
Porquê? Porque, entre muitas outras "coisas",
independentemente das "moscas" serem outras,
quem vai continuar a mandar é "Bruxelas".
Infelizmente!
AS TROMBETAS DO PODER (-por J.Pacheco Pereira, Abrupto, 16/2/2015)
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(1)
O "jornalismo" "económico" em Portugal caracteriza-se por
não ser jornalismo. (
nem sério nem económico.) Há alguns jornalistas económicos que não merecem
aspas? Há sem dúvidas, mas são a excepção da excepção. E eles são os primeiros a saber que o são e como são verdadeiras as afirmações que aqui faço. Até porque fazer jornalismo na imprensa económica é das coisas mais difíceis nos dias de hoje. Fica-se sem "fontes", sem a simpatia dos donos e dos anunciantes
e pode-se ficar sem emprego. (que é
precário ou estagiário explorado, e daí também a
auto-censura, ameaças, assédio, ...)
A maioria que escreve na
imprensa "económica" fá-lo entre páginas e
páginas feitas por agências de comunicação, artigos enviados por auditoras e escritórios de advogados, fugas "positivas" de membros do Governo. Quase tudo
é pago nessa imprensa, mas esse pagamento não é o salário normal do jornalismo, mas o seu "modelo de negócio",
"vender comunicação" como se fosse jornalismo. É pago por
empresas, associações de interesse, agências de comunicação e marketing, por sua vez empregues por quem tem muito dinheiro para as pagar.
O
público é (mal) servido por "informação" que não é informação, mas publicidade (propaganda) e comunicação profissionalizada
de agências, dos prémios
de "excelência" disto e daquilo, destinados a
adornar a publicidade empresarial,
páginas encomendadas por diferentes associações,
grupos de interesse e lóbis, nem sempre claramente identificados, anuários sem que
só se pode estar se se pagar, organização
de eventos que
parecem colóquios ou debates, mas não são. Um cidadão que não conheça estes meandros
pensa que o prémio é competitivo e dado por um júri
isento, que as páginas especializadas são feitas pelos jornalistas e que quem é objecto de notícia é-o
pelo seu mérito e não porque uma agência de comunicação
"colocou" lá a notícia, que um anuário
é suposto ter todos os profissionais ou as empresas de um sector e não
apenas as que pagam para lá estar, e que um debate é para
ser a sério, ter contraditório e exprimir opiniões não para a
propaganda governamental ou empresarial. O
acesso ao pódio nesses debates
é cuidadosamente escolhido para não haver surpresas, e os participantes pagam caro
para serem vistos onde se tem de ser visto, num exercício de
frotteurisme da família das filias.
(2) Um dos usos que o poder faz deste tipo de imprensa é a "fuga" punitiva. Dito de outro modo, se o Governo tiver um problema com os médicos, ou com os professores, ou com os magistrados, ou com os militares, aparece sempre um relatório, ou uma "informação" de que os médicos não trabalham e ganham muito, que os professores são a mais e não sabem nada, que os magistrados são comodistas, e atrasam os processos por negligência, e que os militares são um sorvedouro de dinheiro e gostam de gadgets caros. E há sempre um barbeiro gratuito para o pessoal da Carris, ou uma mulher de trabalhador do Metro que viaja de graça, em vésperas de uma greve.
(3) A
luta contra a corrupção, seja governamental, seja empresarial, a
denúncia de "más práticas", os excessos salariais de administradores e gestores, a transumância entre entidades
reguladoras e advocacia ligada à regulação, entre profissionais de
auditoras e bancos que auditavam
e vice-versa, o embuste de tantos lugares regiamente pagos para "controlar", "supervisionar", verificar a "governance" ou a "compliance", para "comissões de remunerações", a miríade de
lugares ("tachos") para gente de estrita confiança do poder (ou a troca de favores e o nepotismo), que depois se verifica que não controlam
coisa nenhuma, nada disto tem um papel central na imprensa económica. A maioria dos grandes
escândalos envolvendo o poder económico foram denunciados pela imprensa generalista e não pela imprensa económica, que é suposto conhecer os meandros dos negócios. A
sua dependência dos grandes anunciadores em publicidade, as (grande) empresas
do PSI-20 por exemplo, faz com que
não haja por regra
verdadeiro escrutínio do que se passa.
(4) Esta imprensa
auto-intitula-se "económica", mas verifica-se que
reduz a "economia" às empresas e muitas vezes as empresas aos
empresários e gestores mais conhecidos. Os trabalhadores, ou "colaboradores", é como se não existissem. Um exemplo típico é Zeinal Bava, cuja
imagem foi cultivada com todo o cuidado pela imprensa económica. Agora que Bava
caiu do seu pedestal, como devemos interpretar as loas, os prémios, doutoramentos honoris causa, "gestor do ano", etc., etc.? A questão coloca-se porque muita da análise aos seus comportamentos como quadro máximo da PT é feita para um passado próximo, em que teriam sido cometidos os erros mais graves. Onde estava a imprensa económica?
A louvar Zeinal Bava, como Ricardo Salgado, como Granadeiro, como Jardim Gonçalves, como…
Até ao dia em que caíram e aí vai pedrada. (5) Dito tudo isto... ...a imprensa económica é uma das poucas boas novidades na imprensa em crise nas últimas décadas. Eu, em matéria de comunicação social, sou sempre
a favor de que mais vale
que haja do que não haja, por
muitas objecções que tenha
ao que "há". Eu não gosto em geral do modo como
se colou ao discurso do poder, servindo-lhe de trombeta, e isso pode vir a ser um problema, até porque esse discurso está em perda e os
tempos de luxo (e 'antena') para o "economês" já estão no passado.
O facto de ter havido um ascenso da imprensa económica ao mesmo tempo que estalava a
sucessão de crises, da crise bancária à crise das dívidas soberanas, impregnou-a do
discurso da moda, encheu-a de repetidores e propagandistas, colou-a ainda mais aos interesses económicos. Abandonou a
perspectiva política, social, cultural, sem a qual a
economia é apenas a legitimação pseudocientífica da política do poder e dos poderosos. Vai conhecer agora um período de penúria, em particular
de influência, e pode ser que isso leve a um esforço introspectivo sobre aquilo que se chamou nos últimos anos,
"danos colaterais", agora que caminha também para essa "colateralidade". ---
(url)
A ideia de que os portugueses são responsáveis pela crise, porque andaram a viver acima das suas possibilidades, é um enorme embuste.
Esta mentira só é ultrapassada por uma outra. A de que não há alternativa à austeridade, apresentada como um castigo justo, face a hábitos de consumo exagerados. Colossais fraudes. Nem os portugueses merecem castigo, nem a austeridade é inevitável.
Quem viveu muito acima das suas possibilidades nas últimas décadas foi a classe política e os muitos que se alimentaram da enorme manjedoura que é o orçamento do estado. A administração central e local enxameou-se de milhares de "boys", criaram-se institutos inúteis, fundações fraudulentas e empresas municipais fantasma. A este regabofe juntou-se uma epidemia fatal que é a corrupção. Os exemplos sucederam-se. A Expo 98 transformou uma zona degradada numa nova cidade, gerou mais-valias urbanísticas milionárias, mas no final deu prejuízo. Foi ainda o Euro 2004, e a compra dos submarinos, com pagamento de luvas e corrupção provada, mas só na Alemanha. E foram as vigarices de Isaltino Morais, que nunca mais é preso. A que se juntam os casos de Duarte Lima, do BPN e do BPP, as parcerias público-privadas e mais um rol interminável de crimes que depauperaram o erário público. Todos estes negócios e privilégios concedidos a um polvo que, com os seus tentáculos, se alimenta do dinheiro do povo têm responsáveis conhecidos. E têm como consequência os sacrifícios por que hoje passamos.
Enquanto isto, os portugueses têm vivido muito abaixo do nível médio do europeu, não acima das suas possibilidades. Não devemos pois, enquanto povo, ter remorsos pelo estado das contas públicas. Devemos antes sentir raiva e exigir a eliminação dos privilégios que nos arruínam. Há que renegociar as parcerias público--privadas, rever os juros da dívida pública, extinguir organismos... Restaure-se um mínimo de seriedade e poupar-se-ão milhões. Sem penalizar os cidadãos.
Não é, assim, culpando e castigando o povo pelos erros da sua classe política que se resolve a crise. Resolve-se combatendo as suas causas, o regabofe e a corrupção. Esta sim, é a única alternativa séria à austeridade a que nos querem condenar e ao assalto fiscal que se anuncia.
Por: Paulo Morais [CM]