Domingo, 07.06.15

Lembram-se daquele sujeitinho checo de nome Kafka?   Afinal «o processo kafquiano» não tem nada de imaginário!   No nosso País, com a bênção deste desGoverno, é tudo bem real!   Duvidam? Leiam p.f.

MEDO  e 'raiva'  é o que o que este país nos inspira!  Uma  distracçãozinha e lá estamos com um problema dos diabos!    E com um (des)governo de fraldas, andamos todos borrados!   Pudesse eu e emigrava !  Sem pestanejar !
---- Carta aberta ao Senhor Ministro da Solidariedade, Emprego e Segurança Social
Lisboa, 29 de Abril de 2015    Exmo Senhor Ministro, Dr. Pedro Mota Soares
 ...     Escrevo-lhe esta carta com uma enorme raiva. Vai, assim, perdoar-me um ou outro termo menos correcto para si, para os serviços do seu  Ministério ou para os políticos e povo português de um modo geral.
    Sou Pai de quatros filhos (um rapaz emigrado e três raparigas), todos  já a viverem fora de casa, com as suas vidas encaminhadas; todos com algumas dificuldades financeiras, uma em "estágios" que duram há dois anos, mas todos trabalhadores esforçados, honestos e cumpridores das suas obrigações com o Estado, com a sociedade onde estão integrados e pagadores de todas as dívidas assumidas. Nenhum tem empréstimos bancários, seja para imóvel, seja para crédito ao consumo. Nunca gastaram mais do que ganham.
    Sou avô de quatro netos e 7/9 de outro que nos vai trazer felicidade a mim e à minha mulher de há 37 anos, juntamente com a minha filha e  genro que esperam o seu terceiro filho.     Ontem, esta minha filha, psicóloga e funcionária autárquica, grávida  de 7 meses com gravidez de risco, com o respectivo subsídio entregue desde Fevereiro pelos serviços que V. Exa dirige, foi a uma farmácia  comprar um remédio para uma doença crónica do seu filho mais velho de 6 anos. O pagamento por multibanco não "passou"... foi a uma 'atm' para levantar o dinheiro e recebeu, pela primeira vez, o recado de que a conta não estava disponível. Conta única pois o marido recebe o seu ordenado nesta mesma conta.
     Deslocou-se ao banco tentando averiguar o que se passava. Resposta  pronta: A Senhora tem a conta congelada por dívida à segurança social!
     Ficou surpreendida e muito envergonhada...
"O quê?! Impossível..." - telefonou para a Segurança Social. Resposta:   "tem uma dívida de 301,56 euros (78,09€ do mês de Abril de 2010,   99,38€ do mês de Outubro de 2010 e 124,09€ de Outubro de 2013 por  mudança de entidade patronal) e acrescem juros ultrapassando já os 700 euros. Marcaram reunião para hoje às 13:30, no atendimento geral da divisão (?) de gestão de dívidas (?).
     Entretanto, em consulta aos documentos que tinha em seu poder, e que a  SS, serviços dirigidos por V. Exa., também tinham, verificou que:
.  Em Abril de 2010 estava de baixa de risco da sua segunda filha, pelo que estava isenta de pagamento à SS!!! Em Outubro de 2010 estava de licença de parto dessa 2ª filha, pelo que estava isenta de pagamento à SS; em Outubro de 2013 a Junta de Freguesia de S. João, local onde trabalha há nove anos, foi integrada num conjunto de freguesias e, de acordo com a lei aprovada pelo Conselho de Ministros a que V. Exa pertence, o seu contrato de trabalho manteve-se pelo que não existe outra entidade patronal (como, aliás, seria evidente...mas das leis aprovadas neste país, o que é evidente às vezes torna-se absurdo...).
   Chegou assim à conclusão que haveria um engano da SS e que seria fácil no dia seguinte resolver o problema!   Deslocou-se hoje à SS que faz a "gestão das dívidas", acompanhada por mim, pois já não tinha dinheiro para os transportes, na Av. da República. Foi atendida por uma senhora de seu nome Emília Gião que, quase de imediato reconheceu a inexistência da dívida, mas ... a minha filha teria que preencher dois impressos ("requerimento genérico" e "pedido de regularização de dívida") entregando fotocópias de todos os documentos comprovativos.     Ás perguntas que se seguiram foi respondendo:
      P: "- desculpe, mas estes documentos já foram entregues à SS... onde vou agora tirar fotocópias?"  R: "- Se quer que o processo ande rápido este é o caminho. Existe uma empresa de fotocópias mesmo aqui perto..."
     P: "-Olhe lá, eu não pretendo regularizar uma dívida que não tenho, pretendo corrigir um erro destes serviços ... não tem um impresso para esse fim?" R: "...risos..."
     P: "-Explique-me como é que, numa alegada dívida de 301,56 euros, e recebendo eu de vocês um subsídio de gravidez de risco de perto de 500 euros, vocês me congelam a conta toda, com um saldo superior ao valor pretendido e sem qualquer aviso prévio?" R: "- Nós mandamos congelar todas as contas em nome do devedor, independentemente do saldo e a senhora foi notificada em Set. de 2014!"

     P: "-????, notificada, eu?!"; R:"- Sim, a notificação não foi entregue - depois de consultar o computador - mas nós consideramos para todos os efeitos como se tivesse sido".
     P: "-Mas o que é que eu tenho que fazer para acabar com este martírio?!" R: "-Pagar a dívida! Não a pagando, só lá para Setembro/Outubro terá a conta descongelada..."; P: "Mas, como é que eu posso pagar essa alegada dívida se tenho a minha única conta congelada? E como vou fazer para pagar a renda de casa, a luz, a água, os remédios do meu filho, os transportes, o parto em Junho, tudo... como é que eu vou fazer?!" R: "- Peça emprestado!"
     Entregamos a documentação e viemos embora ... com muito mais raiva do que a que tínhamos quando entramos.
    Senhor Ministro:   isto é a completa miséria! Isto é muito pior que uma ditadura Isto é muito pior que mandar matar! Isto é muito pior que Salazar! Isto é muito pior que incompetência! Isto é o total desespero por saber que V. Exa. em nome do Estado Português, manda para a miséria uma família de 5 pessoas pouco importando se a Mãe dessa família está com uma gravidez de risco, porque esse facto, embora importante, não é o factor principal de raiva incontida ... RAIVA é de nos sabermos impotentes para despedir V. Exa., todo o governo a que V. Exa pertence e todos os deputados desta pobre Nação que discutem o regresso da censura prévia para que ninguém saiba do estado a que isto chegou e, no final, ter uma pena enorme de todo este pobre povo que está com muito  MEDO!

    Sim, medo de ser despedido, medo de ser mal classificado pelo chefe, medo de perder o subsídio, medo de ser mal atendido no hospital, medo de ficar velho e morrer desamparado, medo do funcionário do fisco, medo do funcionário da segurança social, medo das rendas da EDP, medo das taxas, taxinhas e taxonas das autarquias, do IMI, do IUC, da taxa verde, do director e subdirector corrupto, do estágio sem garantia, do trabalho escravo, do (presente e) futuro dos filhos e netos, ... MEDO !!!
     Obrigado por me ter deixado "desopilar"...
Melhores cumprimentos.      Gaspar de S. Pinto



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Quinta-feira, 05.06.14

Ideias para um País sustentável   (Visão, 5/6/2014)

 

--- Deixar à geração futura uma herança de orgulho
João Joanaz de Melo,
Professor na Universidade Nova de Lisboa e presidente do GEOTA
    Desenvolvimento sustentável significa deixarmos aos nossos netos um mundo em que eles se possam orgulhar dos seus avós. Algumas ideias concretas:

1) Apostar na eficiência energética na reabilitação urbana, indústria, transportes públicos; é um excelente meio para tornar a nossa economia mais competitiva, equitativa e amiga do ambiente, e cria mais emprego que obras públicas faraónicas;

2) Salvaguardar os fantásticos valores naturais e patrimoniais do nosso país, desde as multifacetadas paisagens naturais e humanizadas à gastronomia, à cultura ou a ícones únicos como o vale e a linha do Tua e rentabilizá-los como turismo de qualidade diferenciado;

3) Fazer uma verdadeira reforma fiscal, aliviando a carga sobre o trabalho, acabando com os subsídios perversos aos lobbies e taxando o desperdício de recursos naturais; e

4) Pensar na crise, não como uma calamidade, mas sim como oportunidade para a inovação e a eficiência. O futuro não é negro nem branco, o futuro é o que nós fizermos dele.

--- Promoção de uma alimentação sustentável, nas escolas

Susana Fonseca, Ambientalista, ex-presidente da Quercus

    A ideia passa por potenciar as escolas como centros de educação, exemplos de ligação à comunidade através da transição progressiva para alimentos de agricultura biológica e de qualidade (denominação de origem protegida ou indicação geográfica protegida), nos diferentes graus de ensino.

   Esta transição deverá assentar numa diversificação dos alimentos oferecidos, que respeite a sazonalidade e que promova a alternância entre proteína animal e vegetal.

   Deverá ter-se particular cuidado para garantir o envolvimento de produtores de média dimensão e da produção local, recorrendo a estratégias como as seguidas em países que já estão a trabalhar nesta área (Itália, Escócia, Finlândia).
   Deve ser definida uma estratégia progressiva que defina os objetivos, as metas e o calendário de implementação (por exemplo, uma década), para que o mercado possa responder.
   Uma estratégia desta natureza trará óbvios benefícios para a saúde das crianças e jovens, para a sua educação alimentar e enquanto cidadãos, para o ambiente e para o desenvolvimento económico e social do País.

---Aposta no crescimento verde como oportunidade para Portugal sair da crise
Nuno Lacasta, Presidente da Agência Portuguesa para o Ambiente

   O paradigma do crescimento verde ganhou força como resposta à crise económica global, porque se centra na gestão eficiente dos recursos, na inovação e na criação de emprego. Em bom rigor, o paradigma do crescimento verde aborda o "esverdeamento" da economia, não a identificação de um subsetor verde da economia. Temos hoje claro que a recuperação económica, no nosso país, se deverá fazer na base de maior exportação e valor acrescentado.
   Ora, são já inúmeras as evidências de que os setores mais dinâmicos da economia nacional são setores do crescimento verde. Os Green Project Awards (GPA) 2013 confirmam isso mesmo.   Os setores do turismo, energias renováveis, agricultura, mar e tecnologias de informação são aqueles que têm resistido à crise ou que até têm crescido.
    Exemplos de projetos premiados pelo GPA 2013 são:   vinho biológico em larga escala, da Herdade do Esporão;    reaproveitamento de subprodutos da extração de azeite, da UCASUL;    sistema pioneiro de gestão inteligente das perdas de água, da EPAL;    fraldas 100% recicláveis, da Ecologicalkids;    recibos 100% online (sem impressão), da Escrita Inteligente, etc.  

   A aposta forte na eficiência de recursos, na economia de baixo carbono, na ecoinovação, na valorização do capital natural, na produção e consumo sustentáveis e na valorização dos serviços dos ecossistemas configura uma oportunidade excecional para Portugal sair da crise e se projetar como uma economia moderna e geradora de emprego.

 

---Estabelecer metas de sustentabilidade a nível do País, das cidades e das empresas/instituições
Pedro Norton de Matos, Organizador do GreenFest

   A questão do desenvolvimento sustentável tem fundamentalmente a ver com a educação cívica dos cidadãos. Começa nas escolas e no seio familiar e prolonga-se nas empresas e outras instituições.  É transversal à sociedade.

   A cidadania ativa consagra o princípio segundo o qual cada indivíduo é um agente de mudança, com capacidade de transformação da comunidade onde se insere e do mundo em geral.  As sociedades nórdicas são um bom exemplo, nesses domínios.   A título ilustrativo, refira-se que a cidade de Copenhaga tem a visão mobilizadora de se tornar uma cidade carbon free (livre de emissões de carbono), no ano de 2025.   Esse objetivo inspirador leva a que todos os projetos apresentados na Câmara cumpram esse requisito.   As visões mobilizadoras e envolventes permitem um maior alinhamento para o bem comum e traduzem-se em mudanças comportamentais consistentes.

   Em Portugal, deveríamos estabelecer metas no domínio dos pilares da sustentabilidade (ambiental, social e económica), a nível do País, das cidades e das empresas/instituições.   Esses objetivos deveriam ser tornados públicos e passíveis de serem monitorados com métricas simples e transparentes. 

   Em paralelo, não esquecer que o tema da sustentabilidade implica visão e a consideração do médio e longo prazos na equação, rejeitando as aproximações redutoras do imediatismo e das crises de curto prazo.   Um ditado da sabedoria oriental diz que "a melhor altura para se plantar uma árvore era há 20 anos; a segunda melhor altura, é agora".   Semeemos um futuro mais sustentável, desde já.

---Pensar a sustentabilidade na sua forma integrada: económica, social e ambiental 

Eugénio Sequeira, Engenheiro agrónomo e dirigente da Liga para a Proteção da Natureza

    A sustentabilidade tem várias vertentes:   a económica, a social e a ambiental.   Para se perceber como isso é importante, é bom olhar para um exemplo concreto, como a barragem do Alqueva.   Ao avançar para um projeto como aquele, seria desejável que o custo da água, de acordo com a diretiva Quadro da Água, fosse pago por inteiro e que fosse baixo.   Mais do que cinco ou seis cêntimos por metro cúbico já não seria sustentável no Alqueva, o custo está estimado em 41 cêntimos.   Também se esperaria que fosse sustentável do ponto de vista social.   Isto significa que as produções a fazer ali deviam garantir a estabilidade e a segurança quanto às flutuações do mercado, do clima e do emprego. 

   Neste momento, o que há na área são plantações sazonais, como olival hiperintensivo, milho e vinha, que apenas geram empregos sazonais.
   Do ponto de vista ambiental, um projeto daquela envergadura também deveria garantir que os recursos não são degradados.   Não se pode plantar florestas ou regar com uma água que não dá garantias de manter a qualidade.   Ora, acontece que a montante do Alqueva existem 3 milhões de habitantes.  

   Feitas as contas com números conhecidos, só de uso doméstico, são lançadas mais de 20 mil toneladas de sal, por ano, na barragem.   A longo prazo, vai haver ali água de má qualidade, com problemas graves de salinização.   No futuro, noutros investimentos como este, é preciso pensar se está garantida a estabilidade e segurança, do ponto de vista económico, se há garantias de mão de obra e emprego e se existem recursos de boa qualidade.   Não basta olhar para o ambiente e para a biodiversidade.



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Sexta-feira, 01.11.13

O mundo em 2030   (-por Ignacio Ramonet , 22/5/2013)

     De quatro em quatro anos, no início de cada novo mandato presidencial nos Estados Unidos, o National Intelligence Council (NIC), organismo de análise e de antecipação geopolítica e económica da Central Intelligence Agency (CIA), publica um relatório que automaticamente se torna uma referência fundamental para as embaixadas de todo o mundo. Apesar de conter, como é óbvio, uma visão muito parcial (a de Washington) produzida por uma agência (a CIA) cuja principal missão é defender os interesses dos Estados Unidos, o relatório estratégico do NIC tem um indiscutível interesse, que resulta da partilha – revista por todas as agências de informações norte-americanas – de estudos elaborados por especialistas independentes de várias universidades, em diferentes países e regiões (Europa, China, Índia, África, América Latina, mundo muçulmano-árabe, etc.).

     O documento confidencial que o presidente Barack Obama encontrou no seu escritório da Casa Branca a 21 de Fevereiro último, quando iniciou o seu segundo mandato, acaba de ser publicado com o título Global Trends 2030. Alternative Worlds (Tendências globais para 2030. Mundos alternativos) [1]. Que diz este documento?

     A sua principal constatação é o declínio do Ocidente. Pela primeira vez desde o século XVI, os países ocidentais perdem poder perante a ascensão das novas potências emergentes. Começa a fase final de um ciclo de cinco séculos de dominação ocidental do mundo. Os Estados Unidos continuarão a ser uma das principais potências planetárias, mas perderão a sua hegemonia económica em benefício da China e deixarão de exercer a «hegemonia militar solitária» que os caracteriza desde o fim da Guerra Fria (em 1989). Caminhamos para um mundo multipolar em que novos actores (China, Índia, Brasil, Rússia, África do Sul) estão vocacionados para constituir sólidos pólos regionais e para disputar a supremacia internacional a Washington e aos seus aliados históricos (Reino Unido, França, Alemanha, Japão).      Para se ter uma ideia da importância e da rapidez da desclassificação ocidental que se anuncia, basta sublinhar estes números: a parte que cabe aos países ocidentais na economia mundial passará dos actuais 56% para 25% em 2030… Em menos de vinte anos, o Ocidente vai perder mais de metade da sua preponderância económica. Uma das principais consequências disto é que os Estados Unidos e os seus aliados provavelmente deixarão de ter meios financeiros para assumir o papel de polícias do mundo. De modo que esta mudança estrutural, agravada pela profunda crise económica actual, pode ter sucesso naquilo em que a União Soviética e a Al-Qaeda falharam, isto é, no enfraquecimento duradouro do Ocidente.

     Segundo este relatório da CIA, a crise na Europa vai durar pelo menos uma década, ou seja, até 2023… Também segundo este estudo, não é certo que a União Europeia consiga manter a sua coesão. Enquanto isso, a emergência da China confirma-a como segunda economia mundial, que em breve se tornará a primeira. Simultaneamente, os outros países do grupo BRICS (Brasil, Rússia, Índia e África do Sul) instalam-se numa segunda linha e entram em concorrência directa com os antigos impérios dominantes do grupo JAFRU (Japão, Alemanha, França e Reino Unido). Na terceira linha aparecem agora várias potências intermédias com demografias em alta e fortes taxas de crescimento económico, chamadas a tornarem-se, também elas, pólos hegemónicos regionais e com tendência para se constituírem como grupo de influência mundial – o CINETV (Colômbia, Indonésia, Nigéria, Etiópia, Turquia, Vietname).

      Até 2030, no novo sistema internacional, algumas das maiores colectividades mundiais já não serão, contudo, países mas comunidades reunidas e ligadas entre si pela Internet e pelas redes sociais. Por exemplo, a «Facebooklândia» terá mais de mil milhões de utilizadores e a «Twitterlândia» mais de 800 milhões. A sua influência no jogo dos tronos da política mundial pode vir a ser decisiva. As estruturas de poder vão disseminar-se devido ao acesso universal à Internet e à utilização de novas ferramentas digitais.

      A este respeito, o relatório da CIA anuncia o aparecimento de tensões entre os cidadãos e certos governos, tensões essas que vários sociólogos classificam como «pós-políticas» ou «pós-democráticas». Por um lado, a generalização do acesso à Internet e a universalização do uso das novas tecnologias vão permitir que os cidadãos alarguem o campo das suas liberdades e que desafiem os seus representantes políticos (como aconteceu nas «Primaveras árabes» ou na crise dos «indignados»). Mas, ao mesmo tempo, segundo os autores do relatório, estas mesmas ferramentas digitais vão dar aos governos «uma capacidade sem precedentes de vigiar os cidadãos» [2].

     «A tecnologia», acrescentam os analistas de Global Trends 2030, «vai continuar a ser o grande critério de diferenciação dos Estados, mas os futuros imperadores da Internet, semelhantes aos do Google ou do Facebook, vão possuir verdadeiras montanhas de dados e vão manipular em tempo real muito mais informações do que os Estados».  É por isso que a CIA recomenda à administração dos Estados Unidos que se prepare para enfrentar as grandes empresas privadas que controlam a Internet, activando o Special Collection Service [3], um serviço de informações ultra-secreto que depende conjuntamente da NSA (National Security Service) e do SCE (Service Cryptologic Elements) das Forças Armadas, e que é especializado na captação clandestina de informações de origem electromagnética. Se um grupo de empresas privadas viesse a controlar a massa de dados que circula na Internet, poderia vir a condicionar o comportamento de uma grande parte da população mundial, ou mesmo das entidades governamentais. A CIA receia também que o terrorismo jihadista seja substituído por um ciberterrorismo ainda mais atroz.

      O relatório leva este novo tipo de ameaça ainda mais a sério porque, em última análise, o declínio dos Estados Unidos não foi provocado por uma agressão externa, mas antes por uma causa interna: a crise económica surgida em 2008, na sequência da falência do banco Lehman Brothers. Os autores consideram que a geopolítica contemporânea deve ter em conta novos fenómenos, que não têm forçosamente carácter militar. Porque, mesmo que as ameaças militares não tenham desaparecido – como se vê pelos confrontos armados na Síria, pelas ameaças relativas ao Irão ou pela recente gesticulação nuclear da Coreia do Norte –, os principais perigos que hoje ameaçam as sociedades são de tipo não-militar: alterações climáticas, conflitos económicos, crime organizado, guerras electrónicas, novas pandemias, esgotamento dos recursos naturais…

      Relativamente a este último aspecto, o relatório assinala que um dos recursos que está a esgotar-se mais rapidamente é a água doce. Em 2030, 60% da população mundial passará por problemas de abastecimento de água, o que poderá dar origem a «conflitos hídricos»… Em contrapartida, no que se refere aos hidrocarbonetos a CIA mostra-se muito mais optimista do que os ecologistas. Graças às novas técnicas (muito poluentes) de fracturação hidráulica, a exploração do petróleo e do gás de xisto deverá atingir níveis excepcionais. Os Estados Unidos serão já auto-suficientes em gás e sê-lo-ão em petróleo em 2030, o que faz baixar os seus custos de produção manufactureira e encoraja a relocalização das suas indústrias. No entanto, se os Estados Unidos, principais importadores mundiais de hidrocarbonetos, deixarem de importar petróleo, os preços do barril vão colapsar. Quais seriam nessa altura as consequências para os actuais países exportadores?

     No mundo de amanhã, 60% das pessoas viverá em cidades, algo que acontece pela primeira vez na história da humanidade. Por outro lado, como consequência da redução acelerada da pobreza (?!), as classes médias tornar-se-ão dominantes e triplicará o número de pessoas que as compõem, passando de mil milhões para 3 mil milhões. É uma revolução colossal. Entre outras consequências, isso vai provocar uma mudança geral dos hábitos culinários, em particular um aumento do consumo de carne à escala planetária. Por sua vez, essa mudança agravará a crise ambiental, porque será necessário aumentar consideravelmente a criação de gado (bovino, ovino, porcino) e de aves. Isso implicará uma explosão do consumo de água (para produzir as forragens), de energia e do uso de fertilizantes, com efeitos negativos em termos de efeito de estufa e de aquecimento global.

     O relatório prevê igualmente que, em 2030, o planeta terá 8,4 mil milhões de habitantes, mas que o aumento demográfico cessará em toda a parte menos em África. Haverá, portanto, um envelhecimento geral da população mundial. Em contrapartida, a relação entre o ser humano e as «tecnologias proféticas» vai acelerar a entrada em funcionamento de novas gerações de robôs e o aparecimento de «super-homens» capazes de proezas físicas e intelectuais inéditas.

     O futuro raramente é previsível. Mas isso não implica que se deixe de o imaginar em termos de prospectiva, nem que não nos preparemos para agir em função de diversas circunstâncias possíveis, das quais só uma se concretizará. Mesmo que, como já o dissemos, a CIA possua o seu próprio ponto de vista subjectivo sobre o rumo do mundo, e que este ponto de vista seja condicionado pelo imperativo da defesa dos interesses dos Estados Unidos, este relatório constitui uma ferramenta de trabalho extremamente útil. A sua leitura ajuda-nos a tomar consciência das rápidas evoluções em curso e a reflectir sobre a possibilidade que cada um de nós tem de intervir e agir para inflectir o rumo das coisas. A fim de contribuir para construir um futuro mais justo.



Publicado por Xa2 às 07:38 | link do post | comentar

Sábado, 31.12.11
O GOVERNO, SA e uma visão do nosso futuro... por Daniel Estulin
(Partes duma Conferência de Imprensa no Parlamento Europeu em 01.12.2011)
 


Publicado por [FV] às 09:57 | link do post | comentar | comentários (2)

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