Recado para o pres. da Comissão Europeia Senhor Juncker,
Mentem desbragadamente quando dizem que se a Troika não nos emprestasse dinheiro, não se poderia ter pago salários e pensões
A mentira e a ignorância estão cada vez mais presentes nos ataques às funções sociais do Estado pelos comentadores com acesso privilegiado aos media. É mais um exemplo concreto do pensamento único sem contraditório atualmente dominante nos grandes órgãos de comunicação social. Quem oiça esses comentadores habituais que muitas vezes revelam que não estudaram minimamente aquilo de que falam, poderá ficar com a ideia de que Portugal é um país diferente dos outros países da União Europeia onde o "Estado Social" é insustentável e está próximo da falência por ter garantido aos portugueses uma saúde, uma educação e uma proteção, que inclui o sistema de pensões, mais "generosos" do que a dos outros países e que, por isso, é insustentável.
Um dos arautos mais conhecidos dessa tese, não porque seja um estudioso credível mas sim porque tem tido acesso fácil aos media, é Medina Carreira com as suas diatribes periódicas contra o "Estado Social". Mas antes de confrontarmos o que dizem estes comentadores com os próprios dados oficiais, divulgados até recentemente pelo Eurostat, para que o leitor possa tirar as suas próprias conclusões, interessa desconstruir uma outra grande mentira que tem sido sistematicamente repetida em muitos órgãos de comunicação social sem contraditório o que tem determinado que ela passe, a nível de opinião pública, como verdadeira.
SERÁ VERDADE QUE PORTUGAL FOI OBRIGADO (...) A PEDIR O EMPRÉSTIMO À "TROIKA" PORQUE NÃO TINHA DINHEIRO PARA PAGAR SALÁRIOS E PENSÕES?
Esta é mais uma das grandes mentiras repetidas sistematicamente que não tem qualquer fundamento real, como os dados do quadro 1, retirados do relatório do OE-2013 do próprio Ministério das Finanças, provam.
Em 2011, as receitas dos impostos e contribuições foram superiores às despesas com Pessoal de todas as Administrações Públicas mais as despesas com pensões e outras prestações, incluindo as em espécie, que são as prestadas nomeadamente pelo SNS, em +4.229,6 milhões €; em 2012 esse excedente subiu para 4,454,1 milhões € e, para 2013, o governo previa que atingisse um excedente de +6.676,2 milhões € Para além das receitas consideradas, as Administrações Públicas têm mais receitas. Por ex. na rubrica de "Outras receitas" foram registadas, em 2012, mais 9.606,2 milhões € segundo o Ministério das Finanças. E tudo isto num período de recessão económica em que se verifica uma forte quebra nas receitas fiscais e contribuições. Afirmar, como fazem alguns comentadores e mesmo jornalistas, que o Estado foi obrigado a pedir um empréstimo à "troika" porque não tinha dinheiro para pagar salários e pensões é ignorância ou mentir descaradamente com o objetivo de manipular a opinião pública, pois os impostos e contribuições pagas todos os anos pelos portugueses são suficientes para pagar aquelas despesas. A razão porque se pediu o empréstimo à troika foi para pagar credores leoninos, que são grandes bancos, companhias de seguros, e fundos muitos deles especulativos e predadores.
A DESPESA DO ESTADO COM AS FUNÇÕES SOCIAIS SERÁ EXCESSIVA E INSUSTENTÁVEL EM PORTUGAL COMO AFIRMAM ESTES DEFENSORES DO PODER DOMINANTE?
Esta é uma questão que tem de ser esclarecida pois também é utilizada para manipular a opinião pública. Os dados do Eurostat constantes do quadro 1, em que é apresentada a despesa total do Estado em percentagem do PIB, permite comparar a situação portuguesa com a de outros países da União Europeia.
Em 2011, e são os dados mais recentes disponibilizados pelo Eurostat, a despesa total das Administrações Públicas em Portugal representava 49,4% do PIB português, quando a média na União Europeia situava-se entre os 49,1% e 49,5%, portanto igual. E em 2012, segundo o Relatório do Orçamento do Estado para 2013 (pág, 90) do Ministério das Finanças, a despesa pública em Portugal reduziu-se para apenas 45,6% do PIB. E neste valor estão incluídos os juros da divida que atingiram 7.038,9 milhões € em 2012 devido a juros leoninos pagos por Portugal. Se deduzirmos aquela percentagem desce para apenas 41,4%. Afirmar ou insinuar, como muitos fazem, que a despesa pública em Portugal é excessiva pois é superior à média dos países da União Europeia é uma mentira. Mas é desta forma que se procura manipular a opinião pública para levá-la a aceitar o ataque violento que está em curso em Portugal ao Estado Social, em que um dos instrumentos é ameaça de mais um corte de 4.000 milhões € na despesa pública.
EM PORTUGAL A DESPESA PÚBLICA COM A SAÚDE É INFERIOR À MEDIA DA UE
O ataque ao Serviço Nacional de Saúde tem sido também um dos grandes objetivos destes defensores do poder económico e politico com acesso privilegiado aos grandes media. O argumento é que a despesa em Portugal é excessiva e superior à média dos países da União Europeia. Os dados que o Eurostat divulgou, constantes do quadro 2, prova que isso é mentira.
Como mostram os dados do Eurostat, tanto em percentagem do PIB como euros por habitante, aquilo que o Estado gasta em Portugal com a saúde dos portugueses é significativamente inferior não só ao que se verifica nos países mais desenvolvidos da União Europeia, mas também em relação à média comunitária. Em 2011, a despesa pública com a saúde em Portugal correspondeu apenas a 6,8% do PIB quando a média na União Europeia variava entre 7,3% e 7,4% do PIB. E em euros por habitante, a diferença era ainda muito maior. Em 2011, em Portugal o gasto público com a saúde por habitante era apenas de 1.097€, quando a média nos países da União Europeia variava entre 1.843€ (+68% do que em Portugal) e 2.094€ (+91%). E nos países desenvolvidos a despesa por habitante era muito superior à portuguesa (Bélgica:+142%; Dinamarca:+229%; Alemanha:+103%; Irlanda:+142%; França : +131%), embora a diferença de ganhos em saúde entre Portugal e esses países seja reduzida. Em 2012, com cortes nas transferências para o SNS e para os hospitais públicos aquele valor ainda desceu mais.
A DESPESA COM A PROTEÇÃO SOCIAL EM PORTUGAL É INFERIOR TAMBÉM À MÉDIA DA UE
Uma outra mentira é a de que a despesa com proteção social em Portugal, que inclui as pensões, é superior às dos outros países. O quadro 4, com dados do Eurostat, mostra que não é verdade.
Como mostram os dados do Eurostat, quer se considere em percentagem do PIB, quer em euros por habitante, a despesa pública com a proteção social em Portugal, que inclui as pensões, é inferior quer à dos países mais desenvolvidos europeus quer à média dos países da União Europeia. Em 2011, a despesa pública com a proteção social em Portugal correspondia apenas a 18,1% do PIB quando a média na União Europeia variava entre 19,6% e 20,2% do PIB. E em euros por habitante, a diferença era ainda muito maior. Em Portugal o gasto público com a proteção social por habitante era apenas de 2.910€, quando a média nos países da União Europeia variava entre 4.932€ (+69% do que em Portugal) e 5.716€ (+96%). E nos países desenvolvidos a despesa por habitante era muito superior à portuguesa (Bélgica:+126%; Dinamarca:+274%; Alemanha:+114%; Irlanda:+110%; França: +151%). Fazer cortes significativos nas prestações com a justificação de que as despesas em Portugal são excessivas quando se comparam com outros países da União Europeia é mais uma mentira para enganar a opinião pública.
EM % DA DESPESA TOTAL DO ESTADO, A DESPESA COM AS FUNÇÕES SOCIAIS EM PORTUGAL É TAMBÉM INFERIOR À MEDIA DOS PAÍSES DA UE
Por ignorância ou com o objetivo de enganar a opinião pública, Medina Carreira fala de um limite mítico acima do qual o Estado e as funções sociais seriam insustentáveis, e que em Portugal esse limite foi largamente ultrapassado. Observem-se os dados do Eurostat constantes do quadro 5 que mostram que esse limite mítico é também uma mistificação e mentira.
Como revelam os dados do Eurostat, em 2011, 63,4% da despesa do Estado em Portugal era com as funções sociais do Estado, quando a média nos países da União Europeia era de 65,7%. No entanto, na Dinamarca atingia 71,8%, na Alemanha 68,1%, e na França 68,1%, portanto superior e, alguns deles, muito superior. Afirmar como alguns fazem que as funções sociais do Estado apenas são sustentáveis se o Estado gastar com elas muito menos de 60% da sua despesa total revela ou ignorância ou a intenção deliberada de enganar a opinião pública, Será que a Alemanha, a Dinamarca, a França, são Estados inviáveis?
Por outro lado, a legitimidade do próprio Estado assenta fundamentalmente nas suas funções sociais já que elas, através dos seus efeitos redistributivos, reduz as desigualdades e melhora de uma forma significativa as condições de vida da esmagadora maioria da população. Querer reduzir significativamente a despesa com as funções sociais terá como consequência inevitável a redução da legitimidade do próprio Estado aos olhos da população, e transformará a sociedade numa selva em que só quem tem muito dinheiro terá acesso aos principais bens necessários à vida e a uma vida humana com dignidade.
O que é insustentável e inaceitável é que se esteja a aplicar em Portugal uma politica fortemente recessiva em plena recessão económica, que está a destruir a economia e a sociedade portuguesa de uma forma irreparável, provocando a falência de milhares de empresas e fazendo disparar o desemprego, o que está a causar uma quebra significativa nas receitas dos Estado e da Segurança Social pondo em perigo a sustentabilidade de todas as funções sociais do Estado e do próprio Estado. Mas disto aqueles comentadores com acesso privilegiado aos média não falam nem querem falar. Os cortes sobre cortes na despesa pública não resolvem este problema, apenas agrava ainda mais a recessão económica, agravando ainda mais todos estes problemas. Como dizia Keynes só os imbecis é que não entendem isto (ou não querem revelar a verdade). [*] Eugénio Rosa, economista, 06/Abril/2013
Petição pela rejeição da proposta de Orçamento de Estado para 2013 : Assina aqui
... Na realidade, não há verdadeira alternativa à proposta de OE que não passe pela redução da única despesa que pode ser cortada sem efeitos recessivos e com benefício na libertação de recursos para o investimento e a criação de emprego: os juros da dívida pública. É, pois, pela denúncia e renegociação dos termos do Memorando que passa qualquer verdadeira alternativa à proposta de OE para 2013. É nisto que consistem as razões do Congresso Democrática das Alternativas, expressas na Declaração aprovada em 5 de outubro (disponível aqui).
... Assina aqui a petição pela rejeição da proposta de OE 2013
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Ainda a estória da Dívida Publica (-por G. Fonseca-Statter)
De vez em quando vêm uns ilustres doutores e consultores (pagos a peso de ouro para eu me roer de inveja...) explicar que isto da dívida pública subir mais do que seria normal» é uma coisa que acontece de vez em quando. Que a dívida é uma coisa para gerir e que os «processos de ajustamento» necessários para pagar a dívida até são uma coisa benéfica. A longo prazo claro... O problema é que, como dizia o outro, «a longo prazo estamos todos mortos». Seja como for, a este respeito, estou a pensar em encontrar uma só referência nos grandes meios de comunicação sobre as raízes desta crise da dívida de todos (repito com ênfase...) todos os países da OCDE (e não só...)
Mas se quisermos procurar uma causa mais profunda, ir às raízes do problema (e já nem vou falar da queda tendencial da taxa de lucro, coisa de análises marxistas...) então, para isso, para procuramos explicações e debates sobre causas mais profundas da crise da divida, pelos vistos só com uma lupa... É um pouco como procurar agulha num palheiro mas em que nem sequer se sabe onde está o palheiro...
Desde logo é preciso saber o que procurar e como procurar. De certa forma saber de antemão aquilo que se procura vir a saber... Uma espécie de confirmação com dados para que não nos acusem de invenções.
E depois cada um fazer-se ao caminho. Hoje com a internet, o google, o youtube e a wikipedia a coisa está mais facilitada. Mas mesmo assim é preciso saber procurar.
Então é assim: aqui há uns trinta anos as grandes empresas em todo o mundo (e os respectivos executivos) pagavam à volta de 45% de IRC e a taxa marginal de IRS dos executivos era na ordem dos 80% - nos EUA chegou a ser a ser de 90%... Depois, em meados dos anos Setenta, começou a «revolução» tatcheriana e a fuga, a evasão e a evitação fiscal por parte das grandes empresas multinacionais. Hoje muitas delas simplesmente não pagam impostos ou pagam 5% a 10% (quando pagam!...).
Ou seja, o Capital cada vez menos contribui para as despesas do Estado. Gostam de autoestradas, universidades e sanidade pública, mas não querem pagar. Chegámos ao ponto de o ex-ministro Miguel Beleza dizer há dias, em tom sarcástico e se bem me lembro, que talvez fosse boa ideia «acabar com o IRC... também já só contribui com 3% para o Orçamento do Estado»...
E depois anda o pessoal a discutir como «pagar a dívida», «quais as alternativas», o «reescalonamento da dívida», o «montante exagerado dos juros» e o que mais for por aí sugerido... A esse respeito vem-me à ideia uma hipotética discussão sobre os méritos da orquestra do Titanic enquanto o barco se afunda...
Para concluir, e mesmo que a dívida publica portuguesa em 2012 fosse genuína e legítima (algo por demonstrar!...),conviria lembrar outros casos de dívidas públicas e de outros países «caloteiros» que não deixaram por isso de serem altamente cotados por todas as famigeradas agências de notação.
Começo por referirque foi só em 3 de Outubro de 2010 que a Alemanha acabou de pagar a dívida soberana em que incorrera por causa da Primeira Grande Guerra. Ou seja, cerca de 95 anos mais tarde... Já no que diz respeito às dívidas incorridas por causa da Segunda Guerra Mundial, os aliados foram mais cautelosos e com medo do «papão comunista» (ou do regresso ao populismo de direita e a novas formas de fascismo) resolveram atenuar a pilula.
Além do perdão de uma parte da dívida que já vinha da Primeira Grande Guerra, foi resolvido perdoar uma parte significativa da dívida provocada pela Segunda Guerra Mundial. Perdão esse que foi gentilmente, com bons modos e diplomacia qb (...) imposto aos Gregos que, pelos vistos, não tinham força suficiente com que argumentar contra a exigência dos Aliados em que alinhassem no tal perdão.
Mas a condição mais interessante – para o nosso caso, agora e aqui – foi a condição de que os pagamentos anuais da dívida da Alemanha estariam sempre limitados a um montante equivalente a 5% das receitas das suas exportações... Alguém se lembre de começar a reclamar essa condição com esse precedente!!!
Um crime de Estado (-por por Daniel Oliveira, Arrastão e Expresso online)
É, por isso, um crime contra as contas públicas. Porque é às empresas e ao trabalho que o Estado vai buscar a sua receita. Sem economia e sem emprego as despesas crescem - e contra isso restará acabar com os subsídios de desemprego e entregar uma parte significativa do País à miséria - e as receitas, por mais altos que sejam os impostos, caem a pique. Para resolver um problema agravaremos esse problema. Só um idiota não vê isto.
É um crime contra a classe média, que será esmifrada até ao último cêntimo. E é preciso ter em conta que a classe média em Portugal não é a classe média do resto da Europa. Vivia apenas com um bocadinho mais do que era necessário para ter o essencial. O bocadinho que sobrava para alguma poupança e algum consumo. Ou seja, grande parte da classe média será atirada para a pobreza. E, em todas as economias, a classe média é, muito mais do que as classes altas, o motor do mercado interno. É ela que garante grande parte do consumo.
É um crime contra a justiça social. A redução do número de escalões (do IRS) põe no mesmo saco pessoas classe média baixa e classe média, classe média e classe média alta, classe média alta e ricos. Os impostos que mais sobem são os da classe média baixa. Os que menos sobem são os que se situavam no que era o escalão mais alto. A sobretaxa, não sendo progressiva, aplica-se igualmente para todos.
É um crime contra a honra do Estado. Porque os pensionistas que recebem reformas "milionárias" de 1.300 euros são roubados nas suas poupanças. Eles confiaram o seu dinheiro ao Estado. E essa confiança dependia de um compromisso: que, descontado o que é necessário para a redistribuição dos rendimentos, esse dinheiro lhes seria devolvido quando deixassem de trabalhar. É extraordinário que este governo se preocupe tanto em passar a ideia de que honra os seus compromissos e paga as suas dívidas externas e não se incomode com a sistemática violação dos seus compromissos com os cidadãos portugueses e os calotes que lhes dá. Que os contratos das PPP's sejam inegociáveis (?!!) mas os contratos com os portugueses não tenham qualquer valor.
É um crime contra a autoridade do Estado. Qualquer português, perante a escolha de deixar de comer, de deixar de mandar os seus filhos à escola, de deixar de ter casa onde viver ou de deixar de pagar impostos escolherá, como é evidente, não pagar impostos. Tentará (e quem o poderá condenar) fugir ao fisco. Tentará (e quem lhe apontará o dedo) enganar o Estado. Os que não o conseguirem fazer às escondidas farão às claras e esperarão por uma justiça atolada em processos. Será o salve-se quem puder. Ficarão os que nada podem fazer para fugir ao assalto a pagar a despesa.
Este orçamento é um crime. E como crime deve ser tratado. A partir de hoje, e confirmando-se as linhas fundamentais do Orçamento, é um imperativo patriótico impedir que ele seja aprovado. Na rua, nos tribunais, em todo o lado. E fazer tudo o que a lei permite para que estes loucos sejam escorraçados de São Bento
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Prémio à desunião (europeia e ao neoliberalismo) (-por João rodrigues)
O actual modelo de construção europeia conduzido pela UE e pelas suas instituições é absolutamente contrário aos interesses dos trabalhadores e dos povos do nosso Continente. Não se pode premiar, em nome da paz, uma instituição que de forma cada vez mais acentuada põe em causa direitos laborais, sociais, culturais, da paz e da cooperação entre os povos. ...
Manual de instruções para austeritários em fuga (- por Nuno Serra)
Não sabemos ainda quando (nem como) sairemos da insanidade em que nos mergulharam. Mas pode dizer-se que entrámos, nas últimas semanas, numa nova fase de evolução da crise: a evidência do fracasso da opção austeritária é cada vez mais indisfarçável e avassaladora. Bem podem os seus arautos e responsáveis continuar a insistir nos «amanhãs que cantam» que já ninguém acredita. Tinham-nos anteontem prometido que cantariam ontem. Tinham ontem prometido que cantariam hoje. E nem um pio se ouviu.
Não por acaso, Vítor Gaspar escolheu a passada quinta-feira, no final da reunião de ministros das finanças da zona euro, para começar a levantar o véu sobre os resultados do último relatório de execução orçamental da DGO. Com a atenção dos portugueses concentrada no jogo com a República Checa, tornava-se mais fácil começar a entreabrir as portas que mostram o desastre em que mergulhou o país.
O ministro reconhece nesse momento que «a informação disponível sobre o comportamento das receitas não é positiva», para acrescentar que os dados «traduzem um aumento significativo nos riscos e incertezas associadas às expectativas orçamentais». Mas assegura, uma vez mais, que «o executivo não vai pedir “nem mais tempo, nem mais dinheiro”» para cumprir o défice. Gaspar chegaria mesmo a glosar uma metáfora futebolística sobre a importância de obter resultados durante o «tempo regulamentar» (isto é, sem recorrer a «prolongamentos»).
Ontem, com a divulgação do relatório da DGO - a que o José Maria Castro Caldas fez referência no post anterior - o descalabro orçamental era conhecido em todo o seu esplendor: em valores homólogos, as receitas caem 3,5% (devido a quebras no IRC, IVA e impostos sobre veículos, tabaco e combustíveis) e a despesa aumenta 2% (dado o acréscimo, entre outros factores, de encargos com o pagamento de subsídios de desemprego e a diminuição das receitas da Segurança Social), dilatando o défice do Estado em 35% nos primeiros cinco meses do ano. Valores que, no seu conjunto, ilustram com clareza a espiral recessiva que a insanidade austeritária desencadeou.
Não querendo pedir nem mais tempo nem mais dinheiro, Vítor Gaspar só conhece uma solução para alcançar o tecto do défice estabelecido para 2012 que, nas suas próprias palavras, «o governo está determinado a cumprir», consciente de que «o esforço necessário para atingir esse valor é muito importante». Voltando às metáforas do futebol, Gaspar já se está nitidamente a preparar para pedir mais esforço (e sacrifícios) a certos jogadores.
Todos vão ficar sem os subsídios de férias e de Natal, mas há várias «adaptações» ao corte entre 3,5% e 10% ainda em vigor. Além disso, os limites de vencimentos para gestores não são para todos, o que pode custar cinco milhões de euros por ano.
Os principais beneficiários das excepções são os administradores de empresas públicas. Os responsáveis de oito empresas vão escapar ao tecto salarial de 6.850 euros mensais – o salário do primeiro-ministro – imposto pelo novo estatuto do gestor público.
Ganhar mais 20 mil euros do que Passos Coelho
O diploma aprovado pelo Governo permite que as empresas em processos de privatização ou extinção, ou que actuem em regime concorrencial, escapem àquele tecto, o que abrange a TAP, CGD, CTT, RTP, ANA, a Empresa de Meios Aéreos, a Empordef e a Parque Expo.
Com estas excepções às estruturas de topo, o Estado gasta mais 3,5 milhões de euros em salários de administradores de empresas públicas, face a um cenário em que houvesse limites.
O presidente da TAP, Fernando Pinto, pode manter o salário mensal de 26 mil euros, e o CEO da Caixa, José de Matos, continua a receber 19 mil euros. O presidente da RTP, Guilherme Costa, fica com 14 mil euros.
Salários de dirigentes de institutos
A estes encargos somam-se os dos dirigentes de institutos públicos que vão ter um regime especial de remuneração. O Governo aprovou uma nova lei-quadro dos institutos públicos, com tabelas salariais mais restritas.
Os dirigentes destes organismos passam a ter vencimentos ao nível de cargos superiores na administração central (entre 3.750 euros e 4.500 euros).
Mas, até ao momento, foram definidas 14 excepções em que os salários podem ir, no limite, até ao do primeiro-ministro. Num primeiro momento, foram abertas excepções a um grupo de dez organismos, dado o seu grau de especificidade e autonomia. São os casos do Instituto Nacional de Estatística ou do Infarmed.
Mais recentemente, foi aprovada uma norma que abre quatro novas excepções, desta vez a institutos envolvidos na gestão de fundos comunitários. Neste caso, os excepcionados são o Instituto de Gestão do Fundo Social Europeu, IEFP, Turismo e o Instituto Financeiro de Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e Pescas.
No limite, estas 14 excepções poderão elevar a factura com os vencimentos dos dirigentes em cerca de 1,5 milhões de euros (a diferença entre a indexação ao primeiro-ministro e o que seria pago se fossem dirigentes de institutos convencionais).
Governo fala de adaptações
Mas as excepções não ficam por aqui. No corte salarial aos trabalhadores, uma medida que reduziu os salários entre 3,5% e 10% em 2011 – mas que foi mantida este ano –, também há «adaptações», segundo a expressão utilizada por membros do Governo.
Em três empresas, está a ser seguida esta opção. Quem trabalha na CGD, na TAP e_na SATA vai receber o seu ordenado por inteiro este ano, sem os cortes médios de 5% para todos os trabalhadores do Estado que recebem mais de 1.500 euros mensais.
Só na TAP e no banco público – os dados da SATA estão indisponíveis – esta alteração agrava a factura anual com os trabalhadores em cerca de 66 milhões de euros. Esta subida terá de ser compensada com cortes equivalentes noutras áreas. O Executivo justificou estas alterações com o facto de as empresas estarem em mercado concorrencial.
Mais excepções
As «adaptações» orçamentais podem não ficar por aqui. Pedidos semelhantes foram efectuados pelos CTT, NAV e ANA, mas apesar da insistência das empresas, o ministro das Finanças ainda não tomou qualquer decisão.
Há ainda uma forte pressão por parte dos trabalhadores das empresas de transportes públicos para obrigarem as diferentes administrações a pedirem ao Governo um regime de excepção para os cortes salariais. Já houve greves na Carris e para a semana ocorrem no Metro de Lisboa. A administração da Carris garantiu ao SOL que não vai ceder à pressão dos trabalhadores e a do Metro de Lisboa não comenta.
Nos institutos podem também surgir novos casos especiais. No âmbito do Plano de Redução e Melhoria da Administração Central do Estado, vão ser fundidos e extintos múltiplos organismos, e ainda estão por publicar novas leis orgânicas em cerca de 20 deles, segundo o último levantamento do Ministério das Finanças comunicado aos sindicatos.
José Abraão, da Frente Sindical da Administração Pública, explicou ao SOL que «é nesta fase que é definido o perfil de remunerações dos institutos e poderá haver mais estatutos diferenciados». Questionado pelo SOL sobre os regimes remuneratórios diferenciados, o gabinete de Gaspar respondeu que «não faz qualquer comentário».
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