Segunda-feira, 01.12.14

O  Estado  corrupto     (-por OJumento, 28/11/2014)

 Enquanto o MP desenvolve a sua caça às bruxas tentando encontrar crimes de corrupção que fundamentem as muitas acusações que já fez contar numa comunicação cujos jornalistas assumiram o estatuto de jurados do auto de fé que vai decorrendo ao sabor das manipulações da informação e da comunicação social a que insistimos em designar por violações do segredo de justiça, vale a pena discutir a corrupção à luz do processo "labirinto" ('vistos gold' ou do mega 'BES/GES', do 'BPN', 'submarinos e pandur', 'PPPs', ...).
     Não porque se considere o processo concluído, assente em provas confiáveis e já devidamente julgado, mas porque por aquilo que se soube e pela própria natureza dos vistos gold este processo pôs em evidência a natureza corrupta do nosso Estado e do estado a que chegaram os mecanismos de controlo político (governativo/partidário e,  indirectamente, dos grandes grupos económicos, financeiros, soc.advogados, 'lojas', 'capelas', 'ordens', 'baronias' e oligarquias) do exercício das (altas) funções da Administração Pública (e nas fundações, institutos, agências, empresas públicas ou participadas, subsidiadas, isentadas, concessionárias e/ou com aberrantes rendas, 'tachos' e privilégios vários).
     Quando um Estado governo monta um esquema através do qual a troco de dinheiro dá vistos especiais a portadores de dinheiro cuja origem não se discute que desta forma podem ir residir para outros países da EU onde teriam dificuldades em estabelecer-se não estamos perante a criação de um esquema nacional e nacionalista de corrupção? A verdade é que um estrangeiro honesto que trabalhe espera anos por um visto e um qualquer general ou negociante chinês consegue-o a troco de uma choruda quantia. E qual é a argumentação em favor do esquema? Igual a de muito bom corrupto, que dá muito dinheiro e que os outros também o fazem.
      Quando os políticos, em vez de criarem mecanismos legais transparentes e iguais para todos os cidadãos, telefonam aos altos dirigentes do Estado mandando-os agilizar procedimentos em relação a determinadas empresas ou cidadãos, sem o assumirem em público, sem o fazerem por escrito e sem darem a cara na hora dos problemas, não estamos a escancarar a porta para tudo e mais alguma coisa? Consta que o ex-director do SEF disse que os governantes lhe deram instruções para agilizar os procedimentos, mas não consta que algum político tenha dado a cara, que tais instruções tenham sido assumidas por escrito ou que algum governante tenha sido interrogado.
      A Administração Pública (e o país) há muito que está nas mãos dos aparelhos partidários (de quem os controla e compra) e nos anos 80 ficaram célebres as grandiosas cerimónias de exibição colectiva dos novos militantes do partido, a maior parte dos quais tinha acedido a lugares de chefia do Estado graça ao empurrão da máquina partidária. Contam-se pelos dedos os altos responsáveis da Administração Pública que não tenham contado com influência partidária na sua nomeação ou que tenham coragem de dizer não a um governante invocando princípios legais. O Estado está cheio de gente fraca que chegou aos mais altos cargos por isso mesmo, porque dá jeito serem fracos (com os fortes e fortes com os fracos).
     Para encobrir esta pouca vergonha têm sido inventado concursos para que os políticos possam dizer, como o tentou fazer a ministra da Justiça em relação ao senhor dos registos que nada tinha que ver com as nomeações. A verdade é que mais de 90% dos dirigentes do Estado escolhidos por concurso são os do costume, são os que já lá estavam. Não faltam concursos onde na primeira volta só aparece um concorrente porque ou por medo, ou por desprezo ninguém concorre contra o “candidato do regime”. São concursos com transparência muito limitada, não se sabe quem chumba, os fundamentos das escolhas ficam escondidos.
    Fala-se muito de combater a corrupção, talvez não fosse má ideia começar pela modernização do Estado, pela adopção de procedimentos transparentes, por promover uma administração independente dos governos e dos aparelhos partidários.
 
      PS: Hoje ia caindo quando soube que o P.R./Cavaco Silva deu como argumento para as vantagens de investir em Portugal o facto de termos mulheres bonitas (e comparadas a cavalos brr!!).   Estaria Cavaco a vender o país por ter paisagens femininas bonitas ou Portugal vai ser invadido por investidores do Dubai em busca das tais mulheres bonitas que tornam Portugal um país atractivo para quem tem dinheiro?   É evidente que estes argumentos da nossa diplomacia económica não reflectem qualquer corrupção de valores, só que até parece.   De repente lembrei-me da famosa fruta do Caso Apito Dourado.  A partir de agora se algum árabe rico se lembrar de mandar um piropo ou de fazer uma proposta à esposa ou à filha bonita devemos fazer um sorriso de gratidão, pois seguiram a sugestão de C.S. e como trouxeram dinheiro para o país devemos ficar-lhes gratos (e ... !! )


Publicado por Xa2 às 07:02 | link do post | comentar | comentários (2)

Domingo, 16.11.14

O chefe de gabinete do secretário de Estado das Finanças e os filhos do ministro Rui Machete e do Presidente angolano José Eduardo dos Santos estão ligados à mesma empresa, a ERIGO, uma sociedade de capital de risco. Esta é a história do dia em que o PSD meteu Angola no Governo.
- José Paulino Dos Santos, Miguel Machete e Rodrigo Balancho de Jesus.

Por: Miguel Carvalho (texto publicado na VISÃO 1129, de 23 de outubro)

Há um "Cavalo de Troia" angolano no Governo. Mas, ao contrário do outro, este parece agradar a gregos e troianos. Menos épica, a odisseia vai de Lisboa a Luanda. Cruza governantes, famílias e jovens-prodígio, hoje trintões, crismados nos ensinamentos financeiros e empresariais do Opus Dei.

Para começar, uma data: 12 de março de 2014. Foi neste dia que Manuel Luís Rodrigues, 34 anos, secretário de Estado das Finanças, oficializou a contratação, para o seu gabinete, de Rodrigo Balancho de Jesus, 36 anos, diretor de investimento da ERIGO, sociedade de capital de risco ligada à família do Presidente José Eduardo dos Santos e a ilustres angolanos. A 9 de setembro seguinte, Rodrigo passou de adjunto a chefe de gabinete do governante.

Manuel Luís Rodrigues tutela, entre outros, o setor empresarial do Estado e o dossiê das privatizações, competências delegadas pela ministra das Finanças. Por inerência de funções, o chefe de gabinete tem acesso a informação reservada. Contratado "em regime de cedência de interesse público", Rodrigo Balancho de Jesus poderá regressar à ERIGO findas as funções no Governo.

Constituída em fevereiro de 2012 com um capital social de 250 mil euros, a empresa tem como administrador José Paulino dos Santos, filho do Presidente angolano e de Maria Luísa Abrantes, sua segunda mulher. A líder da Agência Nacional para o Investimento Privado (ANIP) é também a mãe de Tito Mendonça, CEO da ERIGO, nascido de outra relação. Na administração da sociedade está igualmente Sérgio Valentim Neto, outro incontornável de Luanda, com passagem pelo Governo.

Sobre a ERIGO sabe-se pouco. Desconhecem-se acionistas, atividades e participações, com exceção da quota maioritária na Masemba, que, no ano passado, comprou as publicações Revista de Vinhos, Lux e Lux Woman à PRISA. O sítio da ERIGO na internet diz-nos ao que vem: "A recente crise financeira internacional criou oportunidades únicas de investimento para a tomada de posição de capital em empresas europeias e americanas que detenham know-how e provas dadas no mercado."

Na sede da empresa, em Lisboa, a secretária não se quis identificar nem forneceu o prometido endereço de email para o envio das perguntas da VISÃO. Depois do primeiro contacto, não  mais atendeu o telefone.

ERIGO: poder na sombra

A ERIGO, como já se viu, "chegou" ao Governo de Portugal através da ida do seu diretor de investimento para a Secretaria de Estado das Finanças. Mas para percebermos a nomeação política, talvez seja melhor conhecer quem o recrutou. E aquilo que os liga. Até se tornar a "sombra" do ministro Vítor Gaspar e, mais tarde, de Maria Luís Albuquerque, Manuel Luís Rodrigues foi vice-presidente do PSD, escolha pessoal de Passos Coelho. Nessa qualidade, integrou a equipa de Eduardo Catroga que negociou o Orçamento do Estado de 2011.

Agora chamam-lhe "Sr. Privatizações".Deve o "carimbo" ao facto de ter entre mãos os dossiês sensíveis relacionados com a alienação de património empresarial do Estado, que desperta apetites privados no País e no estrangeiro.  O governante é produto do ensino de elite do Opus Dei: tem um MBA pela IESE Business School de Navarra (Espanha), a escola de administração e direção de empresas da instituição da Igreja Católica, batizada de "maçonaria branca" pelos críticos. Foi professor da AESE - Escola de Direção e Negócios, liderada por membros do Opus Dei e obra cooperativa da prelatura, a partir da qual dirigiu a Naves, sociedade de capital de risco.

O pelouro de Manuel Luís Rodrigues no Governo tem sido, de resto, porto seguro para antigos colegas das instituições de ensino e formação empresarial do Opus Dei, sempre nomeados por ele.

Pouco mais velho do que o secretário de Estado, Rodrigo Balancho de Jesus também é da fornada MBA da IESE espanhola, a escola que se vangloria de levar "a dimensão ética e humana aos negócios". Além disto, ambos têm em comum o curso de engenharia, no Instituto Superior Técnico.
Fixemo-nos, então, na ERIGO, onde Rodrigo ocupou o cargo de diretor de investimento, desde a fundação da empresa, até chegar ao Governo pela mão do colega da Associação de Antigos Alunos da IESE.

Já sabemos que Paulino dos Santos e Tito Mendonça, rostos visíveis da empresa, são irmãos. A mãe é a mesma, só o pai difere. ?O primeiro é conhecido na cena artística por Coréon Dú, cantor multifacetado que navega entre o kuduro e melodias pop cantadas em castelhano. Tito é consultor externo do Banco de Desenvolvimento de Angola. Maria Luísa Abrantes, uma das mulheres mais influentes do país, teve outra filha da relação com o Presidente angolano, de seu nome Welwitschea dos Santos (Tchizé).
Sócia do irmão Paulino dos Santos em vários projetos, a empresária da consultora Westside Investments e da Semba Comunicação em Angola, é uma das personalidades?sob investigação da Procuradoria-Geral da República. Suspeitas sobre as suas transações financeiras foram denunciadas ao Ministério Público português pelo antigo embaixador angolano Adriano Parreira. Tchizé não foi, até agora, constituída arguida, e ameaçou processar o ex-diplomata por difamação. O mal-estar angolano com as averiguações em curso nas instituições judiciais portuguesas é indisfarçável. Mas nem por isso as relações da família "dos Santos" com outros setores nacionais foram afetadas. Pelo contrário, como se vai ler.

Portugal, Angola & Filhos

A Rua General Firmino Miguel, em Lisboa, é morada comum de várias empresas e sociedades. No piso 9.º, do número 3 da torre 2,?fica a sede da ERIGO. Um andar acima é o escritório de advogados da Serra Lopes, Cortes Martins (SLCM), do qual Paula Teixeira da Cruz, ministra da Justiça, foi sócia. A sociedade é um peso-pesado dos escritórios de advocacia. Assessorou a empresa estatal chinesa Three Gorges na privatização da EDP e a Controlinveste, de Joaquim Oliveira, nas negociações com o angolano António Mosquito para a venda do grupo.

Na torre, há uma pessoa com acesso aos dois pisos: Miguel Nuno Ferreira Pena Chancerelle de Machete. Sócio da firma de advogados, é também presidente da mesa da assembleia-geral da empresa ligada à família de José Eduardo dos Santos. O advogado faz parte dos órgãos sociais da ERIGO desde a fundação, mas não é figura de noticiários, nem dá nas vistas pelas atividades profissionais. Administrador da Benfica Multimedia, fala cinco línguas e o apelido diz o resto: é filho de Rui Machete, ministro dos Negócios Estrangeiros.

No ano passado, o governante, histórico do PSD, foi criticado por pedir "diplomaticamente desculpas" a Angola, em nome de Portugal, por causa das investigações em curso na Procuradoria, envolvendo cidadãos angolanos da órbita do poder. "Não há nada substancialmente digno de relevo e que permita entender que alguma coisa estaria mal, para além do preenchimento dos formulários e de coisas burocráticas", resumiu Rui Machete à Rádio Nacional de Angola, tentando pôr água na fervura.
O ministro falara como se, em Portugal, não houvesse separação de poderes. Dura, a reação da procuradora-geral da República Joana Marques Vidal lembrou-lhe isso mesmo. E também, já agora, que as investigações continuavam.

Às explicações sucederam contradições. À rádio angolana, Machete afirmou que a PGR lhe assegurara não haver nada de grave nas investigações. Quando a polémica estalou, garantiu nada ter perguntado. Quisera apenas tranquilizar o regime angolano e evitar danos maiores nas relações com Luanda, justificou. O Jornal de Angola, diário oficial do Governo, saiu em defesa do ministro, criticando "as elites corruptas de Lisboa".
Comentadores, diplomatas e empresários falaram de relações bilaterais "beliscadas" por causa da polémica. A oposição pediu a demissão do governante. O PSD contorceu-se, mas o primeiro-ministro segurou-o, resumindo tudo a uma "expressão menos feliz".

Justino Pinto de Andrade, respeitado académico angolano, criticou a "subserviência" do País aos interesses de Luanda. "As autoridades angolanas não respeitam quem se põe de joelhos", afirmou. No relacionamento com Angola, escreveu o eurodeputado do PS Francisco Assis, Portugal não precisa "dos que estão dispostos a contrabandear valores de sempre por interesses momentâneos". A PGR angolana retaliou, anunciando investigações a portugueses suspeitos de branqueamento de capitais.
Cavaco, Durão Barroso e Passos Coelho entraram, então, em campo para "serenar os ânimos". A PGR arquivou alguns dos casos relativos a figuras angolanas, a congénere de Luanda fez o mesmo com os portugueses, o clima desanuviou e Machete declarou-se magoado com alegadas tentativas de "assassínio político". "Não acerta uma", criticou Marques Mendes, ex-líder do PSD, no seu comentário televisivo na SIC.

Na altura, uma reação à polémica passou despercebida. Surgiu de Luís Cortes Martins, sócio e líder do escritório de advocacia onde trabalha Miguel Machete. "Na base de tudo isto está uma patologia do nosso sistema de Justiça, que é a violação contínua e sistemática do segredo de Justiça", criticou o advogado da SLCM no Jornal de Negócios, realçando: "Se entre as vítimas de violação do segredo de Justiça estão cidadãos de outros países, obviamente que a questão assume uma sensibilidade agravadíssima."

A entrevista foi publicada a 6 de novembro do ano passado. No dia seguinte, começava em Luanda a II Conferência Internacional sobre Arbitragem, organizada pela SLCM em parceria com a MGA, um dos mais importantes escritórios da ex-colónia, propriedade de Manuel Gonçalves, antigo bastonário da Ordem dos Advogados angolanos. As duas sociedades têm, desde 2012, uma "parceria estratégica" para aproveitar o fluxo económico entre os dois países. "Angola está num processo de internacionalização. Nós também queremos ser parceiros dessa internacionalização, porque Portugal tem muito a beneficiar com os investimentos angolanos", resumiu o patrão de Miguel Machete. Os gestores da ERIGO decerto subscreveriam: "O objetivo de criar uma Sociedade de Capital de Risco é alavancar a presença deste grupo tanto em Angola como na Europa, atraindo investidores privados e institucionais que procurem oportunidades de investimento no mercado internacional", lê-se no site.

 

Tudo em família?

Já vimos que a ERIGO junta figuras próximas de Eduardo dos Santos. Registámos que inclui nos órgãos sociais o filho de um ministro português que mantém uma relação de paninhos quentes com Angola. Explicámos como o diretor de investimento da empresa entrou no Governo. Tanto quanto possível, sabemos o que quer a ERIGO.?Para onde vai e com quem. Mas saberemos tudo sobre as suas ramificações?

O dia é 6 de setembro de 2002. Em Luanda, Walter Rodrigues, jurista alegadamente próximo do Presidente angolano, sócio e representante legal de Tchizé dos Santos em negócios, registou a ZE Designs Importação e Exportação, Lda. na qualidade de "mandatário de José Eduardo dos Santos", na ocasião "representante legal do seu ?filho menor, José Eduardo Paulino dos Santos".

Começava assim, com a bênção paterna, a carreira empresarial do atual administrador da ERIGO. Paulino dos Santos tinha 17 anos.
Enquanto a irmã Isabel dos Santos, bilionária, despertou para a vida empresarial aos 6 anos, a vender ovos, segundo revelou ao Financial Times, Paulino terá sentido o chamamento mais tarde. Ainda assim, mais cedo do que o irmão José Filomeno (Zenú), que criou um banco aos 30 anos, gere os ?4 mil milhões de euros do Fundo Soberano de Angola e é, segundo os analistas, o favorito para suceder ao pai, na presidência.

Os manos Paulino e Tchizé andam de mãos dadas, nos negócios, há mais de uma década. Em 2003, juntaram-se ao português Hugo Pêgo, marido de Tchizé, e criaram a Di Oro - Sociedade de Negócios Limitada. A firma nasceu ligada a eventos de moda e alta-costura. Mas dedicou-se à exploração de diamantes, depois de um decreto do Presidente angolano autorizar uma licença de prospeção na Lunda-Norte a um consórcio que incluía a empresa dos filhos. Em 2010, a licença foi prolongada por dois anos.
Paulino e Tchizé foram ainda acionistas do Banco de Negócios Internacionais (BNI), entidade que iniciou atividade em Portugal e opera em Angola no segmento das grandes empresas e particulares de ?elevado rendimento.

Em 2006 terão usado o endereço do palácio presidencial como residência para criar a Semba Comunicação. O caso foi noticiado por Rafael Marques do Maka Angola, e outros órgãos de informação, nomeadamente o Público. Logo nesse ano, a empresa dos filhos de José Eduardo dos Santos lançou uma campanha internacional na CNN, sob os auspícios da Agência Nacional de Investimento Privado, presidida pela mãe de ambos, Maria Luísa Abrantes.

Em 2012, a Semba arrecadou 31 milhões de euros do erário público para campanhas milionárias de promoção do País no estrangeiro e gestão de dois canais da Televisão Pública de Angola (TPA). No último ano, as transferências rondaram os 87 milhões de euros, canalizados através do gabinete de propaganda e comunicação institucional do Governo angolano, sob tutela da Presidência da República. Sérgio Valentim Neto, sócio e diretor executivo da Semba e administrador da ERIGO, já foi coordenador daquele gabinete.
Antes de irmos a outros links do poder da família "dos Santos" em Portugal vale a pena determo-nos um pouco em Maria Luísa Abrantes, mãe de Tchizé e Paulino, filhos da relação com o Presidente angolano nas décadas de 70/80.
Com passagens pelo Governo no currículo, sobretudo na área do investimento estrangeiro, Milucha, para os íntimos, fez parte da sua formação universitária em Lisboa (na Clássica e na Lusíada) e é presidente do Conselho Fiscal do Banco Caixa Geral Totta de Angola, detido maioritariamente pela Caixa Geral de Depósitos. Através da ANIP, que representou em Washington e da qual é presidente, priva com líderes mundiais. Foi o caso, em 2013, de uma conferência do Centro de Relações Transatlânticas, da Johns Hopkins University, dos EUA, promovida pela ANIP e a ERIGO, em Luanda, com o apoio institucional do Presidência da República. Estiveram presentes antigos e atuais governantes de todo o mundo, entre os quais José Maria Aznar (ex-chefe do Governo espanhol) e Miguel Relvas ?(ex-ministro do Governo PSD/CDS).

Promovida pela referida instituição norte-americana, a denominada Iniciativa de Cooperação para a Bacia do Atlântico inclui, entre os seus membros, Dias Loureiro (ex-ministro do PSD, ex-BPN) e Tito Mendonça, CEO da ERIGO. Os dois, por coincidência, estão juntos em negócios desde março: são administradores da Lagoon, SGPS. A empresa tem a mesma morada da ERIGO e também é gerida pelo filho do general angolano Carlos Hendrick da Silva, militar denunciado à Procuradoria-Geral da República de Portugal pelo ativista de direitos humanos Rafael Marques, a pretexto do seu livro Diamantes de Sangue (Tinta da China). O fundador do site Maka Angola acusa-o de cumplicidade com torturas e assassínios na região diamantífera da Lunda, conforme adiantou a VISÃO, no ano passado.

Como já se percebeu, vários caminhos se cruzam com a ERIGO e os seus administradores, aqui e além-mar.

Em Portugal, a empresa é dona da Masemba, que atua nas áreas da edição, comunicação e marketing. O gerente é Renato Freitas, antigo coordenador dos repórteres de imagem da SIC. Os sócios são Tito Mendonça, Sérgio Valentim Neto, a produtora Até ao Fim do Mundo (detida por ex-jornalistas do canal de Carnaxide) e a Semba Comunicação, na sua versão portuguesa. Nesta, juntam-se Paulino dos Santos, filho do Presidente de Angola, Tito Mendonça, Sérgio Valentim Neto e Renato Freitas.
Resumindo: a ERIGO, a mais recente aventura empresarial de familiares e figuras próximas da casta dirigente angolana, cruza-se com dois governos, um par de famílias, várias sociedades e empresas, entre Lisboa e Luanda. Neste quadro, o recrutamento, pelo Governo português, do diretor da empresa com ligações ao Presidente angolano, até parece um pormenor.

A reação de Rui Machete

O Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros "desconhece a existência ou o objeto" da ERIGO. "As atividades profissionais do dr. Miguel Pena Machete apenas a este dizem respeito", referiu Rui Machete através de um curto esclarecimento enviado à VISÃO. Miguel Machete, advogado da Serra Lopes, Cortes Martins & Associados, não respondeu aos nossos emails.

Também o secretário de Estado das Finanças, Manuel Luís Rodrigues, questionado por escrito sobre a escolha do seu chefe de gabinete, a ERIGO e as nomeações de antigos colegas da IESE Business School para o gabinete, optou pelo silêncio. A ERIGO também não respondeu. Por telefone, email e via redes sociais, em Portugal e Angola, a VISÃO tentou falar com o CEO, Tito Mendonça, ou outro responsável da empresa, sem sucesso. Os contactos com o Banco de Desenvolvimento de Angola, onde é consultor externo, foram infrutíferos. Na sede da sociedade em Lisboa, após um primeiro contacto, nunca mais os telefonemas da VISÃO foram atendidos.



Publicado por [FV] às 20:11 | link do post | comentar | comentários (3)

Quarta-feira, 25.06.14

Decorreu já algum tempo que este texto de José Gil (filósofo) aqui foi postado por mim.

Contudo considerei que estava na altura de ser relembrada, repensada e analisada em simultaneo com a postagem que irei fazer seguidamente duma entrevista a Kevin Dutton de Nicolau Ferreira e saída no Jornal Público...

 

“Há pelo menos uma década e meia está a ser planeada e experimentada quer a nível do nosso país, quer na Europa e no mundo uma nova ditadura - não tem armas, não tem aparência de assalto, não tem bombas, mas tem terror e opressão e domesticação social e se deixarmos andar, é também um golpe de estado e terá um só partido e um só governo - ditadura psicológica.
Nunca uma situação se desenhou assim para o povo português: não ter futuro, não ter perspectivas de vida social, cultural, económica, e não ter passado porque nem as competências nem a experiência adquiridas contam já para construir uma vida. Se perdemos o tempo da formação e o da esperança foi porque fomos desapossados do nosso presente. Temos apenas, em nós e diante de nós, um buraco negro.
O «empobrecimento» significa não ter aonde construir um fio de vida, porque se nos tirou o solo do presente que sustenta a existência. O passado de nada serve e o futuro entupiu. O poder destrói o presente individual e coletivo de duas maneiras: sobrecarregando o sujeito de trabalho, de tarefas inadiáveis, preenchendo totalmente o tempo diário com obrigações laborais; ou retirando-lhe todo o trabalho, a capacidade de iniciativa, a possibilidade de investir, empreender, criar. Esmagando-o com horários de trabalho sobre-humanos ou reduzindo a zero o seu trabalho. O Governo utiliza as duas maneiras com a sua política de austeridade obsessiva: por exemplo, mata os professores com horas suplementares, imperativos burocráticos excessivos e incessantes: stress, depressões, patologias, border-line, enchem os gabinetes dos psiquiatras que os acolhem. É o massacre dos professores. Em exemplo contrário, com os aumentos de impostos, do desemprego, das falências, a política do Governo rouba o presente de trabalho (e de vida) aos portugueses (sobretudo jovens)
O presente não é uma dimensão abstracta do tempo, mas o que permite a consistência do movimento no fluir da vida. O que permite o encontro e a intensificação das forças vivas do passado e do futuro - para que possam irradiar no presente em múltiplas direcções. Tiraram-nos os meios desse encontro, desapossaram-nos do que torna possível a afirmação da nossa presença no presente do espaço público. Actualmente, as pessoas escondem-se, exilam-se, desaparecem enquanto seres sociais.
O empobrecimento sistemático da sociedade está a produzir uma estranha atomização da população: não é já o «cada um por si», porque nada existe no horizonte do «por si». A sociabilidade esboroa-se aceleradamente, as famílias dispersam-se, fecham-se em si, e para o português o «outro» deixou de povoar os seus sonhos - porque a textura de que são feitos os sonhos está a esfarrapar-se. Não há tempo (real e mental) para o convivio. A solidariedade efectiva não chega para retecer o laço social perdido. O Governo não só está a desmantelar o Estado social, como está a destruir a sociedade civil. Um fenómeno, propriamente terrível, está a formar-se: enquanto o buraco negro do presente engole vidas e se quebram os laços que nos ligam às coisas e aos seres, estes continuam lá, os prédios, os carros, as instituições, a sociedade. Apenas as correntes de vida que a eles nos uniam se romperam. Não pertenço já a esse mundo que permanece, mas sem uma parte de mim. O português foi expulso do seu próprio espaço continuando, paradoxalmente, a ocupá-lo. Como um zombie: deixei de ter substância, vida, estou no limite das minhas forças - em vias de me transformar num ser espectral. Sou dois: o que cumpre as ordens automaticamente e o que busca ainda uma réstia de vida para os seus, para os filhos, para si.
Sem presente, os portugueses estão a tornar-se os fantasmas de si mesmos, à procura de reaver a pura vida biológica ameaçada, de que se ausentou toda a dimensão espiritual. É a maior humilhação, a fantomatização em massa do povo português.
Este Governo transforma-nos em espantalhos, humilha-nos, paralisa-nos, desapropria­-nos do nosso poder de acção. É este que devemos, antes de tudo, recuperar, se queremos conquistar a nossa potência própria e o nosso país."



Publicado por [FV] às 10:50 | link do post | comentar | comentários (1)

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