Quinta-feira, 3 de Julho de 2014
Da Eternidade da Poesia no Feminino - Sofia no Panteão
"Esta Gente
Esta gente cujo rosto
Às vezes luminoso
E outras vezes tosco
Ora me lembra escravos
Ora me lembra reis
Faz renascer meu gosto
De luta e de combate
Contra o abutre e a cobra
O porco e o milhafre
Pois a gente que tem
O rosto desenhado
Por paciência e fome
É a gente em quem
Um país ocupado
Escreve o seu nome
E em frente desta gente
Ignorada e pisada
Como a pedra do chão
E mais do que a pedra
Humilhada e calcada
Meu canto se renova
E recomeço a busca
De um país liberto
De uma vida limpa
E de um tempo justo
Sophia de Mello Breyner Andresen, in "Geografia"----------
Da eternidade actual dos ideais... (-por A.P.Fitas)
Sophia, antifascista
Os jornais e as redes sociais estão hoje inundadas por biografias e poemas de Sophia de Mello Breyner, por ocasião do 10º aniversário da sua morte e, sobretudo, porque o seu corpo será transladado esta tarde para o Panteão.
Poucos a recordam como resistente à ditadura, que foi durante décadas, até ao 25 de Abril. Nunca recusou uma presença, uma assinatura, uma voz, normalmente integrada no universo dos chamados «católicos progressistas».
Ligada durante décadas ao Centro Nacional de Cultura e à sua direcção, foi candidata pela oposição (CEUD) às eleições legislativas de 1969 e, um ano antes, escreveu um poema que muitos cantam mas poucos sabem ser de sua autoria: a Cantata da Paz, «estreada» por Francisco Fanhais numa Vigília contra a guerra colonial, na passagem do ano de 1968 para 1969 (onde Sophia esteve obviamente presente).
Vale a pena ouvi-la, em 1968, no início do marcelismo, sobre as condições de vida em Portugal, em entrevista que deu juntamente com o marido, Francisco Sousa Tavares:
Sophia passava bem sem ir para o Panteão – detesto a ideia e o que ela simboliza. Mas, já que vai, que estas memórias da resistência sigam com ela.
(-por Joana Lopes, Entre as brumas da memória)
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