Filhadaputice é isto . (- por j.m. cordeiro, 13/7/2016, Aventar)
Seis países não cumpriram as regras do pacto de estabilidade em 2015
Seis países ficaram em procedimento de défice excessivo em 2015. Croácia, França, Grécia, Reino Unido (se ainda conta), Portugal e Espanha.
Disse-se que houve unanimidade entre os ministros das finanças europeus, que formam o Ecofin, na aplicação de sanções a Portugal. O que é falso, logo em primeiro lugar. "Durante a reunião não houve votação. Portugal e Espanha manifestaram-se contra as sanções, mas os restantes países não levantaram objeções dando luz verde à decisão." [Expresso].
A Grécia opôs-se às sanções. A Croácia calou-se. A França calou-se. Assim se confirma, novamente, que a “europa” é o projecto de um país (e seus satélites oportunistas), capaz de impor aos restantes o seu domínio.
E quem cala consente. Filhadaputice é assobiar para o lado enquanto as chamas do vizinho não chegam ao (seu?) palheiro. Mas lembrando Brecht…
Vivemos um tempo em que a contra-informação domina a informação. Neste caso, passámos de unanimidade para vários protestos. Mesmo assim, não chegou a haver votação. Grande europa.
--- Admirável Nova Europa : Schäuble prepara plano para “nova UE”, incluindo poder de veto sobre orçamentos.
--- O economista chefe do Deutsche Bank pede 150 mil milhões para os bancos falidos da Europa (o dele incluído). Tudo pago pelo contribuinte
--- Golpada CETA? ou Não, a Comissão não quer aprender . (- por Ana Moreno, 14/07/2016, Aventar)
Mas a que espectáculo estaremos nós a assistir??? – pergunta-se apreensivo quem estiver a seguir o processo que, segundo intenção determinada da Comissão, deverá levar à assinatura e celebração do CETA (Acordo Económico e Comercial Global) entre a UE e o Canadá.
Poucos dias após o referendo sobre o Brexit, Juncker e a sua Comissão declararam peremptoriamente o CETA como Acordo “EU only”, ou seja, da exclusiva competência da UE e, portanto, a ser decidido em Bruxelas, com ratificação no parlamento europeu.
Porém, devido aos fortíssimos protestos de uma larga camada de cidadãos esclarecidos que se opõem ao CETA – assim como ao TTIP e TISA – em países como a Áustria, França, Alemanha ou Luxemburgo, os seus governantes não quiseram arriscar o conflito. E foi uma catadupa de reacções contra o plano da Comissão, exigindo a ratificação do CETA pelos parlamentos nacionais. [Read more…]
--- Quando Deus é o mercado e a inspiração é o dinheiro . (- por Santana Castilho,13/7/2016, Aventar)
Carl Levin Milton, advogado e ex-senador pelo Michigan, foi curto e grosso sobre o Goldman Sachs, quando o identificou como “um ninho financeiro de cobras, repleto de ganância, conflitos de interesses e delitos”. O Libération foi fino quando opinou que Durão Barroso fez um simples manguito à Europa.
Eu parafraseio ambos para acrescentar que tudo converge. Se há talento que Durão Barroso sempre teve foi para aproveitar as oportunidades e fazer manguitos à ética e à moral. Foi assim quando desertou do Governo; foi assim quando cooperou com o crime do Iraque; é assim, agora, quando regressa aonde sempre esteve, isto é, para junto dos que promovem fortunas obscenas e calcam os mais fracos. A sua ignóbil conduta faz-me pensar nos valores que a educação instila nos jovens.
A educação é pautada pela doutrina da sociedade de consumo. Os alunos são orientados para os desejos que a orgia da publicidade fomenta. Paulatinamente, muitos professores foram-se transformando em peões de um sistema sem humanidade. Paulatinamente, aceitaram desincentivar os seus alunos de questionar e discutir causas e razões.
Teoricamente livres, usamos a nossa liberdade para permitirmos que nos condicionem. Tudo é mercadoria, educação inclusa. Preferimos estar sujeitos a mecanismos de controlo social a criar mecanismos de oposição ao sistema e de desenvolvimento de outro tipo de desejos: o desejo de visitar a vida, de cooperar com os outros.
Os sistemas de educação deixam as nossas crianças sem tempo para serem crianças. Porque lhes definimos rotinas e obrigações segundo um modelo de adestramento que ignora funções vitais de crescimento. O ritmo de vida das crianças é brutalmente acelerado segundo o figurino errado de vida que a sociedade utilitarista projecta para elas. Queremos que elas cresçam depressa.
A pressa marca tudo e produz ansiedade em todos. Não lhes damos tempo para errar e aprender com os erros, quando o erro e a reflexão sobre ele é essencial para o desenvolvimento dos jovens. É a ditadura duma sociedade eminentemente competitiva e utilitária, mas pobre porque esqueceu a necessidade de formar os seus, também, pelas artes, pela estética e pela música.
Muitos dizem que temos a geração mais preparada de sempre. Mas será que temos? Ou será que temos, tão-só, uma geração com uma relação elevada entre o número dos seus elementos e os graus académicos que obtiveram? E preparada para quê? Para responder ao “mercado” ou para responder às pessoas? É que há uma diferença grande entre qualificar e certificar, preparar e diplomar.
Quantos pais e quantos políticos se preocuparão hoje com o desconhecimento dos jovens acerca de disciplinas essenciais para a compreensão da natureza humana? Refiro-me, entre outras, à filosofia, à literatura, à história, à antropologia, à religião, à arte. Obliterados que estão todos com a economia e as finanças, enviesada que é a sua forma de definir a qualidade de vida das sociedades, sempre medida pelo crescimento do PIB mas nunca pela forma como ele é dividido, dão um contributo fortíssimo para apagar a visão personalista da educação e promover a visão utilitarista e imediatista, que acaba comprometendo a própria democracia. Porque troca o pensamento questionante pela aceitação obediente, de que os mercados carecem. Este minguar do conceito de educação vem transformando a sua natureza pluridimensional numa via única, autoritária, geradora do homem mercantil e do jovem tecnológico, de exigências curtas. E não se conclua daqui que desvalorizo o progresso tecnológico, mas tão-só que rejeito o enfoque único nessa via, para que tendemos mais e mais, como referência dominante da decisão política. Provavelmente porque é bem mais fácil manipular o tecnólogo que o artista, o tecnocrata que o livre-pensador.
A universidade é talvez o mais evidente espelho do que afirmo. Tem a sua natureza cada vez mais corrompida por conceitos de mercado, que vão condicionando o conhecimento gerado pelos seus investigadores. Com efeito, os programas de financiamento da investigação estão marcados pela natureza dos resultados previstos. Hoje procura-se mais a utilidade do conhecimento. Antes partia-se para a procura da verdade, mesmo que essa verdade não tivesse utilização mercantil ou não gerasse lucro imediato. O professor universitário, como intelectual puro, passou de moda. Antes, a missão dos universitários era pensar. Agora é produzir.
A valorização da cultura universal cedeu passo a múltiplos nichos de cultura utilitarista. Houve, por parte dos interesses económicos e empresariais como que uma expropriação do trabalho académico de outros tempos. A utilização da inteligência está canalizada, preferencialmente, para a inovação que interessa às empresas e que elas vão, depois, utilizar, tendo lucros. A universidade, que oferecia conhecimento, vai virando universidade que oferece serviços. A pressão para que os docentes produzam e sejam avaliados por rankings é o reflexo desta nova filosofia, onde Deus é o mercado e a religião é o dinheiro.
A Mocidade Empreendedora, ou o Professor Karamba vai à escola
(-J. Soeiro, 8/5/2015, Expresso)
Se fosse outra coisa, já teríamos ouvido os comentadores do costume indignados com a violação da “liberdade das famílias” e a “doutrinação das criancinhas”. Mas é o empreendedorismo e Portugal precisa de “acreditar”.
A Junior Achievement Portugal (JAP), responsável pelas sessões, é uma iniciativa da responsabilidade da Sonae e do grupo Mello, com mais de uma dezena de outros grandes grupos económicos (Millenium, PT, Barclays, Citibank ou a Jerónimo Martins...) A missão é “guiar os jovens para o empreendedorismo”. Diz a JAP no seu site que o “grande objectivo para Portugal é podermos um dia afirmar que todas as crianças e jovens tiveram uma experiência Junior Achievement”. Para este verdadeiro desígnio nacional, nada melhor que atacar nas escolas, sem autorização dos pais mas com a permissão e o incentivo das autarquias (como Lisboa) e do Ministério da Educação.
Uma organização privada, da iniciativa de grandes empresas, ocupa uma parte do currículo da escola pública e obriga as crianças a frequentar sessões de doutrinação sobre a beleza do mercado, a importância da competição, a magia da criação de valor e a necessidade de disposições empreendedoras. Os programas são ministrados por voluntários e destinam-se a crianças desde os seis anos de idade. Há projetos nacionais e europeus. E há concursos. O mais popular é a competição nacional “A Empresa”. Durante um ano letivo, os alunos simulam que conduzem uma empresa, elaboram o seu “plano de negócios” e são avaliados “de acordo com os resultados obtidos na participação na Mini-Empresa”.
A religião do empreendedorismo já tinha tido momentos altos com o pastor Miguel Gonçalves a mandar os jovens “bater punho” ou com as formações em “empreendedorismo para bebés”, realizadas por um instituto lisboeta e destinadas a crianças entre os 4 e os 18 meses, com o objetivo de “desenvolver, em conjunto com os pais, comportamentos e atitudes chave que ajudarão o bebé, no futuro, a ser um empreendedor”. Agora, chegou em força à escola. De pequenino se torce o pepino e Portugal terá um dia pelo menos uma empresa por habitante. É a “urgência do empreendedorismo”.
Um estudo da OCDE de 2009 fazia um levantamento comparativo sobre os países onde havia mais empreendedorismo. Na Noruega, 7% da população era empreendedora, nos EUA 8% e em França 9%. Já no Gana, 66,9% da população está auto-empregada, no Bangladesh 75,4% são empreendedores individuais. Ou seja, é nos países mais pobres, onde o Estado é débil e onde o tecido económico tem pouca capacidade de concentração de recursos e de massa crítica, que se batem recordes de “empreendedorismo”. Desse ponto de vista, Portugal está no bom caminho. É só acreditar.
Luta social em crescendo na Europa (-Francisco, 5dias, 12/12/2014)
Após uma aparente acalmia, a luta social parece estar a reacender-se por essa Europa fora…
Esta semana ocorreu a maior e mais combativa manifestação da “era austeritária” na Irlanda, que incluiu cerco ao parlamento. Na Bélgica, com outros pretextos mas pelas mesmas razões, ocorreram também grandes protestos e uma greve geral. No Reino Unido têm acontecido várias manifestações estudantis e não só. Em Itália hoje é dia de greve geral e nos últimos tempos a contestação tem subido de tom. As ruas da Grécia voltaram-se a encher e forçaram o governo a recuar.
Essa mesma Grécia vive uma importante crise política, é possível que ocorram eleições legislativas no início de 2015. Existe a forte possibilidade do Syriza ganhar essas eleições. Também em Espanha vai haver eleições, o PODEMOS está muito bem posicionado. Mesmo que não vença as eleições a mossa causada será de tal ordem que irá forçar o PSOE e o PP a governarem juntos pela primeira vez na História (depois disso é mais que provável que o PODEMOS chegue mesmo lá, é exactamente o que se está a passar na Grécia). O Reino Unido é outro dos estados europeus que terá eleições. O Labour cometeu suicídio na Escócia e irá perder todos os deputados dessa nação (cerca de 40), o UKIP lançou uma “OPA agressiva” aos Tories. O resultado eleitoral é imprevisível. Pode haver um Governo Labour+Nacionalistas Escocêses+Nacionalistas Galêses (ambos estes partidos são mais à esquerda que o próprio Labour), pode haver um governo Tories+UKIP, pode até surgir um gabinete Labor+Tories. O que não irá acontecer de certeza é um rotativismo limpo entre Tories e Labor que foi a norma desde o final da II Guerra.
O “centro” está em colapso por toda a Europa, mas não há vazios em política. Se não surgirem alternativas democráticas e progressivas, outras forças tenebrosas tomarão a dianteira (como já acontece na França e não só).
União Europeia
A estratégia a adoptar face a “esta união da tanga” é das questões mais relevantes do nosso tempo. THE POLITICAL STATE OF THE UNION é um artigo que nos fornece um excelente ponto de partida. É feita uma análise da evolução da UE, desde a sua fundação até à actualidade, focada em três pontos: posição da UE no mundo; as relações entre os estados da UE; as relações entre a UE e os cidadãos. Em traços gerais a conclusão é que as propostas de reforma num sentido popular e progressista da UE são um beco sem saída. Em última análise a democracia e a justiça social são incompatíveis com a “construção Europeia” (neoliberal). Eu poria a questão nestes termos, a UE é um inimigo estratégico. Pode e deve haver flexibilidade táctica nesta matéria. Mas do ponto de vista estratégico o objectivo é eliminar a UE e no seu lugar construir uma outra união entre povos livres e soberanos (Lições para Portugal, a discussão à volta do Euro e da UE, ver no final deste texto).
Partido Socialista
Neither pragmatic adaptation nor misguided accommodation: Modernisation as domination in the Chilean and British Left. Neste artigo datado de 2008 os autores fazem uma análise da postura dos partidos “socialistas” face ao neo-liberalismo. O Labour do Reino Unido e o Partido Socialista no Chile são utilizados como caso de estudo. A tese dos autores é que os partidos socialistas não foram “arrastados pelo contexto”, nem foram agentes que limitados pela sua postura de compromisso foram acomodando de forma algo a contra gosto as políticas neo-liberais. Pelo contrário, os partidos socialistas contribuíram de forma activa e deliberada para o ascenso da hegemonia ideológica do neo-liberalismo. Acrescento que a resposta desses partidos à crise que eclodiu em 2008 apenas reforça essa tese.
Por toda a Europa, mas sobretudo nos PIIGS, o social-liberalismo confronta-se com um dilema existencial. Por um lado pode lutar para garantir a sua sobrevivência política, o que implica opor o mínimo de resistência ao grande capital e suas instituições. Por outro lado pode cair sobre a própria espada e sacrificar as suas organizações e estrutura no altar dos “deuses” do regime e dos grandes negócios. Até agora a escolha tem sido sempre a mesma, os social-liberais preferem cair sobre a própria espada do que esboçar o mínimo de oposição consequente aos “mercados” e grande finança.(aqui)
Isto aconteceu na Grécia, está a acontecer na Espanha, no Reino Unido e na França (só para dar os exemplos mais evidentes). Não vejo razão nenhuma para achar que em Portugal será diferente. Se a história provar que esta tese está errada, ou tem uma excepção em Portugal, assumirei o erro. Espero que aqueles que acalentam esperanças numa “viragem à esquerda” do PS também revejam a sua posição se a história demonstrar que Portugal não é excepção à regra…
Protesto Social
Resistance is futile? The impact of disruptive protest in the ‘silver age of permanent austerity’. Desde os anos 80 do século XX está em marcha uma contra revolução conservadora-neoliberal. Neste artigo os autores fazem uma avaliação de vários métodos utilizados para travar essa contra-revolução. A tese defendida é que formas de protesto disruptivas e de confronto com as elites são mais eficazes do que negociações, “diálogos” e outras formas de acção enquadradas nas instituições vigentes. Isso torna-se ainda mais verdade em tempos de crise social e económica, onde as tentativas de “amansar” as contra-reformas pelo “diálogo” são ainda mais inócuas. Para demonstrar isto é empregue um modelo quantitativo que mede o impacto de diferentes formas de combate à desagregação do “estado social”. Aliás, basta conhecer um bocado de história e ir tentando fazer uma análise objectiva à realidade que nos rodeia para chegar à mesma conclusão (e.g. ver aqui).
Ao contrário do que muitos fariseus ao serviço do capital (financeiro-especulativo) nos dizem, o protesto social é das mais eficazes formas de produzir medidas redistributivas em favor da maioria e bloquear o avanço do saque neoliberal. Regra geral, formas de protesto mais disruptivas, inesperadas e imprevisíveis produzem maiores efeitos do que formas mais dóceis e clássicas de protesto/negociação. Acrescento que ao contrário do que algum senso comum advoga, formas mais radicais de luta não são incompatíveis com grandes protestos de massas, sendo muitas vezes até necessárias para que tal aconteça. Um dos mais importantes factores de sucesso num protesto é a esperança e percepção de que uma vitória pode ser obtida. Nada é mais mobilizador do que uma vitória e há poucas coisas mais desmoralizadoras do que uma derrota. Para obter vitórias, muitas vezes é necessário empregar métodos rotulados como “radicais/violentos”.
Tudo isto tem uma aplicação muito imediata no que diz respeito à luta contra a privatização da TAP e da greve entretanto anunciada.
Guerra e Paz
Boaventura: a Terceira Guerra é contra a Rússia. A questão da PAZ e as movimentações anti-guerra tiveram o seu último auge nos dias que antecederam a invasão do Iraque em 2003. De então para cá, outras lutas e preocupações têm tido mais destaque. De facto, a curto prazo, não me parece que este seja o maior desafio com que o movimento popular se confronta. Mas, a médio prazo pode rapidamente se transformar numa questão central.
Nos últimos tempos temos assistido a um acentuar de tensões entre grandes potências, desde o mar da china até à Ucrânia, passando pelo médio oriente. A União Europeia e a NATO estão num confronto em escalada com a Rússia (a guerra de sanções é um exemplo disso e prejudica gravemente a recuperação económica). O prolongar da crise irá aumentar as probabilidades de um conflito de alta intensidade (a grande depressão dos anos 30 do século XX só terminou com o eclodir da II Guerra mundial…). Não esquecer que Portugal é país membro da NATO e tem aviões estacionados na Estónia a patrulhar o mar Báltico quem é que paga?).
Portugal deve ser um estado neutro, promotor da paz. Não deve ser um anfitrião de cimeiras da guerra, nem um auxiliar menor em dispendiosas políticas agressivas de expansão imperial da NATO+UE. No imediato existem outros temas mais prioritários, mas fica dado o alerta.
“Quem semeia miséria colhe raiva” (-por C. Romualdo, Aventar, 29/5/2014)
foto: Demotix
Em Barcelona, e desde o início desta semana, as ruas ardem, literalmente, de descontentamento. Há perseguições policiais, dezenas de detenções, caixas de multibanco destruídas, contentores incendiados, barricadas. Consequências da decisão do autarca Xavier Trias que ordenou o despejo (e demolição do edifício) de Can Vies, um centro social gerido por iniciativa popular. Num edifício ocupado desde 1997, organizaram-se, ao longo dos últimos anos, oficinas de teatro, debates, apresentações de livros, peças de teatro, concertos, jantares comunitários, e até um jornal de bairro: “La Burxa”. Can Vies tem sido um lugar emblemático daquilo a que se vai chamando “movimentos alternativos”, uma espécie de laboratório onde várias gerações foram construindo utopias e dando corpo a projectos sociais com impacto directo na vida da gente de um bairro operário, o de Sants, com grande tradição de associativismo e múltiplas cooperativas.
Ora, uma “escola de militância”, como alguns lhe chamaram, transcende as suas quatro paredes, e o despejo foi sentido como uma afronta às gentes de Sans. O rastilho de Can Vies incendiou o bairro, em seguida a cidade, e os tumultos já chegaram às vizinhas Lleida, Tarragona e Girona.
A autarquia argumenta que não houve, por parte dos colectivos de Can Vies, abertura para chegar a um acordo quanto à utilização do local, e que não cederá à violência dos protestos. Mas não deixa de ser surpreendente, por muito que a acção política se vá mostrando cada vez mais cega às necessidades e anseios das pessoas, que um autarca decida despejar um centro social que é, há quase duas décadas, uma referência na vida de uma cidade, sem prever que essa atitude de força, ainda que tenha a lei do seu lado, é uma afronta aos cidadãos.
Can Vies tem tudo para se transformar num símbolo da violência imposta por governantes cuja arrogância os estupidifica, que são incapazes de entender o alcance de um centro social, incapazes de prever as consequências de uma atitude violenta numa cidade já incendiada pela crise económica, pelas centenas de despejos de famílias, pelo desemprego, pelos cortes, pela desigualdade crescente.
A autarquia lembra agora a necessidade de acabar com a violência, recusa-se a negociar enquanto não terminarem os tumultos, sem reconhecer que era sua obrigação compreender e respeitar o papel social de um lugar que sempre contribuiria mais para a solução do que para o problema. Porque é disso que se trata, procurar soluções cidadãs num contexto cada vez mais difícil e mais desagregador. Foi o acto violento da autarquia que gerou a violência nas ruas. Como se gritava num dos protestos, “quem semeia miséria, colhe raiva”. E é por isso que Can Vies já é muito mais do que as suas quatro paredes entretanto encerradas, já é um símbolo da revolta dos cidadãos já não apenas ignorados e silenciados, mas pisoteados pelo poder político.
Cleptocracia - governo de/por ladrões (+corruptos e nepotistas) (-por F.Castro, 21/5/2011)
... O pessoal continua a dizer que se
se baixarem os impostos (às empresas e ao capital) e se desregulamentar os mercados a crise passa, os empresários ganham dinheiro e criam empregos, pagam salários e a economia dispara. [A teoria
neo-liberal da treta do "chuveiro" foi iniciada por Reagan (e Thatcher no RU, depois seguida por Blair, ...), e logo desde aí näo criou mais que
bolhas especulativas,
crises, privatizações, desregulamentação e crescimento exponencial das
desigualdades e problemas sociais.]
Há 35 anos que eles dizem isto (esta
mentira muito propagandeada por 'Chicago boys', universidades, fundações/'thinktanks', agências de rating, grupos de mídia, grandes empresários, políticos de direita, ... troika) e há 35 anos que
o poder de compra das famílias vai baixando, enquanto os ricos vão ficando mais ricos. Parece-me que a coisa é mais simples:
a) os ricos compram os políticos; b) os políticos baixam-lhes os impostos e dizem-nos que não há dinheiro e que temos de apertar o cinto; c) os ricos empregam-lhes os filhos. ---xx---
A Bosnia-Herzegovina (B-H) é o exemplo de um Estado "complicado" em que a situação política/ administrativa esconde e 'branqueia' a situação económica/social em degradação e que esta provocou/ agravou os conflitos internos. Politicamente a B-H compreende: a Federação da B-H, com 10 cantões; + a Rep. Servia da B-H, separada em 2 zonas laterais com vários distritos.
B-H é uma amostra do que era a ex-Federação da Jugoslávia, que tinha regime 'socialista não-alinhado' em convivência multicultural pacífica, e que, após a morte do presidente Tito, em nome da «democracia e liberdade económica neo-liberal» foi 'sabotada e invadida' pelos EUA e UE para a trazer para a sua esfera de influência e domínio económico, favorecendo determinadas facções/partidos, caudilhos e governantes fantoches, levando-a à guerra civil, ao retalhar dos Estados/territórios e à rapina das suas empresas estatais e recursos públicos.
Mais que a divisão/diversidade 'étnico-religiosa-linguística', a questão actual da B-H (tal como da ex-Y., ou da Ucránia, ...), a razão fundamental é económico-política sendo que a vertente político-diplomática-militar está ao serviço de grandes bancos privados e empresas multinacionais ('corporations') ligadas ao armamento, reconstrução, minérios, energia, transportes, imobiliário, ... com muitos agentes-antenas e fantoches locais, campeões da (des)informação/propaganda, controlo dos mídia, lobbying e corrupção, intermediários de contratos 'leoninos' , privatizações/saldo e fazedores de legislação 'à medida' de determinados interesses e grupos.
Contra estes predadores/ destruidores do país e interesse comum é que estão a levantar-se/manifestar-se cidadãos e grupos mais esclarecidos e ou atingidos: estudantes, jovens, trabalhadores da classe média e baixa, desempregados e reformados empobrecidos. No meio de tudo isto estão também os partidos locais de esquerda contra direita e neo-nazis, ... com muito populismo, demagogia, 'nacionalismo', radicalismo e pulsões/medidas isoladas ou à mistura.
---xx---
Insurreição na Bósnia-H., revisitando a "questão nacional" e a discussão em torno da U.E. (-Francisco, 5Dias, 13/2/2014)
Recentemente, foi discutida a “questão nacional” e a postura a adoptar face à União Europeia e ao euro (sendo o ponto de partida para a análise o referendo sobre a independência da Escócia que terá lugar em Setembro).
Os
motins e amplos protestos em curso na Bósnia e na Ucrânia reforçam as “teses” que expus nesse texto. Uma delas é que
a UE, longe de ser um qualquer escudo contra a ameaça fascista, é na verdade a geradora dessa mesma ameaça e, inclusive, chega a ser
aliada no terreno de movimentos neo-nazis (
aqui,
aqui ou
aqui).
De naturezas bem diferentes, os protestos na Ucrânia, na Bósnia e
na Turquia (tal como no Brasil a onda de protestos do ano passado não se extinguiu) dão a imagem de uma
Europa com as periferias em chamas. Este é um sinal de que
o domínio/ expansão geográfica da UE atingiu os seus limites. Quanto aos limites políticos, esses serão ser bem visíveis nas próximas eleições europeias. No plano social,
o referendo na Suiça e os
movimentos de contestação que irrompem em vários países (
da Grécia à Alemanha) dão
sinal do profundo mal estar. Até no plano jurídico
surgem complicações com o Tribunal Constitucional Alemão.
Algumas exigências na
#Bósnia e
#Herzegovina:
Revisão das privatizações ;
Devolver a propriedade roubada ao povo ;
Sistema de saúde universal ; Que os
salários dos políticos não possa ser mais que duas vezes o salário médio (200€) ; Revogação do sistema de distritos étnicos ;
Demissão em massa
dos governantes; ... -
parece-lhes familiar ?!! .
Um protesto destes por dia, nem sabem o bem que vos fazia (-por J.Lopes, 10/12/2013)
Mas JAP deixou na AR a medalha de ouro comemorativa do 50º aniversário da declaração Universal dos Direitos Humanos e afirmou que a trocava por outro modelo de desenvolvimento económico. «Quero que os cidadãos do meu país hipotecado realizem os seus sonhos, quero que estes governantes estanquem imediatamente este processo de retrocesso civilizacional que ilumina palácios mas que, ao mesmo tempo, enche a cidade de pessoas a dormir na rua.»
«Não quero medalhas, quero que os cidadãos deste país protestem livremente e de forma digna dentro desta casa e que quando reivindicam os seus direitos por uma vida melhor não sejam expulsos pela polícia destas galerias.»
Ele não foi expulso do Salão Nobre e as paredes de S. Bento registaram mais um protesto – simples e corajoso.