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( boneco rapinado aqui ) |
«Na zona euro, se excluirmos a posição Alemã - que, por razões de trauma histórico, vive num mundo monetário e financeiro que é só seu -, parece haver um amplo consenso em torno de dois temas: 1) a deflação é um problema grave; e 2) só o Banco Central Europeu a pode combater. Se o primeiro consenso é positivo, porque a
deflação é, de facto, um gravíssimo problema para a zona euro, tenho muitas reservas quanto ao segundo.
Num contexto de
estagnação económica, endividamento elevado e taxas de juro diretoras próximas do zero, a deflação agrava o problema da dívida. Mas é uma ilusão pensar que só o BCE pode inverter a situação, porque, ao contrário do que pensava Milton Friedman, a inflação não é sempre e necessariamente um fenómeno monetário. É o caso atual.
Delegar no BCE a responsabilidade de combater a deflação,
mantendo a atual estratégia de austeridade e 'reformas estruturais', é a garantia de que nada de muito relevante irá acontecer, porque essa estratégia é hoje a maior responsável pelo clima deflacionário que afeta a zona euro. O BCE pode comprar dívida pública, pode comprar dívida privada, pode pensar nas políticas não convencionais que quiser, mas, se nada for feito para
aumentar a procura agregada e inverter a atual ideia de que a competitividade pressupõe compressão salarial, o ambiente deflacionário irá, infelizmente, manter-se.
Quem atribui ao BCE a responsabilidade de combater a deflação devia olhar para o exemplo do Japão, que anda há mais de duas décadas a fazer o mesmo, sem grandes resultados. O máximo que os japoneses conseguiram fazer foi desvalorizar o iene. O BCE tem instrumentos para
desvalorizar o euro, gerando, por essa via, inflação. Mas
essa inflação será sempre feita por via do aumento do preço dos bens importados, o que diminui o poder de compra dos salários. Mesmo admitindo que a desvalorização do euro pode
favorecer as exportações (o que não é inteiramente líquido) não é seguramente dessa inflação que a zona euro precisa.
O que a zona euro
precisa, e rapidamente, é de crescimento nominal dos salários e de procura agregada, ou seja, o que a zona euro precisa é de
abandonar o estúpido pacto de Euro Plus (competitividade assente na compressão salarial) e todas as 'reformas estruturais' que lhe estão associadas (desregulamentação do mercado de trabalho para embaratecer o fator Trabalho) e de inverter a atual estratégia orçamental,
invertendo, sobretudo,
a redução das prestações sociais, a redução do emprego e salários públicos e do investimento público. Se nada disso for feito, o problema da deflação nunca será resolvido.
E estaremos a alimentar e fazer crescer todos os outros problemas.»