Quarta-feira, 14.01.15

Deflação    espiral de queda      (-por João Galamba, 12/1/2015)

( boneco rapinado aqui )
    «Na zona euro, se excluirmos a posição Alemã - que, por razões de trauma histórico, vive num mundo monetário e financeiro que é só seu -, parece haver um amplo consenso em torno de dois temas: 1) a deflação é um problema grave; e 2) só o Banco Central Europeu a pode combater. Se o primeiro consenso é positivo, porque a deflação é, de facto, um gravíssimo problema para a zona euro, tenho muitas reservas quanto ao segundo.
    Num contexto de estagnação económica, endividamento elevado e taxas de juro diretoras próximas do zero, a deflação agrava o problema da dívida. Mas é uma ilusão pensar que só o BCE pode inverter a situação, porque, ao contrário do que pensava Milton Friedman, a inflação não é sempre e necessariamente um fenómeno monetário. É o caso atual.
    Delegar no BCE a responsabilidade de combater a deflação, mantendo a atual estratégia de austeridade e 'reformas estruturais', é a garantia de que nada de muito relevante irá acontecer, porque essa estratégia é hoje a maior responsável pelo clima deflacionário que afeta a zona euro. O BCE pode comprar dívida pública, pode comprar dívida privada, pode pensar nas políticas não convencionais que quiser, mas, se nada for feito para aumentar a procura agregada e inverter a atual ideia de que a competitividade pressupõe compressão salarial, o ambiente deflacionário irá, infelizmente, manter-se.
    Quem atribui ao BCE a responsabilidade de combater a deflação devia olhar para o exemplo do Japão, que anda há mais de duas décadas a fazer o mesmo, sem grandes resultados. O máximo que os japoneses conseguiram fazer foi desvalorizar o iene. O BCE tem instrumentos para desvalorizar o euro, gerando, por essa via, inflação. Mas essa inflação será sempre feita por via do aumento do preço dos bens importados, o que diminui o poder de compra dos salários. Mesmo admitindo que a desvalorização do euro pode favorecer as exportações (o que não é inteiramente líquido) não é seguramente dessa inflação que a zona euro precisa.
    O que a zona euro precisa, e rapidamente, é de crescimento nominal dos salários e de procura agregada, ou seja, o que a zona euro precisa é de abandonar o estúpido pacto de Euro Plus (competitividade assente na compressão salarial) e todas as 'reformas estruturais' que lhe estão associadas (desregulamentação do mercado de trabalho para embaratecer o fator Trabalho) e de inverter a atual estratégia orçamental, invertendo, sobretudo, a redução das prestações sociais, a redução do emprego e salários públicos e do investimento público.
    Se nada disso for feito, o problema da deflação nunca será resolvido. 
    E estaremos a alimentar e fazer crescer todos os outros problemas.»


Publicado por Xa2 às 07:48 | link do post | comentar | comentários (1)

Terça-feira, 06.01.15

A chance grega e a salvação da Europa    (-por F. Louçã, 30/12/2014)

tsipras  A Grécia terá eleições a 25 de janeiro e a possibilidade de eleger o primeiro governo de esquerda da história europeia das últimas décadas.

Talvez se possa dizer que o primeiro governo Mitterrand, que era uma coligação entre o PSF e o PCF, no seguimento de dez anos de “união da esquerda”, aplicou uma orientação para a mudança entre 1981 e 1983, quando nacionalizou todo o sistema financeiro e os principais grupo industriais nacionais (imagina hoje um PS a propor tal radicalismo?).   No entanto, esse governo submeteu-se a partir de 1983 a uma política de austeridade e privatização. Ora, isso foi há mais de trinta anos. Desde então, os governos dos partidos de centro seguiram sempre uma orientação financeira alinhada com os interesses dos mercados, sem qualquer excepção em qualquer país europeu.  A Grécia é portanto a primeira oportunidade em décadas para um país da União Europeia escolher uma alternativa de esquerda.

     Isso não significa que o resultado esteja já definido. As próximas três semanas farão reviver os medos ancestrais, as campanhas de terror, as chantagens de todo o tipo, a polarização social. E a pressão internacional: durante as últimas semanas, a Comissão Europeia pronunciou-se em favor do candidato presidencial da direita e o comissário Pierre Moscovici, 'socialista', foi a Atenas reafirmar o mesmo. No sábado passado, em entrevista ao Bild, Wolfgang Schäuble veio garantir que o governo alemão obrigará a Grécia a pagar a conta. “As novas eleições não mudarão nada a respeito da dívida grega”, disse o ministro, para bom entendedor meia palavra basta. O FMI suspendeu os tratos com a Grécia assim que foram anunciadas eleições.

     Os dados estão lançados mas ainda não se pode adivinhar quem ganha. O triunfalismo é portanto tão desaconselhável como o catastrofismo. Se a esquerda vencer, começará um ano vertiginoso: ou a dívida soberana (197% do PIB) é reestruturada em profundidade e com grandes perdas para o capital financeiro, ou a Grécia terá de ameaçar ou de forçar a sua saída do euro. O Syriza quer impor a primeira alternativa e evitar a segunda. Se, em contrapartida, a direita ainda for a tempo de recuperar e vencer, a Grécia prosseguirá a sua vertigem de endividamento e desagregação. Essa é a origem da contradição onde está a força da esquerda: é a única que representa a nação contra o protectorado, mas a sociedade está dividida.

     No mapa político grego, este momento parece irrepetível. O partido socialista, o PASOK, que há quatro anos tinha maioria absoluta no parlamento e 40% dos votos, está hoje reduzido a uma franja e foi agora abandonado pelo seu anterior secretário geral, Papandreu, que forma um novo partido. Comprometido no governo de Samaras, é um resíduo do anterior sistema partidário. A Nova Democracia, o principal partido da direita, aparece atrás do Syriza (esquerda) em todas as sondagens. E os restantes partidos ficam muito à distância: o partido comunista (KKE), o Dimar (uma cisão social-democrata do Syriza e que participou no governo até há pouco), os Gregos Independentes (um partido de direita anti-troika) ou a Aurora Dourada (neo-nazis).

     Caso a Grécia opte pela esquerda, será sem dúvida uma oportunidade difícil, mas ainda mais uma inauguração arriscada. Nenhum governo negociou jamais com as autoridades europeias a partir de uma posição de soberania ou de restrição às rendas financeiras da dívida pública. Nenhum governo enfrentou jamais a autoridade do governo Merkel. Nenhum governo questionou até hoje o Tratado Orçamental e a eternização da austeridade. Para o fazer, o governo de esquerda tem de estar muito bem preparado, ancorado em estudos precisos e planos de contingência detalhados, apoiado pela população e disposto a lutar com todas as consequências. O Syriza ainda não apresentou essas propostas concretas e espera-se que o faça nos próximos dias.

     Creio que isto nos ensina duas lições e nos confronta com uma terceira questão em aberto. A primeira é que só haverá um governo de esquerda quando a esquerda unida tiver mais votos do que o centro: enquanto os partidos que aceitam a troika, a austeridade ou as regras do Tratado Orçamental forem dominantes, não há solução para uma alternativa. A segunda lição, na minha opinião, é que é preciso manter sempre um rumo claro: a esquerda só será mais forte do que o centro se milhões de pessoas fizerem seu o esforço de enfrentar a finança pondo em causa o chicote da dívida, pois essa é a explicação para o ascenso do Syriza. A terceira questão não tem ainda resposta: se tiver o apoio da maioria, o governo de esquerda é capaz de cumprir o seu programa, vencendo então essa maldição de Mitterrand? Não sabemos. Não falhar onde tantos recuaram é uma tarefa ciclópica. Saber para onde ir quando tantos se alimentam de medo e incerteza é um risco acima das possibilidades. E, no entanto, tudo é realizável: não resta mais nada, não há caminhos intermédios, não há meias tintas, não há conciliações possíveis, os de cima não cedem nada e levaram quase tudo.

     Oxalá possamos ter a Grécia a desbravar esse caminho, porque à Europa não restam muito mais chances. Tudo, o poder de Merkel, a unidade da União, as suas leis futuras ou o Portugal de 2015, tudo tem uma primeira volta em janeiro nas eleições gregas. (e depois as portuguesas, ...)

----xxx--- A lição que os gregos nos deram em Termópilas em 480 AC onde derrotando os persas salvaram os valores que estão na base da nossa civilização, lhes dê força e ânimo para mais esta vitória.  ... contra o imperialismo financeiro

---

--- Nova carta à Alemanha  (-por J.Castro Caldas, 4/1/2015)

--- Vem aí borrasca e da grossa   (deflação e nova crise económico-política) (-F.Louçã, 6/1/2015)

--- O BCE resgatará a zona Euro do austerismo alemão ? (A.Gomes, 6/1/2015, Causa nossa) 

---  Um país desordenado   (-por A.P.Fitas, 14/11/2014, A nossa candeia)



Publicado por Xa2 às 19:36 | link do post | comentar | comentários (5)

MARCADORES

administração pública

alternativas

ambiente

análise

austeridade

autarquias

banca

bancocracia

bancos

bangsters

capitalismo

cavaco silva

cidadania

classe média

comunicação social

corrupção

crime

crise

crise?

cultura

democracia

desemprego

desgoverno

desigualdade

direita

direitos

direitos humanos

ditadura

dívida

economia

educação

eleições

empresas

esquerda

estado

estado social

estado-capturado

euro

europa

exploração

fascismo

finança

fisco

globalização

governo

grécia

humor

impostos

interesses obscuros

internacional

jornalismo

justiça

legislação

legislativas

liberdade

lisboa

lobbies

manifestação

manipulação

medo

mercados

mfl

mídia

multinacionais

neoliberal

offshores

oligarquia

orçamento

parlamento

partido socialista

partidos

pobreza

poder

política

politica

políticos

portugal

precariedade

presidente da república

privados

privatização

privatizações

propaganda

ps

psd

público

saúde

segurança

sindicalismo

soberania

sociedade

sócrates

solidariedade

trabalhadores

trabalho

transnacionais

transparência

troika

união europeia

valores

todas as tags

ARQUIVO

Janeiro 2022

Novembro 2019

Junho 2017

Março 2017

Fevereiro 2017

Janeiro 2017

Dezembro 2016

Novembro 2016

Outubro 2016

Setembro 2016

Agosto 2016

Julho 2016

Junho 2016

Maio 2016

Abril 2016

Março 2016

Fevereiro 2016

Janeiro 2016

Dezembro 2015

Novembro 2015

Outubro 2015

Setembro 2015

Agosto 2015

Julho 2015

Junho 2015

Maio 2015

Abril 2015

Março 2015

Fevereiro 2015

Janeiro 2015

Dezembro 2014

Novembro 2014

Outubro 2014

Setembro 2014

Agosto 2014

Julho 2014

Junho 2014

Maio 2014

Abril 2014

Março 2014

Fevereiro 2014

Janeiro 2014

Dezembro 2013

Novembro 2013

Outubro 2013

Setembro 2013

Agosto 2013

Julho 2013

Junho 2013

Maio 2013

Abril 2013

Março 2013

Fevereiro 2013

Janeiro 2013

Dezembro 2012

Novembro 2012

Outubro 2012

Setembro 2012

Agosto 2012

Julho 2012

Junho 2012

Maio 2012

Abril 2012

Março 2012

Fevereiro 2012

Janeiro 2012

Dezembro 2011

Novembro 2011

Outubro 2011

Setembro 2011

Agosto 2011

Julho 2011

Junho 2011

Maio 2011

Abril 2011

Março 2011

Fevereiro 2011

Janeiro 2011

Dezembro 2010

Novembro 2010

Outubro 2010

Setembro 2010

Agosto 2010

Julho 2010

Junho 2010

Maio 2010

Abril 2010

Março 2010

Fevereiro 2010

Janeiro 2010

Dezembro 2009

Novembro 2009

Outubro 2009

Setembro 2009

Agosto 2009

Julho 2009

Junho 2009

Maio 2009

RSS