
A avaliação do desempenho não responsabiliza. Desenvolve o medo a agressividade! São duas visões antagónicas. Uma que considera o mundo um grande campo de batalha onde cada um deve competir e derrotar o outro, e outra visão que considera que a humanidade apenas tem futuro com uma cultura humanista, de cooperação social e com a natureza, procurando a felicidade de todos e não apenas de uma minoria competitiva e predadora. Uma luta que ultrapassa gerações ! Não se pode aceitar que a avaliação sirva para despedir. Não apenas porque quase não existe tal dispositivo nas empresas, mas porque fundamentalmente é um mecanismo que envenena e corrompe a organização do trabalho e a cultura solidária dos trabalhadores.
Cleptocracia- governo de/por ladrões (+corruptos e nepotistas) (-por F.Castro, 21/5/2011)
... O pessoal continua a dizer que se se baixarem os impostos (às empresas e ao capital) e se desregulamentar os mercados a crise passa, os empresários ganham dinheiro e criam empregos, pagam salários e a economia dispara. [A teoria neo-liberal da treta do "chuveiro" foi iniciada por Reagan (e Thatcher no RU, depois seguida por Blair, ...), e logo desde aí näo criou mais que bolhas especulativas, crises, privatizações, desregulamentação e crescimento exponencial das desigualdades e problemas sociais.] Há 35 anos que eles dizem isto (esta mentira muito propagandeada por 'Chicago boys', universidades, fundações/'thinktanks', agências de rating, grupos de mídia, grandes empresários, políticos de direita, ... troika) e há 35 anos que o poder de compra das famílias vai baixando, enquanto os ricos vão ficando mais ricos. Parece-me que a coisa é mais simples: a) os ricos compram os políticos; b) os políticos baixam-lhes os impostos e dizem-nos que não há dinheiro e que temos de apertar o cinto; c) os ricos empregam-lhes os filhos.
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A Bosnia-Herzegovina (B-H) é o exemplo de um Estado "complicado" em que a situação política/ administrativa esconde e 'branqueia' a situação económica/social em degradação e que esta provocou/ agravou os conflitos internos. Politicamente a B-H compreende: a Federação da B-H, com 10 cantões; + a Rep. Servia da B-H, separada em 2 zonas laterais com vários distritos.
B-H é uma amostra do que era a ex-Federação da Jugoslávia, que tinha regime 'socialista não-alinhado' em convivência multicultural pacífica, e que, após a morte do presidente Tito, em nome da «democracia e liberdade económica neo-liberal» foi 'sabotada e invadida' pelos EUA e UE para a trazer para a sua esfera de influência e domínio económico, favorecendo determinadas facções/partidos, caudilhos e governantes fantoches, levando-a à guerra civil, ao retalhar dos Estados/territórios e à rapina das suas empresas estatais e recursos públicos.
Mais que a divisão/diversidade 'étnico-religiosa-linguística', a questão actual da B-H (tal como da ex-Y., ou da Ucránia, ...), a razão fundamental é económico-política sendo que a vertente político-diplomática-militar está ao serviço de grandes bancos privados e empresas multinacionais ('corporations') ligadas ao armamento, reconstrução, minérios, energia, transportes, imobiliário, ... com muitos agentes-antenas e fantoches locais, campeões da (des)informação/propaganda, controlo dos mídia, lobbying e corrupção, intermediários de contratos 'leoninos' , privatizações/saldo e fazedores de legislação 'à medida' de determinados interesses e grupos.
Contra estes predadores/ destruidores do país e interesse comum é que estão a levantar-se/manifestar-se cidadãos e grupos mais esclarecidos e ou atingidos: estudantes, jovens, trabalhadores da classe média e baixa, desempregados e reformados empobrecidos. No meio de tudo isto estão também os partidos locais de esquerda contra direita e neo-nazis, ... com muito populismo, demagogia, 'nacionalismo', radicalismo e pulsões/medidas isoladas ou à mistura.
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Insurreição na Bósnia-H., revisitando a "questão nacional" e a discussão em torno da U.E. (-Francisco, 5Dias, 13/2/2014)
Os motins e amplos protestos em curso na Bósnia e na Ucrânia reforçam as “teses” que expus nesse texto. Uma delas é que a UE, longe de ser um qualquer escudo contra a ameaça fascista, é na verdade a geradora dessa mesma ameaça e, inclusive, chega a ser aliada no terreno de movimentos neo-nazis (aqui, aqui ou aqui).
De naturezas bem diferentes, os protestos na Ucrânia, na Bósnia e na Turquia (tal como no Brasil a onda de protestos do ano passado não se extinguiu) dão a imagem de uma Europa com as periferias em chamas. Este é um sinal de que o domínio/ expansão geográfica da UE atingiu os seus limites. Quanto aos limites políticos, esses serão ser bem visíveis nas próximas eleições europeias. No plano social, o referendo na Suiça e os movimentos de contestação que irrompem em vários países (da Gréciaà Alemanha) dão sinal do profundo mal estar. Até no plano jurídico surgem complicações com o Tribunal Constitucional Alemão.
Algumas exigências na #Bósnia e #Herzegovina: Revisão das privatizações ; Devolver a propriedade roubada ao povo ; Sistema de saúde universal ; Que os salários dos políticos não possa ser mais que duas vezes o salário médio (200€) ; Revogação do sistema de distritos étnicos ; Demissão em massa dos governantes; ... - parece-lhes familiar ?!!
Liberdade no mundo recuou em 2013 pelo oitavo ano consecutivo
(Lusa, 23.01.2014)
O estado da liberdade no mundo declinou em 2013 pelo oitavo ano consecutivo, conclui hoje a organização Freedom House, que destaca ainda o fenómeno do 'autoritarismo moderno', mais subtil e mais eficaz do que o tradicional.
No seu relatório anual, intitulado 'Liberdade no Mundo 2014' e hoje divulgado, a organização de defesa da democracia escreve que no ano passado 54 países registaram declínios das suas liberdades, enquanto 40 tiveram ganhos.
No prefácio do relatório, que analisa as liberdades políticas e civis em 195 países e 14 territórios, como o Egito, a Turquia, a Rússia, a Ucrânia, o Azerbaijão, o Cazaquistão, a Indonésia, a Tailândia ou a Venezuela.
O relatório recorda que o ano ficou também marcado por um aumento da lista de países afetados por guerras civis ou campanhas terroristas sangrentas: República Centro-Africana, Sudão do Sul, Afeganistão, Somália, Iraque, Iémen e Síria.
A organização sediada em Washington alerta no entanto para um fenómeno igualmente relevante: "a utilização de técnicas mais subtis, mas em última análise mais eficazes, por parte daqueles que praticam um 'autoritarismo moderno'". Esses líderes, explica a organização, dedicam-se intensamente ao desafio de estropiar a oposição (e os críticos) sem a aniquilar e de violar do Estado de Direito enquanto mantêm uma aparência de ordem, legitimidade e prosperidade. Para estes regimes, é central capturar as instituições que protegem o pluripartidarismo político e dominar, não só os braços executivo e legislativo, mas também os media, a justiça, a sociedade civil, a economia e as forças de segurança, acrescenta a organização.
"Os nossos dados mostram que nos últimos cinco anos, os mais graves declínios na democracia se deveram a maiores restrições à liberdade de imprensa, aos direitos da sociedade civil e ao Estado de direito", disse Arch Puddington.
"Os limites aos média e ao debate público permitem às pessoas no poder ganhar eleição após eleição através da distorção do ambiente político antes da própria votação", acrescentou. Este fenómeno, escreve a Freedom House, está a vingar em países como o Zimbabué de Robert Mugabe, na Venezuela de Nicolas Maduro, no Equador de Rafael Correa, na Rússia de Vladimir Putin, na Ucrânia de Viktor Yanukovych, na China ou na Turquia.
Apesar do tom marcadamente negativo, o relatório destaca alguns pontos positivos, como a melhoria das liberdades civis na Tunísia, "o mais promissor dos países da Primavera Árabe"; a realização de eleições bem sucedidas no Paquistão; as melhorias em países africanos como o Mali, Costa do Marfim, Senegal, Madagáscar, Ruanda ou Togo.
Além disso, sublinha o relatório, o número de democracias eleitorais aumentou em quatro, para 122, no ano passado, com as Honduras, o Quénia, o Nepal e o Paquistão a alcançarem a designação.
C. Scarllaty: Tudo não passou de uma Golpada de Erdogan para conseguir uma revisão constitucional que o torne único e perpétuo ditador eleito! - ... se analisarmos bem todo o "filme" é por demais evidente. Além disso, os militares que encabeçariam a rebelião... onde estavam? Nunca apareceram!!! - Os soldados foram mandados para a rua ao "Deus dará". (nem procuraram tomar/controlar mídia, infraestruturas estratégicas, ...- foram simples 'peões' enganados e mandadas para 'abate' **- tal como os 'camisas castanhas' nazis depois substituídos pelas SS de Hitler.) Uma conspiração a sério nunca teria esse final, daí que os EUA e a UE tenham vindo deitar logo 'água na fervura'! Demasiado evidente, até para um leigo.
----- É um islamofascista mas é o nosso islamofascista (-j.simões, em 17.07.16, derTerrorist)
O primeiro dia da nova ditadura turca.
[A imagem é da primeira página do La Voz de Galicia]
---- O golpe de Erdogan (-Carlos Fino, 18/7/2016, jornalTornado)
… e levantou até suspeitas de que a aparente tentativa de golpe poderia afinal ter sido montada pelo próprio presidente do país.
Eleito chefe de Estado em 2014, depois de 11 anos consecutivos no poder como primeiro-ministro, à la Pútin, Recep Erdogan embarcou desde então numa deriva autocrática cada vez mais acentuada e pode agora, a pretexto da tentativa de golpe, reforçar exponencialmente o seu poder.
O imã muçulmano Fethullah Gulen, líder do Hizmet (Serviço), um movimento social e religioso com grande influência, que começou por apoiar Erdogan, mas depois se transformou num dos seus maiores opositores, foi um dos primeiros a levantar essa hipótese. Do seu auto-exílio na Pensilvânia, onde se refugiou no final dos anos 90 para escapar da perseguição do regime, Gulen afirmou: “É possível que estejamos perante um golpe montado a fim de justificar mais acusações”.
Inépcia ou engano?
Os militares chegaram a atacar a sede do Parlamento(*) e um helicóptero disparou contra os populares que vieram para as ruas protestar. Houve também aparentes tentativas de controlar a rádio e a televisão, mas – espantosamente! – a internet continuou a funcionar e foi através dela (FaceTime) que Erdogan se dirigiu aos seus apoiantes para virem para as ruas resistir.
Se a tentativa de golpe foi genuína, os militares envolvidos deram provas de grande descoordenação e inépcia, mais parecendo estarem a executar um acto desesperado do que uma acção bem pensada e planeada. E no momento da verdade parece não terem tido estômago (ao contrário do general Al-Sisi, no Egipto, em 2013) para enfrentar e reprimir em grande escala a população que protestava.
Ainda assim, dos confrontos resultaram quase três centenas de mortos, mais de cem entre os próprios militares, que baixaram as armas e passaram a ser perseguidos e atacados pelos populares.
Mas também não é de excluir que muitos dos membros das forças armadas envolvidos tenham sido induzidos em erro quanto à finalidade da operação. No sábado, alguns afirmaram terem sido enganados, dizendo que antes de saírem dos quartéis lhes comunicaram que se tratava de um simples exercício…
Uma “dádiva dos céus”
Real ou fictícia, a aparente tentativa de golpe conferiu a Erdogan um pretexto suplementar para intensificar a perseguição aos seus adversários que, numa espécie de golpe de Estado larvar, vem promovendo desde 2013, quando ainda primeiro-ministro, reprimiu violentamente as manifestações contra um polémico projecto urbanístico numa das praças centrais de Istambul.
Quando, em Dezembro desse mesmo ano, rebentou um escândalo de corrupção em que estariam envolvidos membros da sua própria família (um esquema em que eram violadas as sanções americanas contra o Irão), Erdogan fez saneamentos em massa no aparelho de Estado, em particular na polícia, ministério público e judiciário e praticamente suprimiu a liberdade de expressão e de imprensa no país. A Turquia é o quarto país do mundo com mais jornalistas presos.
Por outro lado, Erdogan voltou a reprimir severamente o movimento pela autonomia dos curdos, ao mesmo tempo que intensificava a participação do país na guerra da Síria (de facto contra os curdos e resistentes ao Daesh...), o que levou à reação dos islâmicos radicais, traduzida em sucessivos atentados terroristas.
Criou-se assim um clima de grande tensão e medo, com o país cada vez mais radicalizado e muito dividido entre os incondicionais do presidente e os seus adversários, quase em proporções idênticas.
Agora, real ou fictícia, a tentativa de golpe confere a Erdogan uma oportunidade de ouro (“uma dádiva dos céus”, na sua própria expressão) para intensificar o seu domínio, afastando o que resta da oposição no aparelho de Estado e criando no país um clima de intolerância, em que não há mais adversários, mas apenas inimigos e que em toda a oposição é tratada como um vírus que precisa de ser extirpado.
Desde que os militares regressaram aos quartéis, já foram detidas mais de 6000 pessoas e as autoridades estão inclusive a pensar alterar a lei para permitir a pena de morte para os golpistas, o que constituiria violação do princípio básico da não retroactividade do Direito. Também no sábado foram afastados quase três mil magistrados, incluindo pelo menos um do Supremo Tribunal. O objectivo parece ser o de substituir o regime parlamentar vigente por um regime presidencialista (absoluto/ ditatorial), em que todo o poder estaria concentrado nas mãos do chefe de Estado.
Depois da caça às bruxas e da limpeza radical da administração pública agora em curso, com as vozes da oposição silenciadas, Erdogan conta ter o caminho livre para fazer aprovar essa viragem, seja por votação no Legislativo, seja por via de um referendo, que no clima exacerbado actual certamente teria facilidade em ganhar.
Mais fácil dizê-lo, no entanto, do que concretizá-lo. A ideia – fomentada por razões estratégicas pelos Estados Unidos – sempre desagradou a algumas elites europeias, em particular na França, e agora, com a deriva autoritária de Erdogan, esses planos parecem cada vez mais remetidos para as calendas gregas. (...)